Acórdão nº 50082472320208210033 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segundo Grupo de Câmaras Criminais, 08-07-2022

Data de Julgamento08 Julho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualEmbargos Infringentes e de Nulidade
Número do processo50082472320208210033
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSegundo Grupo de Câmaras Criminais

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002355910
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2º Grupo Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Embargos Infringentes e de Nulidade Nº 5008247-23.2020.8.21.0033/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas (Lei 11.343/06)

RELATORA: Desembargadora GISELE ANNE VIEIRA DE AZAMBUJA

EMBARGANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

ADVOGADO: CRISTIANO VIEIRA HEERDT (DPE)

EMBARGADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

VALDOMIRO LOPES DUARTE opôs, por intermédio da Defensoria Pública, embargos infringentes e de nulidade contra acórdão de evento 12, proferido pelos integrantes da egrégia 3ª Câmara Criminal deste Tribunal de Justiça.

Na decisão, a 3ª Câmara, por maioria, deu parcial provimento ao recurso defensivo, para reduzir a pena para 1 (um) ano, 11 (onze) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime aberto, e a pena de multa para 194 dias-multa, à razão mínima legal, substituída a pena corporal por duas restritivas de direitos, vencida a Desembargadora Rosane Wanner da Silva Bordasch, que dava provimento ao apelo para absolver o réu.

Em razões, o embargante transcreveu o voto dissidente e requereu sua prevalência, uma vez que representa a melhor solução para o tema (evento 22, EMBINFRI1).

Em parecer, a ilustre Procuradora de Justiça, Dra. Maria Ignez Franco Santos, manifestou-se pelo desprovimento do recurso (evento 33, PARECER1).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Eminentes colegas:

Conheço do recurso porque adequado e tempestivo.

O embargante foi condenado como incurso nas sanções do artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006, à pena de 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, em regime semiaberto.

Diante disso, o embargante recorreu. Por ocasião do julgamento, a 3ª Câmara Criminal, por maioria, deu parcial provimento ao recurso a fim de reduzir a pena para 1 (um) ano, 11 (onze) meses e 10 (dez) dias de reclusão, em regime aberto, e a pena de multa para 194 dias-multa, à razão mínima legal, substituída a pena corporal por duas restritivas de direitos, nos termos da fundamentação. A Desembargadora Rosane Wanner da Silva Bordasch, por sua vez, proferiu voto divergente a fim de dar provimento ao apelo, para absolver o acusado.

Primeiramente, por oportuno, ressalto que, nos termos do parágrafo único do artigo 609 do Código de Processo Penal1, a análise da matéria devolvida nos embargos infringentes e de nulidade deve se restringir ao objeto da divergência.

E, com a devida vênia à Desembargadora Rosane Wanner da Silva Bordasch, entendo que o voto dissidente não merece prevalecer.

Como bem salientado no voto vencedor, a diversidade da natureza de substâncias apreendidas (crack, cocaína e maconha), afasta a possibilidade de que o acusado seja apenas usuário de substâncias entorpecentes.

Com efeito, ressalto que o tipo do artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/06, é multivariado e, desnecessário para sua configuração, a prática de atos de venda, bastando que a conduta do acusado se insira naquelas ali previstas como, por exemplo, "trazer consigo".

Conforme refere GUILHERME DE SOUZA NUCCI, in Leis Penais e Processuais Penas Comentadas, 5ª edição, pág. 357, ao tratar do precitado art. 33, caput, o tipo é misto alternativo, ou seja, o agente pode praticar uma ou mais condutas, respondendo por um só delito.

Nesse mesmo sentido, colaciono precedente:

APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE ENTOECENTES. INSURGÊNCIA DEFENSIVA. CONDENAÇÃO MANTIDA. PRELIMINAR DE NULIDADE DA PROVA. AUSÊNCIA DE MANDADO JUDICIAL. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. Segundo se extrai do depoimento dos policiais militares que atuaram na ocorrência, estariam realizando campana, em razão de denúncia anônima noticiando a prática de tráfico de drogas no endereço do réu, sendo que, ao avistarem um indivíduo trocando pequenos objetos pelo portão, em atitude típica, o abordaram, encontrando pequena quantidade de entorpecente. A partir disso, ingressaram na residência e, com a indicação do recorrente, foi localizada maior quantidade de maconha, separada em porções, além de uma balança de precisão. O delito de tráfico de drogas possui natureza permanente, protraindo-se no tempo, de modo que a situação de flagrância perfectibilizada afasta a suposta violação de domicílio referida, consoante entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça. Sendo assim, não há que se falar em nulidade das provas obtidas sem mandado judicial/autorização de ingresso na residência. MÉRITO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. Materialidade e autoria comprovadas, de acordo com as circunstâncias acima narradas, cabendo salientar que, não bastasse a pequena quantidade de entorpecente com ele apreendida, também foi, dentro da residência, após indicação do próprio réu, encontrada razoável quantidade de maconha fracionada (130 gramas, em 08 porções) e uma balança de precisão. Relatos prestados pelos policiais que realizaram a apreensão das drogas coesos, descrevendo, com detalhes, todas as circunstâncias do fato objetivamente apurado, denotando que, efetivamente, as drogas apreendidas na residência do paciente eram destinadas ao comércio ilícito. Depoimento dos policiais que merece crédito, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Dispensável a visualização de atos de compra e venda de entorpecentes para a caracterização do crime de tráfico, visto que o artigo 33 da Lei 11.343/06 possui diversos verbos nucleares, razão pela qual o fato de o apelante “guardar” ou “trazer consigo” a droga, caracteriza a prática criminosa. Descabida, no caso concreto, a desclassificação da conduta delitiva para o crime de posse de entorpecentes para uso pessoal, suficientemente demonstrado o intento de comercialização atrelado às substâncias ilícitas apreendidas. Condenação mantida. APENAMENTO. Pena basilar. Mantida a pena-base, fixada pelo Juízo de origem no patamar mínimo legal, de 05 anos de reclusão. Pena Provisória. Igualmente, inalterado o aumento da provisória em (08) oito meses, em razão do reconhecimento da agravante da reincidência. Muito embora adote o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de exasperação das penas em 1/6, em razão da aludida agravante, inviável qualquer reforma no ponto, em razão da vedação à reformatio in pejus, ante a ausência de qualquer insurgência de parte do Ministério Público no tópico. Resta mantida, portanto, a pena provisória em 05 (cinco) anos e 08 (oito) meses de reclusão. Forma privilegiada do tráfico de drogas. Art. 33, § 4º, da Lei de Tóxicos. Descabimento. Inviável o pretendido reconhecimento da forma privilegiada do crime de tráfico de drogas, elencado no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006 em razão da reincidência. Pena definitiva. Sanção definitiva em 05 (cinco) anos e 08 (oito) meses de reclusão. Regime inicial de cumprimento. O regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade é o fechado, nos termos do art. 33, § 2º, “a” e “b”, da Lei Penal. Substituição da Pena. Inviável a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, pois extrapolado o limite máximo de 04 (quatro) anos, previsto no artigo 44 do Código Penal e reincidente o réu. Pena de multa. Ausente insurgência do Ministério Público, mantenho inalterada a pena de multa em 500 (quinhentos) dias multa, à razão unitária mínima de 1/30 do salário mínimo nacional. RECURSO DESPROVIDO.(Apelação Criminal, Nº 70083831354, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Joni Victoria Simões, Julgado em: 23-02-2021). - Grifei.

Assim, o fato de o acusado estar em conhecido ponto de tráfico de drogas, ser avistado por policiais em atitude suspeita, estar trazendo consigo variedade de substâncias entorpecentes e certa quantia em dinheiro, demonstra, sem sombra de dúvida, que esse incidiu nas sanções do artigo 33, caput, da LAD.

E o fato do réu ser usuário de drogas não retira a conclusão no sentido de que ele seja traficante, já que não se cuida de condições mutuamente excludentes.

Nesse sentido, por exemplo:

APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS E PORTE DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO (ARTIGO 33, CAPUT, DA LEI DE DROGAS; ARTIGO 14, DA LEI N.º 10.826/03). SENTENÇA PROCEDENTE. INCONFORMIDADES DEFENSIVAS. PRELIMINARES DE NULIDADE. Não há que falar em violação de domicílio, eis que, em estando configurada a flagrância, como no presente caso, inexiste qualquer ilegalidade a ser declarada, pois a própria Constituição Federal permite o ingresso em domicílio, em caso de flagrante delito, conforme artigo 5° inciso XI, da Carta Maior. Ademais, não se constata qualquer irregularidade no auto de prisão em flagrante registrado, constando no inquérito policial anexado aos autos todas as peças essenciais que demonstram a higidez da atuação policial. MÉRITO DOS APELOS. A prova contida nos autos autoriza a manutenção da condenação dos réus pelo crime de narcotráfico e de Felipe também pelo porte de arma de fogo de uso permitido, sendo inviável a pretendida absolvição dos mesmos, por insuficiência probatória, como pretendem as defesas. As versões apresentadas pelos agentes públicos, quando confrontadas com as demais provas, demonstram coerência e harmonia, sendo aptas para sustentar um juízo condenatório - posicionamento há muito assentado por este Órgão Julgador -, não existindo qualquer indício que possa desabonar os seus testemunhos, razão pela qual afastada a tese defensiva e, assim, ratificada a condenação prolatada. De igual forma, indevida eventual pretensão de desclassificação do crime de tráfico para aquele previsto no artigo 28, da Lei de Tóxicos, sendo de mencionar que a alegada condição de usuário de drogas por parte de Felipe não o exime do tráfico, eis que, como se sabe, uma circunstância não afasta a outra, pelo contrário, é usual que o usuário em drogas também trafique, até como...

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