Decisão Monocrática nº 50093964120218210026 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 17-10-2022

Data de Julgamento17 Outubro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50093964120218210026
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível
Tipo de documentoDecisão monocrática

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003097920
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5009396-41.2021.8.21.0026/RS

TIPO DE AÇÃO: Empréstimo consignado

RELATOR: Desembargador FERNANDO FLORES CABRAL JUNIOR

APELANTE: VALMI TERESINHA HECK (AUTOR)

APELADO: ITAU UNIBANCO S.A. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por VALMI TERESINHA HECK da sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados na ação declaratória de inexistência de contrato com pedido de indenização por danos morais contra ITAU UNIBANCO S.A. (Evento 39), cujo dispositivo foi redigido nos seguintes termos:

Por todo o exposto, JULGO IMPROCEDENTE a pretensão civil VALMI TERESINHA HECK contra ITAU UNIBANCO S.A.

Condeno a requerente ao pagamento da taxa única, despesas processuais e honorários advocatícios ao patrono da parte adversa, que fixo em 10% do valor atribuído à ação, o que faço com base no art. 85, §2°, do CPC, considerando a natureza da causa e o trabalho desenvolvido.

O valor dos honorários deverá ser corrigido monetariamente, a contar da propositura da demanda, bem como acrescido de juros moratórios de 1% ao mês, a contar do trânsito em julgado desta sentença.

Suspendo a exigibilidade em favor da autora ante a concessão do benefício da gratuidade da justiça.

Com o trânsito em julgado, baixe-se.

Publicação, registro e intimação, eletronicamente.

Em suas razões recursais, a parte apelante sustenta que os documentos colacionados pelo banco réu na comprovam a contratação. Assevera que tais documentos não contêm identificação de assinatura eletrônica ou digital. Salienta que a sentença recorrida deixou de mencionar onde estaria a prova da assinatura eletrônica por meio de senha pessoal e uso do cartão de crédito. Pondera que, tendo impugnado a autenticidade dos documentos, o banco tinha a opção de retirá-los dos autos ou sujeitá-los a perícia técnica. Preconiza que a sua conta-registro é utilizado para recebimentos e saques de sua aposentadoria. Alude que o crédito depositado em sua conta, atinente ao empréstimo que aduz não ter contratado, fora "imediatamente dela retirado", a pretexto de aplicação automática. Postula seja declarada a inexistência dos contratos de empréstimo nº 0079924408220190604 e nº 0003508873120200124 que ensejaram os descontos em seu benefício previdenciário. Pugna pela repetição em dobro dos valores descontados de sua folha de pagamento. Requer a condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos morais em montante não inferior a dez salários mínimos. Subsidiariamente, pede seja determinado o retorno dos autos à origem, a fim de ser realizada prova pericial com o intuito de ser analisada a autenticidade das assinaturas eletrônicas (Evento 44).

Foram apresentadas contrarrazões no Evento 48.

É o relatório.

VOTO

A presente apelação interposta no Evento 44 é tempestiva, pois o prazo para a parte autora recorrer iniciou em 19/07/2022 e findou em 09/08/2022 (Evento 41), sendo que o recurso foi interposto em 31/07/2022. Além disso, a autora é beneficiária da gratuidade judiciária, sendo dispensada do preparo (Evento 3). Dessa forma, considerando que o recurso é próprio, tempestivo e dispensa o recolhimento do preparo, recebo a apelação e passo ao exame da insurgência recursal.

RESPONSABILIDADE CIVIL DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS NAS RELAÇÕES DE CONSUMO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. INOCORRÊNCIA.

O Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 3º, § 2º, incluiu expressamente a atividade de natureza bancária, financeira e de crédito no conceito de serviço.

Note-se:

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.

§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista – grifei.

Nesse contexto, o entendimento atual, tanto na doutrina como na jurisprudência dos Tribunais pátrios, é tranquilo acerca da aplicação do CDC nas operações bancárias, o que restou sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça, inclusive:

Súmula nº 297: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.

Portanto, a responsabilidade contratual do banco é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, de modo que responde, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços.

Reza o art. 14 do CDC:

O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Trata-se de responsabilidade objetiva fundada na teoria do risco do empreendimento ou da atividade empresarial, segundo a qual, consoante doutrina de Sergio Cavalieri Filho:

“(...) todo aquele que se disponha a exercer alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa. Este dever é imanente ao dever de obediência às normas técnicas e de segurança, bem como aos critérios de lealdade, quer perante os bens e serviços ofertados, quer perante os destinatários dessas ofertas. A responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se alguém a realizar atividade de produzir, estocar, distribuir e comercializar produtos ou executar determinados serviços. O fornecedor passa a ser o garante dos produtos e serviços que oferece no mercado de consumo, respondendo pela qualidade e segurança dos mesmos”1.

Os requisitos, portanto, para a configuração da responsabilidade objetiva são: falha na prestação do serviço, dano e nexo causal.

Nesse tipo de responsabilidade, o fornecedor somente afasta o dever de reparar o dano se provar (ônus seu) a ocorrência de uma das causas que excluem o próprio nexo causal, enunciadas no § 3º do art. 14 do CDC, quais sejam, a inexistência do defeito (falha na prestação do serviço) e a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

No caso em tela, entendo que não restou configurada falha na prestação de serviços do banco réu.

Pois bem.

No caso em tela, tendo a parte autora sustentado, na inicial, a ocorrência de falha na prestação de serviços do banco réu, consubstanciada na ausência de contratação dos empréstimos consignados, de nº 0079924408220190604 e nº 0003508873120200124, que ensejaram os depósitos das quantias de R$ 10.619,37 e R$ 428,47, cabia ao demandado o ônus de provar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da parte autora, nos termos do art. 373, II, do CPC.

Da análise dos autos, observa-se que a parte ré se desincumbiu do ônus que lhe competia, porquanto demonstrou não só terem sido devidamente contratados pela autora os empréstimos consignados impugnado sno presente feito, mas também que houve a disponibilização das quantias contratadas à demandante, consoante passo a expor.

Vale dizer, a instituição financeira ré logrou provar que as avenças controvertidas pela demandante foram firmadas em terminal de autoatendimento, mediante a aposição de seu cartão de crédito e digitação de sua senha pessoal, isto é, por intermédio da assinatura eletrônica da parte autora, a qual, como consabido, substitui a assinatura de próprio punho da parte, ante a confirmação pela validação CHIP e senha.

No tocante ao contrato nº 0079924408220190604, o banco réu não só evidenciou que o valor contratado, R$ 10.626,88, foi depositado na conta bancária de titularidade da autora em 05/06/2019, mas também que, em 02/07/2019, fora por ela transferida parcela desta quantia, R$ 10.500,00 para a poupança de sua titularidade:

Ademais, a parte ré na contestação esclareceu que, em 01/10/2019, a parte autora optou pela amortização das parcelas 4 a 67 do contrato supra, oportunidade na qual a instituição bancária referiu ter sido emitido um boleto, no montante de R$ 10.607,98, tendo a demandante quitado tal boleto na mesma data, mediante depósito, restando em aberto apenas as últimas cinco parcelas:

Já em relação ao contrato nº 0003508873120200124, o banco réu demonstrou que tal operação foi regularmente contratada, em 24/01/2020, no valor de R$ 428,54, em caixa eletrônico, mediante utilização do cartão de crédito e inserção de senha pessoal, quantia esta fora depositada na conta bancária de titularidade da autora, em 30/01/2020, e objeto de saques por ela efetuados no dia 04/02/2020:

Neste contexto, ainda que a autora impugne a assinatura eletrônica presente nos contratos objeto da lide, os elementos probatórios colacionados ao feito pelo demandando evidenciam, com suficiência, a licitude das avença ora debatidas e, por consequência, a ausência de qualquer falha na prestação de serviços do banco réu.

Vale reforçar que não há nos autos alegação de que a parte demandante teve o seu cartão de crédito furtado e/ou extraviado, a evidenciar que, sob qualquer prisma, a inocorrência de fraude.

A bem da verdade, no caso em tela, embora a parte autora defenda a inexistência dos contratos, a prova documental acostada pelo banco demonstra o contrário, que a demandante celebrou livremente os contratos, utilizando-se da autonomia da vontade, princípio básico das relações contratuais, e que, posteriormente, por algum motivo, se arrependeu das contratações após o prazo legal para tanto.

Destarte, na hipótese, tendo em...

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