Acórdão nº 50052695220198210019 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50052695220198210019
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001382955
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5005269-52.2019.8.21.0019/RS

TIPO DE AÇÃO: Contratos Bancários

RELATOR: Desembargador FERNANDO FLORES CABRAL JUNIOR

APELANTE: OKAY BAG INDUSTRIA DE BOLSAS LTDA (EMBARGANTE)

APELANTE: RAFAELA ARAUJO GONCALVES (EMBARGANTE)

APELADO: BANCO BRADESCO S.A. (EMBARGADO)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por OKAY BAG INDUSTRIA DE BOLSAS LTDA e RAFAELA ARAUJO GONÇALVES em face da sentença prolatada nos autos dos embargos à execução em que contende com BANCO BRADESCO S/A. Constou na sentença apelada (Evento 84):

“[...] Isso posto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por OKAY BAG INDUSTRIA DE BOLSAS LTDA e RAFAELA ARAUJO GONÇALVES em face de BANCO BRADESCO S.A. , com fulcro no artigo 487, inciso I, do CPC, para REVISAR o contrato n° 011.040.193, para:

a) reconhecer excesso na cobrança dos juros remuneratórios, limitando a taxa de juros àquela divulgada pelo BACEN para o período, qual seja, 18,71% ao ano;

b) reconhecer a descaracterização da mora.

Reciprocamente sucumbentes, CONDENO as partes ao pagamento das custas processuais, na proporção de 50% para cada um, e dos honorários advocatícios ao patrono da parte adversa, que fixo em R$ 800,00, considerando a baixa complexidade da ação e o seu caráter repetitivo (art. 85, §8º, CPC).

Verbas cuja exigibilidade resta suspensa a cargo dos embargantes, por litigarem sob o amparo da AJG.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.”

Em suas razões recursais, a parte apelante pleiteia que seja vedada a inscrição do seu nome nos cadastros de inadimplentes. Afirma que o título objeto da ação não cumpre os requisitos do art. 783 do CPC. Alega que o contrato possui cláusulas abusivas e ilegais, ensejando a necessidade de extinção do feito executivo. Menciona que a execução de um título é nula quando falta um dos requisitos - liquidez, certeza e exigibilidade -, de acordo com o art. 803 do CPC. Defende haver necessidade de materialização correta do crédito, respeitando o princípio da formalidade desse. Pontua que há excesso na execução, conforme comprovado no cálculo anexado aos autos. Afirma que não há previsão legal para a capitalização diária constante no contrato. Colaciona precedentes. Alega que o banco réu embutiu no contrato tarifas administrativas com o intuito de reaver seus custos operacionais. Menciona ser necessário apurar o valor do débito em liquidação de sentença, nos termos do art. 509 do CPC. Pede a compensação dos valores pagos a maior ou, caso o contrato já esteja quitado, a restituição destes. Postula a condenação do banco apelado ao pagamento dos ônus sucumbenciais. Requer a atribuição do efeito suspensivo, nos termos do art. 1.012, §1º, III, do CPC. Pleiteia o provimento do presente recurso (Evento 90).

Foram apresentadas contrarrazões no Evento 102.

É o relatório.

VOTO

A apelação interposta no Evento 90 é tempestiva, pois o prazo para recorrer da sentença iniciou em 09/04/2021 e findou em 19/05/2021 (Eventos 86 e 87), sendo que o recurso foi interposto em 13/04/2019 (Evento 90). Além disso, a parte apelante é beneficiária da gratuidade de justiça (Evento 17), sendo dispensada do recolhimento do preparo.

Dessa forma, considerando que o recurso é próprio, tempestivo e dispensa o recolhimento do preparo, recebo a apelação a qual passo ao exame.

Inicialmente, saliento que é objeto da execução a Cédula de Crédito Bancário - Capital de Giro nº 011.040.193, firmada em 05/09/2017, no valor de R$39.031,83 a ser pago em 36 parcelas de R$1.788,43, colacionada no Evento 1, CONTR10. Ademais, há previsão de taxa de juros efetiva no percentual de 2,96% ao mês e 41,91% ao ano. Em caso de inadimplemento, estão previstos juros moratórios de 1% ao mês e multa de 2% sobre o total devido (cláusula 5).

1. AUSÊNCIA DE LIQUIDEZ, CERTEZA E EXIGIBILIDADE.

Na hipótese, a Cédula de Crédito Bancário - Capital de Giro nº 011.040.193 (Evento 1 – CONTR10), caracteriza-se como título executivo extrajudicial, nos termos do artigo 784, inciso XII, do CPC/2016.

Com efeito, no contrato objeto da execução, a parte embargante confessou a quantia ali consignada, correspondendo a R$39.031,83, acrescidos de juros de 12,96% ao mês e 41,91% ao ano, capitalizados diariamente, a ser quitado em 36 parcelas de R$1.788,43.

Ou seja, verifica-se o preenchimento dos requisitos legais, na medida em que se trata de um documento contendo a obrigação de pagamento de quantia determinada em momento certo.

