Acórdão nº 50053603320208210141 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Criminal, 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo50053603320208210141
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001662810
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5005360-33.2020.8.21.0141/RS

TIPO DE AÇÃO: Decorrente de violência doméstica (art. 129, §§ 9º e 11)

RELATORA: Desembargadora GISELE ANNE VIEIRA DE AZAMBUJA

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

ADVOGADO: MARIANE LAVIEJA (OAB RS100060)

ADVOGADO: ELIETE DE FATIMA BASSANI LAVIEJA (OAB RS015165)

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofertou denúncia contra BRUNO OLIVEIRA DA SILVA, com 18 anos na época dos fatos, como incurso nas sanções do artigo 129, §9º, do Código Penal, observadas as disposições da Lei nº 11.340/2006, pela prática do seguinte fato delituoso:

No dia 09 de setembro de 2020, por volta 20h, na Rua Rio Novo, n. 577, bairro Centro, em Xangri-Lá/RS, o denunciado BRUNO OLIVEIRA DA SILVA, prevalecendo-se das relações familiares, ofendeu a integridade corporal da vítima Ângela de Oliveira, sua avó materna, causando-lhe lesões na mandíbula, conforme Ficha de Atendimento Ambulatorial das fls. 05-verso/06.

Na oportunidade, o denunciado discutiu com a vítima, que é sua avó materna, e, lhe desferiu um soco no rosto, causando-lhe lesões na mandíbula.

A vítima foi socorrida, sendo encaminhada para o Posto 24h de Xangri-Lá/RS, e, após, removida para o Hospital Santa Luzia, em Capão da Canoa/RS, diante da gravidade das lesões apresentadas.

O denunciado foi preso em flagrante, sendo posteriormente convertida a sua prisão em flagrante em prisão preventiva (fls. 38/39).

O crime foi praticado contra ascendente e pessoa maior de 60 (sessenta) anos.

A denúncia foi recebida em 18 de novembro de 2020 (evento 4, DESPADEC1).

O réu foi pessoalmente citado (evento 20, CERTGM1) e ofereceu resposta à acusação (evento 31, DEFESA PRÉVIA1).

Durante a instrução processual, foi ouvida a vítima, inquiridas as testemunhas e procedido o interrogatório do réu (evento 93, TERMOAUD1).

Encerrada a instrução, os debates orais foram convertidos em memoriais, apresentados pelo Ministério Público (evento 104, ALEGAÇÕES1) e pela defesa (evento 107, MEMORIAIS1).

Sobreveio sentença de lavra do Juiz de Direito, Dr. Leandro da Rosa Ferreira, de procedência da denúncia, para condenar o réu como incurso nas sanções do artigo 129, § 9º, do Código Penal, combinado com o artigo 61, inciso II, alínea "h", também do Estatuto Repressivo e nos moldes da Lei nº 11.340/2006, à pena de 03 meses de detenção em regime aberto (evento 109, SENT1).

A sentença foi publicada em 03 de maio de 2021.

A defesa interpôs apelação (evento 120, APELAÇÃO1). Em razões, aduziu, preliminarmente, nulidade absoluta, por violação da Súmula Vinculante nº 11 do STF. No mérito, sustentou ausência de prova da materialidade, pois a vítima não foi submetida ao exame de corpo de delito. Ainda, referiu ausência de animus leadendi e argumentou que o acusado é acometido de doença mental e se encontrava sob influência de sedativos, razão pela qual sequer recorda do que realmente ocorreu. Arguiu insuficiência probatória e a aplicação da atenuante prevista no artigo 65, inciso I, do Código Penal. Postulou o reconhecimento da nulidade ou, ainda, a absolvição do acusado. Subsidiariamente, requereu a desclassificação do crime para o previsto no artigo 129, § 6º, do CP e, em caso de manutenção da condenação, seja reconhecida a atenuante de minoridade do agente (evento 127, RAZAPELA1).

O Ministério Público apresentou contrarrazões (evento 129, CONTRAZAP1) e os autos foram remetidos a esta Corte.

Em parecer, a ilustre Procuradora de Justiça, Dra. Jacqueline Fagundes Rosenfeld, manifestou-se pelo afastamento da preliminar e pelo não provimento do recurso defensivo (evento 8, PARECER1).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Desembargadores.

O recurso defensivo se apresenta adequado e tempestivo.

O acusado BRUNO OLIVEIRA DA SILVA, através de defensor constituído, interpõe recurso de apelação, em face da sentença que o condenou como incurso nas sanções do artigo 129, §9º, combinado com o artigo 61, inciso II, alínea "h", ambos do Código Penal e nos moldes da Lei nº 11.340/2006.

Preliminar de nulidade da instrução por uso de algemas em afronta à Súmula Vinculante 11 do STF.

Antecipo que não merece acolhida a preliminar de nulidade.

No caso, não há falar em nulidade da instrução por violação à súmula nº11 do STF na medida em que o uso de algemas em audiência sequer foi objeto de insurgência oportuna pela defesa.

Posteriormente à solenidade, a fim de levantar alegada nulidade, traz à evidência a alegada nulidade sem sequer apontar efetivo prejuízo sofrido.

De toda sorte, ainda que se admitisse a irregularidade na manutenção do acusado algemado, a questão está preclusa, uma vez que não arguida no momento oportuno, ou seja, durante a realização da audiência.

