Acórdão nº 50047281720208210073 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeira Câmara Cível, 20-04-2022

Data de Julgamento20 Abril 2022
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50047281720208210073
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001368637
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

1ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5004728-17.2020.8.21.0073/RS

TIPO DE AÇÃO: Pensão

RELATOR: Desembargador RICARDO TORRES HERMANN

APELANTE: MUNICÍPIO DE TRAMANDAÍ (RÉU)

APELADO: GILMAR VIERA SA (AUTOR)

RELATÓRIO

O MUNICÍPIO DE TRAMANDAÍ apela da sentença que julgou procedentes os pedidos formulados na ação de concessão de pensão por morte que lhe move GILMAR VIEIRA SÁ, cujo dipositivo transcrevo:

Em face do exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos deduzidos por GILMAR VIEIRA SÁ contra o MUNICÍPIO DE TRAMANDAÍ, para determinar que o réu conceda ao autor benefício de pensão por morte da segurada Carmen Regina Cardoso da Rosa, a contar de cinco anos antes do pedido administrativo feito em 28/08/2020; b) condenar o réu ao pagamento das parcelas vencidas e das vincendas ao longo da presente demanda até a data da efetiva implantação do benefício, conforme regramento previsto na Lei Complementar nº 013/2009. No que se refere à atualização monetária da condenação, assinalo que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento proferido do Recurso Extraordinário nº 870947, firmou a tese de que é inconstitucional o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que determina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração básica e juros da caderneta de poupança, por impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (art. 5º, inciso XXII, da Constituição Federal). No mesmo julgado, restou consignada a constitucionalidade do mesmo dispositivo legal no que se refere aos juros de mora quando o débito não é oriundo de relação jurídico-tributária. Dessa forma, deverá o valor da condenação ser atualizado pelo IPCA-E e ser acrescido de juros moratórios nos índices da caderneta de poupança, ambos contados do vencimento de cada parcela.

O réu é isento de pagamento da taxa única e das despesas, consoante o disposto na Lei Estadual nº 14.634/14. Por sua vez, condeno o demandado ao pagamento de honorários advocatícios ao procurador da parte contrária, que estabeleço em 15% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, conforme teor da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.

Tendo em vista os termos da fundamentação da sentença ora proferida e a natureza alimentar da verba postulada, entendo preenchidos os requisitos do fumus boni iuris e periculum in mora, motivo pelo qual antecipo os efeitos da tutela, determinando que o réu conceda imediatamente ao demandante o benefício ora deferido.

Sentença não sujeita a reexame necessário.

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.

Em razões recursais, o Município nega a existência de provas da convivência marital entre o autor e a servidora falecida, argumentando que o juízo não poderia ter se baseado unicamente na sentença proferida no iventário, pois nele o ente público não foi parte. Afirma que o juízo a quo desconsiderou o pedido de expedição de ofício ao INSS para apurar a existência de suposto casamento do autor paralelo à união estável ora noticiada. Requer seja reconhecida a decadência do direito do demandante, já que o óbito ocorreu em 2005. Defende a necessidade de comprovação da dependência econômica do cônjuge para que faça jus à pensão por morte. Pede provimento.

Vêm os autos conclusos.

É o relatório.

VOTO

Adianto, a hipótese é de desprovimento do apelo.

Quanto à decadência ou à prescrição do fundo do direito pleiteado, o Plenário do Supremo Tribunal de Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 626.489/SE, sob a sistemática da repercussão geral, sufragou a seguinte tese (Tema n. 313):

“O direito à previdência social constitui direito fundamental e, uma vez implementados os pressupostos de sua aquisição, não deve ser afetado pelo decurso do tempo. Como consequência, inexiste prazo decadencial para a concessão inicial do benefício previdenciário.”

Outrossim, o e. STJ, nos Embargos de Divergência em REsp nº 1.269.726/MG, dispôs sobre a Superação da orientação adversa oriunda de julgamento na Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, em Recurso fundado em divergência entre a Primeira e a Terceira Seções do STJ.

O julgado em questão recebeu a seguinte ementa:

PREVIDENCIÁRIO E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE DE SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. RELAÇÃO DE TRATO SUCESSIVO QUE ATENDE NECESSIDADE DE CARÁTER ALIMENTAR. INEXISTINDO NEGATIVA EXPRESSA E FORMAL DA ADMINISTRAÇÃO, INCIDE A SÚMULA 85/STJ.

SUPERAÇÃO DA ORIENTAÇÃO ADVERSA ORIUNDA DE JULGAMENTO DA CORTE ESPECIAL DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, EM RECURSO FUNDADO EM DIVERGÊNCIA ENTRE A PRIMEIRA E A TERCEIRA SEÇÕES DO STJ. ULTERIOR CONCENTRAÇÃO, MEDIANTE EMENDA REGIMENTAL, DA COMPETÊNCIA PARA JULGAR A MATÉRIA NO PRIMEIRA SEÇÃO. EMBARGOS DO PARTICULAR E DO MPF ACOLHIDOS.

1. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 626.489/SE, Rel. Min. ROBERTO BARROSO. DJe 23.9.2014, com repercussão geral reconhecida, firmou entendimento de que o direito fundamental ao benefício previdenciário pode ser exercido a qualquer tempo, sem que se atribua qualquer consequência negativa à inércia do beneficiário, reconhecendo que inexiste prazo decadencial para a concessão inicial de benefício previdenciário.

2. De fato, o benefício previdenciário constitui direito fundamental da pessoa humana, dada a sua natureza alimentar e vinculada à preservação da vida. Por essa razão, não é admissível considerar extinto o direito à concessão do benefício pelo seu não exercício em tempo que se julga oportuno. A compreensão axiológica dos Direitos Fundamentais não cabe na estreiteza das regras do processo clássico, demandando largueza intelectual que lhes possa reconhecer a máxima efetividade possível. Portanto, no caso dos autos, afasta-se a prescrição de fundo de direito e aplica-se a quinquenal, exclusivamente em relação às prestações vencidas antes do ajuizamento da ação.

3. Não se pode admitir que o decurso do tempo legitime a violação de um direito fundamental. O reconhecimento da prescrição de fundo de direito à concessão de um benefício de caráter previdenciário excluirá seu beneficiário da proteção social, retirando-lhe o direito fundamental à previdência social, ferindo o princípio da dignidade da pessoa humana e da garantia constitucional do mínimo existencial.

4. Essa salutar orientação já foi acolhida no Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 626.489/SE, Rel. Min. ROBERTO BARROSO. DJe 23.9.2014, de modo que não se faz necessária, em face desse acolhimento, qualquer manifestação de outros órgãos judiciais a respeito do tema, porquanto se trata de matéria já definida pela Suprema Corte. Ademais, sendo o direito à pensão por morte uma espécie de direito natural, fundamental e indisponível, não há eficácia de norma infraconstitucional que possa cortar a fruição desse mesmo direito. Os direitos humanos e fundamentais não estão ao alcance de mudanças prejudiciais operadas pelo legislador comum.

5. Assim, o pedido de concessão do benefício de pensão por morte deve ser tratado como uma relação de trato sucessivo, que atende necessidades de caráter alimentar, razão pela qual a pretensão à obtenção de um benefício é imprescritível. Assim, não havendo óbice legal a que se postule o benefício pretendido em outra oportunidade, o beneficiário pode postular sua concessão quando dele necessitar. Sendo inadmissível a imposição de um prazo para a proteção judicial que lhe é devida pelo Estado.

6. Mesmo nas hipóteses em que tenha havido o indeferimento administrativo, não se reconhece a perda do direito em razão do transcurso de tempo. Isso porque a Administração tem o dever de orientar o administrado para que consiga realizar a prova do direito requerido, não havendo, assim, que se falar na caducidade desse direito em razão de um indeferimento administrativo que se revela equivocado na esfera judicial.

7. Tal compreensão tem sido adotada pelas Turmas que compõem a Primeira Seção quando da análise de recursos relacionados a Segurados vinculados ao Regime Geral de Previdência Social, reconhecendo-se que as prestações previdenciárias tem características de direitos indisponíveis, que incorpora-se ao patrimônio jurídico do interessado, daí porque o benefício previdenciário em si não prescreve, somente as prestações não reclamadas no lapso de cinco anos é que prescreverão, uma a uma, em razão da inércia do beneficiário, nos exatos termos do art. 3o. do Decreto 20.910/32. Precedentes: AgRg no REsp. 1.429.237/MA, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe 5.10.2015; AgRg no REsp. 1.534. 861/PB, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, DJe 25.8.2015; AgRg no AREsp. 336.322/PE, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe 8.4.2015; AgRg no AREsp. 493.997/PR, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 9.6.2014.

7. Impõe-se, assim, estender tal compreensão às demandas que envolvem o pleito de benefícios previdenciários de Servidores vinculados ao Regime Próprio de Previdência, uma vez que, embora vinculados a regimes diversos, a natureza fundamental dos benefícios é a mesma 8. Nestes termos, deve-se reconhecer que não ocorre a prescrição do fundo de direito no pedido de concessão de pensão por morte, estando prescritas apenas as prestações vencidas no quinquênio que precedeu à propositura da ação.

9. Não é demais pontuar que no âmbito da Lei 8.112/90, o art. 219 confere esse tratamento distinto àquele que tem legítimo interesse ao benefício previdenciário, reconhecendo que só ocorre a prescrição das prestações exigíveis há mais de 5 anos, uma vez que a lei permite o requerimento da pensão a qualquer tempo.

10. Embargos de Divergência do particular e do MPF acolhidos, a fim de...

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