Acórdão nº 50050590920208210005 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Segunda Câmara Cível, 20-04-2022

Data de Julgamento20 Abril 2022
ÓrgãoVigésima Segunda Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50050590920208210005
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001982587
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

22ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5005059-09.2020.8.21.0005/RS

TIPO DE AÇÃO: Enriquecimento sem causa

RELATORA: Desembargadora MARIA ISABEL DE AZEVEDO SOUZA

APELANTE: MUNICÍPIO DE BENTO GONÇALVES (AUTOR)

APELADO: CESAR CINI (RÉU)

RELATÓRIO

O MUNICÍPIO DE BENTO GONÇALVES, em 02 de outubro de 2020, ajuizou contra CESAR CINI ação de repetição de indébito da quantia de R$ 4.655,35 que pagara, indevidamente, nos autos da ação (processo n.° 9005909-97.2017.8.21.0005) relativa à Taxa de Serviços Urbanos.

Para tanto, alegou que foram ajuizadas diversas ações declaratórias de inexigibilidade tributária, cumulada com repetição de indébito, relativa à "Taxa de Serviços Urbanos", as quais foram julgadas procedentes, condenando-o à restituição dos valores indevidamente recolhidos, respeitada a prescrição quinquenal. Disse que, no cumprimento de sentença da ação ajuizada pelo Réu, efetuou o pagamento de quantia superior a ser restituída, dado que o valor a ser restituído era de R$ 23.490,63, mas pagou indevidamente R$ 28.145,98. Sustentou que não há coisa julgada e liberalidade em relação ao dinheiro público, configurando o pagamento a maior enriquecimento sem causa (processo originário - evento 01 - INIC1).

Citado, o Réu contestou a ação. Sustentou que, nos autos da ação de repetição de indébito tributário, o Autor não apresentou contestação tampouco impugnou a memória de cálculo, a despeito de assegurado tal direito na fase de cumprimento de sentença. Afirmou que a procedência da ação importará violação à coisa julgada. Impugnou a quantia que o Autor busca repetir nesta ação (processo originário - evento 21 - CONT3).

Houve réplica (processo originário - evento 24 - RÉPLICA1).

Na sentença, a MM. Juíza a quo julgou improcedente o pedido pelos seguintes fundamentos:

"Através da presente ação, o autor pretende a repetição de indébito do valor de R$ 4.655,35 pago a maior nos autos do processo nº 9005909-97.2017.8.21.0005.

Alega que em ação declaratória de inexigibilidade de débito tributário cumulada com repetição de indébito foi declarada a inexigibilidade da Taxa de Serviços Urbanos e determinada a restituição dos valores indevidamente pagos pelos contribuintes a esse título.

Disse que efetuou pagamento, nos moldes da planilha de cálculo elaborada pelo contribuinte, ora réu, no entanto, posteriormente constatou que o valor efetivamente devido era de R$ 23.490,63 e não R$ 28.145,98, importando em um pagamento a maior no valor de R$ 4.655,35. Agora, pretende a devolução desse valor.

Alega que ocorreu enriquecimento indevido da parte ré e que se trata de verba pública, considerada indisponível.

O réu, por sua vez, alega que a questão encontra-se preclusa e portanto, não pode ser rediscutida.

Compulsando os autos verifica-se que nos autos do processo que originou a presente (lide nº 9005909-97.2017.8.21.0005), foi julgado procedente o pedido veiculado por CESAR CENI em face de MUNICÍPIO DE BENTO GONÇALVES, para "DECLARAR a inexigibilidade da cobrança da Taxa de Serviços Urbanos, instituída pela Lei Municipal 106/2006, e CONDENAR o MUNICÍPIO DE BENTO GONÇALVES na restituição dos valores indevidamente pagos sob tal rubrica, referentes aos últimos cinco anos anteriores ao ajuizamento da presente lide, além daqueles vincendos no curso desta, com correção monetária pelo IGP-M, a contar de cada pagamento indevido, consoante Súmula 162 do STJ e juros de mora de 1% ao mês, com amparo no art. 161, parágrafo único, do CTN, a contar do trânsito em julgado da sentença, conforme Súmula 188 do STJ" (vide evento 1 - OUT3).

Posteriormente, em fase de cumprimento de sentença, houve expedição de V (evento 1 - OUT7), que foi devidamente quitada pelo Município (evento 1 - OUT8).

O pedido de cumprimento de sentença veio aparelhado com cálculo atualizado e discriminado do débito (evento 1 - OUT6), sendo oportunizado ao ente público manifestar-se acerca de eventuais incorreções.

