Acórdão nº 50046554020198210086 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Cível, 23-02-2023

Data de Julgamento23 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50046554020198210086
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003213122
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5004655-40.2019.8.21.0086/RS

TIPO DE AÇÃO: Recuperação judicial e Falência

RELATOR: Desembargador NIWTON CARPES DA SILVA

APELANTE: FELIPE SAMPAIO CORRÊA DA SILVA (REQUERENTE)

APELADO: MBN TRADING QUIMICA S/A (REQUERIDO)

APELADO: CROMAFIX INDUSTRIA DE MASTERBATCHES LTDA (REQUERIDO)

APELADO: MBN PRODUTOS QUIMICOS LTDA (REQUERIDO)

APELADO: PROTON QUIMICA LTDA (REQUERIDO)

RELATÓRIO

FELIPE SAMPAIO CORRÊA DA SILVA ajuizou incidente de habilitação de crédito em face de MBN PRODUTOS QUÍMICOS LTDA., CROMAFIX INDÚSTRIA MASTERBATCHES LTDA., MBN TRADING QUÍMICA S/A e PROTON QUÍMICA LTDA. dizendo ser credor do valor de R$ 348.359,12 (...), referente a dívida consubstanciada em título executivo judicial transitado em julgado oriunda da ação nº 086/1.15.0009975-1.

Sobreveio sentença de improcedência do incidente, sem a condenação ao pagamento de custas e honorários advocatícios (evento 44, SENT1).

A parte autora apelou aduzindo que o valor buscado é oriundo de processo de execução de títulos extrajudiciais (nº 086/1.15.0001975‐1), o qual tramitou de 2015 a 2019, sendo que lá ocorreu o trânsito em julgado do feito, fato aparentemente ignorado quando da prolação do decisum. Asseverou que a certidão juntada se constitui em título executivo judicial, de modo que não cabe mais discutir a origem de tal crédito, cuja análise ocorreu no feito de origem. Sustentou que a ação nº 086/1.15.0001975‐1 tramitou regularmente, durante anos, inclusive, onde a recorrida teve todas as oportunidades de demonstrar qualquer insubsistência da nota promissória lá executada, porém não obteve sucesso em fazê‐lo, ante à total regularidade do título ante aos requisitos legais para sua emissão. Defendeu que a suposta irregularidade de título executivo tem que ser provada (o que não o foi no momento oportuno), não podendo o mesmo ser desconstituído posteriormente com base em meras ilações. Requereu, assim, o provimento do recurso (evento 54, APELAÇÃO1).

A parte ré apresentou contrarrazões pugnando pelo não conhecimento do recurso (evento 65, CONTRAZAP1).

Os autos vieram conclusos em 17 de janeiro de 2022.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas. Trata-se, consoante sumário relatório, de pedido de habilitação de crédito na qual objetiva a parte autora a inclusão do seu crédito quirografário no rol de credores da demandada, julgado improcedente na origem.

Em que pese as razões trazidas no presente recurso, o não conhecimento do recurso de apelação é medida impositiva, considerando que esse não foi interposto adequadamente.

Consoante o disposto nos artigos 10, § 5º, e 17, ambos da Lei nº 11.101/05, contra a decisão que julga a habilitação de crédito ou sua impugnação é cabível o recurso de agravo de instrumento, nos seguintes termos:

“Art. 10. Não observado o prazo estipulado no art. 7º, § 1º, desta Lei, as habilitações de crédito serão recebidas como retardatárias.

(...)

§ 5º As habilitações de crédito retardatárias, se apresentadas antes da homologação do quadro-geral de credores, serão recebidas como impugnação e processadas na forma dos arts. 13 a 15 desta Lei.”

“Art. 17. Da decisão judicial sobre a impugnação caberá agravo.”

No caso em tela, tendo a parte habilitante se utilizado de recurso de apelação não há como ser recebida e conhecida a presente irresignação recursal.

Importante sinalar que a oposição de recurso de apelação traduz erro grosseiro, inviabilizando a aplicação do princípio da fungibilidade recursal.

Nesse sentido, é o entendimento do egrégio Superior Tribunal de Justiça, ipsis litteris:

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1293698 - SP (2018/0104990-0)
DECISÃO
Trata-se de agravo contra decisão que negou seguimento a recurso especial fundamentado no art. 105, III, "a", da Constituição Federal, interposto em face de acórdão assim ementado (e-STJ, fl. 378):


HABILITAÇÃO DE CRÉDITO.
RECUPERAÇÃO JUDICIAL. DECISÃO QUE A REJEITA. RECURSO CABÍVEL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. INTERPOSIÇÃO DE APELAÇÃO. NÃO CONHECIMENTO.
Habilitação de crédito em recuperação judicial.
Decisão que a rejeitou. Impugnação pelo habilitante. Interposição de Apelação.
Cabimento de Agravo de Instrumento.
Fungibilidade. A expressa previsão legal quanto ao cabimento do correto recurso impede seja conhecida a Apelação como Agravo de Instrumento. Recurso não conhecido.


Opostos embargos de declaração, foram rejeitados.


Nas razões do recurso especial, a parte agravante aponta violação aos arts. 10, § 6º, da Lei n. 11.101/2005 e 4º, 188, 277 e 283 do Código de Processo Civil.


