Acórdão nº 50078989420178210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quinta Câmara Cível, 28-02-2023

Data de Julgamento28 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50078989420178210010
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quinta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002950891
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

25ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5007898-94.2017.8.21.0010/RS

TIPO DE AÇÃO: Contratos Bancários

RELATORA: Desembargadora HELENA MARTA SUAREZ MACIEL

APELANTE: LIVRARIA OCEANO AZUL LTDA (RÉU)

APELANTE: ARCANGELO ZORZI NETO (RÉU)

APELADO: BANCO DO BRASIL S/A (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por LIVRARIA OCEANO AZUL LTDA. e OUTRO contra sentença proferida nos autos da ação que lhe promove o BANCO DO BRASIL S/A.

O dispositivo da sentença atacada foi redigido nos seguintes termos:

Isso posto, ACOLHO PARCIALMENTE OS EMBARGOS opostos por LIVRARIA DO MANECO LTDA E ARCANGELO ZORZI NETO contra BANCO DO BRASIL S.A, para fins de excluir a cobrança de Tarifa de Abertura de Crédito (TAC), Tarifa de Emissão de Carnê (TEC) e Tarifas de Avaliação e Registro, bem como autorizar a compensação de valores, se constatado pagamento superior ao devido, e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação monitória para constituir título executivo judicial em favor do autor o saldo do contrato que instrui a inicial, conforme fundamentação.

Tendo a parte autora/embargada decaído de parte mínima do pedido, as custas processuais serão devidas pelos demandados/embargantes. Ainda, arbitro honorários em 10% sobre o valor da condenação, devidos pela parte embargante/requerida em favor do patrono da parte embargada/autora, de acordo com o artigo 85, § 2º do CPC.

Interposta apelação, intime-se a parte contrária para contrarrazões e, após, remeta-se o processo ao TJ/RS.

Publique-se.

Registre-se.

Intime-se.

Transitada em julgado, baixe-se.

Contra a sentença atacada, foram opostos embargos de declaração que restaram assim decididos:

Vistos.

Recebo os embargos de declaração e os acolho.

Ocorre que o contrato firmado entre as partes previa em sua cláusula quinta que, em caso de inadimplemento, seria exigida comissão de permanência à taxa de mercado do dia do pagamento, em substituição aos encargos de normalidade pactuados. Não havia previsão de utilização da FACP.

No entanto, conforme os extratos acostados aos autos, (Evento 2, PROCJUDIC1 01), houve lançamento do encargo com base na variação do FACP (Fator Acumulado de Comissão de Permanência), debitado e capitalizado mensalmente. Ocorre que a utilização do referido fator revela-se abusiva, porque se desconhece sua fórmula de cálculo, que não decorre de previsão contratual, conferindo vantagem excessiva ao credor na apuração do débito.

Neste sentido:

APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO REVISIONAL. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. É admitida a cobrança da comissão de permanência no período de inadimplência, cujo valor não pode ultrapassar a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato, a qual exclui a exigibilidade dos juros remuneratórios, moratórios e da multa contratual. Súmulas nº 294, 296 e 472 do Superior Tribunal de Justiça. No caso concreto, há utilização do Fator de Acumulação FACP cujo montante não se pode prever, evidenciando flagrante potestatividade. Portanto, a comissão de permanência deverá ser limitada, conforme assentado na sentença recorrida. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. Na forma simples ou pela correspondente compensação é admitida, ainda que ausente prova de erro no pagamento. MINORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA. Impossibilidade. APELO DESPROVIDO.(Apelação Cível, Nº 50019002720178210017, Vigésima Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ana Paula Dalbosco, Julgado em: 24-05-2022)

Assim, consequentemente, reconheço como abusiva a utilização com base na variação do FACP.

Desta forma, o dispositivo sentencial fica com a seguinte redação:

"Isso posto, ACOLHO PARCIALMENTE OS EMBARGOS opostos por LIVRARIA DO MANECO LTDA E ARCANGELO ZORZI NETO contra BANCO DO BRASIL S.A, para fins de excluir a cobrança de Tarifa de Abertura de Crédito (TAC), Tarifa de Emissão de Carnê (TEC) e Tarifas de Avaliação e Registro, afastando a utilização do FACP na comissão de permanência, que não pode ser cumulada com juros remuneratórios, multa, juros de mora e correção monetária no período de inadimplência, bem como autorizar a compensação de valores, se constatado pagamento superior ao devido, e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação monitória para constituir título executivo judicial em favor do autor o saldo do contrato que instrui a inicial, conforme fundamentação."

Dil. Legais.

