Acórdão nº 50054656220208210059 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeiro Grupo de Câmaras Criminais, 08-07-2022

Data de Julgamento08 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualEmbargos Infringentes e de Nulidade
Número do processo50054656220208210059
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoPrimeiro Grupo de Câmaras Criminais

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002139095
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

1º Grupo Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Embargos Infringentes e de Nulidade Nº 5005465-62.2020.8.21.0059/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5005465-62.2020.8.21.0059/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas (Lei 11.343/06)

RELATOR: Desembargador JOSE ANTONIO CIDADE PITREZ

EMBARGANTE: ANDREI CAETANO ALVES (RÉU)

ADVOGADO: CRISTIANO VIEIRA HEERDT (DPE)

EMBARGADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de embargos infringentes opostos exclusivamente pela defesa de ANDREI CAETANO ALVES, tendo como fundo acórdão proveniente da 1ª Câmara Criminal do TJRS que, ao julgar o apelo de nº 5005465-62.2020.8.21.0059, oposto pelo agente do parquet e pela defesa dos acusados, por maioria (Des. Lucas, Relator e Drª. Andréia), manteve a condenação do embargante e corréu pelo delito de narcotráfico, vencido o Des. Jayme que de ofício, reconhecia a ilicitude da prova obtida mediante violação de domicílio, mencionando contaminada a prova obtida pelo ingresso em residência, eis que tal configurava a violação alegada e ensejava a absolvição dos acusados, forte no artigo 386, II, do CPP. Ainda, dito voto isolado mantinha a absolvição dos acusados pelo delito do artigo 35, da Lei de Drogas, tal como fora feito na sentença, sendo este o voto que deu azo aos presentes infringentes.

Seguiu-se o ingresso de embargos infringentes, opostos pela Defensoria Pública, apenas em prol do acusado Andrei, objetivando a prevalência do douto voto vencido, exarado pelo Des. Jayme, colacionando-o modo integral.

Colheu-se parecer escrito da douta Procuradoria de Justiça, no rumo do conhecimento e da rejeição dos embargos infringentes.

É o relatório.

VOTO

Adianto que acolho em parte os embargos infringentes.

Tenho por validar o ingresso em domicílio que culminou com a apreensão do tóxico.

Compartilho do entendimento do voto majoritário, ao proceder à mantença da condenação do embargante pelo delito de narcotráfico, eis que a prova dos autos assim o autoriza.

Não se há que falar em violação de domicílio, a contaminar a prova dos autos e importar na absolvição pelo delito de tráfico de drogas.

Os agentes policiais que procederam ao flagrante foram uníssonos em referir que o imóvel já vinha sendo monitorado pelo setor de inteligência, face à provável prática de traficância no local.

Se extrai do feito que os policiais Jader e Volmar trazem narrativa similar, referindo que receberam do comando da inteligência a ordem de abordar pessoas que se aproximavam da casa alvo da operação, sendo que estes para lá se deslocaram e quando se aproximaram do casal, o ora embargante Andrei e sua namorada correram na direção da casa, indo os policiais no seu encalço e ali sendo abordados, ocasião em que encontraram as drogas.

Bem enfatizado no voto do colega Lucas que o ora embargante confirmou que estava traficando no local.

Além disso, não se cogita de violação de domicílio, eis que havia percepção anterior de ocorrência de narcotráfico no local, o que se confirmou à exaustão.

Pensar diversamente disso e num viés paralelo, colocaria em risco até mesmo a abordagem de rotina dos transeuntes, com o fito de coibir crimes.

O parecer do Dr. Silvio Miranda Munhoz, textualiza o teor ao qual me coaduno:

"De plano, como visto, o voto vencido se norteou na ilicitude da prova perfilhada para sustentar a condenação a pretexto de haver sido obtida mediante violação à garantia constitucional do domicílio. O critério orientador para a percepção de eventual ilicitude da prova amealhada advém da análise casuística. No caso em estudo, como já alertado com pertinência no voto majoritário, o substrato fático demonstrado não deixa dúvidas acerca de possuírem os Policiais elementos idôneos apontando a traficância narrada na peça incoativa, não se tratando de medida arbitrária o ingresso na residência localizada na Rua Antônio Monteiro da Costa, n.º 159, Bairro Farroupilha, na cidade de Osório.

Como visto na fundamentação do acórdão, inclusive no enfrentamento minucioso promovido no próprio voto vencido, os agentes policiais afirmaram que a residência dos acusados já estava sendo monitorado pelo setor de inteligência. E na data do fato, uma guarnição foi acionada para se deslocar ao logradouro, em razão do intenso fluxo de pessoas, e ao chegarem ao local, os policiais buscaram abordar um casal que fugiu para o interior da residência, sendo procedida perseguição.

No imóvel, foi arrecadada vultosa quantidade de drogas, totalizando 02 porções de maconha e 49 porções de cocaína, além de uma balança de precisão e relevante quantia em dinheiro. Logo, justificado, pois, o acesso ao imóvel! Sabidamente prestação de socorro e crime permanente viabilizam o ingresso na casa, não estando, assim, configurada nenhuma ilicitude no ingresso na residência, na forma do disposto no art. 5.º, inc. XI, da Constituição Federal.

Não desconheço os julgados do Superior Tribunal de Justiça – HC N.º 598.051-SP e EDcl no AgRg nos EDcl no HABEAS COUS N.º 561.988-PR – declarando a nulidade das provas colhidas em diligência policial sem mandado judicial de busca e apreensão. Todavia não constituem orientação vinculante, motivo por que mantenho minha posição, porque, como é cediço, quem está praticando uma infração penal pode ser preso e ter apreendido o material relacionado ao crime independentemente de ordem escrita, como exsurge da leitura dos arts. 244 e 302, inciso I, do Código de Processo Penal, amparados pelo art. 5.º, inciso LXI, da Constituição Federal.

Trata-se de “prisão sem mandado”, exatamente por ocorrer a “certeza visual do crime”, como sublinhado pelo festejado autor MIRABETE1 . Lamentavelmente os julgados mencionados representam retrocesso no entendimento acerca da temática do ingresso nas residências diante de indício robusto de comercialização de drogas, sendo oportuna a recordação de acórdão mais antigo totalmente em coerência com a conceituação doutrinária de prisão em flagrante. Vejamos:

“PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS COUS. TRÁFICO DE DROGAS. ALEGAÇÃO DA DEFESA DE ILEGALIDADE POR INVASÃO DE DOMICÍLIO. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. CRIME PERMANENTE. FORTE ODOR DE MACONHA. NERVOSISMO DO PACIENTE. RAZÃO PARA REALIZAR A BUSCA NO IMÓVEL. SITUAÇÃO DE FLAGRÂNCIA. MANUTENÇÃO EM DEPÓSITO DE 667 PORÇÕES DE CRACK (286,14 G), 1.605 INVÓLUCROS DE MACONHA (6.731,81 G), 1.244 INVÓLUCROS DE COCAÍNA (1.533,23 G) E 35 FRASCOS DE LANÇA-PERFUME. 1. Consta nos autos que os policiais perceberam o nervosismo do paciente e que ao chegarem à residência, já sentiram um forte odor de maconha, razão pela qual fizeram a busca dentro da residência. 2. Agravo regimental improvido”. (AgRg no HC 423.838/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 08/02/2018, DJe 19/02/2018). (G.n.)

Aliás, o tema ora questionado foi enfrentado em decisão monocrática do Ministro Jorge Mussi, e o egrégio Superior Tribunal de Justiça deu provimento a recurso especial manejado pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul - REsp 1.674.864 -, publicado em 29-06-2017 – para o efeito de cassar acórdão deste Tribunal de Justiça reafirmando a licitude da prova colhida em circunstâncias análogas ao caso em estudo: “DECISÃO. Trata-se de recurso especial interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO RIO GRANDE DO SUL, fundamentado na alínea ‘a’ do permissivo constitucional, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que deu provimento à apelação defensiva para absolver o réu, com fulcro no art. 386, II, do Código de Processo Penal. Nas razões do presente apelo nobre o Parquet alega negativa de vigência aos arts. 302, I e 303, do Código de Processo Penal e violação dos arts. 157, caput e 240, também do Código de Processo Penal. Sustenta que é assente na doutrina e na jurisprudência que o crime de tráfico é permanente, de modo que a busca domiciliar realizada sem mandado judicial não é ilegal enquanto perdurar o delito. Argumenta que é perfeitamente lícito o ingresso no domicílio alheio, dada a situação de flagrância, uma vez que a inviolabilidade do domicílio não é irrestrita e absoluta. Aduz, ainda, contrariedade ao art. 619 do Código de Processo Penal, alegando que a Corte Estadual incorreu em omissão ao reputar a ilegalidade da ação policial tendo como premissa que o local onde o réu foi detido era a sua residência, quando, na verdade, estava em local diverso. Requer, ao final, o provimento do recurso especial para que seja reconhecida a licitude da prova colhida e o afastamento da absolvição do réu, determinando que a Corte Estadual prossiga no julgamento do recurso manejado pela defesa. Subsidiariamente, postula-se pela desconstituição do acórdão que julgou os embargos de declaração, a fim de que outro seja prolatado em seu lugar, com o devido enfrentamento dos temas lá referidos. Foram apresentadas contrarrazões (e-STJ, fls. 324/341). Instado a se manifestar, o Ministério Público Federal, na condição de custos legis, ofertou parecer pelo provimento do inconformismo (e-STJ, fls. 383/393). “É o relatório. Satisfeitos os pressupostos de admissibilidade, passa-se ao exame recursal. “Acerca do tema trazido à discussão no apelo nobre, assim restou assentado pela Corte a quo, litteris: ‘Rogo máxima vênia ao eminente Relator para divergir, pois entendo ilícita a prova que fundamentou a condenação (invasão de domicílio) e disto decorre a absolvição do réu. Inicialmente, destaco que nulidade por cerceamento de defesa, aventada em razões recursais, não será por mim examinada, na medida em que o mérito indica desfecho mais favorável ao recorrente.’ “[...] “Verifica-se, pois, que a instância de origem decidiu pela ilicitude da prova obtida por meio da ação...

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