Acórdão nº 50047830320158210021 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Segunda Câmara Cível, 16-02-2023

Data de Julgamento16 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50047830320158210021
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Segunda Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003265850
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

12ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5004783-03.2015.8.21.0021/RS

TIPO DE AÇÃO: Transporte Aéreo

RELATOR: Desembargador PEDRO LUIZ POZZA

APELANTE: LAGO BUSATO ASSESSORIA TURISTICA LTDA (AUTOR)

APELADO: ETIHAD AIRWAYS P.J.S.C. (RÉU)

RELATÓRIO

Inicio por adotar o relatório da sentença, da lavra da eminente magistrada Marli Inês Miozzo:

Lago Busato Assessoria Turística Ltda. aforou ação de reparação de danos em face de Etihad Airways P.J.S.C., narrando ter prestado serviços a um grupo de passageiros com bilhetes de transporte aéreo emitido pela ré, com itinerário para alguns países dos Emirados Árabes Unidos, “havendo sido demonstrado para a requerida o percurso integral”. “Todavia, no retorno de Hong Kong, 02/10/13, quando um grupo tentou embargar para Abu Dhabi, não conseguiram, sendo impedidos de fazer o visto no local”. Disse que a ré deixou de avisar aos consumidores da necessidade de documentação, deixando os prejuízos a seu cargo, tendo, de fato, desembolsado um correspondente a R$ 63.652,19 com ressarcimentos aos clientes. Afirmou ter saído do episódio com mancha em sua reputação como boa prestadora de serviços, sofrendo, também, nessa medida, abalo moral. Invocou as regras de pretensão regressiva de ressarcimento de danos, da incidência do Código de Defesa do Consumidor da responsabilidade objetiva por danos por fato do serviço e também por prestadora de serviços públicos, assim como de regulação do contrato de transporte. Aduziu ter a ré incorrido em falha na prestação do serviço, além de furtar-se ao dever de informação clara e precisa sobre os vistos necessários à execução completa e correta do contrato de transporte. Postulou a condenação da ré a ressarcir o valor de R$ 63.652,19 e a indenizar os danos morais, em valor a ser arbitrado pelo juízo. Acostou procuração, atos constitutivos e documentos (fls. 21-157). Recebida a inicial e determinada a citação (fl. 160). Citada (fl. 162), a ré contestou (fls. 163/178), arguindo, preliminarmente, a ilegitimidade ativa da autora, por não fazer prova de ter desembolsado valores perante clientes. No mérito, registrou que a empresa Sky Team Agencia de Viagens emitiu passagens para voo entre Hong Kong e São Paulo, com conexão em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos. Todavia, os passageiros se apresentaram para o embarque sem o visto de entrada em Abu Dhabi, documento exigido pelas autoridades locais e, portanto, indispensáveis à realização da viagem. De sua parte, porém, cumpriu rigorosamente as obrigações ajustadas, não sendo a responsável pelos vistos de entrada dos passageiros. Afirmou ser corrente que, em voos internacionais, não basta ao passageiro portar o bilhete de passagem, mas deve ainda trazer consigo a documentação exigida pelas companhias aéreas e pelas autoridades nacionais dos países por onde passará. No caso, os passageiros não possuíam o visto para entrada em Abu Dhabi, sendo a postura negligente de cada passageiro uma responsabilidade própria sobre a qual a autora afirma ter assumido, sem, contudo, poder se voltar em face da ré. Asseverou que essas exigências estão previstas nas condições do contrato de transporte, além de disponíveis em sua página na rede mundial de computadores. Citou jurisprudência. Salientou que, existindo dever de informação sobre necessidade de visto em viagens internacionais, tal dever incumbe à agência de viagem, não à companhia aérea, sendo exclusiva responsabilidade da autora a falha que possa ter havido. Sustentou caracterizar-se como de relação de mandato a representação da autora perante a companhia aérea na aquisição dos bilhetes de transporte, sendo, portanto, da mandatária a obrigação de informação aos passageiros. Negou que os fatos possam ter acarretado danos morais à autora. Pediu o julgamento de improcedência das pretensões. A autora apresentou réplica (fls. 186/193), onde rebateu os argumentos da defesa e reforçou os da peça vestibular. Oportunizada a requisição de provas, a parte ré postulou a exibição de documentos pela parte contrária, ao passo que a parte autora requereu prova testemunhal (fls. 197/198), anexando documentos (fls. 199- 204). Com vista destes documentos, veio manifestação pela ré (fls. 210- 211). Realizada audiência de conciliação, restou frustrada a tentativa de composição entre as partes (fl. 214). Sobre o pedido de exibição de documentos, foi oportunizado o contraditório à parte autora, vindo a manifestação de fls. 222/223. A autora se manifestou, ainda, sobre a impugnação aos seus documentos de fls. 199-204. Acostou documentos (fls. 224-231). Veio manifestação da ré (fls. 234/235), salientando não haver controvérsia sobre o pagamento das passagens aéreas. Aprazada audiência (fl. 236), apenas a autora arrolou testemunhas. Realizada a solenidade (fls. 246, 259 e 267), com a coleta da prova oral (fls. 247, 250, 268 e 269) e indeferimento de oficiamento solicitado pela autora. As partes apresentaram memoriais (fls. 270/289 e 290/296). Vieram os autos conclusos.

Sobreveio sentença nos seguintes termos:

Isso posto, julgo improcedentes os pedidos deduzidos por Lago Busato Assesssoria Turística Ltda. em face de Etihad Airways P.J.S.C., e extingo o processo, com fulcro no art. 487, I, do CPC. Sucumbente, condeno a autora a arcar com as custas do processo e a suportar a verba honorária dos advogados da parte adversária, que vai arbitrada em 15% do pedido quantificado na letra “c” da peça vestibular, nos exatos termos em que formulado, tendo em conta o trabalho desenvolvido e a natureza da causa, com fulcro no art. 85, §§ 2º, 6º e 8º, do CPC.

Opostos embargos declaratórios pela parte autora às fls. 303/305, os quais foram parcialmente acolhidos à fl. 306.

Irresignada, apela a parte autora sustentando, em síntese, que o próprio site da ré indicava que não havia a necessidade de visto prévio à entrada nos Emirados Árabes, sendo o visto emitido no próprio aeroporto, não havendo motivos para que os passageiros fossem impedidos de viajar. Alega que aplicável à hipótese as regras do CDC, pois figura como consumidora equiparada. Frisa que é vulnerável do ponto de vista técnico, fático e informacional, o que autoriza a inversão do ônus da prova.

Assevera que configurada falha na prestação do serviço, pois para o voo de ida não houve a solicitação de qualquer visto para a escala em Abu Dhabi. Alega que comprovou que arcou com todas as despesas exigidas pelos passageiros, as quais deveriam ter sido pagas pela apelada, pois esta quem vetou o embarque. Sustenta que, diante disso, tem o dever de ressarcir a autora pelos prejuízos suportados. Aduz que configurado dano moral indenizável em razão de ter sua honra maculada por erros que não cometeu. Requer, por fim, o redimensionamento dos ônus sucumbenciais.

Pugna pelo recebimento e provimento do apelo.

Contrarrazões apresentadas no ev. 21, suscitando a recorrida preliminar de não conhecimento do apelo quanto à alegação de que os passageiros poderiam apresentar o visto somente na chegada a Abu Dhabi, pois tal caracteriza inovação recursal.

Os autos ascenderam a esta Corte e foram a mim distribuídos.

É o relatório.

VOTO

Colegas, inicio por acolher a preliminar contrarrecursal de não conhecimento do apelo quanto à alegação de que os vistos dos passageiros seriam emitidos no desembarque, à medida que tal questão não foi trazida na inicial, constituindo, portanto, inovação recursal, o que é vedado pelo ordenamento jurídico pátrio.

Quanto ao mais, o apelo não merece provimento, sendo caso de manutenção da sentença de improcedência pelos seus próprios fundamentos, os quais transcrevo a fim de evitar desnecessária tautologia, verbis:

Versa sobre ação de ressarcimento regressivo por agência de viagem em face de companhia aérea, que, por não ter informado sobre a necessidade de visto de entrada em país onde não foi possível obtê-lo in loco, acarretou despesas arcadas por aquela perante clientes que, já em solo exterior, não lograram conseguir embarcar em voo com bilhetes emitidos pela ré, entendendo a demandante ser a própria ré a responsável pela falha na prestação do serviço. Postula, ainda, a indenização por danos morais, já que sua imagem de boa prestadora de serviços foi ferida pelo ocorrido.

No tocante a arguição de não ter a autora provado sua legitimidade para a propositura da ação, é tema que se confunde com o mérito, como sói acontecer com quaisquer questões que digam respeito a provas, e o argumento da ré é o de não ter a autora demonstrado o desembolso dos valores cujo reembolso pretende obter. Com efeito, a ré toca no ponto da legitimidade sem estruturá-lo em preliminar de defesa, nem reforçou requerimento aos pedidos finais.

No mérito, a agência de viagem pretende, em regresso, ressarcir-se de despesas que, em tese, suportou por não terem seus clientes conseguido embarcar em voo para Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, segundo sustenta, em razão de a companhia aérea, emitente dos bilhetes de passagem, não orientar no sentido de haver necessidade de documentação para a “prestação de seu serviço aéreo.”

Destacam-se duas relações jurídicas dissociáveis quanto às atividades desenvolvidas pela empresa de agência de viagens e os serviços de transporte prestados por companhia aérea, cada uma com obrigações distintas no vínculo que se estabelece entre elas e os destinatários finais, mesmo que atue aquela primeira como intermediária no contrato de transporte, ao solicitar a emissão de bilhetes aéreos desta.

Além disso, conquanto seja admissível que, por hipótese legal, o fornecedor/prestador demandado por consumidores que o responsabilizem por se apresentar a eles mais próximo, promova ação regressiva em face de outro...

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