Acórdão nº 50075646020178210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Nona Câmara Cível, 07-12-2022

Data de Julgamento07 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50075646020178210010
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoNona Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003037109
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

9ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5007564-60.2017.8.21.0010/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por Dano Moral

RELATOR: Desembargador EDUARDO KRAEMER

APELANTE: LILIAN CANABARRO BARRIOS (AUTOR)

APELANTE: MIGUEL CANABARRO BARRIOS DE OLIVEIRA PEREIRA (AUTOR)

APELADO: MUNICÍPIO DE CAXIAS DO SUL (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por LILIAN CANABARRO BARRIOS e MIGUEL CANABARRO BARRIOS DE OLIVEIRA PEREIRA, menor, representado pela primeira, inconformados com a sentença (Evento 75 – SENT1, origem) que julgou improcedente a ação de indenização por danos morais ajuizada em face do MUNICÍPIO DE CAXIAS DO SUL.

Em suas razões (Evento 79 – APELAÇÃO1, origem), refutam o entendimento da sentença a quo de que inexistiram provas acerca dos danos morais experimentados, sustentando estar a conclusão em desacordo com as provas acostadas aos autos. Nesse sentido, afirmam que a testemunha Marcos Dal Bosco não poderia ter seu depoimento acolhido sem as ressalvas feitas em sede de memoriais, uma vez que se trata do autor dos danos alegados na exordial. Enfatizam que ele ratificou os fatos e a existência do Boletim de Ocorrência que acarretou na sua intimação para depor junto à autoridade policial, bem como que foi obstinado em fornecer informações não autorizadas pelo magistrado, elementos que vindicam sejam considerados para fins de valoração. Ainda, reforçam que a imprudência e a imperícia na conduta do profissional também foram confirmadas em seu depoimento, razão pela qual defendem o dever de indenizar do apelado. Registram que, conquanto não tenham resultado danos estéticos, os prejuízos à dignidade do infante restaram evidentes, assim como o episódio no qual o agente público teria chutado o balde de lixo e arremessado objeto contra a janela durante o atendimento. Assim, postulam a reforma da sentença para condenar o apelado ao pagamento de indenização por danos morais em montante não abaixo de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), acrescido de juros e correção monetária, bem como ao pagamento de honorários de sucumbência. Requerem o provimento do recurso.

Foram apresentadas contrarrazões (Evento 82 – CONTRAZAP1, origem).

Instado a se manifestar neste grau de jurisdição, o Ministério Público opina pelo desprovimento do recurso (Evento 7 – PARECER1, autos do segundo grau).

Registro terem sido cumpridas as formalidades dos artigos 931 e 934, do CPC/2015, considerando a adoção do sistema informatizado por este Tribunal (Ato n° 24/2008-P).

É o relatório.

VOTO

Recebo o recurso porquanto preenchidos os requisitos de admissibilidade.

Adoto, de início, o relatório da sentença para uma melhor compreensão da controvérsia, o qual passo a transcrevê-lo:

LILIAN CANABARRO BARRIOS e MIGUEL CANABARRO BARRIOS DE OLIVEIRA PEREIRA, menor reperesentado pela genitora, ajuizamação de indenização por danos morais e materiais em face do MUNICÍPIO DE CAXIAS DO SUL e MARCOS DAL BOSCO. Aduziram que, em consulta odontológica em 22/06/2016, na Unidade Básica de Saúde, localizado na rua Pinheiro Machado, 1258, no momento da anestesia, o autor Miguel teve a bochecha perfurada pela seringa e que, na sequência, o profissional Marcos teria proferido insultos contra os autores, bem como teria jogado a seringa no chão e chutado a lixeira. Mencionaram que, após o ocorrido, foram ao Postão realizar exame de HIV. Requereram a procedência do pedido, com a condenação solidária dos réus ao pagamento indenizatório a título de danos morais no valor de R$ 30.000,00. Pediram a gratuidade judiciária e juntaram documentos (evento 1).

O benefício postulado foi deferido (evento 2- fl. 28).

Citado, o Município ofereceu contestação (evento 2- fls. 37/45). Disse que a criança realizou movimento brusco com a cabeça, o que provocou a perfuração. Referiu que corretamente o profissional adotou todas as medidas possíveis levando a criança em seu próprio veículo para teste de HIV, que resultou não reagente. Defendeu que o agir do profissional está em conformidade com os padrões adotados quando ocorrem acidentes com material biológico. Salientou dano inexistente Rechaçou o pedido indenizatório por danos morais e pediu ao final a improcedência do pedido. Acostou documentos (fls. 27/38).

O demandado Marcos contestou às fls. 05/14 (evento 2- Instrução Processual 6). Em preliminar, arguiu ilegitimidade passiva. No mérito, aduziu que a picada da agulha é risco do serviço, que é de meio e não de resultado. Não há prova da má prestação do serviço, bem como dos danos morais alegados. Pediu a improcedência do pedido, caso não acolhida a preliminar.

Houve réplica (evento 2- Instrução 6).

Em despacho saneador, acolhida a preliminar arguida pelo demandado Marcos (evento 2- Instrução 7).

Designada audiência de instrução e julgamento, inquiridas duas testemunhas arroladas pela parte demandada. Encerrada a instrução, as partes apresentaram memoriais escritos, reiterando suas anteriores manifestações (eventos 67 e 68).

O Ministério Público exarou parecer pela parcial procedência do pedido (evento 72).

Os autos vieram conclusos para julgamento.

Pois bem.

Afasto, de início, a prefacial suscitada no recurso referente ao depoimento prestado por Marcos, o agente comunitário de saúde que realizou o atendimento odontológico ao menor.

A assertiva de que a testemunha deveria ter sido ouvida com ressalvas, justamente por ser o causador do dano pretendido reparar, não se sustenta, notadamente porque esta alegação se exibe manifestamente extemporânea.

Como é consabido, a contradita deverá ser realizada antes do depoimento, nos termos do artigo 457, § 1º1, do CPC, de modo que esta questão se encontra preclusa.

Na questão de mérito propriamente dita, levando-se em consideração que o atendimento odontológico foi prestado junto ao Sistema Único de Saúde, através da disponibilização de recursos púbicos colocados à disposição da população, a responsabilidade aplicável é a de natureza objetiva, a teor do artigo 37, § 6º2, da Carta Federal.

Contudo, a responsabilidade objetiva não dispensa a demonstração do nexo de causalidade entre a conduta do agente e o evento danoso, a ensejar o reconhecimento do dever de indenizar. Nesse passo, necessária a comprovação do dano e do nexo causal, conforme as regras de distribuição do ônus da prova do art. 373 do Código de Processo Civil.

Nesse sentido:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS E ESTÉTICOS. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO AGENTE PÚBLICO RECONHECIDA DE OFÍCIO. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA AFASTADA. ERRO MÉDICO. ALEGAÇÃO DE ERRO NO DIAGNÓSTICO DE APENDICITE E NEGLIGÊNCIA MÉDICA POR ALTA HOSPITALAR PRECOCE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE IMPERÍCIA OU NEGLIGÊNCIA MÉDICA. DEVER DE INDENIZAR INEXISTENTE. 1. Ilegitimidade passiva do agente estatal. Princípio da dupla garantia. Não se pode admitir que o médico que atendeu a autora figure no polo passivo da demanda sob pena de infringir a dupla garantia consagrada no art. 37, § 6º, da CF, consoante entendimento preconizado pelo STF no RE nº 327.904/SP, segundo a qual se deve garantir ao administrado a responsabilização objetiva do ente público e, por outro lado, ao servidor estatal que somente responda perante a pessoa jurídica a cujo quadro funcional se vincular. Exclusão do corréu Odécio Paulo Ferreira da lide, de ofício. 2. Cerceamento de defesa. Não há falar em nulidade da sentença quando não suscitada a suspeição do auxiliar do juízo oportunamente, nem em razão da ausência de respostas se não formulada a quesitação complementar no momento oportuno do procedimento. Da mesma forma, não é inconclusivo o laudo que apresenta respostas contrárias ao defendido pela parte. 3. Natureza da responsabilidade da instituição hospitalar. A responsabilidade do hospital que atende o paciente pelo SUS é objetiva, incidindo no presente caso o disposto no art. 37, § 6º, da CF. Necessário, no entanto, para que seja responsabilizado por alegado erro médico que reste demonstrada conduta desidiosa, negligente ou imperita do profissional que tratou o paciente. 2. Caso dos autos, no entanto, em que restou demonstrado pelo contexto probatório que a alta da autora quatro dias depois da realização de apendicectomia não foi precoce, mas adequada diante da evolução de seu quadro clínico. Cirurgias subsequentes que não decorrem de erro médico ou de diagnóstico, mas de complicações esperadas em razão de reação do próprio organismo. Cicatrizes que decorreram das intervenções por que teve de se submeter a autora que são atribuíveis ao seu crescimento e tipo de pele. Inexistência, portanto, de erro no atendimento à paciente e, consequentemente, ausente o dever de indenizar. Sentença de improcedência mantida. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO AGENTE PÚBLICO DECLARADA DE OFÍCIO, PRELIMINAR REJEITADA E APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70075555227, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Eduardo Richinitti, Julgado em 22/11/2017)

RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. INTERVENÇÃO CIRÚRGICA. INFECÇÃO HOSPITALAR. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DEVER DE INDENIZAR. A doutrina distingue duas hipóteses de responsabilização médica: a responsabilidade decorrente da prestação do serviço direta e pessoalmente pelo médico como profissional liberal, e a responsabilidade médica decorrente da prestação de serviços médicos de forma empresarial, aí incluídos os hospitais. No caso concreto, trata-se de responsabilidade médica empresarial, uma vez que a autora moveu a ação contra o Hospital. Hipótese em que a autora se submeteu à procedimento cirúrgico, apresentando infecção hospitalar após a cirurgia (meningite bacteriana). A prova coligida aos autos foi categórica ao concluir pela ocorrência da...

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