Acórdão nº 50066030420218210003 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeira Câmara Criminal, 10-02-2022

Data de Julgamento10 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50066030420218210003
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001571642
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

1ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5006603-04.2021.8.21.0003/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5006603-04.2021.8.21.0003/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas (Lei 11.343/06)

RELATORA: Juiza de Direito ANDREIA NEBENZAHL DE OLIVEIRA

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

ADVOGADO: CRISTIANO VIEIRA HEERDT (DPE)

TESTEMUNHA: SEGREDO DE JUSTIÇA

TESTEMUNHA: SEGREDO DE JUSTIÇA

TESTEMUNHA: SEGREDO DE JUSTIÇA

TESTEMUNHA: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

O Ministério Público ofereceu denúncia contra CLEIA DA SILVA LOPES já qualificada, dando-a como incursa nas sanções do artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/06 (1º fato) e do artigo 14, caput, da Lei nº 10.826/06 (2º fato):

Narra a denúncia que:

"1º FATO

No dia 23 de abril de 2021, por volta das 14h00min, na Av. Zero Hora, nº 30, bairro Jardim Algarve, em Alvorada/RS, a denunciada CLEIA DA SILVA LOPES tinha em depósito, para fins de traficância, 28 (vinte e oito) porções de crack, pesando 4,10g e 01 (uma) porção de cocaína, pesando 0,30g, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

Na ocasião, policiais civis receberam informação anônima dando conta de que a esposa de um indivíduo indiciado recentemente por tráfico de drogas, seria a responsável por continuar a traficância no endereço acima referido, além de descrever características pessoais da denunciada.

Ato contínuo, os policiais deslocaram-se até o local mencionado, com a finalidade de apurar as informações recebidas, oportunidade em que visualizaram a denunciada CLEIA comercializar uma porção de crack para o usuário Argeu Martins da Silva, fato que ensejou a abordagem policial.

Em buscas no local, os agentes de segurança pública localizaram as drogas acima descritas, as quais estavam enterradas no pátio da residência da denunciada.

Além dos entorpecentes, foi apreendida a quantia de R$176,05 (cento e setenta e seis reais e cinco centavos) em notas e moedas trocadas. O local em que flagrada a denunciada, onde anteriormente havia sido desbaratado por ação policial, as circunstâncias da prisão em flagrante, a variedade de drogas apreendidas, a quantia em dinheiro apreendida, as condições de condicionamento dos entorpecentes, os quais se encontravam embalados e prontos para a comercialização, além dos policiais civis terem visualizado a comercialização de drogas pela flagrada, evidenciam circunstâncias típicas de narcotraficância.

As substâncias apreendidas foram submetidas à perícia preliminar, conforme laudo de constatação da natureza da substância (fls. 15/16 do IP).

2º FATO

Nas mesmas circunstâncias de hora e lugar descritas no 1º fato, a denunciada CLEIA DA SILVA LOPES mantinha sob sua guarda um revólver calibre 38, municiado, marca Tanque, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

Na ocasião, durante a abordagem descrita no 1º fato, os policiais civis, ao realizarem buscas na residência utilizada pela denunciada para guardar os entorpecentes, localizaram o revólver descrito."

A denúncia foi recebida em 18/05/2021 (evento 3 dos autos originários) e, após regular instrução, foi prolatada sentença pela qual foi julgada parcialmente procedente a pretensão acusatória contida na denúncia, condenando a ré nas sanções do artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006 e do artigo 12 da Lei nº 10.826/03, às penas de 05 (cinco) anos, 07 (sete) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, a ser cumprida em regime inicial semiaberto; 01 (um) ano, 01 (um) mês e 15 (quinze) dias de detenção, a ser cumprida em regime inicial aberto, e à pena de multa de 582 (quinhentos e oitenta e dois) dias-multa, à razão de 1/30 do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato (evento 49- SENT1).

Inconformada, a defesa, por meio da Defensoria Pública, apelou (evento 68). Em razões, preliminarmente, arguiu ser direito da acusada o oferecimento de acordo de não persecução penal pelo Ministério Público, considerando o possível reconhecimento da forma privilegiada do delito de tráfico, uma vez que a apelante é primária, bem como não se amolda a nenhuma das causas impeditivas do § 2º do art. 28-A do CPP. No mérito, sustentou ausência de provas para manutenção da condenação, visto baseada apenas na palavra dos policiais ouvidos. Referiu que a testemunha Argeu negou ter adquirido drogas da acusada e, em relação à arma apreendida, destacou que os policiais Matheus e Vinícius afirmaram que teria uma testemunha no local que informou que a arma seria de outra pessoa, além da ré não ter assumido a propriedade da arma e nem ser a proprietária da casa onde o armamento foi encontrado. Asseverou que a acusada é usuária e defendeu o reconhecimento da privilegiadora prevista no art. 33, §4º, da Lei de Drogas. Ainda, aduziu ausência e lesividade em relação à arma apreendida ou, ainda o reconhecimento da majorante do art. 40, IV, da Lei de Drogas e a consequente absorção do crime previsto no Estatuto do Desarmamento. Por fim, em relação às penas aplicadas, insurgiu-se à valoração, na pena base do delito de tráfico, em razão da natureza da droga apreendida (crack), além de entender ser desproporcional. Quanto ao delito de posse de arma, referiu que a valorização da vetorial "circunstâncias" pelo fato da arma estar municiada é inerente do próprio tipo penal, além de defender a isenção ou redução da pena de multa, detração do tempo de prisão provisória e revogação da prisão preventiva, sobretudo porque fixado regime semiaberto para cumprimento da reprimenda, não podendo a prisão cautelar servir como antecipação de pena, além de não se fazerem presentes os requisitos do art. 312, do CPP. Prequestionou artigos e pugnou pelo acolhimento da preliminar e provimento da apelação, nos termos da fundamentação.

Foram apresentadas contrarrazões (ev. 192).

A Procuradoria de Justiça, através da ilustre Procuradora, Dra. Irene Soares Quadros, lançou parecer, opinando pela rejeição da preliminar e, no mérito, pelo desprovimento do recurso defensivo.

É o relatório.

VOTO

De início, o recurso é tempestivo e preenche os pressupostos processuais, razão pela qual vai conhecido.

Preliminar

De imediato, passo a analisar a preliminar arguida pela defesa, a qual postula o oferecimento de Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) pelo Ministério Público.

Pois bem. O Acordo de Não Persecução Penal, previsto na Lei nº 13.964/19, que incluiu no Código de Processo Penal o art. 28-A, trata de norma despenalizadora, a exemplo de alguns institutos previstos na Lei nº 9.099/95, como a transação penal e a suspensão condicional do processo, com o objetivo de ampliar a chamada justiça negociada no processo penal.

A lei traz expressos os requisitos para o cabimento do instituto, consistentes na (i) confissão formal e circunstanciada do fato pelo investigado, (ii) prática de infração penal sem violência ou grave ameaça, com pena mínima inferior a quatro anos, e (iii) análise da necessariedade e suficiência da medida para prevenção e reprovação do crime.

Na hipótese dos autos, não houve confissão, de modo que, de pronto, é possível excluir o primeiro requisito para a viabilidade do acordo, o que leva à conclusão de que a apelante não faze jus ao benefício.

Quanto ao segundo item, prática de infração penal sem violência e grave ameaça com pena mínima inferior a quatro anos, também a apelante não preenche tal requisito, pois as penas cominadas aos crimes denunciados (tráfico de drogas e posse irregular de arma de uso permitido) superam o limite objetivo previsto no mencionado artigo.

Além disso, outros dois pontos merecem destaque: a prerrogativa para oferecimento cabe ao Ministério Público e não ao Poder Judiciário, e o acordo pode ser proposto desde que não recebida a denúncia.

No sentido do exposto, os seguintes julgados:

Ementa: APELAÇÃO CRIME. TRÁFICO DE ENTOECENTES E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. CONDENAÇÃO. APELOS DEFENSIVOS. PRELIMINAR. OFERECIMENTO DE ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL. REJEIÇÃO. Não cabe ao Poder Judiciário determinar a proposta do ANPP, de modo que, caso tal instrumento seja passível de aplicação e não tenha sido oferecido pelo Ministério Público, deve o órgão superior da instituição reexaminar a aplicação do instrumento no processo, nos termos do art. 28-A, § 14º, do Código de Processo Penal. Ademais, a pena mínima do delito é superior à exigida para o benefício e o réu não confessou o crime. MÉRITO. MANUTENÇÃO DO JUÍZO CONDENATÓRIO. Os policiais deram voz de abordagem aos réus em via pública, ocasião em que um deles tentou empreender fuga. Foram angariadas drogas na posse do réu condenado por tráfico, ao passo que na posse de ambos, armas de fogo. Quanto à alegação de ofensa ao princípio da inviolabilidade do domicílio, não merece acolhida. Ocorre que, estando os policiais em patrulhamento em local conhecido pelo tráfico de drogas e, ao perceber a guarnição, uma ou mais pessoas tentam empreender fuga sem motivo aparente algum, caracterizada está a fundada suspeita acerca da ocorrência de um crime, pois como diz o famigerado ditado, ”quem não deve, não teme”. É impossível que em uma localidade conhecida pela prática de algum delito, um cidadão de bem, trabalhador, tente fugir simplesmente por avistar a Polícia. Assim, não prospera o pedido de absolvição por insuficiência de provas, tendo em vista que a diversidade e a quantidade dos entorpecentes é absolutamente incompatível com a tese de posse de drogas para consumo pessoal, assim como não existe dúvida acerca da apreensão dos artefatos bélicos na posse dos condenados. APENAMENTO. DIMINUIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. Preliminar afastada. Apelos improvidos.(Apelação Criminal, Nº 70085037026, Primeira Câmara Criminal,...

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