Acórdão nº 50080406220168210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Nona Câmara Cível, 23-02-2023

Data de Julgamento23 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50080406220168210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoNona Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003239933
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

9ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5008040-62.2016.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Indenização por Dano Moral

RELATOR: Desembargador EUGENIO FACCHINI NETO

APELANTE: EDER DE ARAUJO BARBOSA (AUTOR)

APELADO: ASSOCIACAO DOS FUNCIONARIOS PUBLICOS DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

APELADO: GUSTAVO CORADINI TOLFO (RÉU)

RELATÓRIO

Por economia processual adoto o relatório elaborado na sentença (evento 41, SENT1):

Vistos etc.

EDER DE ARAÚJO BARBOSA, ajuizou ação de indenização por danos morais em desfavor da ASSOCIAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL – AFPERGS, entidade mantenedora do HOSPITAL ERNESTO DORNELLES e GUSTAVO CORADINI TOLFO. Relatou ter realizado exame de colonoscopia no Hospital requerido, cujo laudo descrito pelo médico requerido apontou para neoplasia de cólon esquerdo, sendo encaminhado pelo seu médico oncologista para a realização de "colectomia esquerda, a céu aberto", cuja cirurgia possuía previsão de duração de três horas, mas foi concluída em 4he30min e constatado se tratar de cólon ascendente. Discorreu acerca do engano cometido pelo médico requerido no tocante a localização do tumor. Aduziu a realização de exploração abdominal durante a cirurgia para localização da neoplasia de cólon esquerdo, aumentando o risco de uma infecção e, consequentemente, o risco de morte. Requereu a procedência do pedido, condenando-se os requeridos ao pagamento de indenização por danos morais. Pugnou pela concessão da gratuidade judiciária.

Foi deferida a gratuidade judiciária (ev.5, proc1, pág.49).

Foi realizada audiência de tentativa de conciliação, mas as partes não chegaram a um consenso (ev.5, proc.2, pág.8).

O requerido Gustavo contestou, discorrendo acerca do correto diagnóstico acerca da neoplasia e sustentando a perda de referência anatômica em decorrência da lesão obstrutiva do intestino, tratando-se a colonoscopia de um exame de certeza para o câncer, mas não quanto a sua localização. Impugnou a gratuidade judiciária deferida ao autor. Requereu a improcedência do pedido (ev.5, proc.2, pág.15 e seg.).

O Hospital requerido contestou, arguindo preliminar de ilegitimidade passiva. No mérito, aduziu culpa exclusiva do médico requerido no tocante a localização do tumor e destacou se tratar de pedido de danos hipotéticos, fundamentado no risco de infecção, não ocorrido. Requereu o acolhimento da preliminar e, sucessivamente, a improcedência do pedido. Pugnou pela concessão da gratuidade judiciária (ev.5, proc3, pág.10 e seg).

O TJRS deferiu a gratuidade judiciária ao Hospital requerido.

Houve réplica (ev.5, proc.7, pág.31).

Foi mantida a gratuidade judiciária ao autor (ev.5, proc.7, pág.35).

Laudo pericial no evento 5, proc.11, pág.1/7.

Em audiência de instrução foram ouvidas quatro testemunhas arroladas pela parte requerida (ev.5, proc.13, pág.18).

Encerrada a instrução, os requeridos ofertaram memoriais.

Vieram-me os autos conclusos para a prolação de sentença.

Sobreveio decisão terminativa de improcedência dos pedidos iniciais, com condenação do autor aos ônus sucumbenciais, incluindo honorários de 10% sobre o valor atualizado da causa, verbas cuja exigibilidade do pagamento restou suspensa em face da gratuidade da justiça concedida (mesmo EVENTO supra referido).

Inconformado, o autor apela. Em suas razões (evento 47, APELAÇÃO1), o recorrente alega, em resumo, que por ter sofrido de dores abdominais submeteu-se a exame de colonoscopia no hospital-réu, realizado pelo médico-réu, cujo diagnóstico foi de neoplasia no cólon esquerdo. Refere que com base no diagnóstico realizou procedimento cirúrgico. Diz que após a cirurgia foi informado que a neoplasia era no cólon direito. Assevera que na colonoscopia não constou observação acerca da possibilidade de a neoplasia estar em outro lugar. Aduz que a falta dessa observação induziu o cirurgião a erro, aumentando em muito a possibilidade de erro na na cirurgia. Sustenta que o próprio médico-réu reconheceu que a colonoscopia é um exame de certeza para diagnosticar o câncer, mas não sua localização. Anota que o hospital-réu cedeu suas instalações para que o médico-réu realizasse o exame, pelo que também deve ser responsabilizado, na forma do art 14 do CDC. Pontua que o médico-réu agiu com culpa por não ter relatado no exame de colonoscopia que o câncer poderia estar em outro local. Pede, nestes termos, o provimento do apelo.

