Acórdão nº 50061319520208210016 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeiro Grupo de Câmaras Criminais, 08-07-2022

Data de Julgamento08 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualEmbargos Infringentes e de Nulidade
Número do processo50061319520208210016
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002342073
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

1º Grupo Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Embargos Infringentes e de Nulidade Nº 5006131-95.2020.8.21.0016/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5006131-95.2020.8.21.0016/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas (Lei 11.343/06)

RELATOR: Desembargador JOSE ANTONIO CIDADE PITREZ

EMBARGANTE: CAROLINE RIBEIRO RODRIGUES (RÉU)

ADVOGADO: MAURILIA GABRIELLI ANDRADE FAGUNDES RODRIGUES (OAB RS124036)

ADVOGADO: MONIA PERIPOLLI DIAS (OAB RS056957)

EMBARGANTE: LUCIANO RIBEIRO RODRIGUES (RÉU)

ADVOGADO: MONIA PERIPOLLI DIAS (OAB RS056957)

EMBARGADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

RELATÓRIO

Cuida-se de Embargos Infringentes, com fundamento no artigo 609, parágrafo único do Código de Processo Penal, opostos por advogada, em favor de CAROLINE RIBEIRO RODRIGUES e LUCIANO RIBEIRO RODRIGUES, em face de acórdão oriundo da Colenda Primeira Câmara Criminal deste TJRS que, por maioria (Desembargador Jose Conrado, Relator e Drª. Andréia), ao exame do apelo de nº 5006131-95.2020.8.21.0016, manteve a condenação dos réus pelos delitos de narcotráfico e porte de arma de fogo de uso restrito, restando vencido o Des. Jayme, que acatava a tese de nulidade da prova obtida pelo ingresso em residência, eis que tal configurava violação de domicílio e ensejava a absolvição de ambos os acusados, forte no artigo 386, II, do CPP, quanto ao delito de armas, tendo esta sido encontrada na casa objeto da violação, por ele reconhecida.

Ainda, dito voto isolado absolveu a ré do narcotráfico, tendo em vista que parte da droga fora localizada na casa desta, pelo mesmo fundamento da violação operada.

Tocante ao delito de narcotráfico, tendo em vista que a outra parte da droga fora localizada com o embargante, restou mantida sua condenação, mas com redução de pena e regime mais brando de seu cumprimento, conforme trazido no voto minoritário, restando a divergência ora posta nestes pontos descritos acima.

Destaco que ambos os embargantes Luciano e Caroline, foram denunciados e condenados por incursos nas sanções do artigo 33, da Lei n.º 11.343/2006 (Fato I) e do Artigo 16, § 1º, IV da Lei nº 10.826/2003. O primeiro, condenado a pena total de 08 anos de reclusão, sendo a ré penalizada com 08 anos e 11 meses de reclusão, acrescido de 510 dias multa para ambos, a ser cumprida em regime inicial fechado.

Mediante ingresso de apelo de ambos, foi, por maioria, repelida a nulidade decorrente do ingresso em domicílio sem o competente mandado judicial, mantida a condenação e apenamento fixados, sendo alterado apenas o regime de cumprimento de pena para o semiaberto, como preconiza o voto preponderante.

Na ocasião, proferido voto dissonante pelo colega Jayme, que acatava a tese de nulidade da prova obtida pelo ingresso em residência, eis que tal configurava violação de domicílio e ensejava a absolvição de ambos pelo delito de armas, bem como absolvição da ré, pelo delito de narcotráfico. Quanto ao acusado, o voto minoritário mantinha sua condenação pelo narcotráfico, mas sob forma mais branda de pena e no regime aberto, na forma acima delineada, sendo que o ingresso de embargos infringentes objetiva a prevalência do douto voto vencido, exarado pelo Des. Jayme.

Colheu-se parecer escrito da douta Procuradoria de Justiça, no rumo do parcial conhecimento e da rejeição dos embargos infringentes.

Após, os autos vieram conclusos.

É o relatório.

VOTO

Rogando vênia ao eminente prolator do voto minoritário, dele divirjo e rejeito os presentes embargos infringentes, aderindo integralmente ao voto condutor da maioria, por ocasião do julgamento do apelo, da lavra do Des. Jose Conrado que, modo lapidar, encaminhou a questão.

Dali extraio:

"As defesas técnicas sustentam, preliminarmente, a nulidade da prova obtida na ocasião do flagrante delito, afirmando a violação de domicílio e a atuação investigativa dos policiais militares.

Constata-se da defesa direta dos réus que eles negaram que a droga ilícita apreendida pelos Brigadianos estivesse na residência de Caroline, destacando que teria sido enxertada pelos policiais militares, os quais teriam encontrado os entorpecentes ilícitos na residência de "Cleo", a qual ficaria situada nas proximidades.

A Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso IX, garante a inviolabilidade do domicílio. Nada obstante, a própria Constituição Federal prevê situações excepcionais em que tal garantia é flexibilizada, quais sejam: a) em caso de flagrante delito, a qualquer hora; b) desastre, a qualquer hora; c) para prestar socorro, a qualquer hora; d) ou por determinação judicial, somente durante o dia.

No que toca ao flagrante delito, que é o caso em atenção, o Superior Tribunal de Justiça tem jurisprudência consolidada no sentido de que "o ingresso regular de domicílio alheio depende, para sua validade e regularidade, da existência de fundadas razões (justa causa) que sinalizem para a possibilidade de mitigação do direito fundamental em questão. É dizer, somente quando o contexto fático anterior à invasão permitir a conclusão acerca da ocorrência de crime no interior da residência é que se mostra possível sacrificar o direito à inviolabilidade do domicílio" (REsp n. 1.574.681/RS, relator Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 20/4/2017, DJe de 30/5/2017).

Nada obstante a defesa direta dos réus, verifica-se que, no caso, os relatos dos Brigadianos sobre as circunstâncias da apreensão da droga ilícita, assim como dos artefatos bélicos, são uníssonos no sentido de que o ingresso na residência onde estavam os apelantes ocorreu mediante fundadas suspeitas da prática de crime de tráfico de drogas.

A regularidade do ingresso domiciliar é evidenciada pelo fato de os policiais militares, segundo os seus depoimentos, anteriormente à invasão à residência dos apelantes, terem recebido informações da prática de crime de tráfico de drogas naquela casa ("casa roxa" (sic)), tendo ainda tentado abordar os réus e terceiro indivíduo não identificado em frente ao local, momento em que a ré Caroline foi para o interior da casa enquanto Luciano tentou fugir em direção a um mato, onde foi detido e revistado, ocasião em que foi apreendida quantidade de drogas (crack e maconha).

Portanto, reprisa-se, as circunstâncias que antecederam a atuação dos policiais na residência dos apelantes evidenciaram as fundadas razões que justificaram o ingresso domiciliar, possibilitando, assim, a mitigação do princípio constitucional da inviolabilidade do domicílio (Art. 5º, XI, da Constituição Federal).

A situação, portanto, era de flagrância, estando presente a hipótese excepcional prevista na Constituição Federal (XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial), não havendo falar em atuação investigativa pelos Brigadianos, tampouco em violação de domicílio."

Assim, validada a operação que culminou com a apreensão dos ilícitos na residência da ré, não se cogita de sua absolvição pelos delitos de narcotráfico e armas e tampouco a do corréu, seu irmão.

Enfatizo que parte da droga apreendida com o acusado, que ordenou sua condenação pelo delito de narcotráfico, impõe a condenação e imposição de pena nos moldes ditados no voto vencedor, inclusive ao repelir reconhecimento de tráfico privilegiado.

Ali disposto:

"FATO I - CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS

Diferentemente do que foi sustentado pela defesa, a prova colhida em juízo é robusta a demonstrar que a droga ilícita apreendida pelos Brigadianos estava na residência da ré Caroline e era destinada à distribuição, não havendo qualquer elemento probatório, além da defesa direta dos réus, a demonstrar que os entorpecentes ilícitos tenham sido enxertados pelos Brigadianos na referida casa. Portanto, ausente prova a sustentar a tese defensiva de que o flagrante teria sido forjado1.

Destaca-se que os depoimentos dos Brigadianos, como referido, são coerentes e harmônicos ao destacarem as circunstâncias da prisão em flagrante dos réus, tendo ainda sido corroborados pelos autos de apreensão e pelos laudos definitivos da droga (evento 1, P_FLAGRANTE1, págs. 12-16; (evento 39, PERÍCIA1; evento 39, PERÍCIA2), demonstrando de forma robusta a apreensão das drogas ilícitas, assim como de balanças de precisão, dinheiro, arma de fogo, munição, e telefones celulares, tudo a evidenciar a prática do tráfico de drogas pelos réus.

Outrossim, gizo que o fato de as testemunhas serem policiais militares não torna inidônea suas narrativas. Seus relatos gozam, em linha de princípio, de plena validade, cabendo à defesa demonstrar eventual interesse dos policiais de prejudicar o réu, o que não ocorreu no caso dos autos.

Oportuna a citação de julgado do STJ sobre a questão:

HABEAS COUS. PROCESSO PENAL. ARTS. 33, DA LEI N.º 11.343/06, 304 E 333, DO CÓDIGO PENAL. TESE DE FRAGILIDADE DA PROVA PARA SUSTENTAR A ACUSAÇÃO. VIA IMPRÓPRIA. NECESSIDADE DE EXAME APROFUNDADO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. DEPOIMENTO DE POLICIAIS. VALIDADE PROBATÓRIA. ILEGALIDADE DA DOSIMETRIA DAS PENAS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. INOCORRÊNCIA.

1. O exame da tese de fragilidade da prova para sustentar a condenação, por demandar, inevitavelmente, profundo reexame do material cognitivo produzido nos autos, não se coaduna com a via estreita do writ.

2. Os policiais não se encontram legalmente impedidos de depor sobre atos de ofício nos processos de cuja fase investigatória tenham participado, no exercício de suas funções, revestindo-se tais depoimentos de inquestionável eficácia probatória, sobretudo quando prestados em juízo, sob a garantia do contraditório. Precedentes desta Corte e do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT