Acórdão nº 50048145220178210021 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Câmara Cível, 15-02-2023

Data de Julgamento15 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50048145220178210021
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003221246
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

20ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5004814-52.2017.8.21.0021/RS

TIPO DE AÇÃO: Cancelamento de Protesto

RELATOR: Desembargador GLENIO JOSE WASSERSTEIN HEKMAN

APELANTE: ACIMA CONSTRUTORA LTDA ME (AUTOR)

APELADO: PRO-ALUMINIO INDUSTRIA E COMERCIO EIRELI (RÉU)

APELADO: VEZA COMERCIO DE ALUMINIO LTDA. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por ACIMA CONSTRUTORA LTDA ME em face da sentença que julgou improcedente a ação ajuizada contra PRO-ALUMÍNIO INDÚSTRIA E COMÉRCIO EIRELI e VEZA COMÉRCIO DE ALUMÍNIO LTDA.

Os embargos de declaração opostos pela parte autora foram rejeitados.

Em suas razões recursais, a parte apelante tece breve considerações sobre o processo. Sustenta que o aponte do cheque foi realizado após o prazo legal. Menciona o artigo 33 da Lei 7.357/85. Pede a procedência dos pedidos aduzidos na inicial. Requer o provimento do recurso.

Após as contrarrazões, os autos foram remetidos a esta Corte.

Distribuídos, vieram-me conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Colegas.

Conheço do recurso, pois presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade.

Não assiste razão à parte apelante.

Com efeito, a magistrada a quo bem analisou a prova dos autos e aplicou, com correção, o direito à espécie.

As alegações recursais não têm o condão de afastar as conclusões da sentença, pelo que adoto os fundamentos desta, como minhas próprias razões de decidir, transcrevendo-os, com a devida vênia, conforme segue:

"Passo à fundamentação.

Precipuamente, em resposta à manifestação de folha 424, mantenho a decisão de folhas 418/419 por seus próprios fundamentos, uma vez que, consoante fundamentado, a questão envolve exclusivamente a validade do protesto levado a efeito pela demandada e a existência de dano moral decorrente de tal conduta, demandando, portanto, prova exclusivamente documental.

Quanto à possibilidade jurídica do pedido, encontra amparo nos documentos acostados às folhas 26/27 dos autos, os quais comprovam que, quando do ingresso com a demanda (20/01/2017), persistia o protesto protocolado sob o nº 2702181, o qual foi cancelado em 07/02/2017, conforme demonstra a Nota de Emolumentos de folha 395.

Dito isso, apreciadas as preliminares arguidas pelas requeridas (fls.418/419), passo ao exame do mérito.

No caso telado, a relação jurídica existente entre as partes vem comprovada com o contrato particular de promessa de compra e venda firmado entre a autora e a ré Pro-alumínio Ind. e Com. Ltda (fl.25), bem como com o protesto da cártula nº 000072, apresentada pela ré Veza Com. de Alumínio Ltda (fl.27).

Consoante dispõe o art. 25 da Lei 7.357/85, o cheque é ordem de pagamento à vista, sendo autônomo em relação ao negócio que lhe deu origem. Nesses termos:

Art.25 - Quem for demandado por obrigação resultante de cheque não pode opor ao portador exceções fundadas em relações pessoais com o emitente, ou com os portadores anteriores, salvo se o portador o adquiriu conscientemente em detrimento do devedor.

Assim, embora excepcionalmente seja possível a investigação da causa debendi, é ônus do devedor produzir prova capaz de desconstituir o título.

Nesse viés, transcrevo jurisprudência do STJ:

PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO POR TÍTULO EXTRAJUDICIAL CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. CHEQUES. PRINCÍPIO DA AUTONOMIA. RELATIVAÇÃO. ÔNUS DA PROVA. TÍTULO LÍQUIDO, CERTO E EXIGÍVEL. 1. Na execução de cheque, o dever do executado de pagar o valor devido ao credor é autônomo do negócio jurídico que lhe deu causa. 2. Ainda que excepcionalmente possível a investigação da causa debendi, compete ao devedor o ônus de trazer aos autos prova capaz de desconstituir o título. 3. Hipótese em que o acórdão recorrido assegurou, com base na prova dos autos, que os títulos de créditos são exigíveis, líquidos e certos, tornando válido o valor cobrado. 4. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1148413/PI, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 08/05/2012, Dje 21/05/2012). grifei.

A oposição de exceções pessoais em face de terceiro portador do título somente pode ser suscitada mediante comprovação de má-fé, o que não foi demonstrado no caso em exame, sequer aventado pela parte autora.

Assim, o motivo pelo qual o cheque foi sustado (descumprimento contratual1) não interessa à portadora do título – Veza Comércio de Alumínio Ltda -, que possui o crédito hígido perante a emitente, uma vez que houve a circulação da cártula.

Insta ressaltar, outrossim, que, ao julgar o Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.423.464/SC, o Superior Tribunal Justiça firmou a tese de que é possível, mesmo após o prazo para apresentação, respeitado o prazo para a execução cambial, o protesto cambiário de cheque, com a indicação do emitente como devedor.

Nesse contexto, colaciono a seguinte ementa:

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA DIREITO CAMBIÁRIO E PROTESTO EXTRAJUDICIAL. CHEQUE. ORDEM DE PAGAMENTO À VISTA. CÁRTULA ESTAMPANDO, NO CAMPO ESPECÍFICO, DATA DE EMISSÃO DIVERSA DA PACTUADA PARA SUA APRESENTAÇÃO. CONSIDERA-SE, PARA CONTAGEM DO PRAZO DE APRESENTAÇÃO, AQUELA CONSTANTE NO ESPAÇO PRÓPRIO. PROTESTO, COM INDICAÇÃO DO EMITENTE DO CHEQUE COMO DEVEDOR, AINDA QUE APÓS O PRAZO DE APRESENTAÇÃO, MAS DENTRO DO PERÍODO PARA AJUIZAMENTO DE AÇÃO CAMBIAL DE EXECUÇÃO. POSSIBILIDADE.

1. As teses a serem firmadas, para efeito do art. 1.036 do CPC/2015 (art. 543-C do CPC/1973), são as seguintes: a) a pactuação da pós-datação de cheque, para que seja hábil a ampliar o prazo de apresentação à instituição financeira sacada, deve espelhar a data de emissão estampada no campo específico da cártula; b) sempre será possível, no prazo para a execução cambial, o protesto cambiário de cheque, com a indicação do emitente como devedor.

2. No caso concreto, recurso especial parcialmente provido.

Mister transcrever, ainda, parte do voto do Ilustre Ministro Luis Felipe Salomão (Relator):

“(…) É necessário esclarecer que, em bem recente julgamento de recurso especial representativo de controvérsia, REsp 1.340.236/SP, este Colegiado, na linha da firme jurisprudência do STJ e do que propugna a doutrina especializada, sufragou tese assentando que a legislação de regência estabelece que o documento hábil a protesto extrajudicial é aquele que caracteriza prova escrita de obrigação pecuniária líquida, certa e exigível.

A decisão tem a seguinte ementa:

SUSTAÇÃO DE PROTESTO EXTRAJUDICIAL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. TUTELA CAUTELAR PARA SUSTAÇÃO DE PROTESTO CAMBIÁRIO. A TEOR DO ART. 17, § 1º, DA LEI N. 9.492/1997, A SUSTAÇÃO JUDICIAL DO PROTESTO IMPLICA QUE O TÍTULO SÓ PODERÁ SER PAGO, PROTESTADO OU RETIRADO DO CARTÓRIO COM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. MEDIDA QUE RESULTA EM RESTRIÇÃO A DIREITO DO CREDOR. NECESSIDADE DE OFERECIMENTO DE CONTRACAUTELA, PREVIAMENTE À EXPEDIÇÃO DE MANDADO OU OFÍCIO AO CARTÓRIO DE PROTESTO PARA SUSTAÇÃO DO PROTESTO.

1. Para fins do art. 543-C do Código de Processo Civil: A legislação de regência estabelece que o documento hábil a protesto extrajudicial é aquele que caracteriza prova escrita de obrigação pecuniária líquida, certa e exigível. Portanto, a sustação de protesto de título, por representar restrição a direito do credor, exige prévio oferecimento de contracautela, a ser fixada conforme o prudente arbítrio do magistrado.

2. Recurso especial não provido.

(REsp 1340236/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 14/10/2015, DJe 26/10/2015)

De fato, ao estabelecer, o art. 1º, da Lei n. 9.492/1997, que protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida, a interpretação mais adequada, inclusive tendo em vista os efeitos do protesto, é o de que o termo "dívida" exprime débito, consistente em obrigação pecuniária, líquida, certa e que é/se tornou exigível.

(…)

3.3. Como visto, o art. 48 da lei 7.357/1985 (Lei do Cheque), ao remeter ao art. 47 do mesmo Diploma, como bem observado em lição doutrinária citada pelo Ministério Público Federal, limita-se à questão da possibilidade de cobrança dos eventuais devedores indiretos (coobrigados), mas não do devedor principal (emitente).

Em suma, a exigência de realização do protesto, antes de expirado o prazo de apresentação do cheque, é dirigida apenas ao protesto obrigatório à propositura da execução do título, nos termos dos arts. 47 e 48 da Lei n. 7.357/1985. (REsp 1297797/MG, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE...

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