Acórdão nº 50054073720198210013 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Criminal, 14-12-2022

Data de Julgamento14 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50054073720198210013
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003018942
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5005407-37.2019.8.21.0013/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes do Sistema Nacional de Armas (Lei 9.437/97 e Lei 10.826/03)

RELATORA: Desembargadora GISELE ANNE VIEIRA DE AZAMBUJA

APELANTE: MARCOS ANDRE STORMOSCKI (RÉU)

ADVOGADO: FABRÍCIO UILSON MOCELLIN (OAB RS058899)

ADVOGADO: ROMEU CLAUDIO BERNARDI (OAB RS070455)

APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia em desfavor de MARCOS ANDRÉ STORMOSCKI, com 33 anos de idade à época dos fatos, dando-o como incurso nas sanções do artigo 146 do Código Penal (1° Fato), e dos artigos 14 (2° fato) e artigo 16, caput (3° fato), ambos da Lei n.° 10.826/03, todos na forma do artigo 69 do Código Penal, pela prática dos seguintes fatos delituosos:

1º Fato:

No dia 19 de junho de 2019, por volta das 23h, na Rua Jacó Luis Busatta, n.° 439, Bairro Koller, nesta Cidade, o denunciado, MARCOS ANDRÉ STORMOSCKl, constrangeu a vítima NICOLAS LUIS CADORE CONCEIÇÃO, mediante grave ameaça, exercida por meio de uma arma de fogo, a fazer o que a lei não manda.

Na oportunidade, o denunciado e a vítima participavam de uma confraternização na residência de MARCOS. Em um dado momento, o acusado ofereceu uma bebida alcoólica denominada Absinto à vítima, para tanto, serviu o líquido em um copo e ateou fogo ao mesmo. Com a negativa da vítima em ingerir a substância, o denunciado ameaçou NICOLAS, fazendo o uso de uma arma de fogo, momento em que NICOLAS derrubou a bebida, em chamas, sobre o seu rosto e peito, causando-lhe as queimaduras descritas no Laudo Pericial da fl. 11 do inquérito policial.

2º FATO:

Nas mesmas condições de tempo e local do fato anterior e até o dia 22 de agosto de 2019, o denunciado, MARCOS ANDRÉ STORMOSCKI, possuía e tinha em depósito arma de fogo, acessórios e munições, de uso permitido, consistentes em 01 (um) revólver, calibre .38, marca Rossi; 01 (um) revólver, calibre .40, marca Simson; 01 (uma) espingarda, calibre .40, marca Boito; 46 (quarenta e seis) munições, calibre .44, marca Whinchester; 12 (doze) munições, calibre .44, marca Whinchester e 06 (seis) estojos da mesma marca e calibre; 01 (uma) munição, calibre .40, marca CBC; 01 (uma) munição, calibre .45, marca CBC; e 01 (um) estojo, calibre .44, marca W-W; conforme auto de apreensão da fl. 53 do IP, sem autorização e em desacordo com a determinação legal ou regulamentar.

Na oportunidade, o denunciado, mantinha em depósito os objetos supradescritos em sua residência. Após a ocorrência do 1° Fato, expediu-se mandado de busca e apreensão na residência do acusado, momento em que os objetos foram localizados e apreendidos.

3º FATO:

Nas mesmas condições de tempo e local do fato anterior e até o dia 22 de agosto de 2019, o denunciado, MARCOS ANDRÉ STORMOSCKl, possuía e tinha em deposito arma de fogo, e acessórios de uso restrito, consistente em 01 (um) fuzil, calibre .7mm, marca Mauser, e 03 (três) silenciadores, conforme auto de apreensão da fl. 53 do IP, sem autorização e em desacordo com a determinação legal ou regulamentar.

Na oportunidade, o denunciado, mantinha em depósito os objetos supradescritos em sua residência. Após a ocorrência do 1° Fato, expediu-se mandado de busca e apreensão na residência do acusado, momento em que os objetos foram localizados e apreendidos.

A lesivídade da arma de fogo e das munições apreendidas restaram comprovadas por meio do Laudo Pericial da fl. 71/74 do IP.

A denúncia foi recebida em 06.08.2020 (evento 3, PROCJUDIC3, fl. 02).

Pessoalmente citado, o acusado apresentou Exceção de Litispendência, em relação ao 1º Fato, narrado na peça acusatória (evento 3, PROCJUDIC3, fls. 05/06), e apresentou resposta à acusação por intermédio de defensor constituído (evento 3, PROCJUDIC3, fls. 07/15).

Houve réplica do Ministério Público em relação à Exceção de Litispendência (evento 3, PROCJUDIC3, fls. 17/19).

Sobreveio sentença do Dr. Marcos Luiz Agostini, julgando improcedente a exceção de litispendência proposta (evento 27, SENT1).

Durante a audiência de instrução, foram ouvidas as testemunhas e procedido ao interrogatório do réu. Encerrada a instrução, os debates orais foram convertidos em memoriais, apresentados pelo Ministério Público (evento 67, MEMORIAIS1), e pela Defesa (evento 71, ALEGAÇÕES1).

Atualizada a certidão de antecedentes criminais (evento 72, CERTANTCRIM1).

