Acórdão nº 50078354220178210019 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Cível, 15-12-2022

Data de Julgamento15 Dezembro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50078354220178210019
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSegunda Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003090531
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5007835-42.2017.8.21.0019/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por Dano Moral

RELATORA: Desembargadora LAURA LOUZADA JACCOTTET

APELANTE: MUNICÍPIO DE NOVO HAMBURGO (RÉU)

APELADO: GILMAR ADAIR PORTO (AUTOR)

APELADO: TATIANE CELOI PORTO (AUTOR)

APELADO: TERESINHA BEATRIZ PORTO (AUTOR)

APELADO: LUIS ENRIQUE DONA PORTUGUEZ (AUTOR)

APELADO: MICHELE TAINARA PORTO DE CAMPOS (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de recursos de apelação interpostos por GILMAR ADAIR PORTO, TATIANE CELOI PORTO, TERESINHA BEATRIZ PORTO, MICHELE TAINARA PORTO, LUIS HENRIQUE PORTO e MUNICÍPIO DE NOVO HAMBURGO, nos autos da ação movida em face do ente municipal, contra a sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos da inicial, nos seguintes termos:

Em suas razões, os demandantes defendem, em suma, a necessidade de majoração do quantum indenizatório fixado a título de danos morais. Nesse sentido, aduzem que a condenação imposta ao apelado não satisfaz a pretensão dos recorrentes de serem reparados pelo abalo moral sofrido em decorrência dos fatos narrados na petição inicial. Além disso, não serve para alcançar o efeito educativo desejado, de modo a servir de advertência e evitar a reiteração de acontecimentos da espécie. Sinalam o sofrimento e o abalo experimentado em consequência do extravio dos restos mortais de seus familiares, sepultados nas dependências do cemitério municipal administrado pelo demandado. Pedem, também, a majoração dos honorários advocatícios de sucumbência. Requerem, nesses termos, o provimento do recurso.

O ente municipal, por sua vez, sustenta a não caracterização de danos morais passíveis de indenização, porquanto devidamente identificado o local em que, atualmente, se encontram alocados os restos mortais dos familiares dos autores, os quais estariam em jazigo que, anos atrás, teria sido utilizado para o sepultamento de outros parentes dos demandantes. Ainda, colaciona julgados e postula a redução do valor da indenização, porquanto discrepante de precedentes mais graves já apreciados por este Tribunal. Postula, assim, o acolhimento da inconformidade.

Houve contrarrazões.

O Ministério Público exarou parecer requerendo diligências e opinando, no mérito, pelo desprovimento de ambos os apelos.

Em seguida, vieram os autos conclusos para julgamento.

VOTO

GILMAR ADAIR PORTO, TATIANE CELOI PORTO, TERESINHA BEATRIZ PORTO, MICHELE TAINARA PORTO e LUIS HENRIQUE PORTO ajuizaram o presente feito em face do MUNICÍPIO DE NOVO HAMBURGO, buscando, em síntese, compelir o ente municipal à localização e à entrega de ossadas de familiares sepultadas no cemitério municipal, bem como condenar o demandado à reparação dos danos morais experimentados em consequência do extravio dos referidos restos mortais.

O juízo da instância de origem, conforme relatado, acolheu parcialmente a pretensão inicial.

Inconformadas, recorrem ambas as partes.

De início, deve ser afastada a preliminar invocada pelo representante do Ministério Público em parecer, quanto à (in)competência interna desta Câmara para julgamento da causa, considerando que os pedidos autorais não estão limitados ao pleito indenizatório por danos morais, havendo, também, pedido de obrigação de fazer (entrega de ossadas de familiares aos autores).

Assim, para fins de determinação da distribuição interna e julgamento no âmbito deste Tribunal, a demanda não se enquadra na classificação "Responsabilidade Civil", mas, sim, em "Direito Público Não Especificado", matéria afeita à competência deste órgão fracionário.

Pois bem. Dito isso, parto ao exame das teses recursais.

