Acórdão nº 50057677320188210023 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeira Câmara Criminal, 07-07-2022

Data de Julgamento07 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50057677320188210023
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001983967
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

1ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5005767-73.2018.8.21.0023/RS

TIPO DE AÇÃO: Leve (art.129, caput)

RELATOR: Desembargador MANUEL JOSE MARTINEZ LUCAS

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Na Comarca de Rio Grande, R. C. M., 47 anos à época do fato, foi denunciado como incurso nas sanções do art. 129, § 9º, do Código Penal, combinado com os arts. e da Lei n.º 11.340/2006.

A peça acusatória, recebida em 02/04/2019 (p. 46, contida no evento 3 - PROCJUDIC2 da ação penal), foi do seguinte teor:

“No dia 17 de novembro de 2018, por volta das 17h50min, na Rua A, nº 159, Vila da Quinta, nesta Cidade, o denunciado ofendeu a integridade corporal da vítima Renata Pereira Santos, sua companheira, causando-lhe as lesões assim descritas no laudo pericial da fl. 12: '[...] No lábio inferior e no lábio superior, apresenta aumentos de volume (edemas traumáticos), encimados por feridas de bordo irregulares e afastadas entre si, cobertas por crosta cicatricial hemática, a maio delas no lábio inferior medindo 8mm. [...]'.

Na ocasião a vítima ao chegar em casa encontrou o denunciado, o qual começou a discutir com esta e a lhe desferir tapas contra o rosto e a cabeça, causando-lhe as lesões acima descritas.

Ato contínuo, a vítima acionou a policia militar que compareceu no local e encontrou o denunciado, o apresentava comportamento agressivo, de forma que foi necessário o uso de algemas para contê-lo, tendo sido preso em flagrante, conforme auto da fl. 03.”

Processado o feito, sobreveio sentença (p. 18-28, evento 3 - PROCJUDIC4 da ação penal), prolatada em 28/09/2021, julgando parcialmente procedente a ação penal para CONDENAR o réu R. C. M. como incurso nas sanções dos arts. 129, § 9º, do Código Penal, com as disposições dos arts. e da Lei n.º 11.340/06, à pena de 01 (um) ano e 05 (cinco) meses e 15 (quinze) dias de detenção, em regime inicial semiaberto, e ao pagamento de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais) a título de indenização pelos danos morais suportados pela vítima, corrigidos pelo IGP-M e com juros de mora de 1% ao mês.

Irresignada, a defesa interpôs recurso de apelação (p. 35, evento 3 - PROCJUDIC4 da ação penal). Em suas razões (p. 43-50, evento 3 - PROCJUDIC4/ p. 1-14, evento 3 - PROCJUDIC5, da ação penal), requereu a absolvição do réu por insuficiência probatória para a condenação. Subsidiariamente, no caso de manutenção da decisão, pugnou pelo redimensionamento da pena-base e da pena provisória, bem como pela alteração do regime inicial de cumprimento de pena. Ainda, postulou a possibilidade de concessão do sursis, o afastamento ou a redução do valor fixado a título de indenização e a restituição do valor apreendido do réu no momento da prisão em flagrante.

Foram apresentadas contrarrazões pelo Ministério Público (p. 15-27, contidas no evento 3 - PROCJUDIC5 da ação penal).

Vieram os autos a este Tribunal.

Nesta instância, o parecer do Procurador de Justiça, Dr. Silvio Miranda Munhoz, foi pelo não provimento do recurso defensivo (evento 7 da apelação).

Esta Câmara adotou o procedimento informatizado, tendo sido observado o disposto no art. 613, inciso I do Código de Processo Penal.

É o relatório.

VOTO

O recurso interposto é tempestivo e preenche os demais requisitos de admissibilidade, razões pelas quais é conhecido.

Inexistindo teses preliminares, passo ao exame do mérito.

A materialidade delitiva restou consubstanciada pelo boletim de ocorrência policial n° 14713/2018/150910 (Evento 3, PROCJUDIC1 - p. 08/10), pelos termos de declarações (Evento 3, PROCJUDIC1 - p. 12, 13, 14 e 19), pelo Laudo Pericial n° 177481/2018 (Evento 3, PROCJUDIC2 - p. 35/36), bem como pela prova oral colhida em juízo.

A autoria do delito é certa e recai sobre a pessoa do acusado.

A fim de evitar inútil e fastidiosa tautologia, transcrevo a análise dos depoimentos contida na sentença:

