Acórdão nº 50063787220178210019 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Criminal, 09-05-2022

Data de Julgamento09 Maio 2022
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo50063787220178210019
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001511277
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

5ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5006378-72.2017.8.21.0019/RS

TIPO DE AÇÃO: Receptação (art. 180)

RELATOR: Desembargador IVAN LEOMAR BRUXEL

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

ELIANDRO FELTES MARQUES, 29 anos na data dos fatos (DN 25/05/1988), foi denunciado por incurso nos artigos 180, caput, e 311, caput, do Código Penal, e artigo 12 da Lei nº 10.826/03.

Os fatos, ocorridos na comarca de Novo Hamburgo, foram assim descritos na denúncia, recebida em 04/07/2017:

PRIMEIRO FATO

Em datas, horários e locais não definidos nos autos, porém entre as datas de 16/04/2017 a 08/06/2017 (Ford/Fiesta) e de 10/05/2017 a 08/06/2017 (Hyundai/HB20S), o denunciado adulterou sinais identificadores de dois veículos automotores, sendo que o veículo Ford/Fiesta, branco, teve as placas reais IMU 2571 trocadas pelas placas aparentes IMH 3516 e o veículo Hyundai/HB20S, branco, teve as placas reais IVH 3716 trocadas pelas placas aparentes IXA 1171 (auto de apreensão da fl.07 e certidão da fl. 45).

SEGUNDO FATO

Em datas, horários e locais não definidos nos autos, porém entre as datas de 16/04/2017 a 08/06/2017 (Ford/Fiesta) e de 10/05/2017 a 08/06/2017 (Hyundai/HB20S), bem como no dia 08 de junho de 2017, por volta das 11 horas, na Rua Campo Bom, altura do nº 2603, em via pública, em Novo Hamburgo/RS, o denunciado adquiriu, recebeu, conduziu e/ou ocultou, em proveito próprio ou alheio, coisas que sabia serem produtos de crime, quais sejam, o veículo Ford/Fiesta, branco, placas aparentes IMH 3516, placas reais IMU 2571, roubado (ocorrência da fl.8) e o veículo Hyundai/HB20S, branco, placas aparentes IXA 1171, placas reais IVH 3716, roubado (ocorrência da fls.11-2) (auto de apreensão da fl.07).

TERCEIRO FATO

No dia 08 de junho de 2017, por volta das 11 horas, na Rua Campo Bom, altura do nº 2603, em via pública, em Novo Hamburgo/RS, o denunciado possuía e/ou mantinha sob sua guarda, no interior de sua residência, dois cartuchos de munição calibre .38 (auto de apreensão da fl.07. e ofício da fl.54 ao IGP) de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

DAS CIRCUNSTÂNCIAS

Na oportunidade, alertados por vítima que tentara, sem sucesso, negociar o veículo Ford/Fiesta com pessoa residente na Rua Campo Bom, nº 2603, via site OLX, policiais civis dirigiram-se até o local, onde estava o denunciado, que lhes franqueou a entrada. Na frente da residência, os policiais localizaram o veículo Ford/Fiesta, estacionado em via pública, e verificaram que as placas haviam sido trocadas e que, na realidade, tratava-se de veículo roubado; ato contínuo, os policiais detectaram, estacionado na mesma quadra, o veículo Hyundai/HB20S, o qual conseguiram abrir com uma chave portada pelo denunciado, e verificaram que as placas, igualmente, haviam sido trocadas e que, na realidade, tratava-se de veículo roubado. Na sequência, os policiais prenderam em flagrante delito o denunciado.

Após, os policiais realizaram buscas no interior da residência do denunciado, onde localizaram três potes grandes de vidro contendo miguelitos (objeto para perfurar pneus de veículos policiais) e dois cartuchos de munição calibre .38, a reforçar a vida de crimes do denunciado e a plena ciência de que os veículos que ele receptou, por meio de aquisição/recebimento/ocultação, e adulterou, por meio de troca de placas, eram objetos de crimes.

A ação penal foi julgada parcialmente procedente, para condenar ELIANDRO por incurso no artigo 180, caput, na forma do artigo 70, do Código Penal, e artigo 12, da Lei nº 10.826/2003.

A DEFESA apelou, postulando absolvição, alegando insuficiência de provas. Alternativamente, entende possível o reconhecimento da insignificância com relação ao delito de posse ilegal de munição.

Oferecida contrariedade.

Parecer pelo improvimento.

É o relatório.

VOTO

Esta a fundamentação da sentença:

(...)

A existência dos fatos ficou comprovada pelos registros de ocorrência de fls. 04, 08 e 11, pelo auto de apreensão de fl. 07, pelos autos de restituição de fls. 86 e 96, pelo laudo pericial de fl. 138, bem como pela prova oral colhida.

A autoria também restou demonstrada, recaindo seguramente sobre o acusado.

