Acórdão nº 50061596020208210017 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Criminal, 24-05-2023

Data de Julgamento24 Maio 2023
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo50061596020208210017
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003612460
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5006159-60.2020.8.21.0017/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5006159-60.2020.8.21.0017/RS

TIPO DE AÇÃO: Estupro de vulnerável CP art. 217-A

RELATOR: Desembargador JONI VICTORIA SIMOES

RELATÓRIO

O Ministério Público, na Comarca de Lajeado, ofereceu denúncia contra W.R.P., já qualificado nos autos, imputando-lhe a prática do crime previsto no artigo 217-A, caput, c/c o artigo 226, inciso II, e com o artigo 61, inciso II, alínea "f", todos do Código Penal, pelo seguinte fato, assim narrado na denúncia:

FATO DELITUOSO:

No dia 24 de março de 2019, domingo, período da tarde, na residência localizada na R. [...], no município de Lajeado/RS, o denunciado W.R.P., praticou atos libidinosos diversos da conjunção carnal, com a vítima B.B.P., menor de 14 (quatorze) anos de idade à época dos fatos (nascida em 27/08/2005).

Na oportunidade, o denunciado, pai da vítima, residia com a ela na mesma residência, situada no endereço acima referido. Aproveitando-se da ausência da genitora, o denunciado dirigiu-se até o quarto da menor, deitando-se na cama onde ela já se encontrava. Em cima da cama, o denunciado passou a praticar diversos atos libidinosos contra a filha, esfregando-se no corpo dela, beijando-a lascivamente, além de acariciá-la, mais precisamente colocando suas mãos dentro das vestes dela e passando-as nas nádegas e vagina da menina, consumando, assim, o delito.

O denunciado é ascendente da vítima (pai - vide certidão de nascimento da adolescente, à fl. 15).

O denunciado agiu prevalecendo-se de relações domésticas e de coabitação, visto que, à época dos fatos, residia na mesma casa que a vítima (sua filha).

Trata-se de crime hediondo.

Foram determinadas medidas restritivas contra o causado.

Foi juntada aos autos a avaliação psíquica realizada com a vítima (Processo Original, evento 2, PROCJUDIC2, fls. 57-67).

A denúncia foi recebida em 29/07/2021.

Citado pessoalmente, o réu apresentou resposta à acusação, por intermédio de defesa constituída.

A defesa também ajuizou ação, distribuída, por dependência, sob o nº 5005417-98.2021.8.21.0017, em que pleiteava a instauração do incidente de insanidade mental do acusado, o que restou indeferido (evento 3, DESPADEC1).

Não sendo caso de absolvição sumária, seguiu-se à instrução processual, com a oitiva da vítima através de depoimento especial, de quatro testemunhas de acusação, duas de defesa e, ao final, interrogatório do réu.

Foram atualizados os antecedentes criminais do acusado (Processo Originário, evento 138, CERTANTCRIM1).

Encerrada a instrução, as partes ofereceram memoriais escritos.

Sobreveio sentença, julgando PROCEDENTE a ação penal, para condenar o réu como incurso nas sanções do artigo 217-A, caput, c/c o artigo 226, inciso II e com o artigo 61, inciso II, alínea "f", todos do Código Penal, na forma da Lei 8.072/90, à pena de 12 anos e 03 meses de reclusão, em regime inicial fechado. O réu foi condenado, ainda, ao pagamento das custas processuais, cuja exigibilidade restou suspensa em face da gratuidade da justiça deferida.

A sentença foi publicada em 22/02/2023.

O réu foi intimado acerca da sentença.

Irresignada, a defesa do réu interpôs recurso de apelação, o qual foi recebido.

Nas suas razões, aduz que há dúvida quanto à ocorrência do delito descrito na denúncia. Alega que a palavra da vítima não é coerente e harmoniosa com os demais elementos probatórios. Menciona que a mãe da vítima, em seu depoimento, afirma que o denunciado é um ótimo pai, e, da mesma forma, a irmã da ofendida reafirma que o acusado é um pai exemplar. Enfatiza que o laudo pericial é duvidoso e inconclusivo. Arrazoa que diante de tantas divergências, é imprescindível a aplicação do princípio in dubio pro reo. Quanto à dosimetria da pena, pugna pelo redimensionamento, pleiteando a redução da reprimenda para 06 anos e 08 meses, bem como que o seu cumprimento se dê em regime inicial semiaberto. Requer, ao final, a substituição da pena privativa de liberdade por aplicação de medida de segurança, mediante internação, ou por meio de tratamento ambulatorial, no prazo mínimo de um a três anos, conforme artigos 26 e 98 do Código Penal.

Apresentada contrarrazões.

Os autos foram remetidos ao Tribunal de Justiça e distribuídos a esta Relatoria.

O Ministério Público, em parecer da lavra do Procurador de Justiça, Dr. José Pedro M. Keunecke, opinou pelo improvimento do apelo defensivo.

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Satisfeitos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso interposto.

Sustenta a defesa, em suas razões recursais, que não há, nos autos, prova suficiente a indicar a ocorrência do crime de estupro, postulando, nesses termos, a absolvição do réu. De forma subsidiária, pleiteia a "substituição da pena por aplicação de medida de segurança mediante internação, ou por meio de tratamento ambulatorial no prazo mínimo de um a três anos (art. 26 e 98 do Código Penal) - incidente de insanidade mental, processo número 5005417- 98.2021.8.21.0017/RS."

Adianto, primeiramente, que não merece guarida o pleito absolutório.

A existência do crime, no caso, vem comprovada por meio do registro de ocorrência policial, da cópia da carteira de identidade e certidão de nascimento da vítima, do laudo pericial, da avaliação psíquica da vítima (evento 2, PROCJUDIC2, fls. 11/13, 33, 35, 47 e 56/67), bem como pela prova oral colhida.

A autoria do delito, por sua vez, é indubitável e se encontra respaldada, principalmente, pela firme palavra da ofendida, recaindo sobre o réu.

Com o intuito de melhor elucidar o caso em tela, transcrevo a síntese dos elementos de prova produzidos ao longo da instrução, realizada pelo juízo de piso, na sentença vergastada, ressaltando que os nomes dos envolvidos serão abreviados, para fins de preservação da intimidade da vítima:

(...)

A vítima B. B. P., ouvida através de depoimento especial, afirmou estar com 15 anos de idade. Disse que era domingo, sendo que, por volta do meio dia, o réu chamou para a depoente ir comer. Relatou que comeu normalmente e, após, foi ao seu quarto mexer no celular, momento em que o réu foi até lá e começou a abraçá-la. Na sequência, o réu chamou a depoente para ver o programa The Voice Kids e, após um tempo, o réu foi até o quarto da vítima para chamá-la novamente. Alegou que estava deitada na cama, ocasião que o réu deitou em cima da depoente e começou passar a mão em seu corpo. Recorda que o réu bebeu muito naquele dia, sendo que, na noite do dia anterior, foram na casa de uma nova amiga, tendo o réu também bebido muito lá. Salientou que foi ver o The Voice Kids, sendo que sua mãe estava em casa, porém quando ela saiu para buscar a irmã da depoente, o réu novamente começou a passar a mão no corpo da vítima e, inclusive, mordeu sua orelha. Mencionou que estava deitada na cama de seu quarto de barriga para cima, tendo o réu deitado em cima da depoente. Destacou que o réu mexeu com a mão dele na área da pelves da depoente. Afirmou que estava de short pois era verão. Sustentou que o réu, primeiramente, mexeu por cima da roupa e após, por baixo da roupa na região da pelves, inclusive na bunda. Arguiu que o réu mexeu na depoente em duas oportunidades no mesmo dia, sendo uma antes de assistirem ao programa e outra após sua mãe sair para buscar sua irmã. Narrou que que o réu nunca falou nada sobre os fatos. Referiu que o réu somente parou quando a vítima disse que estava cansada e que ia dormir, tendo fingido que tinha dormido, momento que o réu parou. Confirmou que, quando o réu parou, a depoente mandou mensagem para sua mãe dizendo para vir logo para casa "mãe vem logo, vem logo, vem logo". Declarou que sua mãe chegou e foi ao quarto da depoente e perguntou porque queria tanto que ela voltasse para casa, ocasião que a depoente explicou a situação para ela. Asseverou que sua irmã foi até o quarto, que era dividido entre elas, perguntou porque a depoente estava assim. Ressaltou que contou os fatos para sua irmã, momento que ela disse que também tinha acontecido isso com ela, quando tinha mais ou menos a mesma idade da depoente, porém ela demorou para falar. Ressaltou que somente ficou sabendo do que tinha acontecido com sua irmã naquele dia, porém lembra que pedia para o réu não beber em seus aniversário ou festas especiais, porém ele sempre bebia muito. Informou que, atualmente, reside com sua mãe e irmã. Comentou que, após os fatos, teve contato com seu pai, porém ele não estava mais bebendo, pois tinha ido se tratar. Descreveu que ter contato com o réu não foi tão desconfortável pois sabia que ele não iria beber e que a mãe estava ao seu lado. Contou que o réu pediu, no começo do ano de 2019, desculpas e disse que não iria mais beber. Explicou que o réu mordeu a orelha da depoente e beijou seu pescoço e bochecha. Manifestou que, na época, tinha um amigo virtual ao qual contou sobre o fato, tendo ele dito que isso era errado, que o réu não poderia fazer isso. Esclareceu que, no momento dos fatos, o réu não falou nada sobre sua intenção. Acredita que os fatos demoraram cerca de oito minutos (primeiro fato) e seis minutos (segundo fato), porém parecia uma eternidade. Ponderou que o réu nunca tinha feito algo assim antes. Pronunciou que o réu somente bebia aos finais de semana, porém sua mãe falou que, antes da depoente nascer, quando sua irmã era bebê, o réu saía todos os dias para beber. Revelou que seu pai era bem querido quando não bebia, porém quando bebia ficava mais bobão, fazendo piadinha sem graça, gritava, ficando diferente. Exprimiu que o réu, quando não bebia, era carinhoso, sendo que dava abraços normais.

A mãe da vítima, C. F. B., ouvida como informante, disse que tinha...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT