Acórdão nº 50044828420218210073 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Terceira Câmara Cível, 28-02-2023

Data de Julgamento28 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50044828420218210073
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Terceira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003351566
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

23ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5004482-84.2021.8.21.0073/RS

TIPO DE AÇÃO: Empréstimo consignado

RELATOR: Desembargador BAYARD NEY DE FREITAS BARCELLOS

APELANTE: CARLOS JAYME ALVES (AUTOR)

APELANTE: BANCO SANTANDER S/A (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de apelação e recurso-adesivo interpostos por ambas as partes, em face da sentença que julgou procedente a demanda ajuizada por CARLOS JAYME ALVES contra BANCO SANTANDER (BRASIL) S/A.

A parte ré sustenta a legalidade da contratação de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC). Pede pela reforma da sentença, com a improcedência da ação. Requer o provimento do apelo.

Por sua vez, a parte autora postula pela condenação da ré à devolução em dobro dos valores descontados indevidamente e pela majoração da indenização pelo abalo moral sofrido. Por fim, requer o provimento do recurso-adesivo.

Com ambas as contrarrazões, vieram os autos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Extrai-se da petição inicial que a parte autora pretende seja declarada nula a contratação de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC) em seu benefício previdenciário, e, com isso, seja o réu compelido a se abster de efetuar descontos em sua folha de pagamento sob essa rubrica, bem como a restituir os valores descontados e ao pagamento de indenização por danos morais.

Em sua defesa, o banco réu sustenta que não há qualquer ilegalidade na contratação, tendo em vista que a parte demandante aderiu voluntariamente a contrato de cartão de crédito, o qual prevê o pagamento mediante reserva de margem consignável em folha de pagamento.

A Lei nº 10.820/2003, que dispõe sobre autorizações de descontos em folha de pagamento, prevê em seu artigo 6º e respectivo parágrafo 5º, com a redação dada pela Lei nº 13.172/2015:

Art. 6o Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social poderão autorizar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a proceder aos descontos referidos no art. 1o e autorizar, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na qual recebam seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil por ela concedidos, quando previstos em contrato, nas condições estabelecidas em regulamento, observadas as normas editadas pelo INSS.
(...)
§ 5o Os descontos e as retenções mencionados no caput não poderão ultrapassar o limite de 35% (trinta e cinco por cento) do valor dos benefícios, sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para:
I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou;
II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito.

Por seu turno, no âmbito infralegal, a cláusula que prevê a reserva de margem consignável para operações com cartão de crédito em benefícios previdenciários está prevista na Resolução nº 1.305/2009 do Conselho Nacional de Previdência Social, art. 1º, que assim dispõe:

RESOLUÇÃO Nº 1.305, DE 10 DE MARÇO DE 2009.
O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL, no uso da atribuição que lhe confere o inciso V do art. 21 do Regimento Interno, aprovado pela Resolução nº 1.212, de 10 de abril de 2002, torna público que o Plenário, em sua 151ª Reunião Ordinária, realizada em 10 de março de 2009, resolveu:
Art. 1º Recomendar ao Instituto Nacional do Seguro Social – INSS que, relativamente aos empréstimos consignados, e respeitado o limite de margem consignável de 30% (trinta por cento) do valor do benefício, torne facultativo aos titulares dos benefícios previdenciários a constituição de Reserva de Margem Consignável – RMC de 10% (dez por cento) do valor mensal do benefício para ser utilizada exclusivamente para operações realizadas por meio de cartão de crédito.

Não obstante, a constituição de Reserva de Margem Consignável (RMC) exige expressa autorização do consumidor aposentado, seja por escrito ou via eletrônica, conforme prevê expressamente o art. 3º, III, da Instrução Normativa do INSS nº 28/2008, alterada pela Instrução Normativa do INSS nº 39/2009, conforme segue:

Artigo 3º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão por morte, pagos pela Previdência Social, poderão autorizar o desconto no respectivo benefício dos valores referentes ao pagamento de empréstimo pessoal e cartão de crédito concedidos por instituições financeiras, desde que:
(...)
III - a autorização seja dada de forma expressa, por escrito ou por meio eletrônico e em caráter irrevogável e irretratável, não sendo aceita autorização dada por telefone e nem a gravação de voz reconhecida como meio de prova de ocorrência.

Assim, nos termos da lei de regência, os aposentados e pensionistas do INSS, além do percentual relativo a empréstimos consignados, podem comprometer, mediante autorização expressa, 5% de seu benefício para pagamento de despesas com cartão de crédito ou para saques por meio cartão de crédito.

Por consequência, os descontos em folha de pagamento sobre a reserva de margem consignável (RMC) somente são válidos e regulares se (1) o consumidor autorizar a operação de forma expressa, por escrito ou por meio eletrônico, (2) haja efetiva utilização do cartão de crédito para despesas em geral ou saques em dinheiro até o limite previsto em lei (5% do benefício previdenciário).

Ainda, considerando que o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras, conforme teor da Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça, a interpretação a ser dada ao art. 6º, parágrafo 5º, inciso II, da Lei 10.820/2003, com a redação dada pela Lei 13.172/2015, mais favorável ao consumidor em contrato de adesão, é no sentido de que os descontos devem corresponder a saques efetivamente realizados até o limite da margem consignável.

Nesse aspecto, revela-se abusiva a conduta da instituição financeira que efetua descontos sobre a reserva de margem consignável (RMC), ainda que autorizados, sem a respectiva contraprestação, vinculados ao pagamento mínimo da fatura do cartão de crédito, para o saque de valores em dinheiro.

Isso porque, com o pagamento mínimo da fatura, o consumidor compulsoriamente adere ao crédito rotativo do cartão de crédito, modalidade que não se encontra prevista na Lei 10.820/2003, havendo a possibilidade de não ser quitado o contrato mediante os descontos sobre a RMC, pois mensalmente é refinanciado o saldo devedor, com juros acrescidos ao saldo em aberto da fatura do mês anterior, que por sua vez, capitaliza os juros vencidos mês a mês.

Explico. O percentual de 5% abatido do benefício, referente à reserva de margem consignável, quase não é suficiente para amortizar o principal, tendo em vista que corresponde ao valor dos encargos mensais incidentes diante do pagamento mínimo da fatura. Assim, sempre haverá saldo devedor a ser pago na próxima fatura, o que impõe a necessidade de refinanciamento do débito a cada novo período. Tal fato acarreta o...

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