O réu admitiu a posse das munições, alegando que essas foram encontradas sobre o roupeiro. Alegou que as chaves foram localizadas na rua pelas crianças algum tempo antes da apreensão e não sabia de que carros eram. Sustentou que os miguelitos também estavam guardados há tempos. Sustentou que, na época da prisão, estava fazendo uns bicos na instalação de ar-condicionado. Quanto aos veículos, disse que o Fiesta estava na rua, mas que nada sabia a seu respeito. Já o HB20 sequer o havia visto, apenas posteriormente, na Delegacia. (fl. 51)

O Policial Civil Moisés Alexandre Fortes Aiub disse que receberam uma denúncia referente a um veículo que estava à venda na OLX, o qual não teria documentação. Frente a isso, deslocaram-se até a casa do réu, que os atendeu. Detalhou que o Fiesta estava estacionado bem perto à casa do réu e já viram que o lacre era de outro veículo subtraído na região metropolitana. Aduziu que, em buscas na casa, encontraram as chaves de um Hyundai, tendo o réu alegado que as crianças haviam achado as chaves na rua. Expôs que, em diligência, o veículo correspondente foi localizado na rua de trás, o qual foi aberto pela chave apreendida. Referiu que tal automóvel foi levado à Delegacia de Polícia, onde foi periciado, tendo sido constatado que também era clonado e que havia sido subtraído também na região metropolitana. Manifestou que, na casa do réu, também foram achados dois potes de miguelitos e cartuchos calibre .38, que estavam dentro de um vaso. Esclareceu que o acusado não era alvo de investigação pela Polícia. (CD de fl. 145)

O Policial Civil Carlos Henrique Machado da Silva disse que receberam uma informação referente a um negócio de venda de carro, que não se concretizou por ausência de documentação. Sustentou que foram até o local, onde foram atendidos pelo acusado, que disse não saber de nada. Sustentou que, ao questionarem se havia algo ilegal na residência, o réu respondeu negativamente. Declarou que, bem defronte à residência, se encontrava o Fiesta. Mencionou que, ao perguntarem ao réu sobre o veículo, esse admitiu que estava com as placas trocadas. Aduziu que encontraram também as chaves de um Hyundai, tendo o réu alegado que “as crianças haviam achado na rua”. Sustentou que tal veículo não foi encontrado na rua do réu, mas a cerca de uma quadra e meia dali. Aduziu que tal veículo também estava com as placas trocadas. Acrescentou que, na residência do acusado, também foram encontrados cartuchos e miguelitos. (CD de fl. 145)

Sendo essas as provas produzidas nos autos, resta inequívoca a prática dos delitos de receptação pelo denunciado.

Ao que se infere dos autos, a diligência da Polícia Civil decorreu de denúncia recebida pela Polícia Civil referente a um veículo Fiesta à venda no aplicativo OLX, o qual não teria a documentação correspondente. Frente a isso, deslocaram-se os policiais até o local indicado, em frente ao qual estava o Fiesta, onde foram atendidos pelo acusado. Na residência, foi localizada a chave de um veículo Hyundai, o qual foi encontrado próximo dali. Também foram apreendidos miguelitos e dois cartuchos calibre .38. Em averiguação, constatou-se que tanto o veículo Ford/Fiesta quanto o Hyundai/HB20 estavam com placas trocadas e haviam sido roubados da região metropolitana, conforme ocorrência de fls. 08 e 11.

O réu negou a prática dos crimes, alegando não ter qualquer relação com os veículos em questão. Contudo, sua versão não encontra nenhum amparo nos autos, restando plenamente desmentida pelas circunstâncias da prisão e, principalmente, pelos relatos dos policiais.

Em relação ao veículo Hyundai/HB20, foram encontradas as chaves desse na casa do réu, sendo que o veículo estava estacionado a menos de duas quadras da casa dele. Já o automóvel Ford/Fiesta, esse estava sendo negociado pelo próprio réu em aplicativo de venda, tendo a transação não se concretizado justamente pela falta de documentação do automóvel, o que levou o pretenso comprador a comunicar a Polícia. Vale destacar que, quando da diligência policial, o veículo estava estacionado bem em frente a casa do acusado. Um dos policiais referiu que o réu chegou a reconhecer que o bem estava com as placas trocadas.

Assim, o fato de existirem nas proximidades da casa do réu dois automóveis roubados, ambos com as placas trocadas, tendo sido encontradas as chaves de um dos veículos com o réu e havendo a notícia de que ele estava negociando o outro veículo, deixam induvidosa a autoria delitiva pelo réu, ficando evidente que a tese defensiva de que os filhos dele acharam as chaves na rua tratou-se de criação fantasiosa do réu para tentar afastar a sua responsabilidade.

O fato de se tratarem de dois veículos roubados, ambos sem documentação e não tendo o réu justificado a posse deles (inclusive negou tal posse), deixa certo que ele detinha conhecimento da origem ilícita desses.

Em casos como o dos autos, importante trazer à baila trecho de voto proferido pelo Desembargador Sylvio Baptista Neto no julgamento da apelação crime nº 70030997860, da Sétima Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ocorrido em 06/08/2009:

“A situação em tela é igual àquela da posse da coisa furtada pelo agente. Sua constatação, como, repetindo, ocorreu aqui, faz prova do envolvimento do possuidor no delito, criando uma inversão do ônus probatório. Por uma questão de lógica, a apreensão do objeto gera a presunção de autoria do fato por parte do detentor, devendo ele, então, justificar, de modo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT