Acórdão nº 50079228820188210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Nona Câmara Cível, 30-03-2022

Data de Julgamento30 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50079228820188210010
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoNona Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001676352
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

9ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5007922-88.2018.8.21.0010/RS

TIPO DE AÇÃO: Responsabilidade civil

RELATOR: Desembargador CARLOS EDUARDO RICHINITTI

APELANTE: BRADESCO AUTO/RE COMPANHIA DE SEGUROS (AUTOR)

APELADO: RIO GRANDE ENERGIA SA (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por BRADESCO AUTO/RE COMPANHIA DE SEGUROS em face da evento 4, PROCJUDIC3, fls. 37/40) que, nos autos da ação de regresso proposta contra RIO GRANDE ENERGIA SA, julgou improcedente o pedido, nos seguintes termos:

"(...) Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado por BRADESCO AUTO/RE COMPANHIA DE SEGUROS, em face de RIO GRANDE ENERGIA S.A. - RGE, com fulcro no artigo 487, I do Código de Processo Civil.

Sucumbente, condeno a autora ao pagamento das despesas processuais e de honorários advocatícios ao procurador da requerida, arbitrados em 10% do valor atualizado da causa, na forma do art. 85, §2º do CPC, observados a natureza e a importância da causa, sua pouca complexidade, o trabalho realizado e o tempo de tramitação do feito (...)"

Nas razões (evento 4, PROCJUDIC3, fls. 43/50), faz breve síntese da demanda e afirma que realizou e comprovou o pagamento da indenização securitária a seu segurado, de forma que deve ser considerada legítima para figurar no polo ativo da presente demanda. Aponta que a petição inicial foi devidamente recebida pelo juízo de origem, sem qualquer ressalva e que não lhe foi dada a oportunidade de sanar o vício. Assim, sustenta configurado cerceamento de defesa, mesmo porque o juízo não esclareceu os motivos pelos quais o documento colacionado não foi considerado como prova de pagamento. Pugna pela anulação da sentença, para que seja oportunizada a juntada de novo comprovante de pagamento, se necessário. Alternativamente, postula pela reforma da sentença, para que a demanda seja julgada procedente, de forma a inverter e majorar as verbas sucumbenciais. Requer o provimento a apelação.

Foram apresentadas contrarrazões (evento 4, PROCJUDIC4, fls. 11/15).

Vieram-me conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Recebo o recurso porquanto atendidos seus pressupostos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, comprovado o preparo (evento 4, PROCJUDIC4, fl. 01).

Inicialmente, destaco que, diferente do entendimento exarado pela magistrada a quo, considero a documentação trazida pela parte autora junto à inicial prova suficiente da realização do pagamento ao seu segurado (evento 4, PROCJUDIC2, fl. 13). Dessa forma tenho que, data vênia, a decisão merece reforma.

Nesse sentido, colaciono julgado no qual enfrentei situação análoga:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE REGRESSO DE SEGURADORA. INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS. QUEIMA DE EQUIPAMENTOS ELETROELETRÔNICOS EM LOCAIS DIVERSOS, INDENIZADOS PELA DEMANDANTE EM VIRTUDE DE ALEGADA OSCILAÇÃO DE TENSÃO ELÉTRICA NA REDE DA RÉ. ÔNUS DA SUB-ROGADA EM COMPROVAR O LIAME CAUSAL ENTRE FALHA DO SERVIÇO E OS DANOS QUE INDENIZOU AOS SEUS SEGURADOS, BEM COMO O EFETIVO PAGAMENTO, ESTE ÚLTIMO COMPROVADO EM RELAÇÃO A TRÊS DE UM TOTAL DE QUATRO SINISTROS. AUSENTE RELAÇÃO DE CONSUMO ENTRE COMPANHIA DE SEGURO E CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA. NEXO CAUSAL DEMONSTRADO. PARCIAL PROCEDÊNCIA DO PEDIDO INICIAL. - O simples fato de a seguradora ter adimplido a obrigação que assumiu perante seu contratante em indenizar um risco coberto, em contrapartida do pagamento de um prêmio, não traduz necessariamente que sua pretensão judicial de regresso contra o causador do dano será automaticamente procedente. - Embora a responsabilidade da companhia de luz seja objetiva, é da seguradora o ônus de demonstrar, na instrução do feito, o nexo de causalidade entre o dano suportado e eventual falha de serviço fornecido pela ré. Princípio da distribuição dinâmica do ônus da prova. - A ausência de requerimento administrativo à época do sinistro, perante a concessionária, ou qualquer tipo de comunicação que permitisse a vistoria da unidade e dos prejuízos pela RGE, embora não condicione o pagamento de um seguro tampouco impeça o acesso ao Judiciário, é um risco a ser assumido pela seguradora que não adota tal precaução, dificultando o sucesso da sua produção de prova em uma ação de regresso. - Caso concreto, onde embora tenha restado suficientemente demonstrado durante a regulação do sinistro o nexo causal entre a queima de eletrônicos e a falha do serviço de energia da rede mantida pela ré, a magistrada entendeu pela improcedência dos pedidos em decorrência da ausência de comprovação de pagamento aos segurados. Contudo, a documentação trazida junto à inicial é suficiente para a demonstração do pagamento efetuado a três de um total de quatro segurados, circunstância que somente foi corroborada pelos comprovantes apresentados, ainda que intempestivamente, em sede recursal, pela seguradora, de forma que a sentença de improcedência merece ser reformada. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70079978003, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Eduardo Richinitti, Julgado em 18/12/2018) Grifei.

Assim, a falta de comprovação de pagamento que fundamentou a sentença que julgou improcedente o pedido resta afastada, impondo-se a análise, por este juízo, dos tópicos prejudicados pelo resultado da sentença.

Veja-se que foi oportunizada às partes ampla instrução probatória, com expressa renúncia de ambas à produção de outras provas (evento 4, PROCJUDIC3, fls. 27/33).

Isso posto, passo à controvérsia de fundo, que se cinge à responsabilidade da RGE por estrago de equipamentos (01 condicionador de ar 12000 BTUs Electrolux, 01 condicionador de 9000 BTUs Invert, 01 home theater Philips, 01 Televisor full hd 42" Philips) que teriam sido danificados por oscilação na rede de energia em relação a sinistro ocorrido em 18/01/2018, no município de Palmeira das Missões/RS.

Portanto, esta discussão se dá no bojo de uma ação de regresso da seguradora demandante (BRADESCO AUTO/RE), que, por força da apólice 34154, indenizou seu segurado, MARCIO FIAD LEMOS, no total de R$ 4.894,04, devido à recomposição dos prejuízos; de modo que, com amparo na previsão do artigo 786 do Código Civil e verbete nº 188 da Súmula do STF, a parte autora se sub-rogou no direito que competia a seu segurado em face do causador do dano.

Ainda que até há pouco estivesse entendendo que era necessário diferenciar a relação existente entre consumidor/usuário final do serviço diante da companhia de energia que abastece a sua casa, e, outra – de natureza distinta – a relação existente entre as seguradoras e as companhias de luz e, em consequência, não aplicar a esta última, em favor da sub-rogada, privilégios processuais como a inversão do ônus da prova prevista no CDC, estou revendo meu posicionamento ante a jurisprudência majoritária desta Câmara e do STJ ao interpretar os artigos 349 e 786, caput, do CC1.

Assim, doravante passo a entender que a diferenciação que vinha fazendo não pode subsistir exatamente porque a sub-rogação transfere à seguradora todos os direitos, ações, privilégios e garantias do primitivo credor, sem qualquer ressalva.

Isso significa dizer que a aplicação do CDC é inquestionável, porquanto o segurado no caso em apreço é consumidor dos serviços prestados pela apelada, concessionária do serviço público de energia elétrica.

Aplicável o diploma consumerista, torna-se possível a inversão do ônus da prova, nos moldes do que dispõe o artigo 6º, VIII, do CDC. Isso, no entanto, não exime a parte autora de minimamente demonstrar a verossimilhança de suas alegações, consequência da aplicação do princípio dispositivo, inerente à distribuição do ônus da prova, o qual determina que compete ao autor comprovar os fatos constitutivos do seu direito nos termos do que preceitua o inciso I do artigo 373 do CPC.

Desta forma, em situação como a dos autos, caberá à seguradora demonstrar os danos elétricos sofridos pelo seu segurado, bem como que eles estão relacionados com o alegado inadequado fornecimento de energia elétrica – nexo de causalidade.

De outro lado, à concessionária de energia, porque hiperssuficiente com relação ao sistema de fornecimento de energia em si, caberá demonstrar que prestou adequadamente o serviço, sem que houvesse falhas a si imputáveis. Ou, a fim de se eximir de sua responsabilidade, demonstrar que houve culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Trata-se, assim, de corolário do princípio da distribuição do ônus da prova, sem deixar de destacar que sua aferição é dinâmica dentro do exame de cada contexto factual e do que é razoável ou não exigir de cada litigante.

Neste sentido, aliás, precedente desta Câmara:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO REGRESSIVA. SEGURADORA EM FACE DE CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. INAPLICABILIDADE. Inobstante a seguradora se sub-rogue no direito de seus segurados de pleitear a indenização pelos danos causados pela concessionária de energia, ex vi dos artigos 786 e 349, ambos do Código Civil, incumbe a ela o ônus de efetivamente demonstrar o nexo de causalidade entre o dano suportado e...

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