Acórdão nº 50052760420208210021 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Sétima Câmara Cível, 06-12-2022

Data de Julgamento06 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50052760420208210021
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Sétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002962210
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

17ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5005276-04.2020.8.21.0021/RS

TIPO DE AÇÃO: Compromisso

RELATORA: Desembargadora LIEGE PURICELLI PIRES

APELANTE: CONSTRUTORA E INCORPORADORA MARTINS LTDA (RÉU)

APELADO: ANA CAROLINA ANTUNES PICCOLI MASSING (AUTOR)

RELATÓRIO

Adoto, de início, o relatório da sentença (Evento 42, SENT1):

ANA CAROLINA ANTUNES PICCOLI MASSING, ajuizou a presente ação de cobrança cumulada com obrigação de fazer em desfavor de CONSTRUTORA E INCORPORADORA MARTINS LTDA, todos qualificados. Asseriu que adquiriu da ré um apartamento nº 1503 e um box de garagem nº 34, no Edifício Residencial e Comercial Monte Bello localizado na Rua Morom nº 2894, bairro Boqueirão nesta cidade de Passo Fundo/RS. Relatou que o imóvel foi quitado em 22/12/2014, tendo as partes ajustado, em termo de acordo, o prazo de 180 dias para a ré regulamentar a documentação (regularização registral) pendente dos imóveis. Alegou que, até o momento, a documentação não foi regularizada, tendo efetuado a notificação extrajudicial da ré, que permaneceu inerte. Aludiu que houve a estipulação de uma multa diária de R$50,00. Fundamentou o pedido na legislação. Postulou a procedência do feito, a fim de condenar a parte ré a obrigação de fazer consistente em regularizar o imóvel para fins de registro, sob pena de imposição de astreinte, bem como condenar a parte ré ao pagamento da multa no valor atualizado de R$91.450,00. Requereu o pagamento das custas ao final, ou o parcelamento em seis vezes. Instruiu a inicial com documentos (Ev. 1).

Determinada a intimação da parte autora para comprovar a hipossuficiência econômica (Ev. 4), a parte autora comprovou o recolhimento das custas (Ev. 7).

Recebida a inicial, dispensada a audiência de conciliação e determinada a citação da parte ré para contestar (Ev. 10).

Citada (Ev. 12), a ré contestou no Ev. 14. Arguiu a prescrição. No mérito, reconheceu que o imóvel depende de regularização, porém tal não decorreu de sua inércia. Asseriu que há diversas execuções fiscais movidas pela União, cujo valor atualizado perfaz aproximadamente R$3.000.000,00, de modo que se faz impossível a apresentação de certidão negativa de débitos, ou mesmo positiva com efeitos de negativa, para a regularização no Registro de Imóveis. Discorreu sobre a impossibilidade da obrigação de fazer, devendo ser declarada resolvida a obrigação. Fundamentou acerca da abusividade da multa diária, pois não limitada temporalmente. Requereu o acolhimento da prejudicial de mérito, subsidiariamente, a improcedência do feito e, caso superada, a limitação da multa em período não superior a 365 dias. Pugnou a gratuidade judiciária. Acostou documentos.

Houve réplica (Ev. 17).

Instadas as partes acerca do interesse na produção de outras provas (Ev. 18), a parte autora pediu o julgamento antecipado do mérito (Ev. 22), ao passo em que a ré silenciou.

Corrigido o valor da causa e determinada a intimação da parte autora para complementar o valor das custas iniciais, bem como instada a parte ré a comprovar sua hipossuficiência econômica (Ev. 27).

A parte autora comprovou o recolhimento das custas iniciais complementares (Ev. 34), ao passo em que o réu acostou documentos (Ev. 40).