Ou seja naqueles autos foi assegurado o devido processo legal, assim como oportunizado amplo contraditório, em todas as fases processuais. No entanto, o ora autor deixou de se manifestar ou alegar quaisquer incorreções nos cálculos, no momento oportuno, o que acarretou a expedição da Requisição de Pequeno Valor, bem como o pagamento dela e a extinção do feito pelo pagamento do débito.

Dessa forma, não tendo a parte se insurgido à época, sem que houvesse qualquer tipo de cerceamento de defesa, é o caso de ocorrência da preclusão temporal, conforme previsto nos art. 507 do CPC:

“Art. 507. É vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão."

Aliado a isso está o fato de que não houve interposição de recurso pela parte, o que importa em anuência tácita com todos os atos praticados no feito, nos termos do disposto no artigo 1.000 do Código de Processo Civil, verbis:

"Art. 1.000. A parte que aceitar expressa ou tacitamente a decisão não poderá recorrer.

Parágrafo único. Considera-se aceitação tácita a prática, sem nenhuma reserva, de ato incompatível com a vontade de recorrer."

Este juízo não desconhece o fato de que se trata de verba pública e que foram diversas as ações ajuizadas, no entanto, não se pode olvidar que ao ente municipal foi oportunizada a manifestação, naqueles autos, acerca do cálculo apresentado pelo credor, em mais de um momento processual.

Como se não bastasse, o autor na inicial sequer discrimina qual seria o erro no cálculo do credor. Limita-se a alegar que houve pagamento a maior, sem conduto indicar o que desencadeou o excesso, o que inclusive acarreta a inépcia da inicial.

Nesse cenário, verifica-se que o réu não alega a ocorrência de simples "erro material" do cálculo, mas sim, pretende a rediscussão da metodologia empregada pelo credor quando da confecção do cálculo, questão essa já ultrapassada pela marcha processual, estando, portanto, preclusa.

Isso porque o autor teve oportunidade de se insurgir contra os cálculos, tendo optado por permanecer inerte, devendo, portanto, arcar com o ônus da sua inércia processual, que é justamente a preclusão.

É evidente que a tutela jurisdicional não pode ficar a mercê das partes, ad eternum, tampouco pode sofrer modificação a qualquer tempo e sob qualquer pretexto, sob pena de afronta a segurança jurídica.

Entender de modo diverso é autorizar a modificação de questão processual já discutida e estabilizada e consequentemente, violar o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, com assento no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal.

A propósito, veja-se o entendimento jurisprudencial do E. TJ/RS: (...)

Em igual sentido, o entendimento do E. STJ: (...)

Desta forma, impõe-se a improcedência do pedido.

Pelo exposto, com fundamento no artigo 487, inciso I, do CPC julgo improcedente a ação de repetição de indébito ajuizada por MUNICÍPIO DE BENTO GONÇALVES em face de CESAR CINI, pelos fatos e fundamentos acima apontados.

Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% do valor atualizado da causa (IPCA desde o ajuizamento), nos termos do art. 85, §2º, do CPC.

Isento de custas nos termos do disposto no artigo 5º, I da Lei nº 14.634/2014.

Com o trânsito em julgado, baixe-se." (processo originário - evento 35 - SENT1)

Inconformado, tempestivamente, apela o MUNICÍPIO DE BENTO GONÇALVES. Alega que cabe à parte contrária demonstrar o fato impeditivo, modificativo ou extintivo do seu direito, porquanto comprovada a existência de prova mínima suficiente a justificar a pretensão, na forma do artigo 373 do Código de Processo Civil. Sustenta que não deve haver liberalidade no que diz respeito ao dinheiro público, de modo que o Réu não pode se beneficiar com o recebimento de valores sem justa causa. Afirma que a declaração do direito à restituição do indébito preserva os princípios da segurança jurídica, da confiança, da boa-fé e da cooperação, como também o direito adquirido pelo contribuinte e a estabilidade das relações jurídicas. Pede, então, o provimento do recurso para condenar o Réu à restituição do valor recebido sem justa causa (processo originário - evento 40 - APELAÇÃO1).

Intimado, o Réu não apresentou as contrarrazões. Foram, então, os autos remetidos a este Tribunal. O Ministério Público opinou pelo desprovimento do recurso. É o relatório.

VOTO

Os autos dão conta que o Apelado ajuizou ação declaratória de inexigibilidade tributária, cumulada com pedido de repetição de indébito, contra o Apelante da taxa de serviços de limpeza pública (processo n.° 9005909-97.2017.8.21.0005), instituída pela Lei Municipal n.° 106/2006, a qual foi julgada procedente, no Juizado Especial da Fazenda Pública, para

"DECLARAR a inexigibilidade da cobrança da Taxa de Serviços Urbanos, instituída pela Lei Municipal 106/2006, e CONDENAR o...

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