Acórdão nº 50052163020218210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Câmara Cível, 23-02-2023

Data de Julgamento23 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50052163020218210010
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003161063
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

10ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5005216-30.2021.8.21.0010/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por Dano Material

RELATOR: Desembargador MARCELO CEZAR MULLER

APELANTE: MARILEI RODRIGUES DA COSTA MIRANDA (AUTOR)

APELANTE: BANCO BRADESCO S.A (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

As partes apelam da sentença de procedência proferida nos autos da ação declaratória c/c indenizatória que MARILEI RODRIGUES DA COSTA MIRANDA move em face do BANCO BRADESCO S.A. Transcrevo o dispositivo da decisão:

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTES OS PEDIDOS DE DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO, DE REPITAÇÃO DO INDÉBITO E DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS formulados pela autora MARILEI RODRIGUES DA COSTA MIRANDA em face do banco requerido BANCO BRADESCO S.A., para o fim de:

a) Declarar a inexigibilidade do valor do contrato de empréstimo n.º 330785346-9, no valor de R$767,86, em relação ao Banco Bradesco S.A., pois não comprovada a alegada migração do contrato;

b) Condenar o banco requerido à restituição à autora, em dobro, dos valores indevidamente descontados no benefício previdenciário da autora, a partir de dezembro de 2019, cada uma no valor de R$21,60, até o último desconto realizado, com correção monetária pelo IGP-M, a contar de cada desembolso, e juros moratórios de 1% ao mês, a contar da citação;

c) Condenar o banco requerido a pagar à autora indenização por danos morais, no valor de R$3.500,00 (três mil e quinhentos reais), com correção monetária pelo IGP-M, a contar desta data, e juros moratórios de 1% ao mês, a contar da citação.

Por sucumbente, condeno o banco requerido ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 20% sobre o valor total da condenação, na forma do artigo 85, §2.º, do CPC.

Constou no relatório:

Trata-se de AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DE INDÉBITO, com pedido de antecipação dos efeitos da tutela, ajuizada por MARILEI RODRIGUES DA COSTA MIRANDA contra o BANCO BRADESCO S.A., respectivamente, qualificada e identificado na petição inicial, narrando a autora ter verificado que seu benefício previdenciário vinha sofrendo descontos que ela desconhece e também não autorizou. Os descontos eram oriundos de suposto empréstimo firmado entre a autora e o banco requerido, contrato n.º 330785346-9, no valor de R$767,86, com pagamento em 75 parcelas de R$21,60 cada uma, das quais foram descontadas, até o ajuizamento da ação, 15 parcelas. Disse a autora jamais ter autorizado ou firmado o referido contrato de empréstimo, e que as parcelas continuam sendo descontadas de seu benefício. Afirmou que tal situação lhe causou um enorme desconforto, tendo o banco requerido agido de má-fé, pois, em momento algum, a autora contratou ou autorizou terceiro a contratar referido empréstimo. Discorreu sobre o princípio da dignidade da pessoa humana, sobre a proteção ao consumidor, bem como sobre a aplicabilidade do CDC. Requereu, em sede de antecipação dos efeitos de tutela, determinação para que o banco requerido suspenda os descontos no seu benefício previdenciário, sob pena de multa. No mérito, postulou a procedência da ação, para ver declarada a inexistência de relação jurídica entre as partes, referente ao contrato supramencionado, com a condenação do banco requerido à restituição de todas as parcelas debitadas, e de todas as que o forem sendo debitadas no decorrer da presente ação, com repetição indébito, em dobro, tudo devidamente corrigido com juros e correção monetária; bem como a condenação do banco requerido ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$10.000,00. Pleiteou a inversão do ônus da prova e a concessão do benefício da gratuidade da Justiça. Acostou documentos, (evento 1).

Decisão deferindo o benefício da gratuidade da Justiça à autora e a inversão do ônus da prova, bem como indeferindo o pedido de antecipação de tutela, e determinando a citação do banco requerido, (evento 3).