Insurgiu-se a parte apelante contra a sentença atacada, discorrendo, inicialmente, sobre a abusividade das taxas de juros aplicadas ao contrato. Referiu que no contrato renegociado, assinado no dia 26 de junho de 2012, a taxa mensal de juros restou fixada em 1,596% ao mês, e 20,926% ao ano, enquanto que, no mesmo período, a taxa média divulgada pelo Banco Central foi de 1,19% ao mês, 15,27%. Afirmou ser necessário o afastamento do índice contratual para que seja aplicada a taxa média de mercado. Pugnou pela revisão do contrato, para que seja vedada a capitalização dos juros em patamar inferior ao anual (evento 55).

A parte apelada apresentou contrarrazões (evento 59).

Os autos vieram conclusos.

É o relatório.

VOTO

A interposição dos recursos está adstrita aos pressupostos de admissibilidade, os quais se dividem em extrínsecos e intrínsecos. Por conseguinte, devidamente preenchidos os referidos requisitos, conheço do recurso e passo à análise do mérito.

Juros remuneratórios

Relativamente aos juros remuneratórios estabelecidos nos contratos bancários e sua limitação, trago a lume o teor da Súmula n° 596/STF, que dispõe que: “As disposições do Decreto nº 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional”.

O Egrégio STJ já sedimentou a matéria, no sentido de que a estipulação dos juros remuneratórios em percentual acima de 12% ao ano não indica, necessariamente, abusividade.

Esse posicionamento, inclusive, ensejou a formulação da Súmula 382, in verbis:

A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.

No ponto, cito julgado:

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL. REEXAME DE FATOS, PROVAS E CLÁUSULAS CONTRATUAIS. INADMISSIBILIDADE. LIMITAÇÃO DE JUROS REMUNERATÓRIOS. IMPOSSIBILIDADE. INDICAÇÃO DE ABUSIVIDADE EM RELAÇÃO AOS JUROS MORATÓRIOS. CAPITALIZAÇÃO ANUAL DE JUROS. REVISÃO DE TAXAS DE JUROS REMUNERATÓRIOS. CARACTERIZAÇÃO DA MORA.

1. Ação revisional.

2. O reexame de fatos, provas e cláusulas contratuais em recurso especial é inadmissível.

3. As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33).

4. A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.

5. Admite-se a capitalização anual dos juros nos contratos de mútuo firmado com instituições financeiras, desde que seja expressamente pactuada. Precedentes. 6. É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada (art. 51, §1°, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.

7. O afastamento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) caracteriza a mora.

8. Agravo interno não provido.

(AgInt no AREsp 1419353/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/06/2019, DJe 12/06/2019) (grifei)

Uma vez que aplicável o Código do Consumidor às instituições bancárias, o STJ consolidou o entendimento de que o pacto referente à taxa de juros só pode ser alterado se reconhecida sua abusividade em cada hipótese, uma vez que a pactuação é livre entre as partes. Nesta esteira, há taxa abusiva se constatado que outras instituições financeiras, nas mesmas condições, praticam percentuais bem inferiores ao do contrato objeto de discussão.

Destarte, a limitação dos juros remuneratórios, quando demonstrada a taxa contratada, somente ocorrerá se comprovado que a taxa contratada é superior à taxa média para as operações financeiras similares.

A limitação dos juros remuneratórios, pois, se perfaz medida excepcional, quando demonstrado que a taxa contratada apresenta significativa discrepância em relação à taxa média de mercado. Neste caso, se procederá a limitação com base nas taxas divulgadas e publicadas pelo BACEN, que reflete a média de mercado.

Nesta esteira, o seguinte precedente da Corte Superior:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE. TAXA MÉDIA DE MERCADO. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. REPETIÇÃO DE INDÉBITO.

1. Os juros remuneratórios incidem à taxa média de mercado em operações da espécie, apurados pelo Banco Central do Brasil, quando verificada pelo Tribunal de origem a abusividade do percentual contratado ou a ausência de contratação expressa.

2. Admite-se a capitalização mensal dos juros nos contratos bancários celebrados a partir da publicação da MP 1.963-17 (31.3.00), desde que seja pactuada.

3. É admitida a incidência da comissão de permanência desde que pactuada e não cumulada com juros remuneratórios, juros moratórios, correção monetária e/ou multa contratual.

4. Aquele que recebeu o que não devia deve restitui-lo, sob pena de enriquecimento indevido, pouco relevando a prova do erro no pagamento.

5. Agravo interno no recurso especial não provido.

(AgInt no REsp 1417066/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/03/2018, DJe...

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