Acórdão nº 50070158020188210021 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Segunda Câmara Cível, 26-05-2022

Data de Julgamento26 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50070158020188210021
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002164522
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

12ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5007015-80.2018.8.21.0021/RS

TIPO DE AÇÃO: Responsabilidade civil

RELATOR: Desembargador UMBERTO GUASPARI SUDBRACK

APELANTE: RENAN CRUZ MEIRELES (AUTOR)

APELANTE: SONY BRASIL LTDA. (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

De início, a fim de evitar tautologia, transcrevo o relatório da sentença recorrida (Evento ):

RENAN CRUZ MEIRELES ajuizou Ação de Indenização contra SONY BRASIL LTDA (SONY INTERACTIVE ENTERTAINMENT DO BRASIL COMÉRCIO E SERVIÇOS DE MARKETING LTDA), alegando, em resumo, que a sua conta na plataforma PlayStation Network (PSN) foi bloqueada indevidamente pela parte ré, restando impedido de acessar os seus jogos e aplicativos adquiridos e o seu histórico de gamer Negou ter violado qualquer termo de uso do serviço. Disse que, não obstante as inúmeras reclamações, não conseguiu obter uma solução na esfera administrativa. Aduziu que a parte ré praticou ato ilícito que lhe causou danos materiais e morais. Pediu, liminarmente, a reativação da sua conta. Requereu, ao final, a procedência da ação para o fim de condenar a parte ré a reativar a sua conta ou, subsidiariamente, ao pagamento de todos os valores despendidos em jogos e aplicados adquiridos, bem como ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 18.740,00. Pediu a Gratuidade da Justiça. Juntou documentos (fls. 26/111).

Deferida a AJG e deferido o pedido liminar (fls. 112/113).

Citada, a parte ré apresentou contestação (fls. 120/129), postulando, preliminarmente, a retificação do seu nome para SONY INTERACTIVE ENTERTAINMENT DO BRASIL COMÉRCIO E SERVIÇOS DE MARKETING LTDA e a anotação de segredo de justiça na demanda. No mérito, sustentou, em suma, que a conta do autor restou bloqueada por violação aos Termos de Uso da plataforma, uma vez que foi constatada a prática pelo demandante de Hacking/Exploitation em razão da instalação de software pirata denominado Custom firewall - CFW e a utilização do aplicativo MultiMAN (BELS80608_00) desde o ano de 2014. Argumentou que cumpriu o seu dever de informação e transparência, ressaltando que o autor teve ciência dos termos de uso disponíveis na sua plataforma, com os quais aquiesceu quando do seu registro. Impugnou o pedido de inversão do ônus da prova. Frisou que, embora o autor possua quatro videogames, não pode acessar mais de um aparelho ao mesmo tempo com a mesma conta na modalidade online. Sustentou que não estão presentes os pressupostos da responsabilidade civil, notadamente o ato ilícito, o nexo causal e os alegados danos materiais e morais. Impugnou o pedido liminar e de inversão do ônus da prova. Requereu a improcedência da ação. Juntou documentos (fls. 130/160)

Deferidos os pedidos de retificação do polo passivo e de anotação de segredo de justiça (fl. 161).

Houve réplica (fls. 180/185).

Após determinação judicial, a parte ré regularizou a sua representação processual (fl. 187-v).

Intimadas, as partes não manifestaram interesse na produção de outras provas (fls. 192/194).

Vieram os autos conclusos para sentença.

Sobreveio julgamento nos seguintes termos:

Diante do exposto, forte no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTES os pedidos deduzidos por RENAN CRUZ MEIRELES contra SONY INTERACTIVE ENTERTAINMENT DO BRASIL COMÉRCIO E SERVIÇOS DE MARKETING LTDA para o efeito de:

A) CONDENAR a parte ré ao pagamento de indenização por danos materiais ao autor, no valor correspondente ao montante por ele comprovadamente despendido na aquisição de jogos e aplicativos através da sua conta na plataforma PlayStation Network (PSN), denominada "GauderioLoko", acessada através do endereço eletrônico ******meireles@yahoo.com.br, a ser apurado em sede de liquidação sentença simplificada, corrigidos monetariamente pelo IGP-M a contar da data do efetivo desembolso e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação; e

B) CONDENAR a parte ré ao pagamento de indenização por danos morais à parte autora, no valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), corrigido monetariamente pelo IGP-M a contar da data da sentença e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a contar da citação.

Outrossim, nos termos da fundamentação acima, REVOGO a medida liminar concedida no feito.

CONDENO a parte ré ao pagamento integral das custas processuais e dos honorários advocatícios da procuradora da parte autora, fixados em 20% do valor atualizado da condenação, nos termos do artigo 85 do Código de Processo Civil, considerando a natureza da matéria debatida, o trabalho desenvolvido e o tempo decorrido até a conclusão do processo.

Inconformadas, apelam ambas as partes (APELAÇÃO35 e APELAÇÃO36 - Evento 02).

Em suas razões, a ré defende a regularidade do bloqueio realizado na conta do autor junto à sua plataforma (PlayStation Network - PSN), já que teriam sido verificadas diversas condutas incompatíveis com seus os Termos de Uso. Relata que averiguou, por meio do seu setor de armazenamento de danos, que o demandante teria lançado mão de software ilegal, denominado "Custom Firmware" (CFW), bem como de aplicativo não oficial denominado "Multiman", incorrendo, assim, em duas violações às normas da plataforma. Refere que o primeiro possibilitaria a instalação de programas e a ativação de recursos para uso de conteúdo pirata, o que não seria possível em um videogame PlayStation com sistema original, enquanto o segundo seria usado para copiar jogos ou para carregá-los de sites de pirataria online. Alega que as referidas ilicitudes teriam sido comprovadas em sede de contestação. Pondera que o banimento do autor da sua plataforma constituiria exercício regular de direito, de modo a refutar a restituição de valores determinada na sentença. Sustenta a inocorrência de danos morais, argumentando que o caso dos autos envolveria "uma simples narrativa de ofensa incapaz de gerar o dever de indenizar", não passando de "mero aborrecimento". Pede, ao final, o provimento do recurso, a fim de que a demanda seja julgada improcedente.

Por sua vez, em seu recurso, o autor se insurge contra a revogação da tutela provisória que fora deferida pelo juízo de primeira instância, questionando o fundamento no sentido de que, após o seu banimento da plataforma da ré, a reativação da conta não seria possível. Afirma que "em nada custava à apelada reativar a conta do apelante até que no presente processo houvesse decisão de mérito". Alega que, diante do descumprimento da decisão judicial quanto à reativação da sua conta "GauderioLoko", impor-se-ia a aplicabilidade da multa diária outrora arbitrada. Sustenta, ainda, a necessidade de majoração do quantum fixado a título de indenização por danos morais, ressaltando o caráter abusivo da conduta da demandada. Pugna pela fixação do montante de R$ 18.740,00 nesse particular. Requer, ao final, o provimento do recurso.

Devidamente intimadas, as parte apresentaram contrarrazões (CONTRAZ37 - Evento 02 e CONTRAZAP1 - Evento 17)

É o relatório.

VOTO

A despeito dos argumentos ventilados nas razões recursais de ambas as partes, entendo que a sentença não reclama quaisquer reparos, merecendo ser mantida integralmente.

Em primeiro lugar, como bem concluiu o magistrado a quo, tenho que a falha na prestação do serviço da ré foi devidamente comprovada nos autos. Isso porque, frisa-se, até a apresentação da contestação no feito, o autor não reunia condições de saber nem mesmo o motivo específico que teria ensejado o banimento da sua conta na PlayStation Network (PSN).

A esse respeito, veja-se que a justificativa apresentada pelos canais de atendimento da demandada (FOTO9 - Evento 02), no sentido de que o demandante teria violado os Termos de Uso da plataforma, afigura-se genérica e arbitrária, inviabilizando qualquer tipo de esclarecimento por parte do consumidor, que não poderia "adivinhar" a irregularidade específica que teria sido constatada.

Assim, ao bloquear o acesso do autor sem, contudo, indicar-lhe em qual violação contratual teria incorrido, a fornecedora descumpriu o dever de prestar informação clara e precisa ao consumidor, que lhe recai por força do art. 6º, III, do CDC1.

Por sua vez, quanto à motivação apresentada na peça defensiva, no sentido de que o requerente teria lançado mão de software e aplicativo ilegais ("Custom Firmware" e "Multiman"), a fim de copiar jogos e utilizar conteúdo pirata, considero que as alegações da requerida carecem de comprovação. Isso porque as telas anexadas à contestação (CONT E DOCS17 - Evento 02), além de constituírem documento de difícil compreensão, produzido unilateralmente, não fazem qualquer referência a nenhum código dos quatro aparelhos de videogame titularizados pelo autor, o que torna plausível a tese autoral no sentido de que os problemas verificados podem ter advindo do ataque hacker do qual a plataforma foi alvo naquele período, conforme notícias juntadas aos autos (FOTO10 - Evento 02).

De outra banda, diante das circunstâncias acima explanadas, reputo não haver dúvidas quanto à ocorrência de dano moral no caso concreto. Há de se ressaltar, no ponto, as implicações da conduta abusiva da ré, que, ao banir indevida e...

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