Acórdão nº 50055094620168210019 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Criminal, 03-02-2022

Data de Julgamento03 Fevereiro 2022
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo50055094620168210019
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001468724
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5005509-46.2016.8.21.0019/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes do Sistema Nacional de Armas (Lei 9.437/97 e Lei 10.826/03)

RELATOR: Desembargador NEWTON BRASIL DE LEAO

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

1. Trata-se de apelação, interposta por MOACIR CAMARGO, contra decidir que o condenou, como incurso nas sanções do artigo 12 da Lei nº 10.826/03, às penas de 01 ano de detenção, no regime aberto, substituída, e 10 dias-multa, por fato assim descrito na inicial acusatória:

"FATO DELITUOSO:

No dia 27 de dezembro de 2015, por volta das 16h00min, na Rua da Conquista, 500, Bairro Dihel, nesta Cidade, o denunciado Moacir Camargo mantinha sob sua guarda e possuía uma espingarda, calibre .12, marca Boito, numeração E8773209, bem como um estojo e quatro cartuchos do mesmo calibre, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar (autos de constatação e de apreensão de fls.).

Na ocasião, Policiais Militares, em atendimento a uma ocorrência de disparo de arma de fogo, foram informados que na residência acima localizada o denunciado estaria na posse de uma arma de fogo. Ato contínuo, os Policiais Militares deslocaram-se até a casa do denunciado encontraram a arma suprarreferida, motivo pelo qual o denunciado foi preso em flagrante delito e conduzido até a Delegacia de Polícia para lavratura do auto respectivo."

Nas razões, sustenta nulidade da prova da materialidade, em razão de indevida violação do domicílio do réu. No mérito, alegando insuficiência probatória e inconstitucionalidade dos crimes de peritgo abstrato, pede absolvição.

O recurso foi contrarrazoado.

Em parecer escrito, o Dr. Procurador de Justiça opina pelo improvimento da desconformidade.

Esta Câmara adotou o procedimento informatizado, tendo sido atendido o disposto no artigo 613, inciso I, do Código de Processo Penal.

É o relatório.

VOTO

2. A inconformidade defensiva não merece acolhida.

Inicialmente, esclareço não verificada a alegada ilicitude de violação de domicílio, por se tratar a posse de arma de fogo de delito permanente, com o que desnecessário mandado de busca e apreensão quando há indícios da prática, como evidenciado no presente caso.

Assim a jurisprudência desta Câmara:

“APELAÇÃO CRIMINAL. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. POSSE IRREGULAR DE MUNIÇÃO DE USO PERMITIDO. RECEPTAÇÃO. ARTS. 14 E 12 DA LEI Nº 10.826/03. ART. 180, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL. PRELIMINARES. AUSÊNCIA DE RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. NULIDADE DE EXAME PERICIAL. CRIMES DE PERIGO ABSTRATO. VIOLAÇÃO DOMICILIAR. REJEIÇÃO. PROVAS DA AUTORIA E MATERIALIDADE. DOLO DA RECEPTAÇÃO EVIDENCIADO. CONDENAÇÕES MANTIDAS. PENAS REDUZIDAS. 1. Inexiste nulidade por ausência de recebimento da denúncia, em relação ao réu L.A.L.D. No caso, houve recebimento tácito da exordial, porquanto, ainda que o recebimento não tenha sido explícito, o Magistrado procedeu a realização dos atos subsequentes da instrução do feito, observando as formalidades legais e as garantias do acusado, que teve oportunizada sua defesa e foi devidamente inquirido, não havendo prejuízo. Precedentes. 2. Segundo entendimento dos Tribunais Superiores, é desnecessária a realização da perícia da potencialidade lesiva da arma, caracterizando-se o crime, ainda que a arma de fogo esteja desmuniciada. No presente caso, de qualquer modo, os testes demonstraram ser a arma e as munições aptas à produção de disparos. Além disso, foram realizados por policiais civis detentores de curso superior, não se verificando qualquer nulidade, eis que atendidos os comandos legais. 3. O porte ilegal de arma defogo e a posse irregular de munição são crimes de perigo abstrato e de mera conduta, mostrando-se prescindível a demonstração de perigo concreto. Precedentes. Na esteira do entendimento dos Tribunais, em especial o Supremo Tribunal Federal, não são inconstitucionais os crimes de perigo abstrato, a exemplo daqueles previstos na Lei 10.826/03, que teve sua constitucionalidade assentada na ADI 3.112/DF. 4. Conforme a jurisprudência dos Tribunais Superiores, que interpretam o conteúdo explícito do art. 5º, XI, da CF, não há nulidade ou imprestabilidade da prova obtida durante prisão em flagrante por porte e posse de arma, por alegada violação de domicílio. Tratam-se de crimes permanentes, mostrando-se desnecessária a existência de mandado de busca e apreensão. (...) PRELIMINARES REJEITADAS. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA” (Apelação Crime Nº 70069683860, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Julio Cesar Finger, Julgado em 01/09/2016).

