Acórdão nº 50068083320218210003 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Cível, 23-02-2022
Data de Julgamento | 23 Fevereiro 2022 |
Órgão | Sétima Câmara Cível |
Classe processual | Apelação |
Número do processo | 50068083320218210003 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Tipo de documento | Acórdão |
PODER JUDICIÁRIO
Documento:20001124221
7ª Câmara Cível
Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906
Apelação Cível Nº 5006808-33.2021.8.21.0003/RS
TIPO DE AÇÃO: De Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas
RELATOR: Juiz de Direito ROBERTO ARRIADA LOREA
APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA
APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA
RELATÓRIO
Vistos.
Cuida-se de recurso de Apelação interposto por G.L. de L., irresignado com a decisão proferida nos autos do procedimento de apuração de ato infracional ajuizado pelo Ministério Público, que julgou parcialmente procedente a representação, aplicando-lhe medida socioeducativa, consistente em internação, sem a possibilidade de atividade externa, pela prática da conduta equiparada à descrita no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/06 (evento 63).
Em suas razões recursais, o apelante, em sede preliminar, suscita a nulidade do feito ante a falta do laudo da equipe interdisciplinar, bem como, a ausência do laudo toxicológico definitivo. No mérito, refere que as provas produzidas durante a instrução processual são insuficientes para ensejar em juízo condenatório, reforçando que não restaram demonstrados os atos de comércio. Pugna pelo provimento do apelo para ver julgada a demanda como improcedente, ou subsidiariamente, seja substituída a medida socioeducativa aplicada para outra mais branda (evento 74).
Ofertadas as contrarrazões recursais pelo Ministério Público (evento 79), subiram os autos a esta Corte.
Sobreveio parecer da Procuradoria de Justiça, manifestando-se pelo conhecimento e desprovimento do recurso interposto (evento 7).
É o relatório.
VOTO
O recurso, porque preenchidos os requisitos de admissibilidade, resta conhecido.
Busca o apelante a reforma da decisão que julgou parcialmente procedente a representação oferecida pelo Ministério Público, imputando ao adolescente a prática do ato infracional análogo ao descrito no artigo 33, caput, da Lei 11.343/2006, aplicando-lhe medida de internação sem a possibilidade de atividade externa.
Do ato infracional descrito na representação, tem-se que:
"1º ATO INFRACIONAL
No dia 19 de maio de 2021, aproximadamente às 17h45min, em via pública, nas imediações da rua Wesceslau Fontoura, nº 344, Sumaré, Alvorada/RS, em via pública, o representado, GREGORI L.DE L., em comunhão de esforços e conjunção de vontades com outros indivíduos imputáveis, trazia consigo e vendia substâncias entorpecentes que causam dependência física e psíquica, sem autorização e em desacordo com a determinação legal ou regulamentar.
Na ocasião, o representado vendia entorpecentes a usuários, em conhecido ponto de traficância, momento em que passou a ser monitorado por Policiais Civis que faziam campana no local. Nesse ínterim, o adolescente comercializava drogas, enquanto seus comparsas buscavam as substâncias em uma residência próxima e lhe entregavam para venda. Na sequência, em abordagem, goram localizadas em poder de Gregori 01 (uma) porção de maconha pesando, aproximadamente, 1,20g, 04 (quatro) pinos de cocaína pesando, aproximadamente, 4 g, além de 03 (três) cédulas de R$ 20,00 reais.
Salienta-se, por pertinente, que foi realizado o acompanhamento e a abordagem de outro indivíduo imputável que acompanhava o representado, com ele também sendo apreendidos tóxicos. E, em busca realizada na residência em que este havia entrado, localizaram-se drogas com embalagens idênticas às que encontradas em poder do infante.
As drogas apreendidas foram submetidas à perícia preliminar que constatou tratar-se de maconha (cujo princípio ativo é o tetracannabinnol) e cocaína, substâncias que causam dependência física e psíquica e constam na relação de substâncias e produtos entorpecentes e psicotrópicos de uso proscrito no Brasil. Nos termos da Portaria nº 344, de 12.05.98, da SVS-MS.
2º ATO INFRACIONAL
Em data não esclarecida nos autos, mas, certamente, até o dia 19 de maio de 2021, em Alvorada/RS, o representado GREGORI LEAL DE LIMA, em comunhão de esforços e auxílio de vontades com indivíduos imputáveis, associou-se a fim de cometer o ato infracional equiparado ao tráfico de drogas.
No lapso temporal, o representado, estando previamente acordado com os imputáveis comercializava drogas em via pública a usuários, que lhe eram periodicamente fornecidas por seus comparsas e que, inclusive, armazenavam as substâncias em imóvel próximo ao da venda dos entorpecentes, em divisão de tarefas e organização da prática delitiva.
Inicialmente, acerca da preliminar de nulidade em razão da falta de laudo definitivo das drogas apreendidas, denota-se que o laudo preliminar de constatação da natureza das drogas apreendidas (evento 1, BOC1, fl. 10 – autos 5006797-04.2021.8.21.0003), revela que foram apreendidos maconha e cocaína.
Diante disso, existindo laudo de constatação provisório que produz grau de certeza sobre o material apreendido, não há que se falar em nulidade, consoante o entendimento jurisprudencial deste E. Tribunal de Justiça em casos análogos.
Nesse sentido:
ECA. ATO INFRACIONAL. TRÁFICO DE ENTOECENTE. PROVA. MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS DE LIBERDADE ASSISTIDA E DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE. ECA. ATO INFRACIONAL. TRÁFICO DE ENTOECENTES. PROVA. MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO. AUSÊNCIA DE LAUDO POR EQUIPE INTERDISCIPLINAR E DE LAUDO TOXICOLÓGICO. INOCORRÊNCIA DE NULIDADE. 1. O laudo de exame por equipe interdisciplinar constitui elemento de convicção útil, que deve ser realizado apenas quando julgador entender conveniente, sendo que a sua ausência não enseja nulidade processual. 2. Não há nulidade pela ausência do laudo toxicológico definitivo, pois ficou constatado, com segurança, que as substâncias apreendidas são identificadas como crack e maconha, portadoras de potencialidade lesiva e causadora de dependência física e psíquica. 3. Comprovadas a autoria e a materialidade do ato infracional, torna-se imperiosa a procedência da representação e também a aplicação da medida socioeducativa adequada à gravidade do fato e às condições pessoais do infrator(...) Recurso desprovido.”(Apelação Cível, Nº 70079066759, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em: 31-10- 2018)
Já no que tange à preliminar de nulidade arguida, em razão da ausência de laudo de estudo interdisciplinar, igualmente não prospera.
Com efeito, o laudo de exame por equipe interdisciplinar constitui elemento de convicção útil, cuja realização o julgador deve determinar sempre que entender conveniente, mas sua realização é facultativa e, obviamente, não vincula o julgador, não ensejando nulidade processual a sua ausência.
Inclusive, o entendimento já sedimentado no 4º Grupo Cível é o de que a ausência do laudo de avaliação por equipe multidisciplinar não constitui sequer vício processual e, obviamente, não é causa de nulidade, pois se trata apenas de um elemento de convicção útil, que o julgador pode solicitar quando bem lhe aprouver, mas que não o vincula, não sendo, portanto, providência necessária e, menos ainda, indispensável. E é nesse mesmo sentido a Conclusão nº 43 do Centro de Estudos do Tribunal de Justiça:
“Em processo de apuração de ato infracional, a realização de laudo pela equipe interdisciplinar não é imprescindível à higidez do feito, constituindo faculdade do juiz a sua oportunização.”
Sendo assim, não é nula a sentença pela ausência de laudo de estudo multidisciplinar, pois cabe ao julgador determinar a produção das provas que lhe parecer necessário, motivo pelo qual resta afastada a preliminar aventada.
Nesse sentido, destaco:
ECA. ATO INFRACIONAL. FURTO. PROVA. REITERAÇÃO DE PRÁTICAS INFRACIONAIS. GRAVE DESAJUSTE PESSOAL. MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO. ADEQUAÇÃO. 1. O laudo de exame por equipe interdisciplinar constitui elemento de convicção útil, que deve ser realizado apenas quando julgador entender conveniente, sendo que a sua ausência não enseja nulidade processual. 2. Estando cabalmente comprovadas a autoria e a materialidade do ato infracional tipificado como furto, impõe-se o juízo de procedência da representação e a aplicação da medida socioeducativa adequada tanto à gravidade dos fatos como também às condições pessoais do infrator. 3. Tratando-se de jovem que vem reiterando na prática de fatos graves e especificamente de furto, mas também responde por roubo, homicídio e tráfico, estando inclusive com prisão preventiva decretada por fato praticado após a maioridade, mostra-se cabível e necessária a aplicação da medida socioeducativa de internação sem possibilidade de desenvolver atividades externas. 4. A finalidade da medida extrema é impor limites ao jovem e promover a sua reeducação e ressocialização, com derradeiro convite para refletir acerca da conduta que vem desenvolvendo, na expectativa de que ainda possa se tornar pessoa capaz de conviver em sociedade e também de respeitar o patrimônio das demais pessoas, sob pena de se tornar inquilino assíduo do sistema penitenciário do Estado. Recurso desprovido.(Apelação Cível, Nº 70084842103, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em: 24-03-2021)
Destarte, vão rechaçadas as preliminares arguidas.
No mérito, a sentença comporta reparos, adianto.
Efetivamente, a autoria e a materialidade do ato infracional apurado encontram-se consubstanciadas nos autos.
Assim, a fim de evitar tautologia, colaciona-se trecho do parecer da ilustre Procuradora de Justiça Denise Maria Duro, que bem apurou a questão fática posta nos autos, o qual acresço às razões de decidir:
"A materialidade e a autoria do ato infracional estão consubstanciadas no boletim de ocorrência, no auto de apreensão, no laudo de constatação da natureza da substância, no levantamento fotográfico (evento 1 – autos...
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