Acórdão nº 50060227720198212001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Cível, 01-04-2022

Data de Julgamento01 Abril 2022
ÓrgãoSexta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50060227720198212001
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001536980
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5006022-77.2019.8.21.2001/RS

TIPO DE AÇÃO: Tratamento médico-hospitalar

RELATOR: Juiz de Direito FELIPE KEUNECKE DE OLIVEIRA

APELANTE: MARTINA DE CARLI LOPES (AUTOR)

APELANTE: BRADESCO SAUDE S/A (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível e recurso adesivo interpostos, respectivamente, por BRADESCO SAÚDE S/A. e MARTINA DE CARLI LOPES, menor incapaz representada por seus genitores GUILHERME DE OLIVEIRA LOPES e NATÁLIA DE CARLI, em face da sentença que, nos autos da ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais com pedido de tutela de urgência, proposta pela última em desfavor da primeira, resolveu pela parcial procedência da demanda, nos seguintes termos (Evento 72, SENT1 – processo originário):

“(...)

ISSO POSTO, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por MARTINA DE CARLI LOPES, menor incapaz, representada por seus pais, GUILHERME DE OLIVEIRA LOPES e NATALIA DE CARLI contra BRADESCO SAÚDE S/A, para o fim de tornar definitivos os efeitos da tutela deferida e determinar que a requerida dê cobertura aos tratamentos recomendados pelos métodos BOBATH E PEDIASUIT, nos termos prescritos pelos médicos e fisioterapeutas que acompanham a autora.

Diante do decaimento parcial de cada parte, arcarão a parte autora e ré, respectivamente, com 50% das custas processuais. Sendo parcial e na mesma proporção o decaimento, cada parte arcará com os honorários do procurador da parte contrária, no percentual de 15% sobre o valor atualizado da causa, em observância ao artigo 85, §2º do CPC/2015, corrigidos monetariamente pela variação do IGP-M a contar da data da fixação da verba e acrescidos de juros de mora de 1% a.m a contar do trânsito em julgado. Suspensa a exigibilidade do pagamento com relação à parte autora, pois isenta do pagamento.

(...)” (GRIFOS DO ORIGINAL).

Em razões de apelo, a parte Ré refere a ausência de cobertura, em razão do risco excluído, por força da taxatividade do rol da ANS, recentemente reconhecido pelo STJ. Subsidiariamente, em caso de manutenção da sentença, pede seja observada a limitação do número das sessões, como definido pela ANS, bem como os limites de reembolso, em razão de a cobertura ocorrer fora da rede referenciada (Evento 82, APELAÇÃO1 – processo originário).

No recurso adesivo, a Autora pede a condenação da Ré ao pagamento dos danos morais, a alteração do valor da causa, com a reforma da decisão que estipulou o valor de alçada, na medida em que o valor e a quantidade dos protocolos anuais de que a menor necessita podem ser apurados em liquidação de sentença, e, ao fim, a majoração dos honorários sucumbenciais, que deverá observar o valor da causa apurado em liquidação de sentença, e, na hipótese de ser negado o pedido de alteração do valor da causa, que sejam majorados para que o percentual incida sobre o valor anual do tratamento postulado na demanda (Evento 88, RECADESI1 – processo originário).

Foram apresentadas contrarrazões (Evento 89, CONTRAZ1 – processo originário e Evento 13, CONTRAZ1).

O Ministério Público exarou parecer pelo não provimento do apelo e pelo parcial provimento do recurso adesivo (Evento 7, PARECER1).

Vieram-me os autos conclusos, oriundos de redistribuição (Evento 17, INF1).

É o relatório.

VOTO

Satisfeitos pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos e passo a analisa-los.

1. DO RECURSO DE APELAÇÃO

Eminentes Desembargadores, conforme exposto no relatório, a parte Ré, BRADESCO SAÚDE S/A. apelou da sentença que a impeliu a fornecer cobertura aos tratamentos recomendados pelos métodos BOBATH e PEDIASUIT, nos exatos termos prescritos pelos médicos e fisioterapeutas assistentes da Autora.

A decisão recorrida foi proferida pelo Juízo da 2º Juízo da Vara Cível do Foro Regional do Alto Petrópolis da Comarca de Porto Alegre, estando assim fundamentada (Evento 72, SENT1 – processo originário):

“(...)

A existência de contrato de assistência à saúde entre as partes é incontroversa, aplicando-se, no ponto, o disposto no artigo 374, II, do CPC.

A atividade securitária está abrangida pelo Código de Defesa do Consumidor, conforme se verifica da leitura do artigo 3º, parágrafo 2º do diploma consumerista, in verbis:

Art. 3° ...

...

§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

Ademais, tal entendimento encontra-se consubstanciado no texto da Súmula 469 do STJ, que assim disciplina:

‘Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde’.

Assim, aplicáveis ao presente caso as disposições do Código de Defesa do Consumidor, dentre elas a inversão do ônus da prova, dada a hipossuficiência probatória da autora.

Conforme laudo médico apresentado no evento 1, laudo7, a autora necessita de reabilitação pelos métodos BOBATH E PEDIASUIT:

(...)