Sobreveio sentença de lavra do Dr. Marcos Luiz Agostini, julgando parcialmente procedente a ação penal a fim de condenar o réu como incurso nas sanções dos artigos 12 e 16, caput, da Lei nº 10.826/03 (2º e 3º Fatos), em concurso formal, às penas de 03 (três) anos e 06 (seis) meses de reclusão em regime inicial aberto, bem como à pena de multa, fixada em 20 (vinte) dias-multa, à razão de 3/30 do salário-mínimo vigente à data do fato, e absolvê-lo em relação ao delito de constrangimento ilegal contido no 1º Fato, com fulcro no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. Substituída a pena privativa de liberdade por 02 (duas) restritivas de direitos (evento 74, SENT1 - publicada em 26.08.2022).

A Defesa interpôs recurso de apelação requerendo a apresentação das razões recursais nesta Corte (evento 83, APELAÇÃO1). Em razões, requereu a absolvição do réu alegando atipicidade na conduta do agente. Subsidiariamente, pugnou pelo reconhecimento de crime único, à vista de que as apreensões foram efetuadas no mesmo contexto fático, não havendo falar em duas imputações (evento 7, RAZAPELA1).

O Ministério Público apresentou contrarrazões (evento 15, CONTRAZAP1).

Em parecer, a ilustre Procuradora de Justiça, Dra. Ana Lúcia Cardozo da Silva, manifestou-se pelo desprovimento do recurso defensivo (evento 19, PARECER1).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes colegas.

No caso em epígrafe, o acusado foi absolvido pela infração do artigo 146 do Código Penal (constrangimento ilegal), sendo condenado como incurso nas iras dos artigos 14 e 16, caput, ambos da Lei 10.826/03, em concurso formal. Contra a condenação, insurge-se a defesa.

Antecipo que não prospera a irresignação defensiva.

No caso em julgamento, a prova da materialidade e autoria criminosa foi suficientemente demonstrada pela acusação e referida no decreto condenatório.

E, a fim de evitar descabida tautologia, reproduzo a prova oral resumida em sentença:

No interrogatório o réu MARCOS ANDRE STORMOSCKI negou a prática do primeiro fato imputado. Ofereceu bebida aos convidados da confraternização e não obrigou que ingerissem. Admitiu a prática do segundo e terceiro fatos. Em relação ao revólver calibre .38, referiu que pertencia a Juarez José Cercena, que lhe ofereceu para aquisição. No primeiro momento teve posse do referido revólver sem a devida documentação. Posteriormente legalizou e esperou o trâmite legal, considerando o tempo demorado pela grande demanda. Na oportunidade, já havia feito o apostilamento da arma, apenas não estava em seu nome. Posteriormente acostou aos autos o documento atual da arma, a qual que foi restituída. O revólver calibre .44 e o fuzil, pertenciam ao avô do interrogando, o qual participou da 2° Guerra Mundial e teve direito de trazer consigo quando veio ao Brasil. Essas armas ficaram em sua família por 50 anos. Há 15 anos teve oportunidade de trazer as armas para sua casa, mas por ter um acervo integralmente legal, optou por não comprometer o restante das armas. Ao mudar a presidência, seria lançado um decreto, o qual autorizaria apostilar todas as armas não registradas. Diante da situação, o réu buscou as armas para efetivar a legalização das mesmas. No Senado Federal o projeto não foi aprovado. Os documentos das referidas armas foram perdidos com o tempo, nunca encontrados pelo réu. Possuía um revólver Rossi calibre .44 e vendeu, mas continuou com as respectivas munições.

O ofendido NICOLAS LUIS CADORE CONCEIÇÃO relatou em juízo que ele e os amigos haviam combinado de sair naquele dia. João estava nessa janta e ele estava em casa. Foi até o local buscar João para saírem. Estacionou em frente a residência e manteve o automóvel ligado, pois não entraria no local. Ao chamar o amigo, este lhe convidou para entrar. Já trabalhou na empresa da Rubi, conhecia o pessoal e o Mateus gostaria de falar com ele. Ao entrar lhe foi oferecida bebida alcóolica, a qual recusou, pois estava dirigindo. Em determinado momento Marcos lhe chamou para um canto da casa, onde encheu um copo com a bebida absinto e colocou fogo. O ofendido pegou o copo mas disse que não beberia, pois poderia se queimar. Na oportunidade, o réu sacou uma arma da cintura e apontou para a vítima, lhe obrigando a beber. O ofendido se sentiu pressionado com a arma em sua direção e levou a bebida até sua boca, tão logo tremeu as mãos e derrubou em seu peito, por consequência da pressão psicológica. Pelo alto teor alcóolico da bebida, ao cair em seu peito, subiu para o rosto. Teve seu rosto tomado pelo fogo e sofreu queimaduras de 3° grau na região peitoral. Houve risco de perder a visão de um olho. Não tinha problemas com Marcos, eram conhecidos, inclusive. Mantém amizade com João e saem juntos até hoje. Possui problemas com tremor em sua mãos somente quando exposto à determinadas situações de nervosismo e pressão. Depois do ocorrido não teve mais contato com o réu.

O informante JOÃO VITOR SINHORINI relatou em juízo que estavam em uma confratenização na residência do acusado. Estavam em uma sala e ingeriram absindo com fogo. O depoente estava envolvido na brincadeira e amizade. Ao chegar ao local Nicolas foi convidada a entrar por Mateus ou Marcos, não lembra ao certo. Foram até a salinha, Marcos serviu uma dose da bebida e ateou fogo, em seguida...

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