Acórdão nº 50056821520218210013 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Criminal, 03-02-2022

Data de Julgamento03 Fevereiro 2022
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo50056821520218210013
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001543808
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

4ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5005682-15.2021.8.21.0013/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes do Sistema Nacional de Armas (Lei 9.437/97 e Lei 10.826/03)

RELATOR: Desembargador ARISTIDES PEDROSO DE ALBUQUERQUE NETO

APELANTE: LENOMAR SOARES (RÉU)

APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

RELATÓRIO

O Ministério Público denunciou LENOMAR SOARES, por incurso nas sanções previstas nos arts. 15 e 14, caput, da Lei nº 10.826/03, e nos arts. 180 e 329, caput, ambos do Código Penal, pela prática dos seguintes fatos delituosos:

1.° FATO: Disparo de arma de fogo:

No dia 20 de junho de 2021, por volta das 20 horas, nas proximidades da Rua São Vitor, Bairro Cristo Rei, no Município de Erechim, RS, o denunciado LENOMAR SOARES disparou arma de fogo (apreendida – auto de apreensão das fls. 13 e 14 do IP) e acionou munição em lugar habitado e em via pública.

Na oportunidade, o denunciado, então suspeito de envolvimento na morte de Keiti Nascimento Clausi, sua namorada, ocorrido horas antes, vinha empreendendo fuga pelo bairro acima referido, quando, no percurso, efetuou pelo menos um disparo de arma de fogo em via pública, nas adjacências de local que é habitado.

Uma munição de calibre .38 deflagrada foi apreendida (fl. 13 do IP).

2.° FATO: Porte ilegal de arma de fogo de uso permitido:

Nas mesmas circunstâncias de tempo e local do fato anterior, o denunciado LENOMAR SOARES portava e transportava 01 (uma) arma de fogo de uso permitido e munições, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar (conforme auto de apreensão das fls. 13 e 14 do Inquérito Policial).

Logo após o fato anterior, o denunciado foi avistado por policiais civis na via pública, tendo sido flagrado portando 01 (um) revólver, marca Taurus, calibre .38, bem como 03 (três) munições calibre .38 intactas. Tais objetos foram apreendidos em poder do denunciado.

3.° FATO: Resistência:

Nas mesmas circunstâncias de tempo e local do fato anterior, o denunciado LENOMAR SOARES opôs-se à execução de ato legal, mediante violência e ameaça a policiais civis (funcionários) competentes para executá-lo.

Na ocasião, o denunciado foi avistado por policiais civis na via pública, portando uma arma de fogo, momento em que eles lhe deram voz de abordagem. Ao lhe ser ordenado que largasse a arma, o denunciado resistiu à ordem e ameaçou os policiais, apontando a arma em direção ao policial Fernando Cruz Silva, sendo necessário que outro policial, a fim de obstar eventual disparo por parte do denunciado, efetuasse um disparo de arma de fogo em direção às pernas do denunciado, logrando êxito em atingi-lo e fazendo-o cessar a sua conduta.

Em seguida, foi dada voz de prisão ao denunciado, bem como acionado o Corpo de Bombeiros para socorrê-lo, tendo sido encaminhado a um hospital local.

4.° FATO: Receptação:

Em período não precisado nos autos, mas antes da prática do 1.° Fato (e até a data dos fatos desta denúncia), o denunciado LENOMAR SOARES adquiriu, recebeu, transportou e conduziu, em proveito próprio, 01 (um) revólver, marca Taurus, calibre .38, pertencente a Adão Antunes Pires, arma que sabia ser produto de crime (arma furtada no dia 14/03/2013, conforme consta do teor do documento da fl. 10 e boletim de ocorrência das fls. 56 e 57 do IP).

O denunciado adquiriu a arma de forma não esclarecida, mas com prévia ciência acerca de sua origem ilícita, dada a natureza do bem e a ausência de formalidades ou registro em seu nome.

O objeto foi apreendido em poder do denunciado quando do flagrante pela prática dos delitos anteriores descritos nesta denúncia.

A denúncia foi recebida em 06.07.2021 (evento 3).

Instruído o feito, sobreveio sentença julgando parcialmente procedente para condenar LENOMAR SOARES, como incurso no art. 15, caput, da Lei nº 10.826/03, e, nos arts. 180 e 329, caput, c/c o art. 69, caput, todos do Código Penal, à pena de 04 anos, 04 meses e 20 dias de reclusão e 03 meses e 15 dias de detenção, em regime fechado, 30 dias-multa, à razão de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos; e, absolvê-lo da imputação prevista no art. 14, caput, da Lei nº 10.826/03, com fulcro no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal (evento 81).

Inconformada, a defesa interpôs recurso de apelação (evento 93).

Em suas razões, sustenta insuficiência probatória quanto aos delitos de receptação e resistência. Alega também, quanto a estes delitos, a atipicidade das condutas por ausência de dolo. Requer a absolvição. Subsidiariamente, o redimensionamento da pena-base, a modificação do regime inicial de cumprimento de pena e substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos (evento 98).

