Acórdão nº 50068323120218210013 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Quarta Câmara Cível, 23-06-2022

Data de Julgamento23 Junho 2022
ÓrgãoDécima Quarta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50068323120218210013
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002261918
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

14ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5006832-31.2021.8.21.0013/RS

TIPO DE AÇÃO: Cláusulas Abusivas

RELATOR: Desembargador ROBERTO SBRAVATI

APELANTE: LUCIANO MARCOS DANIEL (AUTOR)

APELANTE: BANCO VOTORANTIM S.A. (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de apelações interpostas por LUCIANO MARCOS DANIEL e BANCO VOTORANTIM S.A. contra sentença proferida nos autos da Ação de Revisão de Contrato que litigam as partes.

A sentença recorrida assim decidiu:

Assim, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação revisional ajuizada por LUCIANO MARCOS DANIEL contra BANCO VOTORANTIM S.A., para:

1) determinar a revisão do(s) contrato(s) objeto(s) dos autos para:

- limitar os juros remuneratórios incidentes sobre as parcelas em atraso ao percentual previsto para o período de normalidade contratual;

- limitar os juros moratórios a 1% ao mês.

2) condenar a parte ré a compensar o débito com o crédito da parte autora decorrente desta revisão, corrigindo-se monetariamente cada pagamento a maior pelo IGP-M, com juros moratórios de 1% ao mês desde a citação e, remanescendo saldo credor em favor da parte autora, os valores deverão ser restituídos, na forma simples, com a mesma forma de atualização monetária e juros determinados na compensação;

3) rejeitar os demais pedidos, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.

Condeno cada uma das partes ao pagamento de 50% das custas processuais, além de honorários advocatícios ao procurador da parte contrária, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa. Suspensa a exigibilidade da parte autora em tendo havido o deferimento da AJG.

Interposta apelação, intime-se a parte adversa para contrarrazões no prazo legal. Com a juntada das contrarrazões, remetam-se os autos ao Tribunal de Justiça.

Após o trânsito em julgado, subsistindo crédito em favor de uma das partes e/ou de seus procuradores, o cumprimento de sentença deverá ser promovido em procedimento eletrônico apartado, indicando-se o processo principal ao qual deve ser vinculado., conforme orientação posta no Ofício-Circular nº 077/2019-CGJ, item “6”.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

O Réu recorre (evento 56). Alega, preliminarmente, se extra petita a sentença quanto à limitação dos juros remuneratórios e moratórios no período da inadimplência. No mérito, requer o provimento do apelo para manter os juros moratórios conforme pactuados e vedar a compensação/ e a repetição do indébito, ou, alternativamente, que esta seja corrigida exclusivamente pela SELIC. Postula pela redistribuição dos ônus de sucumbência e pela redução dos honorários advocatícios.

Apela o Autor (evento 63). Requer o provimento do recurso para a reforma da sentença a fim de possibilitar a revisão das quantias cobradas em excesso, pleiteando pela limitação da taxa de juros remuneratórios; pelo afastamento da capitalização de juros; pela exclusão da comissão de permanência; pela aplicação do IGP-M como índice de correção monetária; pela limitação da multa em 2%, pela repetição/compensação do indébito. Afirma a necessidade de perícia a fim de apurar-se as abusividades existentes no contrato.

Com as contrarrazões (eventos 62 e 67), subiram os autos a este Tribunal.

Vieram os autos conclusos e em condições de julgamento.

Foram observadas as disposições legais dos artigos 931 e 934, ambos do CPC.

É o relatório.

VOTO

PRELIMINARMENTE

De início, não conheço do recurso do Autor quanto à correção monetária, multa, comissão de permanência e repetição/compensação do indébito, pois matérias que foram favoravelmente julgadas à parte na sentença, carecendo, portanto, o apelante de interesse de recorrer quanto a esses tópicos.

Ainda requer o apelante a perícia técnica, a fim de verificar as abusividades no contrato.

Ocorre que tal pedido não foi sequer postulado na petição inicial, razão pela qual não deve ser conhecido o apelo nesse ponto pela configuração da inovação recursal.

Nesse sentido:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. TELEFONIA MÓVEL. CLARO S.A. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. COBRANÇA INDEVIDA. INOCORRÊNCIA. COMPROVADO FATO EXTINTIVO, MODIFICATIVO OU IMPEDITIVO DO ALEGADO DIREITO DO AUTOR. No caso em comento, a concessionária do serviço logrou comprovar a regularidade da cobrança, motivo pelo qual deve ser confirmada a sentença de primeiro grau por seus próprios fundamentos. Não conheço do recurso no tocante ao preço ajustado entre as partes -R$36,00- corresponder apenas ao que excedesse a quantidade de 40 Megabytes, uma vez que tal tese não foi esposada na inicial, tampouco submetida ao crivo do Juízo a quo, tratando-se de flagrante inovação recursal. APELO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE EM QUE CONHECIDO, IMPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70068291657, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Guinther Spode, Julgado em 18/07/2016)

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICO-TRIBUTÁRIA. IPTU. INOVAÇÃO RECURSAL. INADMISSIBILIDADE. Ante a impossibilidade de inovar o pedido em sede de recurso, haja vista que é impossível recorrer do que não foi objeto de discussão e de decisão no juízo inferior, impõe-se o não conhecimento do recurso. RECURSO NÃO CONHECIDO. (Apelação Cível Nº 70068003789, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sergio Luiz Grassi Beck, Julgado em 18/07/2016)

APELAÇÕES CÍVEIS. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. INVESTIMENTO NO MERCADO DE AÇÕES. BOLSA DE VALORES. ALEGAÇÃO DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. DOLO. INOVAÇÃO RECURSAL. RECURSO DE APELAÇÃO DA PARTE AUTORA NÃO CONHECIDO. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. POSSIBILIDADE. APELO DA RÉ PROVIDO. Inovação recursal. O recurso de apelação não merece ser conhecido, posto que aduz matéria que não foi objeto da petição inicial, sendo vedada a inovação processual em grau recursal. Recurso de apelação da parte autora não conhecido. Honorários sucumbenciais. Majoração, possibilidade. Tal verba deve atender os requisitos previstos no art. 85, §2º, do CPC/15, qual sejam eles o grau de zelo do profissional, o lugar da prestação do serviço, além da natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. NÃO CONHECERAM DO RECURSO DE APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DERAM PROVIMENTO AO APELO DA RÉ. (Apelação Cível Nº 70070004411, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Giovanni Conti, Julgado em 14/07/2016)

Ainda preliminarmente, deve ser afastada a alegação do Réu no sentido de ser extra petita a sentença quanto à limitação dos encargos moratórios do contrato, na medida em que, na inicial, o Autor postulou: "F) A redução de taxas de juros remuneratórios, conforme taxa divulgada pelo Bacen, à época da contratação, bem como a redução de juros moratórios para 1% ao ano;".

Portanto, tendo sido proferido julgamento nos limites da lide, vai rechaçada a alegação do Réu/recorrente.

JUROS REMUNERATÓRIOS

No que pertine com a questão dos juros remuneratórios, o colendo STJ já pacificou o tema, preconizando que é livre a pactuação da taxa de juros entre os contratantes, exceto em havendo excesso manifestamente comprovado (na forma do decisório tornado paradigma – RESP 1.061.530/RS, rela. Min. Nancy Andrighi, j. 22/10/08), ocasião em que se limitam os juros.

Decidiu-se, à ocasião, o que segue:

a) que as instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF;

b) que a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;

c) que são inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;

d) que vai admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto.

Como asseverado no voto pela eminente relatora, quanto à limitação dos juros remuneratórios, “a dificuldade do tema, que envolve o controle do preço do dinheiro é enorme. Isso não é, entretanto, suficiente para revogar o art. 39, V, CDC, que veda ao fornecedor, dentre outras práticas abusivas, “exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva”, e o art. 51, IV, do mesmo diploma, que torna nulas as cláusulas que “estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou seja, incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade”.

Então, cumpre dizer que os juros serão limitados, a um patamar razoável, para expungir abusividade, e que a diretriz que se adota para fixar tal patamar é a taxa média do mercado, tal como fornecida pelo BACEN em seu site, consoante estipulado no acórdão paradigma suso mencionado. Os juros são limitados, então, em hipótese excepcional, qual seja, quando ultrapassada a taxa média de mercado.

No mesmo sentido, num dos precedentes que deu esteio ao decisório paradigma antes mencionado, o Min. João Otávio de Noronha decidiu que “a alteração da taxa de juros pactuada depende da demonstração cabal de sua abusividade em relação à taxa média do mercado”(AgRg no REsp 939.242/RS, Quarta Turma, DJe de 14.04.2008). Neste mesmo tom, o Min. Fernando Gonçalves sustentou que “a alteração da taxa de juros pactuada depende da demonstração cabal da sua abusividade em relação à taxa média de mercado” (AgRg no REsp 1.041.086/RS, Quarta Turma, DJe de 01.09.2008).

Ou seja,...

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