Acórdão nº 50047050820218210018 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 14-12-2022

Data de Julgamento14 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50047050820218210018
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoOitava Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002672909
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5004705-08.2021.8.21.0018/RS

TIPO DE AÇÃO: Furto Qualificado (Art. 155, § 4º)

RELATOR: Desembargador LEANDRO FIGUEIRA MARTINS

APELANTE: JUNIOR LUIS SCHWEIG (RÉU)

APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia contra JÚNIOR LUÍS SCHWEIG, afirmando estar incurso nas sanções do artigo 155, § 4º, incisos I e II, do Código Penal (CP), pela prática do seguinte fato descrito na peça inicial (evento 1, INIC1):

"FATO DELITUOSO

No dia 16 de junho de 2021, por volta das 19h, na EMEF Cinco de Maio, na Rua Padre Alberto Trasel, nº 347, Bairro Cinco de Maio, em Montenegro/RS, o denunciado JÚNIOR LUÍS SCHWEIG, mediante escalada, ao pular a cerca externa da Escola e utilizar um bicicletário como escada, passando por cima do telhado até o prédio em que se encontrava o depósito, e mediante rompimento de obstáculo, ao arrombar a porta do depósito da Instituição de Ensino, causando dano de, aproximadamente, R$ 1.000,00 (um mil reais), subtraiu, para si, 12 (doze) latas de tinta, cor areia, de esmalte sintético, avaliadas em, aproximadamente, R$ 80,00 (oitenta reais) cada, totalizando R$ 960,00 (novecentos e sessenta reais); 01 (um) rolinho de pintura, avaliado em, aproximadamente, R$ 26,90 (vinte e seis reais e noventa centavos) e 20 (vinte) sacos de 1kg de Sabão em Pó, marca +Clean, avaliado em, aproximadamente, R$ 100,00 (cem reais), todos de propriedade da Escola Cinco de Maio, conforme auto de avaliação indireta.

À ocasião, o denunciado JÚNIOR LUÍS SCHWEIG, mediante escalada e rompimento de obstáculo, subtraiu, para si 12 (doze) latas de tinta, cor areia, de esmalte sintético, avaliadas em, aproximadamente, R$ 80,00 (oitenta reais) cada, totalizando R$ 960,00 (novecentos e sessenta reais); 01 (um) rolinho de pintura, avaliado em, aproximadamente, R$ 26,90 (vinte e seis reais e noventa centavos) e 20 (vinte) sacos de 1kg de Sabão em Pó, marca +Clean, avaliado em, aproximadamente, R$ 100,00 (cem reais), todos de propriedade da Escola Cinco de Maio. Ato contínuo, o denunciado esperou o Educandário estar fora do horário de funcionamento, pulou a cerca externa, utilizando um bicicletário que havia no interior da escola, para subir no telhado e acessar o prédio de nº 1, onde se encontra o depósito. Este arrombou a porta do depósito e subtraiu os itens acima descritos.

O furto foi percebido no dia seguinte pela diretora da escola e funcionárias, que visualizaram o denunciado pelas câmeras de videomonitoramento do local, constatando que este vestia casaco camuflado, máscara e boné, e que o irmão do indivíduo teria estudado na EMEF Cinco de Maio".

Recebida a denúncia em 04/08/2021 (evento 4, DESPADEC1) e produzida a prova, a pretensão, nos seguintes termos, foi julgada procedente (evento 99, SENT1):

"Dispositivo

Ante ao exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão acusatória para CONDENAR o réu JÚNIOR LUÍS SCHWEIG pela prática do crime previsto no art. 155, §4°, incisos I e II, do Código Penal combinado com o art. 61, I, do mesmo diploma legal.

Passo a dosar a pena.

No tocante à culpabilidade, entendo que fora normal à espécie delitiva, não merecendo reprovação maior. O acusado registra antecedentes, sendo inclusive reincidente, circunstância que será valorada na segunda fase de aplicação da pena. Ausentes elementos para aferição de sua personalidade e conduta social. Os motivos não destoam dos esperados quanto ao delito. Quanto às circunstâncias do crime, exaspero a sanção, tendo em vista a existência de duas qualificadoras, de acordo com o entendimento dos Tribunais Superiores.As consequências são comuns à espécie. Por fim, não há falar em contribuição da vítima à prática delituosa.

Portanto, exaspero a sanção mínima em 1/6, de acordo com o entendimento dos Tribunais Superiores, fixando a pena-base em 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão.

Outrossim, tratando-se de réu multirreincidente, procedo ao aumento de 3/6, de acordo com o entendimento dos Tribunais Superiores, fixando a pena provisória em 03 (três) anos, 05 (cinco) meses e 27 (vinte e sete) dias de reclusão, a qual torno definitiva, em face da ausência de outras causas modificadoras de pena.

O regime inicial a ser adotado é o semiaberto, nos termos do art. 33, § 2º, alínea “b” e §3° do Código Penal, tendo em conta a reincidência do condenado.

Ainda quanto ao regime da pena, de acordo com o art. 387, §2º, do CPP (alterado pela Lei n.º 12.736/12), o tempo de prisão provisória deve ser computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade.