Por oportuno, saliento que o contrato executado não se confunde com o de abertura de crédito rotativo em conta corrente.

Logo, não se trata, in casu, da hipótese da Súmula nº 233 do STJ, que visa a coibir execuções fundadas em contrato de abertura de crédito rotativo em conta corrente pela iliquidez do título, visto que a evolução da dívida é demonstrada unilateralmente pelo credor. Nessa espécie, o banco credor coloca à disposição do correntista um limite de crédito que será ou não utilizado, sendo que, durante a contratualidade, as partes realizam vários lançamentos de débitos e créditos, tornando a dívida ilíquida.

Destarte, o aludido contrato estabelece claramente os dados da contratação, tendo sido assinado por duas testemunhas, motivo pelo qual constitui título capaz de autorizar o ajuizamento da ação de execução.

Nesse sentido, cito precedentes desta Câmara:

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. - PRELIMINAR DE NULIDADE DE EXECUÇÃO. A cédula de crédito bancário constitui título com força executiva, nos termos da Lei nº 10.931/2004. Na hipótese, estão preenchidos todos os requisitos dos arts. 28 e 29 da referida Lei, não havendo, assim, nulidade de execução pela ausência de liquidez, certeza e exigibilidade do título. Preliminar desacolhida. - EXCESSO DE EXECUÇÃO DECORRENTE DE PEDIDO REVISIONAL - NÃO CONHECIMENTO - INOBSERVÂNCIA DO ART. 917, § 3º, DO CPC. Alegado o excesso de execução como fundamento dos embargos, cabe à parte embargante indicar o valor que entende como devido desde logo, com sua demonstração mediante memória de cálculo, não bastando meras alegações genéricas quanto à existência de abusividades em cláusulas contratuais, sob pena de rejeição liminar, ou não conhecimento da alegação de excesso, conforme dispõe o 917, §§ 3º e 4º, I, do CPC. Neste caso, como não houve a indicação do valor que seria devido, com demonstração em cálculo discriminado, não devem ser conhecidos os embargos quanto ao excesso de execução decorrente do pedido de revisão contratual. Recurso não conhecido no ponto. - REPETIÇÃO DE INDÉBITO. A repetição de indébito e a compensação de valores são admitidas, no que couber, como consequência lógica do julgado e como vedação do enriquecimento injustificado do credor, sem necessidade de prova do erro, conforme a súmula 322 do STJ. Todavia, no presente caso, como não houve o efetivo pagamento do débito, e sim a redução do valor cobrado, em razão do reconhecimento do excesso de execução decorrente da primeira memória incorreta de cálculo que a instruiu, resta inviabilizada a pretensão de repetição em dobro, sendo cabível apenas a adequação dos valores, conforme já determinado pela sentença recorrida. Desprovido no tópico. APELAÇÃO CONHECIDA EM PARTE E DESPROVIDA.(Apelação Cível, Nº 70083868083, Vigésima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Cairo Roberto Rodrigues Madruga, Julgado em: 25-11-2020)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. ALEGAÇÃO DE ILIQUIDEZ E CERTEZA DA CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. Conforme construção jurisprudencial, a exceção de pré-executividade pode ser arguida nas hipóteses em que levantadas questões de ordem pública como, por exemplo, nas matérias envolvendo pressupostos processuais. Ainda, a alegação de iliquidez e certeza do título pode igualmente ser alegada em sede de exceção de pré-executividade. Na hipótese dos autos, verifica-se que a instituição financeira, quando do ajuizamento da execução, acostou aos autos o título executivo, comprovando a certeza e liquidez da cédula de crédito exequenda. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 70084492347, Vigésima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Altair de Lemos Junior, Julgado em: 25-11-2020) (grifei)

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. EMBARGOS À EXECUÇÃO. EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO. Objeto - Cédula de Crédito Bancário nº a70430210-1, no valor de R$ 60.062,10, datada de 02/07/2007. AUSÊNCIA DE LIQUIDEZ, CERTEZA E EXIGIBILIDADE DO TÍTULO EXECUTIVO. INOCORRÊNCIA. Nos termos dos artigos 28 e 29 da Lei nº 10.931/2004 c/c o art. 784, XII, do CPC, a cédula de crédito bancário é título executivo extrajudicial. Outrossim, conforme previsto no mesmo dispositivo da lei referida, a Cédula de Crédito Bancário representa dívida em dinheiro, certa, líquida e exigível, seja pela soma nela indicada, seja pelo saldo devedor demonstrado em planilha de cálculo. No caso, a parte exequente acostou aos autos o contrato objeto da ação de execução, bem como planilha de evolução do débito, suficientes a instruir a execução, sendo descabida a alegação de ausência de título executivo a ensejar a nulidade da execução. Sentença mantida. RECURSO DESPROVIDO.(Apelação Cível, Nº 70076571702, Vigésima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Maraschin dos Santos, Julgado em: 29-05-2019) (grifei

Ademais, eventuais excessos na execução ou nulidade de cláusulas abusivas não retiram o seu caráter de título executivo, haja vista a revisão das cláusulas contratuais, o que possibilita a readequação do montante devido.

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