Foram apresentadas as contrarrazões (fls. 102).

Neste grau de jurisdição, manifesta-se o eminente Procurador de Justiça pelo desprovimento do recurso (evento 7).

VOTO

A inconformidade não merece acolhida.

Materialidade delitiva consubstanciada pelo auto de apreensão, boletim de ocorrência de furto de arma de fogo, laudo pericial e demais elementos coligidos ao feito.

Autoria comprovada.

Como bem resumida a prova oral na douta sentença:

O réu LENOMAR SOARES, em seu interrogatório judicial, confessou ter portado a arma de fogo apreendida, negando, contudo, os demais fatos descritos na denúncia. Na ocasião, efetuou um disparo de arma de fogo no pátio da residência de sua genitora, a fim de testar a funcionabilidade da arma. Pegou a arma de fogo emprestada de seu vizinho, efetuando o pagamento de R$ 100 (cem reais) pelo empréstimo, cerca de 10 (dez) minutos antes do ocorrido, com a pretensão de suicidar-se, haja vista que sua namorada teria falecido na mesma data. Acrescentou que a arma de fogo estava em sua cintura, pois estava procurando lugar apropriado para o suicídio, momento em que visualizou a viatura da Brigada Militar e empreendeu fuga pelos terrenos do bairro. Foi abordado por agentes que estavam a paisana. Os agentes não estavam com a viatura policial. Não apontou a arma de fogo para os policiais. Foi alvejado por um disparo de arma de fogo há uma distância de 15 metros dos policiais. Que o bairro onde reside sua genitora é habitado.

O Policial Civil FABIANO MOREIRA relatou que na data dos fatos receberam informação da morte de uma jovem no Bairro Cristo Rei, tendo como principal suspeito o seu namorado, LENOMAR SOARES. Por volta das 17h30min, quando estavam deixando o bairro, moradores locais pararam a viatura e informaram que o acusado havia ingressado num “beco”, na posse de uma arma de fogo e que, inclusive, teria efetuado disparos para o alto. Quando chegaram no beco, avistaram o acusado conversando com um rapaz, momento em que se identificaram como sendo policiais, solicitando-lhe que soltasse a arma de fogo. O acusado recusou-se a entregar a arma de fogo que portava, além de apontar a referida arma na direção de seu colega Fernando, razão pela qual efetuou um disparo na perna de LENOMAR, a fim de contê-lo. O réu portava um revólver calibre .38, com 03 (três) munições intactas. Mencionou que o réu estava drogado.

O informante FERNANDO CRUZ SILVA, também Policial Civil, declarou que estavam auxiliando nas investigações do crime de homicídio de uma jovem, companheira do acusado, razão pelo qual se deslocaram ao local dos fatos. Quando estavam deixando o local, foram abordados por moradores, os quais informaram que o acusado estava na posse de uma arma de fogo, usando uma roupa preta e que teria efetuado um disparo em uma casa. Em seguida, após diligências, avistaram o acusado na posse da arma de fogo, momento em que ligou o giroflex e se aproximou dele. Ato contínuo, desceu da viatura, identificou-se como policial, contudo, o acusado resistiu e apontou a referida arma em sua direção. Nesse momento, seu colega Fabiano, tentou contê-lo, sem lograr êxito, motivo pelo qual efetuou um disparo de arma de fogo na perna do acusado. Após, conseguiram conter o acusado, que foi encaminhado ao hospital. Foi identificada a existência de um registro de furto da arma de fogo que o réu portava.

A testemunha ADÃO ANTUNES PIRES, Policial Militar da reserva, relatou que teve a sua arma de fogo subtraída do interior de seu veículo automotor no ano de 2013. Que registrou o fato na polícia civil.

A testemunha ANDRÉ MARTINEZ DA SILVA declarou que estava na casa de seu compadre, momento em que o acusado chegou ao local portando uma arma de fogo, com a boca machucada e chapado. Ato contínuo, a Brigada Militar chegou ao local, tentou abordagem pessoal e entraram em luta corporal com o réu. O acusado só soltou a arma de fogo quando foi atingido por um disparo desferido pelos policiais.

Essas são as provas.

Cumpre destacar que a palavra dos policiais, quando firme e segura, como no presente caso, goza de credibilidade. Além disso, não há qualquer indício de que policiais militares em serviço fossem imputar falsamente ao réu tal conduta delituosa. Assim, o relato dos policiais merece acreditado, porquanto além de harmônico e coerente, não há nenhum indicativo capaz de torná-lo suspeito ou parcial.

Tocante ao delito de resistência, oss policiais foram uníssono em relatar que se identificaram como policiais e ordenaram que o réu largasse a arma, contudo, nada foi obedecido e, ao contrário, o acusado apontou o artefato contra a guarnição.

Com efeito, o denunciado utilizou da arma de fogo para opor-se à prisão, sendo dispensável que haja lesão para a tipificação do crime em apreço, bastando insurgir-se a ato legal, mediante o emprego de violência ou ameaça. Exatamente o caso.

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