Acórdão nº 50061681520178210021 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Criminal, 03-08-2022

Data de Julgamento03 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50061681520178210021
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002427945
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5006168-15.2017.8.21.0021/RS

TIPO DE AÇÃO: Estelionato (art. 171)

RELATOR: Desembargador Sérgio Miguel Achutti Blattes

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

APELANTE: JOSE EDUARDO CORREA PEDROSO JUNIOR (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Adoto o relatório da sentença:

O Ministério Público ofereceu denúncia contra:

JOSÉ EDUARDO CORREIA PEDROSO JÚNIOR, vulgo “Alemão”, brasileiro, branco, solteiro, escolaridade não informada nos autos, desempregado, nascido em 26/01/1987, com 30 anos na época dos fatos, natural de Porto Alegre/RS, filho de José Eduardo Correia Pedroso e Regina Baldez, residente e domiciliado na Rua Capitão Pedroso, nº 115, Bairro Restinga, em Porto Alegre/RS, por imputada infração ao delito previsto no artigo 171, caput, combinado com o artigo 14, inciso II, do Código Penal e do artigo 297, caput, na forma do artigo 69, caput, do Códio Penal. Narrou a inicial acusatória:

“1º FATO:

No dia 04 de agosto de 2017, por volta das 14h00min, na Avenida Presidente Vargas, nº 1416, Vila Exposição, nesta cidade, o denunciado JOSÉ EDUARDO CORREIA PEDROSO JÚNIOR deu início ao ato de obter, para si, vantagem ilícita, no valor de R$ 34.900,00 (trinta e quatro mil e novecentos reais) em prejuízo do estabelecimento comercial financeiro DIDOMÊNICO SERVIÇOS ADMINISTRATIVOS, induzindo em erro Marisa Di Domênico, mediante meio fraudulento a seguir descrito, somente não consumando o intento criminoso por circunstâncias alheias à sua vontade, qual seja, a atenção dos funcionários durante o exame dos documentos apresentados.

Na oportunidade, o denunciado JOSÉ EDUARDO CORREIA PEDROSO JÚNIOR, pretendendo obter vantagem ilícita, na manhã do dia 04/08/2016, mediante contato telefônico com o estabelecimento DIDOMÊNICO SERVIÇOS ADMINISTRATIVOS, apresentou-se como PAULO RICARDO ROCHA NOGUEIRA e solicitou informações acerca do procedimento para retirada de um empréstimo consignado, dizendo que residia em Porto Alegre/RS, mas estava mudando-se para Passo Fundo/RS.

Na sequência, à tarde, o denunciado JOSÉ EDUARDO identificando-se como PAULO RICARDO ROCHA NOGUEIRA compareceu ao estabelecimento comercial, munido de documentos, todos em nome de PAULO RICARDO ROCHA NOGUEIRA, dando início ao procedimento para retirada do empréstimo no valor de R$ 34.900,00 (trinta e quatro mil e novecentos reais)

Ao notar que os funcionários da financeira estavam realizando o procedimento de confrontação de dados, o denunciado JOSÉ EDUARDO retirou-se do estabelecimento, momento em que foi abordado pelo Policial Federal Flávio da Silva Ramos, que ocasionalmente estava no local.

O crime de estelionato não se consumou por circunstâncias alheias à vontade do denunciado JOSÉ EDUARDO, vez que os funcionários do estabelecimento passaram a realizar a confrontação de dados nos sistemas de informática, apurando que o benefício previdenciário de pensão por morte estava vinculado ao Banco Itaú de Porto Alegre/RS (fls. __), o que gerou a desconfiança dos funcionários e motivou o denunciado a empreender fuga do estabelecimento.

O denunciado JOSÉ EDUARDO CORREIA PEDROSO JÚNIOR é reincidente em crime doloso, conforme certidão de antecedentes criminais das fls.___.

2º FATO:

Em dia, horário e local não esclarecido, mas no ano de 2017, o denunciado JOSÉ EDUARDO CORREIA PEDROSO JÚNIOR falsificou, no todo, documento público, mediante supressão de dados originais e substituição por outros e fotografia pertencente à pessoa diversa da titular do documento de identidade (laudo pericial das fls. 50/57).

Na ocasião, o denunciado JOSÉ EDUARDO utilizando o suporte autêntico da carteira de identidade que havia sido roubada de David Raone Derin de Lima (fl. 57), suprimiu os dados originalmente apostos no documento e substituílos por outros, pertencentes a PAULO RICARDO ROCHA NOGUEIRA, colocando uma fotografia sua no referido documento.

O documento público falsificado foi apreendido em poder do denunciado JOSÉ EDUARDO CORREIA PEDROSO JÚNIOR no dia 04/08/2017, ocasião em que foi preso em flagrante.

O denunciado JOSÉ EDUARDO CORREIA PEDROSO JÚNIOR é reincidente em crime doloso, conforme certidão de antecedentes criminais das fls. ___.”

A denúncia foi recebida em 13/12/2017 (fl. 04x).

Citado (fls. 121/122), o acusado apresentou resposta à acusação (fls. 123).

Não sendo o caso de absolvição sumária, foi designada data para audiência de instrução, oportunidade em que procedeu-se a oitiva de duas testemunhas, sendo decretada a revelia do réu (fl. 114 e mídia da fl. 136).

Encerrada a instrução, foram atualizados os antecedentes criminais do acusado (fls. 137/138).

Em memoriais, o Ministério Público requereu a condenação do réu nos termos da denúncia (fls. 139/143).

A defesa postulou a absolvição do acusado por atipicidade da conduta, reconhecendo-se o instituto da desistência voluntária. Subsidiariamente, requereu a absolvição por insuficiência probatória (fls. 151/155).

Acresço que adveio sentença julgando procedente em parte a pretensão acusatória formulada na denúncia, para absolver o réu das sanções do artigo 297 do Código Penal, com fundamento no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal, e condená-lo como incurso no artigo 171, caput, combinado com o artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal, à pena de 01 ano de reclusão (basilar fixada em 01 ano, agravada em 06 meses pela reincidência e diminuída em 1/3 pela tentativa, restando definitiva nesse patamar diante da ausência de outras causas modificadoras), em regime inicial semiaberto, e multa de 10 dias-multa, à razão unitária mínima.

Sentença publicada em 12.11.2019 (considerado o primeiro ato cartorário após a prolação da sentença).

Intimadas as partes, o Ministério Público e a defesa interpuseram recursos de apelação.

Em suas razões, o Ministério Público requer a condenação do réu nos exatos termos da denúncia, sustentando que a consumação do delito de falsificação de documento ocorreu em período anterior aos atos executórios do delito de estelionato; isto é, que a consumação dos delitos ocorreu em momentos distintos, sendo inviável a incidência do princípio da consunção.

A defesa, em seu arrazoado, suscita preliminar de nulidade em decorrência do flagrante preparado, com fundamento na Súmula nº 145 do Supremo Tribunal Federal e no artigo 17 do Código Penal. Afirma que a situação de flagrante foi preparada pela ofendida e pela testemunha Flávio, policial federal, que teriam atraído o réu até o estabelecimento da financeira, embora já suspeitassem de tentativa de fraude. Tece considerações a respeito da prova oral, aduzindo que a ofendida admitiu que a testemunha não estava em sua agência por coincidência, mas justamente para flagrar o acusado. Sustenta, ainda, que a jurisprudência já entende que o flagrante preparado pode ser induzido pela vítima – e não exclusivamente por um agente policial. No mérito, pretende a absolvição do acusado, com fundamento no artigo 386, incisos III, V ou VII, do Código de Processo Penal. Sustenta, em síntese, a ocorrência de crime impossível, tendo em vista que o réu não logrou induzir nem manter a vítima em erro; em verdade, a ofendida teria desconfiado de fraude desde o primeiro contato com o acusado, não se fazendo presente uma das elementares do delito, de modo que atípica a conduta imputada ao acusado. Subsidiariamente, requer o reconhecimento da desistência voluntária.

Apresentadas as contrarrazões.

Nesta instância, a Procuradoria de Justiça exara parecer pelo provimento do apelo ministerial e desprovimento do recurso defensivo.

Vêm os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes colegas:

O Ministério Público e a defesa de Juarez Mendes da Cunha interpõem recursos de apelação, pois inconformados com a sentença de parcial procedência da pretensão acusatória.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço dos apelos.

A fim de introduzir o mérito do apelo ministerial, transcrevo o excerto pertinente da sentença proferida pelo juízo originário:

[...]

2º FATO – FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO

No que toca ao suposto delito de falsificação, entendo ser o caso de aplicação da consunção entre este delito e o delito de estelionato.

Analisado o caderno probatório, verifica-se que o crime de falsidade se exauriu na tentativa de estelionato, não subsistindo qualquer potencialidade lesiva, já que a carteira de identidade fora imediatamente apreendida no momento da prisão do acusado.

No caso, a vantagem ilícita objetivada sempre foi uma só: retirar um empréstimo consignado em nome de terceira pessoa. O documento falsificado fora entregue pelo acusado à vítima para induzi-la em erro, de modo a conceder-lhe o empréstimo solicitado. Assim que, diversamente do exposto nas razões do apelo ministerial, perfeitamente aplicável, na verdade, o princípio da consunção, sendo matéria inclusive já sumulada pelo STJ (Súm. 17, STJ: “Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido”).

No mesmo sentido, é uníssona a jurisprudência do TJRS:

[...]

Desta feita, tendo a falsidade se dado com único fim de propiciar a execução do crime de estelionato, fica por ele absorvido, devendo o réu ser absolvido quanto ao crime previsto no art. 297, caput, do CP.

[...]

A despeito dos fundamentos constantes nas razões de apelação, reputo que o acervo probatório coligido aos autos se mostra insuficiente a demonstrar a prática delitiva tal como narrada na exordial.

Em síntese, a denúncia imputa ao acusado a prática dos delitos de falsificação de documento público e tentativa de estelionato, pois teria apresentado uma identificação civil falsa em uma agência financeira em...

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