Acórdão nº 50071771920218210038 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeira Câmara Criminal, 07-07-2022

Data de Julgamento07 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50071771920218210038
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002278435
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

1ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5007177-19.2021.8.21.0038/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5007177-19.2021.8.21.0038/RS

TIPO DE AÇÃO: Associação para a produção e tráfico e condutas afins (Lei 11.343/06, art. 35)

RELATORA: Juiza de Direito ANDREIA NEBENZAHL DE OLIVEIRA

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

APELADO: IVANDRO DE JESUS DA SILVA ABREU (RÉU)

ADVOGADO: JOAO FERNANDO ANTUNES OSORIO (OAB RS070317)

TESTEMUNHA: CACIANE VARELA BOEIRA (TESTEMUNHA)

TESTEMUNHA: CLEO GOBETTI (TESTEMUNHA)

TESTEMUNHA: ELIANE ALVES DA SILVA (TESTEMUNHA)

TESTEMUNHA: ELTON SUBTIL BORGES (TESTEMUNHA)

TESTEMUNHA: EVERSON FELIPE WROBEL (TESTEMUNHA)

TESTEMUNHA: FERNANDA FÃO DA ROSA DOS SANTOS - PM (TESTEMUNHA)

RELATÓRIO

Cuida-se de apelações interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO e por IVANDRO DE JESUS DA SILVA ABREU, irresignados com a sentença que, julgando parcialmente procedente a ação penal, condenou o último, como incurso nas sanções do artigo 33, caput, da Lei n.º 11.343/06, agravado pelo artigo 61, I, do Código Penal, à pena privativa de liberdade de 06 anos de reclusão, no regime fechado, e ao pagamento de 600 dias-multa, à razão de 1/30 do salário-mínimo vigente à época do fato.

Narra a denúncia:

“No período compreendido entre o dia 07 de julho de 2021 e o dia 1º de setembro de 2021, na Rua Vitória, nº 344, bairro Vitória, em Vacaria/RS, o denunciado IVANDRO DE JESUS DA SILVA ABREU adquiriu, vendeu, expôs à venda, ofereceu, teve em depósito, transportou e trouxe consigo, para fins de tráfico, no endereço antes informado, as substâncias entorpecentes conhecidas como crack à base de cocaína e cocaína, conforme Auto de Apreensão, Laudos de Constatação, Laudo Pericial nº 226831/2021 e Laudo Pericial nº 226833/2021; substâncias que causam dependência física ou psíquica, sem autorização e em desacordo com a determinação legal e regulamentar, uma vez que de uso proscrito no Brasil (Portaria n° 344/98 – SVS/MS).

Na oportunidade, a Brigada Militar estava recebendo informações de que o denunciado, apontado como foragido do PEV - Presídio Estadual de Vacaria/RS em razão de condenação por latrocínio, estaria escondido no endereço antes mencionado e traficaria drogas no imóvel. Diante da veracidade do informe, uma guarnição da Brigada Militar aproximou-se para observação e reconhecimento do local, momento em que o denunciado estava à frente da residência e, ao perceber a aproximação dos Policiais Militares, deslocou-se furtivamente para os fundos do terreno, passando para o imóvel limítrofe pertencente a um indivíduo conhecido como 'Levino', claramente tentando o acusado ocultar-se à ação policial. Ao perceber que seria cercado, o denunciado tentou fugir, sendo, contudo, alcançado e detido pelos Servidores. Durante a fuga, o denunciado dispensou um invólucro em forma de pacote, que continha 06 (seis) volumes em forma de 'buchas de cocaína', que estavam embaladas e prontas para a revenda, e 01 (um) volume em forma de 'pedra de crack'.

O denunciado é reincidente (Processo nº 03820700020219) e cumpria pena no regime semiaberto, estando em gozo de saídas temporárias e trabalho externo desde o dia 06 de julho de 2021, sendo considerado foragido do Sistema Prisional a partir de 07 de agosto de 2021.

As drogas apreendidas em poder do denunciado foram avaliadas em R$ 75,00 (setenta e cinco reais).

Em poder do denunciado também foram apreendidos:

a) a quantia em dinheiro de R$ 30,00 (trinta reais);

b) 02 (dois) telefones celulares.

O delito era praticado nas imediações do ginásio de esportes do Bairro Vitória”.

Em razões, o Ministério Público postula a reforma da sentença apenas no que tange ao afastamento da majorante prevista no inciso III do artigo 40 da Lei nº 11.343/2006, "em razão que a incidência de tal causa de majoração, notadamente de natureza objetiva, restou evidenciada nos autos", basicamente porque o fato de o réu manter ponto de tráfico de drogas nas imediações do ginásio de esportes do Bairro Vitória evidencia o propósito de atrair o público infanto-juvenil". Pede o provimento do recurso quanto ao ponto.

De seu turno, em longo arrazoado, o acusado, por meio de defesa constituída, em primeiro lugar, suscita preliminar de nulidade do feito por cerceamento de defesa, em face do indeferimento de realização de exame toxicológico no réu. Também em prefacial, sustenta a nulidade da prova porque os bens apreendidos não teriam sido acondicionados em recipientes lacrados, como de rigor, a fim de preservar a cadeia de custódia. Depois, no mérito, discorrendo sobre a prova e repassando cada depoimento contido nos autos, alega insuficiência probatória a embasar a procedência da denúncia, postulando absolvição. Em pedido alternativo, pede pena-base no mínimo legal, seja deferida a suspensão da pena, que seja aplicada a redução máxima prevista no § 4º art. 33 da Lei n.º 11.343/2006, deferimento da assistência judiciária gratuita, isenção da multa ou reduzido o quantum, afastadas as custas processuais e detração.

Com as contrarrazões, o Ministério Público opina pelo desprovimento do recurso defensivo e provimento do recurso ministerial.

É o relatório.

VOTO

Conheço dos apelos, porque preenchem os pressupostos de admissibilidade recursal.

Examino, inicialmente, o recurso defensivo, porque mais abrangente.

De logo, rejeito as prefaciais, suscitadas pela defesa, na linha do entendimento exposto na sentença.

A primeira delas, nulidade do feito por cerceamento da defesa, diante do indeferimento da realização de exame toxicológico, não prospera, já que somente é obrigatória a realização de exame de dependência química quando houver fundada dúvida sobre a sanidade mental do réu ou sua capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de se determinar de acordo com esse entendimento, hipóteses que não se verificam nos autos.

Para além disso, cabe ao magistrado decidir o deferimento ou indeferimento da produção de novos elementos de prova no curso da instrução, sopesando sua real necessidade, em decisão fundamentada. No caso dos autos, o juiz indeferiu o pedido por entendê-lo impertinente e desnecessário ao deslinde do feito, em evidente acerto, diante da inaptidão do referido exame para fins de alteração do enquadramento típico do fato.

Sobre isso, precedente do egrégio STJ:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS COUS. SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. NÃO CABIMENTO. TRÁFICO DE DROGAS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. NULIDADE. EXAME TOXICOLÓGICO. ALEGADO CERCEAMENTO DE DEFESA. INDEFERIMENTO DE PRODUÇÃO DE PROVA. NÃO CONFIGURAÇÃO. HABEAS COUS NÃO CONHECIDO. (...) II - Embora ao acusado no processo penal assista o direito à produção de prova, o Magistrado tem discricionariedade para indeferir, motivadamente, aquelas que reputar protelatórias, irrelevantes ou impertinentes, devendo a sua imprescindibilidade ser devidamente justificada pela parte, o que não ocorreu na hipótese. III - As instâncias ordinárias, soberanas na análise dos fatos e provas, concluíram que o acervo probatório era suficiente para embasar a negativa do exame de dependência toxicológica. Para modificar tal conclusão seria necessário o aprofundado exame do conteúdo da ação penal, providência que, sabidamente, é inviável na via estreita do habeas corpus. Habeas corpus não conhecido. (HC 521.812/SP, Rel. Ministro LEOPOLDO DE ARRUDA RAPOSO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/PE), QUINTA TURMA, julgado em 01/10/2019, DJe 11/10/2019).

Descabida, igualmente, a segunda prefacial, que busca a declaração de nulidade diante da quebra da cadeia de custódia da droga apreendida.

Busca-se, com a cadeia de custódia, possibilitar o acompanhamento e verificação do caminho percorrido pela substância a ser periciada, no intuito de garantir a idoneidade do material apreendido. No presente caso, não há sequer indícios de que a prova não tenha seguido todo o caminho cronológico, desde sua obtenção através da apreensão, entrega à Autoridade Policial, encaminhamento para perícia, até a análise pelo Magistrado, a teor do que dispõe o art. 158 do Código de Processo Penal. Não há menor demonstração de possível interferência, manipulação indevida ou adulteração do material apreendido durante o trâmite processual que possa levar à imprestabilidade.

Além disso, não há notícias de que tenha sido negado à Defesa acesso aos procedimentos utilizados.

Como sabido, para o reconhecimento de nulidades no processo penal deve haver efetiva demonstração de prejuízo à parte. Nesse toar, se não demonstrado o efetivo prejuízo, tampouco afronta aos princípios da ampla defesa e do contraditório, mantém-se o ato, porque atingido sua finalidade.

A respeito, o STJ:

"AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS COUS. TRÁFICO DE DROGAS. ABSOLVIÇÃO.QUEBRA DE CADEIA DE CUSTÓDIA. NÃO CONFIGURAÇÃO.1. O instituto da quebra da cadeia de custódia refere-se à idoneidade do caminho que deve ser percorrido pela prova até sua análise pelo magistrado, e, uma vez ocorrida qualquer interferência durante o trâmite processual, esta pode resultar na suaimprestabilidade.2. Não se trata, portanto, de nulidade processual, senão de uma questão relacionada à eficácia da prova, a ser vista em cada caso.Não é o que se tem no caso dos autos, em que não houve comprovação por parte da defesa acerca de qualquer adulteração no iter probatório.3. Agravo regimental improvido" (AgRg no HC 665948 / MS, Min. Olindo Menezes - Des. Convocado TRF 1ª Região - Sexta Turma, j. em 24/08/2021).

Rejeitadas as preliminares, passo ao exame do mérito.

Conforme a denúncia, o apelante adquiriu, vendeu, expôs à venda, ofereceu, teve em depósito, transportou e trouxe consigo 06 porções de cocaína, pesando com embalagem 0,96 gramas, e 02 porções de crac...

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