Além disso, apenas o uso de algemas durante a audiência não se prestaria, absolutamente, para a anulação dos atos processuais realizados neste feito, uma vez que não se declara a nulidade, ainda que absoluta, de qualquer ato sem que haja a efetiva demonstração de prejuízo.

Sobre o tema trago entendimento do STJ:

PROCESSUAL PENAL. SÚMULA VINCULANTE N. 11/STF. USO DE ALGEMAS. NULIDADE ARGUIDA APÓS DOIS ANOS DO EXAME PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. INVIABILIDADE. PRECLUSÃO TEMPORAL. AGRAVO DESPROVIDO.
1. A jurisprudência, tanto deste Superior Tribunal de Justiça quanto do Supremo Tribunal Federal, "em respeito à segurança jurídica e a lealdade processual, tem se orientado no sentido de que mesmo as nulidades denominadas absolutas também devem ser arguidas em momento oportuno, sujeitando-se à preclusão temporal." (AgRg no HC 527.449/PR, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 27/08/2019, DJe 05/09/2019).
2. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no HC 572.626/RJ, Rel.
Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 28/04/2020, DJe 05/05/2020)

Dessa forma, é de ser aplicado o princípio pas de nullité sans grief, em conformidade com o que estatui o artigo 563 do CPP, haja vista não haver demonstração de efetivo prejuízo, prova que competia a defesa fazer.

Nesse sentido, colaciono precedentes do STJ:

HABEAS COUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. HOMICÍDIO QUALIFICADO. NULIDADE. USO DE ALGEMAS. FALTA DE IMPUGNAÇÃO DA DEFESA. PRECLUSÃO. DOSIMETRIA. PRIMEIRA FASE. FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA. CIRCUNSTÂNCIA AGRAVANTE. ART. 62, INCISO III, DO CP. BIS IN IDEM. INOCORRÊNCIA. NATUREZA HEDIONDA. AFASTAMENTO. CLÁUSULA SALVATÓRIA. INVIABILIDADE. HABEAS COUS NÃO CONHECIDO.
1. O Superior Tribunal de Justiça, seguindo entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, passou a não admitir o conhecimento de habeas corpus substitutivo de revisão criminal. No entanto, deve-se analisar o pedido formulado na inicial, tendo em vista a possibilidade de se conceder a ordem de ofício, em razão da existência de eventual coação ilegal. 2. A utilização de algemas, isoladamente, não acarreta nulidade do ato, devendo a defesa insurgir-se contra o seu uso no devido tempo, sob pena de a matéria tornar-se preclusa. Além disso, o prejuízo experimentado deve estar adequadamente demonstrado para que se decrete a nulidade, o que não ocorre na espécie. 3. A ponderação das circunstâncias judiciais que influenciam na fixação da pena-base, nos termos do art. 59 do Código Penal, não é resultado de mera operação aritmética, em que se atribuem pesos absolutos a cada um dos vetores listados no dispositivo citado, mas sim exercício de discricionariedade vinculada, devendo o magistrado pautar-se pelo princípio da proporcionalidade e, também, pelo elementar senso de justiça.
4. No caso destes autos, o Tribunal de origem manteve a avaliação negativa da culpabilidade e das circunstâncias do crime com base em elementos fáticos que demonstram a gravidade diferenciada da conduta, não merecendo qualquer reparo a ser feito, de ofício, por esta Corte Superior.
5. Não prospera a alegação de bis in idem quanto ao reconhecimento da agravante prevista no art. 62, inciso III, do Código Penal, pois a pena-base foi majorada em razão da intensidade do dolo e da elevada periculosidade demonstrada pelo agente e não por ter sido ele o mentor intelectual dos crimes.
6. A Lei n. 8.072/90 adotou o chamado sistema legal ou enumerativo, segundo o qual o próprio texto normativo, de forma exaustiva (numerus clausus), define quais são os crimes considerados hediondos.
7. Em razão do critério adotado pela lei, não compete ao magistrado, ao apreciar o caso concreto, afastar a rotulagem atribuída a um delito incluído no rol do art. 1º da Lei n. 8.072/90, nem categorizar como hediondo uma infração que não conste naquela lista. Admitir que o magistrado exerça juízo acerca da hediondez do crime significa autorizar a usurpação de funções que são próprias do legislador ordinário, quebrando a unidade lógica do sistema jurídico.
8. Habeas corpus não conhecido.
(HC 389.105/DF, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 13/08/2019, DJe 02/09/2019)

RECURSO EM HABEAS COUS. FURTO QUALIFICADO TENTADO. CONDENAÇÃO. NULIDADES. NÃO OCORRÊNCIA. AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO. USO DE ALGEMAS. PRECLUSÃO. ORDEM DE INQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHAS. NULIDADE RELATIVA. FALTA DE DEMONSTRAÇÃO DE EFETIVO PREJUÍZO. SUPOSTA AGRESSÃO DO RÉU NO FLAGRANTE. PROVA CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. REEXAME DOS ELEMENTOS FÁTICOS. IMPOSSIBILIDADE.
1. Embora o Supremo Tribunal Federal haja editado súmula vinculante com limites para o uso de algemas, a ausência de comprovação de prejuízo concreto para a parte impossibilita a anulação do ato processual em que o acusado esteve algemado, em razão do princípio do pas de nullité sans grief. Também o fato de a defesa nem sequer haver questionado o uso de algemas no primeiro momento...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT