Acórdão nº 50089795120218210006 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceira Turma Recursal da Fazenda Pública, 04-11-2022

Data de Julgamento04 Novembro 2022
ÓrgãoTerceira Turma Recursal da Fazenda Pública
Classe processualRecurso Inominado
Número do processo50089795120218210006
Tribunal de OrigemTurmas Recursais
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:10026748757
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

3ª Turma Recursal da Fazenda Pública

RECURSO INOMINADO CÍVEL Nº 5008979-51.2021.8.21.0006/RS

TIPO DE AÇÃO: Reajustes de Remuneração, Proventos ou Pensão

RELATOR: Juiz de Direito SYLVIO JOSE COSTA DA SILVA TAVARES

RECORRENTE: MUNICÍPIO DE CACHOEIRA DO SUL (REQUERIDO)

RECORRIDO: SABRINA SILVA MELO (REQUERENTE)

RELATÓRIO

Dispensado o relatório, nos termos do art. 38 da Lei nº 9.099/95 c/c art. 27 da Lei nº 12.153/2009.

VOTO

Estimados colegas.

Examino recurso inominado interposto pelo Município de Cachoeira do Sul em face de julgamento de procedência de ação ajuizada por servidora pública através da qual, declarado o direito da parte autora ao recebimento do adicional de produtividade, que será de 65% enquanto não realizadas as avaliações previstas no art. 3º do DM 218/01, restou condenado ao pagamento dos valores correspondentes, desde 15.3.2016 (repercutindo em gratificação de Natal, férias e adicional de 1/3), a serem atualizados, desde cada inadimplemento, pelo IPCA-E, e juros equivalentes aos da caderneta de poupança, a contar da citação (6.4.2021 – evento 2, INF23).

Em que pese as alegações do recorrente, tenho que a sentença exarada na origem bem enfrentou a questão debatida nos autos, passando a transcrever seus fundamentos:

(...)

A controvérsia cinge-se ao direito da autora à percepção do adicional previsto no art. 1º da LM 2.615/93:

Art. 1º - Fica o Executivo Municipal autorizado a criar o Regime de Produtividade aos servidores municipais da área de saúde, na ordem de 65% (sessenta e cinco por cento), incidente sobre os respectivos salários padrões.

A matéria foi regulamentada pelo Decreto Municipal (DM) 218/01, com o estabelecimento de requisitos de ordem subjetiva, condicionantes à concessão do adicional de produtividade perseguido, conforme transcrevo em parte:

Art. 1º - O presente Decreto regulamenta a Lei 2.615, de 24 de junho de 1993, que concede regime de produtividade aos servidores municipais da área de saúde, na ordem de 65% (sessenta e cinco por cento), incidente sobre o respectivo salário padrão.

Art. 2º - Consideram-se servidores em área de saúde, aqueles desenvolvam suas atividades em unidades, setores e serviços da Secretaria Municipal de Saúde e Meio Ambiente.

Parágrafo único – A contar da data de publicação deste Decreto, somente terão direito ao regime de produtividade os servidores que ingressarem no Quadro da Secretaria Municipal de Saúde e Meio Ambiente mediante concurso público.

Art. 3º - O regime de produtividade será aferido, mensalmente, mediante uma base de cálculos pontuais, individuais, atribuídos de acordo com a avaliação da chefia imediata que utilizará a planilha de ações avaliáveis.

§ 1º – Consideram-se ações avaliáveis as descritas no ANEXO I.

§ 2º – Cada ação avaliável terá pontuação específica prevista no ANEXO II.

§ 3º – Para o servidor obter o percentual de 65%, deverá atingir 100% da pontuação estabelecida no ANEXO III.

Poder-se-ia invocar que a Lei acima fosse meramente autorizativa, colocando, nas mãos do Executivo, instituir ou não o adicional.

Entretanto, além de o Executivo ter feito a opção pelo pagamento, mediante edição do Decreto, a concessão do benefício é obrigatória, por força do art. 86 da LM 2.751/94 (Estatuto e Regime Jurídico dos Servidores do Município):

Art. 86. O regime de produtividade é devido aos servidores da Área do Sistema único de Saúde e corresponde às disposições e valores fixados em lei federal, estadual ou municipal.

Nessa linha, o Decreto extrapolou ao prever, no parágrafo único do art. 2º, que “somente terão direito ao regime de produtividade os servidores que ingressarem no Quadro da Secretaria Municipal de Saúde e Meio Ambiente mediante concurso público”, caso se entenda que dito concurso devesse ser específico para essa Secretaria.

Se assim fosse entendido, e caso compreendido que o Decreto pudesse prever tal restrição, estar-se-ia admitindo que a Prefeitura poderia escolher se cumpriria a Lei ou não: bastaria, para não a cumprir, nunca fazer concurso para o quadro da SMS e, após, transferir servidores, concursados e que começassem noutros setores, para ela.

E, nesse sentido, o Município sequer provou que exista concurso público específico para a SMS. Também não se fizeram as avaliações previstas no Decreto.

O fato de a Prefeitura não haver cumprido a parte dela (fazer a avaliação mensal) não a exime de efetuar o pagamento legalmente estabelecido. A omissão da Administração Pública no cumprimento de uma tarefa dela não tem o condão de revogar uma lei benéfica aos servidores.

Por outro lado, a LM 4.120/11, que dispôs sobre o Plano de Cargos e Salários dos Servidores Municipais, estabeleceu:

Art. 26. O regime de produtividade dos servidores da área de saúde, de que trata o artigo 86 da Lei Municipal 2751/1994, continuará a ser pago aos servidores nomeados até a data de publicação desta Lei e que já estejam percebendo a vantagem, excluindo-se os ocupantes dos cargos do padrão 11, criados nesta Lei.

Com efeito, da leitura atenta da legislação supracitada, tem-se que tal dispositivo foi explícito ao preservar o direito dos servidores que já estavam recebendo tal benefício, preservando a irredutibilidade salarial daqueles com o novo plano de carreira, porém extinguindo tal direito aos que ainda não o recebiam, haja vista não haver direito adquirido a regime jurídico não mais em vigor.

Essa Lei foi publicada em 30.12.2011, e sua vigência está regrada pelo art. 31: “Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação e os seus efeitos econômicos, decorrentes do enquadramento previsto no artigo 24, em 180 (cento e oitenta) dias”.

Como a supressão linear de uma vantagem remuneratória não integra o “enquadramento previsto no artigo 24” da Lei, a vigência do novo Diploma foi imediata.

Conforme o conjunto probatório carreado aos autos, tem-se que, em 19.3.2009 a autora foi nomeada para o cargo de Auxiliar Administrativo, lotada na Secretaria Municipal de Administração. Em 1º.3.2011 a autora foi transferida para a SMS, onde permanece laborando até os dias atuais (evento 2, OUT5).

Na audiência de instrução, ambas as testemunhas arroladas pela autora afirmaram que a demandante realiza o atendimento ao público na SMS desde o ano de 2011, desempenhando as atividades de encaminhar pacientes, marcar consultas, preencher carteira de vacinação, entre outras operações.

Como se pode ver, antes mesmo da data de publicação da Lei, a autora já estava exercendo suas atividades na SMS. Só não percebia o benefício por omissão ilegal da Administração Municipal.

Portanto, é caso de aplicação do disposto no art. 6º, caput e § 2º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro:

Art. 6º A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.

[…].

§ 2º Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo do exercício tenha termo prefixo, ou condição preestabelecida inalterável, a arbítrio de outrem.

[…].

Desse modo, a autora tem direito de perceber o adicional, inclusive relativo ao chamado 13º salário (art. 6º, caput, do DM 218/01) no percentual máximo, sem prejuízo de que, a partir de agora, a Administração faça as avaliações (hipótese na qual, se a avaliação da autora não corresponder ao máximo, poderá ser-lhe pago percentual correspondentemente menor).

O valor do adicional também deve ser levado em conta no cálculo do adicional de férias e respectivo acréscimo de um terço, por força do art. 107 da LM 2.751/94:

...

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