Contrarrazões do Hospital Ernesto Dornelles no evento 54, CONTRAZAP1. Na peça, o apelado alega, em resumo, que não houve falha na prestação do serviço que lhe coube fornecer. Afirma que não possui ingerência sobre o ato médico. Diz que a realização e interpretação do exame se deu dentro da melhor técnica, consoante prova pericial e oral. Sustenta que o dano moral alegado, de um suposto aumento da possibilidade de um erro na cirurgia, capaz de causar problemas graves e, até mesmo, risco de morte, é hipotético. Reafirma que não prova de qualquer dano sofrido. Ressalta que "(i) o tempo de cirurgia não decorreu somente do local em que diagnosticado o carcinoma e (ii) o parco tempo a mais da cirurgia do que estimado pelo autor não gerou risco ao paciente". Pede, nestes termos, o desprovimento do apelo.

Contrarrazões do médico Gustavo no evento 55, CONTRAZAP1. Na peça, o apelado alega, em preliminar, que o apelo não merece ser conhecido por violação ao princípio da dialeticidade. No mérito, alega, em resumo, que antes da cirurgia o cirurgião já sabia a localização do tumor, pois realizada tomografia, exame de rotina para apontar a localização do tumor já que a colonoscopia só aponta a existência do tumor. Repisa a tese defensiva de que "e a colonoscopia é um exame de certeza para diagnosticar o câncer, mas não sua localização", a qual foi confirmada pela prova pericial e testemunhal produzida. Destaca que após a colonoscopia, confirmando o câncer, o paciente é submetido à tomografia, aí sim para localizar o tumor, cuja localização exata só é feita no ato cirúrgico. Pede, nestes termos, o desprovimento do apelo.

É o breve relatório.

VOTO

Colegas: de início, quanto à preliminar arguida nas contrarrazões do réu Gustavo de não conhecimento do apelo por violação ao princípio da dialeticidade/motivação, registro que estou superando o entrave admissional, sobretudo para não criar embaraço processual ao julgamento do mérito da causa ao qual o autor poderia se apegar para prolongar ainda mais a solução do litígio junto às instâncias superiores em eventuais recursos.

É que a violação apontada não é flagrante.

No particular, a improcedência do pedido inicial está amparada, grosso modo, na não identificação de conduta negligente, imprudente e imperita do médico-réu, sob o fundamento de que "laudo de colonoscopia constou expressamente a constatação de lesão estenosante que impedia a passagem do aparelho durante o exame (ev.5, proc1, pág.17), circunstância que dificulta a localização precisa do tumor". Sendo que para lastrear essa conclusão o Juízo fez vasta referência à perícia médica e à prova oral. Fundamentou o Julgador singular, ainda, que sequer houve dano ao autor, na medida em que ele "não sofreu risco de morte pela realização de cirurgia em local diverso", igualmente lastreando essa conclusão na perícia médica e na prova oral colhida.

Pois nas razões de apelo, o autor, bem ou mal, acabou alegando (I) que o médico-réu agiu com culpa (confrontando, portanto, o fundamento da ausência desse pressuposto da responsabilidade imputada) por não ter colocado observação no exame de colonoscopia que o câncer poderia estar em outro local e (II) que a falta dessa observação induziu o cirurgião a erro, aumentando em muito a possibilidade de um erro na cirurgia que poderia ter causado problemas graves, até com risco de morte (confrontando também o fundamento da ausência desse pressuposto da responsabilidade imputada). Não fez qualquer menção à prova dos autos para justificar suas alegações, verdade, que foi explorada à saciedade pelo Juízo 'a quo', como destacado. Mas isso, por si só, é questionável se é suficiente para levar à inadmissão do apelo, podendo ser visto muito mais como demonstração de que as alegações do autor não encontram nenhuma subsistência no conjunto probatório dos autos, questão afeita ao mérito da causa e não à requisito recursal.

Inclusive por esses motivos, em juízo prospectivo de cognição adianto meu convencimento pelo insucesso do apelo, o que reforça a colocação de que não é interessante aos réus a inadmissão do recurso do autor, por introduzir nova discussão processual nos autos, enquanto a solução de mérito lhes favorecer.

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