Quanto à alegação prejudicial do ente municipal de que teria havido a implementação de prazo prescricional anteriormente à propositura da ação, não merece amparo a irresignação.

O contexto fático e probatório constante do processo demonstra que somente no ano de 2012 os demandantes tomaram conhecimento de que teria havido a remoção indevida e para local incerto dos restos mortais de seus familiares que estavam sepultados no cemitério municipal de Novo Hamburgo e, já no ano de 2015, intentaram ação idêntica à presente perante o Juizado Especial Cível.

Naquela seara, o feito restou julgado extinto pela necessidade de realização de prova pericial. Na sequência, em 2017, a ação restou aforada perante a justiça comum.

Não se cogita, portanto, de plano, de prescrição.

No mais, adentrando ao mérito da discussão travada nos autos, denota-se a ausência de controvérsias quanto ao fato de que os falecidos João Leonel Porto e Luis Carlos Porto, familiares dos demandantes, foram sepultados nas dependências do cemitério municipal de Novo Hamburgo, ocupando, em um primeiro momento, jazigo arrendado pela família, em caráter temporário (n. 446).

O demandado também não impugnou especificamente a alegação dos autores de que, por volta do ano de 2011, adquiriram um jazigo perpétuo, identificado como n. 20, no bloco 10 daquele cemitério, passando, a partir de então, a realizar os pagamentos periódicos referentes à aquisição. E, a partir da compra dessa área permanente, deveria haver, com a ciência e presença dos familiares, a exumação dos restos mortais e posterior translado.

Ocorre que os demandantes foram surpreendidos, no ano de 2012, com conduta unilateral adotada pelos funcionários do cemitério: houve a remoção e a transferência das ossadas de João Leonel e Luis Carlos sem o consentimento/acompanhamento da família. Mais: o translado dos restos mortais fora realizado para jazigo cuja identificação era incerta.

Para agravar a situação, no jazigo perpétuo adquirido pelos autores foram alocados restos mortais de terceiros desconhecidos, o que ensejou, por ocasião da constatação das irregularidades, a necessidade de que os autores, pessoalmente, tentassem reconhecer as ossadas de seus familiares, no próprio cemitério, na presença de prepostos, contexto inegavelmente capaz de gerar abalo psicológico e trazer à tona o sofrimento já antes vivenciado pela perda daqueles familiares.

Aliado a isso, tem-se que o ente municipal sequer conseguiu justificar o equívoco operado, tampouco tendo comprovado, desde logo, a atual localização das ossadas. Aventa-se que hoje estejam alocadas no jazigo n. 30, bloco 10, o qual, como visto, não corresponde ao jazigo adquirido e adimplido pelos autores (n. 20, bloco 10).

De outra parte, ainda que se parta da premissa exposta na sentença, no sentido de que os restos mortais de João Leonel e Luis Carlos estão, de fato, no jazigo n. 30, do bloco 10, não se pode ignorar que tal hipótese somente surgiu depois de anos de tramitação de processo e após os autores terem sido submetidos a uma segunda tentativa de identificação das ossadas, in loco.

Extrai-se dos autos, pois, cenário de descaso para com os familiares dos falecidos, assim como indubitável desídia na condução do cemitério municipal na atividade administrativa de comercialização de jazigos e translados de restos mortais.

Note-se, ao que tudo indica, o jazigo vendido aos autores, de n. 20, no bloco 10, teria sido vendido também a terceiros ("família Anjos"), o que ensejou, durante anos, confusão e incerteza acerca da localização dos restos mortais dos parentes dos autores, cujas ossadas foram removidas do local em que inicialmente estavam alocadas sem conhecimento da família.

A corroborar, colaciono auto de verificação confeccionado por determinação por juízo a quo durante a instrução:

Adicionalmente, verifica-se que o próprio ente municipal trouxe ao processo cópia de e-mail interno da administração em que consta a necessidade de comparecimento de um familiar para o translado de ossadas. Veja-se:

In casu, à luz do que se tem, a chamada dos familiares, previamente à movimentaçao dos restos de João...

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