Contudo, seria equivocado simplesmente efetuar-se a detração do tempo de prisão e, após, definir o regime inicial, pois não seria observado o sistema progressivo de cumprimento de pena. Impõe-se, portanto, aplicar a novel legislação em consonância com a Súmula nº 716 do STF, segundo a qual “Admite-se a progressão de regime de cumprimento da pena ou a aplicação imediata de regime menos severo nela determinada, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória”. Desta forma, a modificação do regime inicial de cumprimento da pena, por conta da detração, apenas será possível quando implementado o requisito objetivo indispensável à progressão de regime.

No presente caso, o réu esteve preso por 62 dias (02 meses e 02 dias). O cômputo de tal período em nada altera o regime prisional fixado, porque ainda não implementado o requisito temporal para a progressão de regime (art. 112, II, da LEP).

Registra-se que resta pendente de cumprimento 03 (três) anos, 03 (três) meses e 25 (vinte e cinco) dias.

Pena restritiva de direitos (art. 44 do CP) e sursis (art. 77 do CP).

Em face da reincidência, descabe a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos, bem como a suspensão condicional da pena (arts. 44, II e 77, caput e incisos I e II, ambos do CP).

Fixo a sanção pecuniária em 30 dias-multa, levando em conta as circunstâncias judiciais já analisadas (art. 59 do CP). Considerando-se não haver nos autos prova da capacidade econômica do réu, fixo o valor do dia-multa à razão de 1/30 do salário-mínimo nacional vigente à época do fato (arts. 49, §1º, e 60, do CP) - quantia esta a ser corrigida monetariamente desde a data do fato (art. 49, §2º), pelo IGP-M.

Diante da ausência de motivos supervenientes para decretação da segregação cautelar do acusado e considerando o regime ora aplicado, reconheço o direito de apelar em liberdade.

Custas pelo réu, suspensa a exigibilidade, diante da presunção de hipossuficiência financeira, uma vez que assistido pela Defensoria Pública".

Intimado (evento 107, CERTGM1), o réu ingressou com apelação e alegou, em síntese (evento 108, APELAÇÃO1, e evento 116, RAZAPELA1): (a) nulidade do auto de constatação de furto qualificado; (b) não haver provas suficientes para sustentar a condenação, destacando que "ninguém presenciou o fato, nenhuma testemunha viu o apelante, pelo contrário, disseram que ele estava de máscara, e que não tinha como reconhecer" (fl. 7); (c) que "nenhuma testemunha disse ter visto ou reconhecido o apelante pelas câmeras de segurança, mas apenas que viram um indivíduo ingressando no interior da escola" (fl. 8); (d) ser necessário o afastamento das qualificadoras pela inexistência de laudo capaz de demonstrá-las; (e) que era caso de redução da pena privativa de liberdade e de isenção da multa cumulativa. Assim, ao final, prequestionando a matéria, pediu o provimento do recurso, com o acolhimento da prefacial de nulidade do auto de constatação de furto qualificado, a absolvição ou o êxito no correlato às teses subsidiárias.

O Ministério Público, em contrarrazões, postulou o não provimento do recurso (evento 119, CONTRAZAP1).

Nesta instância recursal, a Procuradoria de Justiça lançou parecer (evento 6, PARECER1).

É o relatório.

VOTO

Conheço do recurso de apelação interposto, porquanto atendidos os requisitos previstos no artigo 593 do Código de Processo Penal (CPP).

1. Nulidade do auto de exame de furto qualificado.

No tocante ao auto de constatação de furto qualificado (evento 1, INQ1, fl. 14 - inquérito policial), realizado de forma indireta, preleciona Guilherme de Souza Nucci1:

"É o exame do corpo de delito, em nosso processo penal, uma espécie de prova pericial constatatória da materialidade do crime investigado, realizada, em regra, por peritos oficiais, ou técnicos, auxiliares dos agentes estatais da persecutio criminis...’ (Do corpo de delito no direito processual penal brasileiro, p. 180-181). No artigo em comento exige-se, para a infração que deixa vestígios, a realização do exame de corpo de delito, direto ou indireto, isto é, a emissão de um laudo pericial atestando a materialidade do delito. Esse laudo pode ser produzido de maneira direta – pela verificação pessoal dos peritos – ou de modo indiretoquando os profissionais se servem de outros meios de provas. Note-se que, de regra, a infração que deixa vestígio precisa ter o exame de corpo de delito direto ou indireto (que vai constituir o corpo de delito direto, isto é, a prova da existência do crime atestada por peritos)" (grifou-se).

Nesta linha, a tese defensiva não merece prosperar.

Primeiro, quanto à qualificação dos peritos, o auto de constatação e a portaria do evento 1, INQ1, fl. 16 do inquérito policial, demonstram o preenchimento dos requisitos do artigo 159 do CPP, que dispõe:

"Art. 159. O exame de corpo de delito e outras perícias serão realizados por perito oficial, portador de diploma de curso superior.
§ 1º Na falta de perito oficial, o exame será realizado por 2 (duas) pessoas idôneas, portadoras de diploma de curso superior
...

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