Ainda, conforme laudo terapêutico anexado no evento1, laudo 6, Martina de Carli Lopes está em uma fase do desenvolvimento na qual é fundamental receber o tratamento mais intensivo e frequente possível a fim de evitar a perpetuação de padrões inadequados de postura e movimento que possam evoluir de forma irreversível. Portanto, cabe salientar que é essencial a intervenção terapêutica pelo Conceito Neuroevolutivo Bobath contemplando fisioterapia, terapia ocupacional e fonoaudiologia, juntamente com a realização da Terapia Intensiva PediaSuit (...)

Portanto, o cerne do presente litígio reside em apurar se a requerida deve dar cobertura aos referidos tratamentos.

Pois bem.

A cobertura oferecida pelos planos de saúde deve observar o padrão mínimo estipulado pela Lei 9.656/98 e pelo contrato firmado, o qual pode fornecer coberturas adicionais.

Os tratamentos de terapia ocupacional, fisioterapia e fonoaudiologia comportamental estão previstos na Resolução Normativa nº 387/2015 da ANS, revogada pela RN nº 428/2017 da ANS, que atualiza o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde, sendo, portanto de cobertura obrigatória pelo plano.

E o Pediasuit é uma técnica moderna que pode ser enquadrada como fisioterapia e/ou terapia ocupacional.

A Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS foi instada a informar acerca da cobertura em rol de planos regulamentados quanto ao tratamento neuropsicomotor com conceito neuroevolutivo Bobath e terapia intensiva PediaSuit.

No tocante a terapia intensiva PediaSuit, a ANS informou que:

No que tange à cobertura para tratamento com o protocolo Pediasuit, vale explicitar que, conforme explica o Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional do Paraná - CREFITO-8, o método PediaSuit é uma abordagem holística para tratamento de indivíduos com distúrbios neurológicos, como paralisia cerebral, atraso no desenvolvimento, lesões traumáticas cerebrais, autismo e outras condições que afetam as funções motoras e cognitivas. O referido método de fisioterapia utiliza-se de diversas ferramentas, dentre elas, o Suit, que consiste em uma órtese mole, composta por colete, touca, shorts, joelheiras, calçados e um sistema de elásticos ajustáveis, posicionados para reproduzir a musculatura, funcionando como uma estrutura elástica externa, um exoesqueleto, que trabalha a propriocepção dinâmica (Fonte: h\ps://www.crefito8.gov.br/pr/index.php/sala-de-imprensa/no:cias/677-ometodo-pediasuit). 14. No entanto, o artigo 10, inciso VII, da Lei 9656/98, exclui, do rol de coberturas assistenciais obrigatórias, o fornecimento de órteses e próteses não ligadas ao ato cirúrgico, de maneira que a realização da terapia PediaSuit, bem como o fornecimento de outras órteses cuja implantação não dependa de cirurgia não possuem cobertura obrigatória pelos planos de assistência à saúde, em razão da citada exclusão legal. (evento43, ofício1, grifei).

Ora, da simples análise da explicitação acima, verifica-se que o método de fisioterapia Suit se trata, em verdade, de uma vestimenta ortopédica que auxilia na fisioterapia, conforme demonstrado nas fotos do evento 1, laudo 6.

In casu, a autora não está postulando a vestimenta ortopédica, mas sim, a utilização da vestimenta durante a fisioterapia, em clínica especializada, a qual depois de utilizada é devolvida à clínica, devendo ser fornecida.

No tocante ao método Bobath, verifica-se sua inclusão nos itens REEDUCAÇÃO E REABILITAÇÃO NO RETARDO DO DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR; REEDUCAÇÃO E REABILITAÇÃO NEUROLÓGICA; REEDUCAÇÃO E REABILITAÇÃO NEURO-MÚSCULO-ESQUELÉTICA.

Considerando que o contrato de plano de saúde celebrado entre as partes, possui cobertura para os procedimentos de reeducação e reabilitação física, é indiscutível o dever de cobertura para o referido tratamento.

Cabe registrar a jurisprudência do TJRS em caso análogo:

AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. MENOR COM SINDROME DE DOWN. TERAPIA OCUPACIONAL, FONOAUDIOLOGIA E PSICOLOGIA. LIMITAÇÃO DO NÚMERO DE SESSÕES DE TRATAMENTO. DESCABIMENTO. TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR. NEGATIVA DE COBERTURA. DESCABIMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCOS. MANUTENÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCOS RECURSAIS. I. No caso em tela, o autor, menor de idade, foi diagnosticado com Síndrome de Down (CID10 Q90.9), necessitando de atendimento interdisciplinar no conceito nervoevolutivo Bobath, com fisioterapia, terapia ocupacional, fonoaudiologia, psicopedagogia, psicoterapia, neurologia infantil, neuro-oftalmologia, geneticista, equoterapia, hidroterapia, além de outras abordagens terapêuticas, como protocolo PediaSuit. Por sua vez, a operadora defendeu a legalidade da limitação das sessões de fonoaudiologia, terapia ocupacional e psicologia, bem como da negativa de cobertura aos demais...

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