A vítima Renata Pereira Santos, ouvida em juízo, confirmou que eram companheiros e residiam juntos no local dos fatos, desde que ele saiu do presídio em prisão domiciliar, em torno de 05 meses antes. Contou que, na ocasião, chegou do serviço e notou o acusado sentado no pátio em frente ao imóvel com uma "cara não muito boa". Disse que entrou em casa e o acusado foi atrás. Em seguida, ele começou a delirar, falar o nome de um rapaz e indagá-la sobre como escreveria o nome desse sujeito. Ressaltou que já tinha sido agredida por ele anteriormente e percebeu que ele estava transtornado da mesma forma que da outra vez, razão pela qual tentou fazer uma volta para se aproximar de sua sobrinha [Nicole] e pedir que ela saísse, oportunidade em que ele lhe deu um tapa de mão aberta, atingindo sua orelha e o maxilar. Nesse momento, sua sobrinha levantou e foi em direção ao réu, que por sua vez fez feição de que iria agredi-la [Nicole], momento em que a vítima o puxou e ele lhe devolveu um "encontrão", derrubando-a e fazendo com que batesse a boca contra uma mesa. Em seguida, ele pegou uma cadeira e fez feição de que jogaria contra as duas, porém sua sobrinha fugiu para pedir ajuda. Disse ter lembrado que ele tinha uma arma - que havia pedido que ele se desfizesse do objeto, mas não sabia se ele tinha se desfeito - e ficou com temor de que sua sobrinha voltasse com ajuda e ocorresse uma tragédia, de modo que saiu para a rua e viu sua sobrinha chegando com dois vizinhos. Pediu que ninguém entrasse no imóvel, porém ficou com receio de que ele fizesse algo contra seus animais, uma vez que ele estava transtornado. Porém, foi impedida de retornar ao local pelas pessoas que estavam ali. Afirmou que chamaram a polícia e ficaram aguardando na rua, enquanto o réu estava dentro de casa. Em seguida, ele saiu com uma sacola de roupas e retornou pouco depois. Disse que os policiais chegaram e a ofendida, então, entrou em casa e percebeu que o acusado atirou uma das gatinhas filhotes que havia resgatado na rua, que tinha um traumatismo na cabeça, na casa ao lado, local onde tinha cachorros, com o intento de que o animal fosse atacado. Referiu que foi apreendido um valor na ocasião, que acreditou que fosse seu, pois havia recebido naquele dia, porém depois percebeu que não era. Ressaltou que o dinheiro poderia ser do réu, mas não tinha ideia de como ele conseguiu, pois não estava trabalhando. Questionada pela Promotora de Justiça, disse que foi necessário contê-lo com algemas, considerando que permanecia transtornado. Disse que ele quebrou vários objetos dentro de sua casa, televisão, caixa de som, porta de guarda-roupas, porém não tinha noção do valor do prejuízo. Asseverou que até mesmo a ração dos gatos ele colocou no lixo. Confirmou que, pouco depois que começaram a morar juntos, ele teve uma crise e a agrediu, porém se comprometeu a "fazer tudo certo" e pediu desculpas. Confirmou ter ficado machucada no rosto, na boca e no maxilar, ficando 02 ou 03 dias sem conseguir mastigar. Informou que a sobrinha que estava presente era Nicole. Disse que não mantiveram contato depois do fato, especialmente porque quando foi levada ao posto de saúde, o acusado informou que era soropositivo e disse que a vítima "já era". Ressaltou que ele sabia que era portador do vírus e que havia lhe transmitido, porém nunca lhe informou para que pudesse iniciar algum tratamento. Informou que os fatos ocorreram por volta de 17h. Respondeu que as agressões cessaram quando ele saiu de casa. Questionada se teriam o agredido, respondeu que apenas o empurrou para defender a sobrinha. Questionada pela magistrada se ele teria agredido Nicole, respondeu que ele deu um "encontrão" nela, deixando-a com um "roxão" no braço.

A testemunha Nicole Soares Teixeira, ouvida em depoimento especial, contou que morava com sua tia há três anos, sendo que Ronaldo também passou a morar no local. Contou que, antes dos fatos, o acusado sempre demonstrou ciúmes da vítima. Relatou que era um sábado e sua tia chegou da rua após passar no supermercado. Assim que sua tia chegou, o acusado começou a discutir com ela e acusá-la de traição. Em seguida, ele passou a agredi-la e deu um soco ou um tapa no rosto, quando ela caiu e bateu a boca em uma cadeira ou mesa. Nesse momento, a depoente foi tentar separar a briga e puxar o acusado, quando então ele foi tentar agredi-la. Sua tia, então, interveio e a infante saiu de casa para tentar chamar ajuda em um mercado e não voltou mais para dentro de casa. Sua tia saiu de casa depois. Quando voltou para casa, viu estava tudo revirado, a televisão e o guarda-roupa estavam quebrados. Referiu que o acusado colocou uma gatinha no pátio do vizinho, onde havia cachorros. Perguntada como teria iniciado as agressões, disse que sua tia estava guardando as compras do supermercado. Quando foi agredida, sua tia não conseguiu se defender, pois foi tudo muito rápido. Disse que quem chamou a polícia foi o rapaz do mercadinho.

O réu, por sua vez, interrogado em juízo, relatou que estava em casa, sendo que a ofendida chegou um pouco mais tarde que o habitual. Disse que ela afirmara que estava no Supermercado Guanabara, quando então questionou-a onde estariam as compras, o que desencadeou toda a confusão. Negou tê-la agredido. Afirmou que apenas se defendeu das duas (Renata e Nicole), pois uma delas lhe mordeu enquanto a outra bateu com um pedaço de pau em sua cabeça. Referiu que sua mão atingiu a boca de Renata sem querer. Reiterou que as duas que lhe agrediram. Afirmou que Nicole fugiu e chamou a Brigada Militar. Negou ter outro envolvimento com violência doméstica.

Como é consabido, a palavra da vítima assume especial relevância probatória em delitos perpetrados no convívio familiar, haja vista, dentre outros fatores, a sua condição de...

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