Sustenta que, apesar de ciente do cabimento do agravo de instrumento para impugnar a decisão que julgou a impugnação ao crédito,
"a recorrente demonstrou que se tratava de exceção à regra, prevista no § 6º da Lei de Recuperação Judicial e Falência, uma vez que na recuperação judicial da empresa ora recorrida, registrado sob nº 0001020-98.2010.8.26.0673, já foi homologado o quadro-geral de credores" (e-STJ, fl.402).


Argumenta que o recurso de apelação é cabível no caso da decisão que rejeita a habilitação de crédito retardatário.


Defende ainda a possibilidade de aplicação do princípio da fungibilidade, uma vez que
"tal princípio consolida o aproveitamento do recurso interposto erroneamente, quando ocorra dúvida gerada pelo próprio sistema e que no âmbito do Código de Processo Civil (CPC) 2015 obtêm novos fundamentos normativos, como na propalada regra interpretativa da primazia (ou preponderância) da análise de mérito, prevista em seu artigo 4º, que busca o máximo aproveitamento da atividade processual" (e-STJ, fl204).


Assim delimitada a controvérsia, passo a decidir.


Inicialmente, destaco que a decisão recorrida foi publicada depois da entrada em vigor da Lei n. 13.105 de 2015, estando o recurso sujeito aos requisitos de admissibilidade do novo Código de Processo Civil, conforme Enunciado Administrativo 3/2016 desta Corte.


No caso, a Corte local não conheceu do recurso de apelação interposto pela recorrente, tendo em vista que
"contra decisão que resolve incidente de habilitação de crédito em recuperação judicial tem cabimento o recurso de Agravo de Instrumento" (e-STJ, fl. 379).


Ressaltou ainda que, diante da previsão expressa do art. 17 da Lei nº 11.101/2005, a interposição de apelação em vez de agravo contra a decisão que julga impugnação em habilitação de crédito na falência caracteriza erro inescusável.


De fato, no caso em exame, tratando-se de pedido para habitação de crédito em recuperação judicial, a Lei n. 11.101/2005, em seu art. 17, prevê expressamente que: "da decisão judicial sobre a impugnação caberá agravo".


Tal entendimento está de acordo com a orientação pacífica do Superior Tribunal de Justiça de que a interposição de recurso contrário ao previsto expressamente em lei configura erro grosseiro, sendo inaplicável o princípio da fungibilidade recursal, pois, no caso em análise, o art. 17 da Lei n. 11.101/05 prevê expressamente que da decisão sobre a impugnação de pedido de habilitação de crédito caberá agravo.
Confiram-se os seguintes precedentes:


AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - PEDIDO DE HABILITAÇÃO DE CRÉDITO - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO.

INSURGÊNCIA DA AUTORA.

1. Nos termos do art. 17 da Lei 11.101/05, contra a decisão judicial sobre impugnação de crédito caberá recurso de agravo. Havendo expressa disposição de lei, constitui erro grosseiro, insuscetível de aplicação do princípio da fungibilidade, a interposição de recurso diverso. Aplicação da Súmula 83/STJ.
2. Agravo interno desprovido.
(AgInt no AREsp 1512820/SP, Rel.
Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 26/11/2019, DJe 27/11/2019) PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
RECUPERAÇÃO JUDICIAL.
HABILITAÇÃO DE CRÉDITO. IMPUGNAÇÃO. RECURSO CABÍVEL. FUNGIBILIDADE. DÚVIDA OBJETIVA. INEXISTÊNCIA. DECISÃO RECORRIDA NO MESMO SENTIDO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA N. 83 DO STJ. DECISÃO MANTIDA.
1. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que a existência de previsão legal expressa impede a aplicação do princípio da fungibilidade, pois afasta a dúvida objetiva e impõe o reconhecimento de erro grosseiro pela utilização de meio processual inadequado. Precedentes.
2. A Súmula n. 83 do STJ aplica-se aos recursos especiais interpostos com fundamento tanto na alínea "c" quanto na alínea "a" do permissivo constitucional.
3. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt no AREsp 1351839/SP, Rel.
Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 07/11/2019, DJe 12/11/2019) AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. IMPUGNAÇÃO PARCIAL DAS QUESTÕES DISCUTIDAS NO RECURSO ESPECIAL. APLICAÇÃO DA PRECLUSÃO CONSUMATIVA E DA COISA JULGADA. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE RECURSAL.
INAPLICABILIDADE. PREVISÃO EXPRESSA NA LEI DO RECURSO CABÍVEL. ERRO GROSSEIRO.
1. Aplicam-se os institutos da preclusão consumativa e da coisa julgada à questão autônoma não impugnada nas razões do agravo em recurso especial, em obediência ao princípio da dialeticidade.
2. Configura erro grosseiro a interposição de recurso contrário ao expressamente previsto na lei, o que inviabiliza a aplicação do princípio da fungibilidade recursal, como no caso de interposição de apelação ao invés de agravo contra decisão que julga o incidente de impugnação de pedido de habilitação de crédito no processo falimentar.
3. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no AREsp 219.866/SP, Rel.
Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/3/2016, DJe 28/3/2016.)


Com efeito, o entendimento da Corte estadual encontra-se em consonância com a orientação desta Corte Superior, sendo aplicável ao caso a Súmula 83/STJ.


Em face do exposto, nego provimento ao
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