Acórdão nº 50060267120188210022 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Cível, 02-03-2023

Data de Julgamento02 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50060267120188210022
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoOitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003342268
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5006026-71.2018.8.21.0022/RS

TIPO DE AÇÃO: Reconhecimento/Dissolução

RELATOR: Desembargador LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS

RELATÓRIO

DÉBORA A. P. e MÁRCIA A. P. H., sucessoras de DARCI P., interpõem recurso de apelação da sentença que, nos autos da ação de reconhecimento póstumo de união estável ajuizada por LORENA U. S., julgou parcialmente procedente o pedido inicial, "para reconhecer a união estável entre a autora e o de cujus, no período compreendido entre 31/01/2016 à 11/02/2018, bem como aos eventuais direitos sucessórios decorrentes de tal reconhecimento", também rejeitando a impugnação à gratuidade judiciária deferida em favor da autora (processo 5006026-71.2018.8.21.0022/RS, evento 21, SENT1, que, em meio físico, tramitou sob o n.º 022/1.18.0006699-4).

Sustentam que: (1) foi demonstrada a capacidade da apelada de pagar as custas processuais de acordo com suas próprias declarações, a exemplo da afirmação de que foram realizadas reformas com custo superior a R$ 30.000,00 no imóvel no qual alegava residir com o falecido DARCI ; (2) a autora figura como parte autora em ações de despejo, a denotar que recebe renda decorrente da locação de imóveis; (3) ademais, a demandante também admitiu trabalhar como costureira e juntou comprovante de percepção de benefício previdenciário de dois salários mínimos; (4) a renda declarada pela apelada é incompatível com os negócios que alega ter feito; (5) em novembro de 2016, DARCI e a autora declararam morar em casas separadas; (6) a apelada sempre residiu em imóvel próprio, onde trabalhava como costureira, conforme apontado pelas testemunhas; (7) para o reconhecimento de união estável é necessária robusta demonstração dos requisitos caracterizadores deste tipo de relacionamento, que são convivência pública, contínua, duradoura e com o objetivo de constituição de família, sendo imprescindível a demonstração dos requisitos subjetivos, que são a affectio maritalis e convívio more uxório; (8) os namoros do extinto DARCI sempre vieram acompanhados de relações negociais e interesses financeiros, nunca com a intenção de constituir família; (9) ainda que exista o compartilhamento diário de experiências e que a própria duração do relacionamento seja longa, só namorar não é suficiente para a geração de efeitos jurídicos; (10) a apelada juntou como comprovante de residência contas de luz da alegada residência do casal, localizada na Rua Daniel Capdebosc, datadas de 2018, em período próximo à morte de DARCI ou do período de sua convalescença, deixando de trazer comprovantes de residência do ano de 2016, quando, supostamente, a união estável teve início; (11) o falecido era titular de plano de saúde, sendo que LORENA não foi incluída como sua dependente, o que também demonstra a inexistência de affectio maritalis; (12) no caso, não há suficiente comprovação da intenção de constituição de família no relacionamento havido entre o extinto DARCI e a apelada LORENA, tratando-se de um namoro com uma proximidade maior que os demais relacionamentos havidos pelo falecido. Requerem o provimento do recurso para reformar a sentença atacada, acolhendo-se a impugnação à gratuidade judiciária deferida em favor da autora/apelada, bem como julgando-se improcedente o pedido inicial (evento 28, APELAÇÃO1).

Houve oferta de contrarrazões (evento 32, CONTRAZAP1).

O Ministério Público opina pelo não provimento (evento 8, PARECER1).

É o relatório.

VOTO

Inicio pela análise da insurgência das apelantes quanto à rejeição da impugnação à gratuidade judiciária deferida em favor da autora/apelada e adianto, com a devida vênia, que não há razão para a revogação do benefício.

Consoante estabelece o art. 98, caput, do CPC, a pessoa natural com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, sendo que, de acordo com o art. 99, § 3º, do CPC, a alegação de insuficiência deduzida por pessoa natural goza de presunção de veracidade. A par disso, a renda mensal bruta de quem postula a gratuidade da justiça tem sido utilizada como critério objetivo para o deferimento do beneficio sem maiores perquirições, quando esta renda for de até cinco salários mínimos nacionais, tendo em vista o teor do Enunciado nº 49 do Centro de Estudos deste Tribunal de Justiça:

49ª - O benefício da gratuidade judiciária pode ser concedido, sem maiores perquirições, aos que tiverem renda mensal bruta comprovada de até (5) cinco salários mínimos nacionais.

No caso, a demandante LORENA, que conta 68 anos de idade, comprovou perceber benefício de aposentadoria em valor equivalente a dois salários mínimos (fl. 18 do evento 3, PROCJUDIC2) e, por mais que ela tenha trabalhado como costureira, tal como apontado nas razões recursais, não se evidencia, pelos elementos probatórios carreados aos autos, que ela desfrute de alto padrão de vida, a denotar uma condição financeira incompatível com os requisitos que autorizam a concessão da gratuidade. Por essa razão, é de ser mantido o benefício da gratuidade que lhe foi concedido inicialmente, tendo em vista que não há suficientes elementos para infirmar a declaração de pobreza por ela apresentada.

Avanço ao exame da inconformidade relativa ao reconhecimento da união estável havida entre o falecido genitor das apelantes, DARCI, e a autora/apelada. No ponto, as recorrentes asseveram que o relacionamento havido não tinha contornos de união estável, tratando-se de mero namoro, sem a intenção de constituir família.

A união estável é entidade familiar que se configura mediante convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família, nos termos do art. 1.723, caput, do Código Civil:

Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família (grifei).

No caso, diferentemente do que aduzem as apelantes, o relacionamento havido entre DARCI e LORENA reunia tais características, havendo provas suficientes que demonstram a existência de vida em comum, isto é, a posse do estado de casados. Conforme bem posto na sentença recorrida e no parecer ministerial, o conjunto probatório é suficiente para amparar a alegação da demandante. No ponto, para evitar desnecessária tautologia e valorizar a minuciosa análise probatória efetivada, peço vênia para transcrever o parecer da lavra da em. PROCURADORA DE JUSTIÇA JOSIANE SUPERTI BRASIL CAMEJO, adotando seus fundamentos como razões de decidir:

"(...) Na sentença, reconhecida a existência da união estável havida entre a apelada e Darci, falecido em 11/02/2018, no período compreendido entre 31/01/2016 até o óbito, insurgem-se as apelantes, aduzindo que a relação havia entre eles não passou de um mero namoro.

Segundo alegado à petição inicial, a união estável existiu pelo período aproximado de 03 anos, até o falecimento de Darci. Durante esse período, a apelada disse ter coabitado com o de cujus, contribuído com despesas da moradia, investido na reforma da...

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