Citado, o banco requerido apresentou contestação, suscitando preliminares de carência de ação, por ausência de pretensão resistida, e falta de interesse processual, pois não comprovado o requerimento por via administrativa, apto a fundamentar o pleito de indenização. Afirmou ser descabida a inversão do ônus da prova, devendo ser aplicado o artigo 373, inciso I, do CPC. No mérito, sustentou a regularidade da contratação, uma vez que a autora firmou a Cédula de Crédito Bancário – Empréstimo Pessoal Consignação – INSS n.º 330785346-9, junto ao Banco Pan, o qual foi migrado, através de cessão de crédito, ao Banco Bradesco S.A., ora requerido, conforme demonstram os documentos que instruem a contestação. Afirmou que, além dos descontos terem sido totalmente devidos, existem débitos em aberto. Referiu que o valor do empréstimo foi creditado na conta da autora, a qual informou seu endereço e apresentou seus documentos pessoais no momento da contratação. Disse que a cobrança é totalmente lícita, bem como a reserva de margem consignável, não havendo que se falar em descontos indevidos, sem prévia autorização da autora. Impugnou o pedido indenizatório por danos morais, defendendo a licitude de sua conduta, pois agiu sempre mediante autorização da autora, a qual nunca solicitou o cancelamento do contrato de empréstimo consignado, tampouco a devolução do valor creditado em sua conta. Requereu a improcedência da demanda. Juntou documentos, (evento 14).

Réplica à contestação, (evento 18). Decisão determinando a intimação do banco requerido para regularizar sua representação processual, bem como a intimação das partes para manifestarem o interesse na produção de outras provas, (evento 20). Intimadas, ambas as partes requereram o julgamento antecipado, e o banco requerido juntou documentos regularizando sua representação, (eventos 24 e 25). Os autos do processo vieramo conclusos para sentença.

Em suas razões, a parte autora pugna pela majoração do valor da indenização, ao argumento de que a quantia fixada não repara de forma integral o prejuízo experimentado. Litiga sob o pálio da gratuidade da justiça.

A requerida, por sua vez, discorre acerca da efetiva contratação, bem como da cessão de crédito. Afirma a inexistência de danos morais. Sucessivamente, pugna por sua redução e pela incidência de juros desde o arbitramento. Afirma, ainda, o descabimento da restituião dos valores, quer na forma simples, quer na forma dobrada. Pugna pelo provimento do apelo, inclusive para fins de redução de honorários. Realiza preparo.

Apenas a parte ré apresentou resposta.

Subiram os autos a esta Corte e vieram-me conclusos para julgamento.

Registra-se que foi observado o disposto nos arts. 931 e 934 do CPC/2015, em face da adoção do sistema informatizado.

É o relatório.

VOTO

De início, merece ser transcrita a fundamentação constante da sentença de lavra da Dra. Maria Oliver, que bem apreciou o caso dos autos, extraindo a decisão mais acertada:

(...)

Trata-se de ação por meio da qual busca a autora a declaração de inexistência do débito, representado no contrato n,º 330785346-9, o qual afirma nunca ter assinado; a restituição, em dobro, dos valores já descontados do seu benefício previdenciário, uma vez que indevidos; bem como a condenação do banco requerido ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$10.000,00.

O requerido, por sua vez, sustentou a regularidade da contratação, afirmando que a autora, efetivamente, contratou o empréstimo consignado, junto ao Banco Pan, contrato que foi migrado, através de cessão de crédito, ao Banco Bradesco S.A., sendo lícitas as cobranças realizadas, e descabida a pretensão de indenização por danos morais.

Inicialmente, destaco que a hipótese presente nos autos do processo se caracteriza, perfeitamente, como relação de consumo, uma vez que as partes integrantes se encaixam nos conceitos descritos nos artigos 2.º e 3.º, §2.º, ambos do Código de Defesa do Consumidor, in verbis:

"Artigo 2.º Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

"Artigo 3.º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. (…)

"§2.º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista".

Tratando-se de relação de consumo, o referido diploma legal estabelece, dentre os direitos básicos do consumidor, a inversão do ônus da prova:

"Artigo 6.º São direitos básicos do consumidor: (...)

"VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências".

Como se vê, o intuito do Código de Defesa do Consumidor é estabelecer o equilíbrio necessário para uma relação harmônica entre as partes na relação de consumo, suprindo a hipossuficiência do mais frágil, que é, obviamente, o consumidor.

Importante ressaltar, entretanto, que a inversão do ônus da prova não exime o consumidor da comprovação do fato constitutivo do direito alegado, nos termos do artigo 373, inciso I, do CPC.

Analisando a prova produzida nos autos do processo, considerando que a autora alegou desconhecer a contratação com o banco requerido, para quem são pagos os valores que estão sendo descontados no seu benefício...

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