Acórdão nº 50074920320178210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Criminal, 20-06-2022

Data de Julgamento20 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50074920320178210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSegunda Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002204661
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5007492-03.2017.8.21.0001/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5007492-03.2017.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Homicídio qualificado (art. 121, § 2º)

RELATORA: Desembargadora GISELE ANNE VIEIRA DE AZAMBUJA

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (AUTOR)

APELANTE: ADEMIR JOSE DOS SANTOS (ACUSADO)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia contra ADEMIR JOSÉ DOS SANTOS, dando-o como incurso por duas vezes, nas sanções do artigo 121, §2°, incisos I (motivo fútil) e VI (recurso que dificultou a defesa da vítima), na forma do artigo 14, inciso II, do Código Penal; e do artigo 121, §2°, incisos IV (recurso que dificultou a defesa da vítima) e VI (contra mulher), combinado com o §7°, inciso III (presença de descendentes), na forma do artigo 14, inciso II, combinado com o artigo 69, caput, do Código Penal, pela prática dos seguintes fatos delituosos (evento 4, DENUNCIA1 e evento 4, TESTEMUNHAS2):

FATOS 1 a 3:

"No dia 26 de agosto de 2017, por volta das 20h52min, na Rua Dr. Telmo Vergara, n° 281, Complemento 203, Vila Intercap, Bairro Partenon, em Porto Alegre, RS, o denunciado ADEMIR JOSÉ DOS SANTOS, mediante disparos de arma de fogo (apreendida – fl. 27), tentou matar a vítima MARIA TERESA OLIVEIRA SOUSA, somente não consumando o desiderato criminoso por circunstância alheia a sua vontade, visto que não logrou êxito em acertá-la.

Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar acima descritas, o acusado ADEMIR JOSÉ DOS SANTOS, desferindo disparo de arma e fogo (apreendida – fl. 27), tentou matar a vítima LUAN SOUSA DOS SANTOS, somente não consumado o desiderato criminoso por circunstância alheia a sua vontade, visto que não logrou êxito em acertá-la.

Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar acima descritas, o acusado ADEMIR JOSÉ DOS SANTOS, desferindo disparo de arma de fogo (apreendida – fl. 27), tentou matar a vítima MARILIANE SOUSA DOS SANTOS, somente não consumando o desiderato criminoso por circunstância alheia a sua vontade, visto que não logrou êxito em acertá-la.

O acusado, quanto às vítimas LUAN e MARILIANE SOUSA DOS SANTOS, cometeu os crimes impelidos por motivo fútil, tão somente em razão de terem interferido em favor da mãe, frente ao disparo perpetrado contra MARIA TERESA.

O denunciado cometeu os crimes valendo-se de recurso que dificultou a defesa das vítimas, visto que, em horário de repouso noturno, no interior do imóvel residencial, onde se sentiam seguras, inesperadamente, passou a desferir-lhes disparos de arma de fogo.

O acusado, quanto a MARIA TERESA, cometeu o crime contra mulher, por razões da condição de sexo feminino, envolvendo violência doméstica e menosprezo e discriminação à condição de mulher.

O denunciado cometeu o crime na presença de descendentes da vítima MARIA TERESA, a saber, LUAN e MARILENE SOUSA DOS SANTOS.

Na ocasião, o acusado estava em sua residência, discutindo e ameaçando as vítimas, seus familiares, até que, em dado momento, com animus necandi, ou, no mínimo, assumindo o risco de causar-lhes a morte, em razão do modus operandi e, notadamente, ante o fato de não ter visão, efetuou disparos de arma de fogo na direção da vítima MARIA TERESA, sem acertá-la. Em ato subsequente, as vítimas MARILIANE e LUAN tentaram interferir, sendo que LUAN tentou apanhar o resolver do denunciado, oportunidade em que o denunciado realizou outro disparo, contudo, não restando êxito em acertá-las. Acionados, os Policiais Militares compareceram ao local dos fatos, onde apreenderam a arma de fogo e prenderam o acusado em flagrante delito, levando-o até Autoridade Policial para lavratura do auto.”

A denúncia foi recebida em 15/12/2017 (evento 4, DESP13).

O acusado foi pessoalmente citado (evento 4, OUT - INST PROC14, fl. 09) e apresentou resposta à acusação através da Defensoria Pública (evento 4, DEFESA PRÉVIA15).

Durante a instrução processual, foram ouvidas as vítimas Maria Teresa e Marilene, as testemunhas e interrogado o acusado (evento 4, OUT - INST PROC29, fl. 15, evento 4, TERMOAUD30, evento 4, ÁUDIO37, evento 4, ÁUDIO38, evento 46, TERMOAUD1 e evento 52, TERMOAUD1).

Encerrada a instrução, o Ministério Público em alegações orais postulou a pronúncia do acusado e a defesa apresentou memoriais requestando impronúncia. Subsidiariamente, pugnou pela desclassificação do delito ou a expunção das qualificadoras e da majorante (evento 52, TERMOAUD1 e evento 55, ALEGAÇÕES1).

Em 15/12/2021, sobreveio decisão, de lavra da Drª. Cristiane Busatto Zardo, pronunciando o acusado Ademir José dos Santos, como incurso nas sanções do artigo 121, §2°, inciso VI (contra mulher), combinado com o §7°, inciso III (presença de descendentes), na forma do artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal e o absolvendo, com fundamento no artigo 415, inciso I, do CPP, quanto ao segundo e terceiro fatos descritos na denúncia (evento 57, SENT1).

A defesa interpôs Recurso em Sentido Estrito (evento 69, PET1). Em suas razões, requestou a despronúncia. Subsidiariamente, pugnou a desclassificação ou o afastamento da majorante (evento 86, RSE1).

O Ministério Público apelou tempestivamente (evento 79, APELAÇÃO1). Arrazoando, susnteou haver prova da materialidade e estarem presentes indicícios suficientes de autoria, requerendo seja o acusado pronunciado também quanto ao segundo e terceiro fatos nos termos da denúncia (evento 92, RAZAPELA1).

As partes apresentaram contrarrazões (evento 91, CONTRAZ1 e evento 95, CONTRAZ1), a decisão foi mantida (evento 95, CONTRAZ1) e os autos foram remetidos a esta Corte.

Nesta instância, o ilustre Procurador de Justiça, Dr. Keller Dornelles Clós, firmou parecer opinando pelo provimento do apelo ministerial e improvimento do recurso defensivo (evento 7, PARECER1).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Antes de adentrar ao conhecimento dos recursos, esclareço que estou julgando no mesmo momento a apelação ministerial requestando a pronúncia, nos termos da denúncia e defensivo pugnando a despronúncia, uma vez que o sistema Eproc não admite a separação com a atribuição de números diversos para cada recurso.

Dessa forma, não há outro caminho que não o julgamento conjunto.

Feitas tais considerações, conheço dos recursos, uma vez que adequados e tempestivos.

O Ministério Público, apelou visando a reforma da decisão no ponto que absolveu o acusado Ademir José quanto ao segundo e terceiro fatos, com fulcro no artigo 415, inciso I, do CPP.

E a defesa de Ademir José recorreu de sua pronúncia.

A decisão recorrida, de lavra da Drª. Cristiane Busatto Zardo, foi fundamentada nos seguintes termos:

"A prova da materialidade dos delitos perpetrados contra as vítimas MARIA TERESA OLIVEIRA SOUSA, LUAN SOUSA DOS SANTOS e MARILIANE SOUSA DOS SANTOS, uma vez que tentativas incruentas, restam demonstradas pela prova oral colhida e pelo auto de apreensão (fl. 27).

Trata-se de fase de pronúncia, em que impera o princípio do in dubio pro societate, que decorre da competência constitucional do Conselho de Sentença para a análise dos crimes dolosos contra a vida. Decorre disso, também, a circunstância de que é vedado ao juiz togado exame aprofundado da prova, para não comprometer a convicção dos jurados, bem como que qualquer dúvida quanto ao dolo, autoria ou excludente de ilicitude, resolver-se-á com a remessa do processo ao seu juízo natural.

Considerando tais premissas, passo ao exame da prova.

Ao ser interrogado em juízo, o réu ADEMIR negou a imputação que lhe foi feita, alegando ter efetuado um disparo para o chão porque seu filho estava lhe agredindo, tentando se defender da agressão. Declarou ter efetuado mais dois disparos acidentais, pois sua filha estava puxando a arma de sua mão. Referiu que não tinha a intenção de matá-los, somente estava se defendendo da agressão de seu filho: I: Não, não atirei contra ela, eu só revidei porque o meu filho me agrediu. Eu já era cego, semi-cego, tinha 3% de visão. Aí o meu filho achou que eu estava brigando com ela e ele empurrou a porta por cima de mim, eu caí em volta da cama, caí sentado entre a cama e o guarda roupa, levantei me apoiando, botei a mão em cima da arma que estava no guarda roupa, peguei e dei um tiro pro chão, não foi nele. Dobrei a mão e dei um tiro no chão porque ele veio por cima de mim, eu achei que ele ia me bater me chamando de velho safado sem vergonha. Foi isso que aconteceu...” (evento 52).

A prova oral produzida, no entanto, autoriza a pronúncia do acusado, com os elementos suficientes de autoria necessários à fase de pronúncia.

A vítima MARIA TERESA OLIVEIRA DE SOUZA, em juízo, referiu que é casada com o acusado há 27 anos e que na ocasião dos fatos, após uma discussão, Ademir pegou o revólver e apontou em sua direção, efetuando dois disparos, mas em razão de sua deficiência visual, errou a pontaria. Referiu que seu filho Luan se meteu na briga, pois viu que Ademir atiraria contra a depoente, referindo que Ademir também tentou atirar em Luan, mas errou a pontaria. Negou que o acusado tenha atirado contra a filha Marilene. Mencionou que após Ademir ficar cego, ele ficou em depressão e esse foi o único episódio de agressão por parte do acusado.

Por ocasião do flagrante, informou que um tiro foi em sua direção, então, seu filho interveio, tentando imobilizar o acusado, quando, então, ocorreu o segundo disparo (fl. 19)

A vítima MARILIANE SOUSA DOS SANTOS, filha do acusado, em juízo, narrou que na ocasião do fato seu pai estava discutindo com sua mãe e tentou agredi-la, momento em que interferiu, tendo sua mãe saído de casa. Referiu que após esse primeiro momento, conversou com seu pai e o acalmou, tendo Ademir pedido para chamar Maria para...

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