Acrescento que sobreveio julgamento de procedência, para o efeito de condenar a ré: a) a implementar as medidas necessárias para a regularização do imóvel perante o Registro de Imóveis, conforme estabelecido contratualmente; b) ao pagamento da multa (cláusula penal) de R$ 91.450,00 em favor da parte autora, limitada ao máximo de R$155.000,00, enquanto não cumprida a obrigação. Diante da sucumbência, restou condenada a parte ré ao pagamento das custas e honorários advocatícios ao patrono da parte autora, estes fixados em 15% do valor da condenação, suspensa a exigibilidade diante da concessão da gratuidade judiciária à parte ré.

Inconformada, apelou a parte demandada (Evento 48, APELAÇÃO1). Em suas razões recursais,

Foram apresentadas contrarrazões (Evento 51, PET1).

É o relatório.

VOTO

Por atendimento aos requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço do recurso.

Trata-se, na origem, de demanda na qual a autora aponta ter firmado promessa de compra e venda com a parte ré acerca do apartamento n. 1.503 e box n. 34, do Edifício Residencial e Comercial Monte Bello, localizado na Rua Morom n. 2.894, Bairro Boqueirão, na cidade de Passo Fundo/RS. Afirma ter quitado todos os valores relacionados à promessa em 22/12/2014, quando ajustou com a ré, mediante acordo extrajudicial, que a construtora teria o prazo de 180 dias para regulamentar a documentação pendente, a fim de lhe transmitir a propriedade registral. Refere que, até a data do ajuizamento - 22/6/2020 - a ré ainda não tinha providenciado a documentação. Refere ter enviado notificação extrajudicial à demandada em 8/2018, tendo ela restado inerte. Diz que no acordo as partes previram multa de R$ 50,00 por dia em caso de descumprimento. Relata já ter tentado de todas as formas cobrar a construtora ré de maneira amigável, porém não obteve êxito. Requereu, assim, o comando de obrigação de fazer para fins de regularização da propriedade registral, além da condenação ao pagamento da multa diária fixada em acordo em razão de seu descumprimento.

Julgado procedentes os pedidos iniciais, contra a sentença apela a parte demandada.

Adianto que não prosperam as irresignações recursais.

Inicialmente, a ser mantido o comando de obrigação de fazer relacionado à implementação das medidas necessárias para a regularização do imóvel perante o Registro de Imóveis. E isso porque, de acordo com a cláusula 3ª do instrumento particular de promessa de compra e venda celebrado entre os litigantes:

A justificativa da ré para não escriturar o imóvel em nome da autora foi de que não tem condições de apresentar certidão negativa de débitos tributários, ante débito com a União de, aproximadamente, R$ 3.000.000,00.

Ora, o adimplemento de débitos da construtora frente aos órgãos públicos não diz respeito à autora, que pagou pelo bem e, portanto, tem direito a adquirir a propriedade registral. O descontrole e desorganização quanto ao pagamento de impostos são causas internas da própria empresa demandada, portanto, não decorrentes de caso fortuito ou força maior (art. 393 do Código Civil).

Eventualmente, em não havendo condições de outorgar a escritura, poderão as partes, em cumprimento de sentença, tratar da possibilidade de conversão da obrigação em perdas e danos, na forma do art. 499 do Código de Processo Civil1

Quanto à alegação de prescrição atinente ao pedido de condenação ao valor da multa fixada no acordo extrajudicial firmado entre as partes, não prospera.

No caso, há instrumento particular firmado entre as partes em 22/12/2014 (Evento 1, CONTR5) prevendo a obrigação da construtora em providenciar a resolução de pendências na obra (tributos municipais e federais, habite-se, alvará bombeiros) a fim de poder outorgar a escritura pública de compra e venda à autora no prazo de 180 dias, estando previsto no referido documento "sob pena de multa diária de R$ 50,00 (cinquenta reais)".

Trata-se de um instrumento particular e dele consta a previsão de dívida líquida, sendo caso, portanto, de aplicação do prazo quinquenal previsto no art. 206, §5º, I, do Código Civil.

O prazo de 5 anos previsto no Novo Código para fins de cobrança de dívida líquida constante...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT