Acórdão nº 50063301720208210017 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeira Câmara Criminal, 24-02-2022

Data de Julgamento24 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50063301720208210017
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001426145
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

1ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5006330-17.2020.8.21.0017/RS

TIPO DE AÇÃO: Homicídio qualificado (art. 121, § 2º)

RELATOR: Desembargador MANUEL JOSE MARTINEZ LUCAS

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Na Comarca de Lajeado, M. A. F. V., alcunha "Marquinho", 25 anos à época dos fatos, foi denunciado como incurso nas sanções do art. 121, § 2º, incisos II e IV, do Código Penal.

A peça acusatória, recebida em 22/05/2020 (evento 2 - OUT-INST PROC8, fl. 62/v), é do seguinte teor:

"FATO DELITUOSO:

No dia 09 de maio de 2020, sábado, por volta das 19h30, na Rua Carlos Sphor Filho, 1507, nas proximidades do "Posto Charrua", Bairro Moinhos, em Lajeado, o denunciado MARCOS AURÉLIO FREDO VIEIRA, mediante golpes de faca1, matou a vítima Éverton Luís da Silva de Oliveira.

Na ocasião, o denunciado MARCOS, de posse de uma faca, compareceu até a residência da vítima, localizada no endereço acima referido. Já no local, na parte externa da casa, o denunciado desferiu golpes de faca contra a vítima, tingindo-a na região do abdômen e na região cervical, matando-a.

Na sequência, o denunciado fugiu do local, sendo, logo após, encontrado nas proximidades e preso em flagrante por policiais militares.

O crime foi cometido por motivo fútil, uma vez que o denunciado matou a vítima pelo simples fato de suspeitar que ela tivesse lhe subtraído valores momentos antes do crime.

O crime foi cometido mediante recurso que dificultou a defesa da vítima, uma vez que ela foi atacada de surpresa pelo denunciado, não esperando, assim, o ataque."

Instruído o processo, sobreveio decisão (evento 57 - SENT2), prolatada em 27/09/2021, CONDENANDO o réu como incurso nas sanções do artigo 121, § 2º, II e IV, do Código Penal, à pena de 15 (quinze) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime fechado.

Irresignada, a Defesa interpôs recurso de apelação (evento 59 - APELAÇÃO1).

Vieram os autos a este Tribunal.

Em razões apresentadas em segunda instância (evento 10 - RAZAPELA1, da apelação), a Defesa pugnou pelo reconhecimento da atenuante de confissão e pelo afastamento das qualificadoras de motivo torpe e de recurso que dificultou a defesa da vítima. Por fim, requereu a fixação da pena base no mínimo legal.

Foram apresentadas contrarrazões pelo Ministério Público (evento 13, CONTRAZAP1, da apelação).

Nesta instância, o parecer do Procurador de Justiça Dr. Ivory Coelho Neto foi pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

No tocante ao art. 593, inciso III, alínea “d”, do Código de Processo Penal, consoante se diz e se repete de forma até enfadonha, só tem cabimento a desconstituição do julgamento pelo Tribunal do Júri por esse fundamento, quando a decisão dos jurados é inteiramente divorciada da prova dos autos, chegando às raias da arbitrariedade. A contrario sensu, havendo nos autos qualquer adminículo probatório que respalde aquela decisão, é impositiva a manutenção do veredicto, o que é corolário do preceito constitucional que consagra a soberania do Júri Popular.

Na hipótese, a decisão condenatória encontra consistente respaldo no conjunto probatório, não havendo que se cogitar de eventual anulação do julgamento.

A fim de evitar tautologia, permito-me transcrever pertinente trecho do parecer ministerial:

(...)

A prova é segura quanto à prática, pelo recorrente, do delito de homicídio pelo qual denunciado, pronunciado e condenado pelo Tribunal do Júri.

O crime foi praticado em razão de uma mera suspeita, por parte do réu, de que a vítima teria furtado o seu cartão de crédito (vide depoimentos das testemunhas Edson Luís de Oliveira Franco, Emanuella da Silva, Gilmar da Silva Soares e Ênio Delavald). Exsurge da análise dos autos evidente a qualificadora do motivo fútil.

Segundo lição do mestre NÉLSON HUNGRIA, “diz-se fútil o motivo que, pela sua mínima importância, não é causa suficiente para o crime” . É exatamente o motivo que lhe deu causa.

A qualificadora do recurso que dificultou a defesa da vítima também encontra amparo na prova produzida, pois MARCO AURÉLIO atacou vítima desarmada, de inopino, enquanto esta estava retornando para a sua residência, acreditando que iria participar de uma confraternização com o réu e vizinhos.

Assim, verifica-se que os jurados condenaram o apelante segundo a sua íntima convicção, adotando uma das versões estampadas nos autos, não sendo, portanto, o reconhecimento das qualificadoras, manifestamente contrário à prova. Ao revés, harmoniza-se com o conjunto probatório.

(...)

Ainda que se possa admitir uma maior ou menor sintonia da decisão com a prova dos autos do processo, isso não pode ensejar um novo julgamento. Não basta que a decisão seja contrária à prova dos autos, mas, sim, absolutamente divorciada do conjunto probatório para, somente nessa hipótese, dar azo à anulação do julgamento, sob pena de violação do princípio da intima convicção dos jurados.

Nesse sentido:

JÚRI. DECISÃO CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. INEXISTENTE. CONDENAÇÃO MANTIDA. PENA. PUNIÇÃO APLICADA DE FORMA ADEQUADA. CONFIRMADA. I - Como é do conhecimento geral, os jurados julgam por íntima convicção, sem a necessidade de fundamentar suas decisões. Deste modo, podem utilizar, para seus convencimentos, quaisquer provas contidas nos autos, ainda que não sejam as mais verossímeis. Só se pode falar em decisão manifestamente contrária à prova dos autos, quando o conjunto probatório não trouxer nenhum elemento a embasar a tese aceita no julgamento, constituindo ela numa aberração,...

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