No mesmo sentido pronuncia-se o STJ:

“RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS COUS. POSSE OU PORTE DE ARMA DE FOGO E MUNIÇÕES DE USO RESTRITO. ILEGALIDADE DA BUSCA E APREENSÃO. CRIME PERMANENTE. DESNECESSIDADE DE MANDADO JUDICIAL. SITUAÇÃO DE FLAGRÂNCIA. DECISÃO DE RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE NULIDADE. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. RECURSO DESPROVIDO.

1. Com relação às provas, o Tribunal de origem afirmou a legalidade da busca e apreensão realizada na residência do recorrente, em consonância com a jurisprudência consolidada nesta Corte Superior, no sentido de que, tratando-se de crime permanente, não há ilegalidade na busca e apreensão por violação de domicílio, uma vez que a própria Constituição Federal autoriza a entrada da autoridade policial seja durante o dia, seja durante a noite, independente da expedição de mandado judicial.

(...)

Cumpre destacar, ainda, que o fato dos policiais terem sido recebidos com disparos de arma de fogo realizados pelos seguranças da propriedade, que em seguida fugiram para o interior da residência, por si só é suficiente para justificar a medida de busca e apreensão em residência.

Do mesmo modo, ainda que pairasse qualquer dúvida sobre a legalidade da busca e apreensão realizada, esta não seria suficiente para o trancamento da ação penal, uma vez que o crime de posse irregular de arma de fogo de uso restrito é do tipo permanente, o qual autoriza a prisão em flagrante no interior do domicílio, independente de mandado judicial.

Não há, portanto, falar em flagrante ilegalidade na decisão que determina seu recebimento.

Recurso ordinário desprovido”

(RHC 85.831/MS, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 19/09/2017, DJe 27/09/2017).

Com efeito, consoante aduzido pelo Dr. Procurador de Justiça Gilmar Bortolotto, em seu parecer, “há elementos suficientes a demonstrar a caracterização de situação de flagrante, pois os referidos policiais militares já tinham a informação sobre a existência de arma de fogo no interior da residência, bem como de disparos realizados nas adjacências (art. 302, inc. I, do Código de Processo Penal). (grifo meu)

Dessarte, a prova é plenamente válida, não havendo qualquer mácula em sua produção.

3. Sem trânsito, no mérito, a tese de insuficiência probatória.

Com efeito, a materialidade do delito veio demonstrada pelo registro de ocorrência das fls. 05/07, auto de apreensão da fl.08, consulta de arma SINARM da fl. 27 (Evento 3 - PROCJUDIC1), laudo pericial das fls. 90/91 (Evento 3 - PROCJUDIC2), assim como pela prova oral produzida, a qual sintetizo abaixo.

O Policial Militar Vitor Luis Argenta Lisboa afirmou que receberam informações de vizinhos do acusado, dando conta de que havia ocorrido uma briga no local e sido efeituado disparos, estando a arma de fogo com o acusado. Se deslocaram ao local informado, sendo localizada a arma de fogo em cima de uma mesa coberta por roupas.

O Policial Militar Sidnei Adiar da Silva Costa, no mesmo sentido que o policial Vitor Luis, relatou que foram despachados pela Sala de Operações para verificar informação de que ciganos estariam efetuando disparos de arma de fogo. Informou que o local era área de invasão. Após revista no local, foi localizada arma de fogo coberta por roupas. Afirmou por fim, que também apreendido revólver calibre .38 sob o vestido de uma mulher, mas que o fato foi registrado separadamente.

O réu não...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT