Acórdão nº 50071514820218210029 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Câmara Cível, 26-05-2022

Data de Julgamento26 Maio 2022
ÓrgãoDécima Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50071514820218210029
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001992515
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

10ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5007151-48.2021.8.21.0029/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por Dano Material

RELATOR: Desembargador MARCELO CEZAR MULLER

APELANTE: JOAO LEOPOLDO DOMINGUES (AUTOR)

APELADO: VITALCOB ADMINISTRACAO E PROMOCAO DE VENDAS LTDA (RÉU)

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação interposta por JOAO LEOPOLDO DOMINGUES em face da sentença de parcial procedência prolatada nos autos da ação indenizatória ajuizada em desfavor do VITALCOB ADMINISTRACAO E PROMOCAO DE VENDAS LTDA. Transcrevo o dispositivo da decisão:

Isso posto, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido deduzido por JOÃO LEOPOLDO DOMINGUES em face de VITALCOB ADMINISTRAÇÃO E PROMOÇÃO DE VENDAS LTDA., com resolução de mérito, para:

1) DECLARAR, para todos os efeitos, a nulidade do termo de adesão a convênio de saúde e autorização para descontos mensais em conta corrente do autor (evento 1, docs. 7e 8),

2) CONDENAR a demandada a pagar ao autor, a título de repetição de indébito a quantia de R$ 3.725,92 (três mil, setecentos e vinte e cinco reais, noventa e dois centavos), com correção monetária pelo IGP-M, a contar do ajuizamento da ação, com juros de mora de 1% ao mês, incidentes desde a citação.

Com ônus da sucumbência o autor pagará 40% das custas processuais, ficando suspensa a exigibilidade enquanto perdurar a gratuidade (artigo 98, §3º, do CPC); arcando a ré com as custas remanescentes (60%) e honorários advocatícios, arbitrados estes em 20% sobre o valor da condenação, na forma do artigo 85, §2°, do Código de Processo Civil.

Publicada e registrada eletronicamente, intimem-se.

Constou no relatório:

Vistos etc.

JOÃO LEOPOLDO DOMINGUES ajuizou "ação declaratória de inexistência de relação jurídica c/c indenização por danos morais e repetição de indébito" em face de VITALCOB ADMINISTRAÇÃO E PROMOÇÃO DE VENDAS LTDA., ambos qualificados na petição inicial, dizendo que foi surpreendido por débitos em sua conta bancária, realizados pela ré, por suposto convênio de saúde, não contratado porque não é sua a assinatura constante do termo de adesão.

Disse que foi debitada de sua conta corrente a quantia de R$ 1.862,96; sustentando que a ré malferiu seus direitos de consumidor, não restando alternativa senão o ajuizamento da presente ação para que fosse reconhecida a inexistência de relação material, devolução do crédito e indenização por danos morais, considerados estes in re ipsa, em razão da responsabilidade objetiva da demandada.

Requereu que fosse declarada a inexistência de relação jurídica e, em consequência a inexistência de débito, condenando-se a demandada à repetição de indébito no valor total de R$ 3.725,92, com a devida atualização e correção monetária, nos termos do art. 42 do CDC, bem como ao pagamento de indenização por dano moral em valor não inferior a R$ 20.000,00 (vinte mil reais), decorrentes dos indevidos descontos que ocorreram em sua conta poupança. Postulou, ainda, a concessão do benefício da gratuidade judiciária e a inversão do ônus da prova.

Acostou procuração e documentos (evento 1).

Foi concedida a gratuidade ao autor (evento 3).

Citada (evento 8) a ré não apresentou contestação (evento 9).

Manifestou-se o autor (eventos 12 e 17).

Em suas razões, defende a ocorrência de danos morais indenizáveis, tendo em vista todos os transtornos enfrentados em decorrência da conduta da requerida. Pondera acerca do dever de indenizar. Pugna, também, pela majoração dos honorários advocaícios. Pede o provimento do apelo. Litiga ao abrigo da AJG.

Nao foram apresentadas as contrarrazões.

Vieram-me os autos conclusos para julgamento.

Registra-se que foi observado o disposto nos arts. 931 e 934 do CPC, em face da adoção do sistema informatizado.

É o relatório.

VOTO

De início, para uma melhor compreensão do feito, cumpre transcrever a sentença de lavra da Dra. Nina Rosa Andres, Juíza de Direito, que bem examinou os fatos e as provas, dando adequada solução ao litígio. Adoto sua fundamentação como razões de decidir:

O pedido comporta julgamento no estado em que se encontra o processo na forma do artigo 355, inciso II, do Código de Processo Civil.

Com a ré foi regularmente citada e deixou transcorrer in albis o prazo para contestação, decreto-lhe a revelia.

Em consequência, incide o disposto no artigo 344 do CPC:

Se o réu não contestar a ação, será considerado revel e presumir-se-ão verdadeiras as alegações de fato formuladas pelo autor.

Assim, resta indiscutível a inexistência de adesão do autor ao plano de saúde que gerou os débitos objeto da pendência.

Com efeito, a despeito de não haver contratação entre as partes, aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, por equiparação, sendo o autor vítima no evento, de acordo com o disposto no artigo 17 do CDC, de modo que competia à ré a prova de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

Como corolário da revelia em que incorreu a ré, não se pode afastar a sua responsabilidade porque o acontecimento encontra-se inserido na Teoria do Risco da Atividade, previsto nos artigos 14 do Código de Defesa do Consumidor, e 927 do Código Civil, procedendo o pedido declaratório e, em consequência, o autor tem direito à restituição em dobro do valores débitos de sua conta bancária, a rigor do artigo 42, parágrafo único, do CDC:

Art. 42 - [...]

Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.

Entretanto, a mesma sorte não o socorre quanto à indenização por danos morais.

É assim porque, segundo a melhor corrente doutrinária, os danos morais exsurgem com a lesão a direitos da personalidade e, em sentido próprio, constituem aquilo que a pessoa sente (dano moral in natura), mas não são verificados necessariamente por sentimento desagradáveis, como dor ou sofrimento, por exemplo, conforme Enunciado nº 445 da V Jornada de Direito Civil, tampouco com meros dissabores, conforme ensina Sergio Cavalieri Filho1:

[...] só deve ser reputado como dano moral à dor, vexame, sofrimento, ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústias e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no transito, entre amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenização pelos mais triviais aborrecimentos”.

É assim, porque a mera cobrança indevida de valor mensal módico, por si só, não possui aptidão para causar abalo moral (atingir a esfera íntima da parte autora), afastando a alegação de dano in re ipsa, sobretudo porque o autor não foi submetido à situação vexatória, não tendo havido lesão a direito da personalidade.

Assim, o pedido deve ser julgado parcialmente procedente.

Como se sabe, o dano moral constitui violação de direito incluído na personalidade do ofendido, como a vida, a integridade física (direito ao corpo vivo ou morto), psíquica (liberdade, pensamento, criação intelectual, privacidade e segredo) e moral (honra, imagem e identidade). A lesão atinge aspectos íntimos da personalidade, como a intimidade e a consideração pessoal, aspectos de valoração da pessoa em seu meio, como a reputação ou consideração social.

Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, Novo Curso de Direito Civil, Obrigações, 12 ª, volume II, Editora Saraiva, pp. 328 e 329, fornecem este conceito para o dano moral:

“... uma lesão a bens e interesses jurídicos imateriais, pecuniariamente inestimáveis, a exemplo da honra, da imagem, da saúde, da integridade psicológica etc.”

A Constituição Federal, art. 5º, V e X, reconhece como direitos fundamentais a “intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas” e a reparação do dano moral sofrido. O Código Civil dispôs, de modo expresso, que “os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária.”, art. 11, sendo inviolável a vida privada da pessoa...

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