Acórdão nº 50094024420228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Criminal, 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
Classe processualHabeas Corpus
Número do processo50094024420228217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001709609
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

2ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Habeas Corpus (Câmara) Nº 5009402-44.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Decorrente de violência doméstica (art. 129, §§ 9º e 11)

RELATORA: Desembargadora GISELE ANNE VIEIRA DE AZAMBUJA

PACIENTE/IMPETRANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

ADVOGADO: BRUNO SELIGMAN DE MENEZES (OAB RS063543)

ADVOGADO: DIEGO DA ROSA GARCIA (OAB RS118774)

PACIENTE/IMPETRANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

ADVOGADO: DIEGO DA ROSA GARCIA (OAB RS118774)

ADVOGADO: BRUNO SELIGMAN DE MENEZES (OAB RS063543)

IMPETRADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

BRUNO SELIGMAN DE MENEZES, defensor constituído, impetrou a presente ordem de habeas corpus em favor de CLÓVIS BATISTA MACHADO ITAQUI, apontando como autoridade coatora o JUÍZO DO JUIZADO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA DA COMARCA DE SANTA MARIA/RS.

Relatou o impetrante, em apertada síntese, que o paciente se encontra preso preventivamente desde o dia 21.01.2022, pela suposta prática dos delitos de lesão corporal e ameaça no âmbito doméstico.

Sustentou que a prisão cautelar é desnecessária, sendo o paciente tecnicamente primário, não ostentando nenhuma condenação criminal transitada em julgado por crimes de violência, grave ameaça ou que envolvam de armas de fogo.

Alegou ausência de contemporaneidade da prisão do paciente, uma vez que foi decretada mais de três semanas após a suposta ocorrência dos fatos.

Ressaltou a possibilidade de aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, como uso de tornozeleira eletrônica e prisão domiciliar.

Pugnou, liminarmente, a concessão de liberdade ao paciente com a aplicação de medidas cautelares diversas ou a substituição da prisão preventiva pela domiciliar, e no mérito, a concessão definitiva da ordem.

O pedido liminar foi indeferido em sede de plantão judicial (evento 5, DESPADEC1).

Remetidos os autos a esta Relatoria, foi mantido o indeferimento da liminar (evento 10, DESPADEC1).

A apontada autoridade coatora prestou informações (evento 16, INF1).

O Ministério Público ofertou parecer, através do douto Procurador de Justiça Dr. Airton Zanatta, pela denegação da ordem (evento 19, PARECER1).

É o relatório.

VOTO

Eminentes Desembargadores:

Trata-se de habeas corpus, impetrado em favor de paciente preso preventivamente pela suposta prática dos delitos de lesão corporal e ameaça no âmbito doméstico.

Examinando os autos, concluo pela denegação da ordem.

Como se sabe, o Habeas Corpus é garantia constitucional fundamental (art. 5º, LXVIII, CF1), com previsão, também, no Código de Processo Penal no artigo 6472 e seguintes.

Tem por finalidade evitar ou fazer cessar a violência ou a restrição da liberdade de locomoção decorrente de ilegalidade ou abuso de poder, mediante ação autônoma, denominada, conforme a melhor doutrina, de ação constitucional.

O artigo 6483 do Código de Processo Penal, arrola as hipóteses em que o writ será passível de concessão. Em que pese a discussão doutrinária a respeito de ser esse rol taxativo ou exemplificativo, a verdade é que o mandamento do inciso I (quando não houver justa causa) poderia abarcar todas as demais situações legais.

No entanto, do exame dos documentos que instruem o presente writ, não verifico qualquer ato ilegal ou abusivo por parte da Magistrada a quo.

Com efeito, a decisão segregatória restou assim redigida:

"A Autoridade Policial Representou pela decretação da prisão preventiva de CLOVIS BATISTA MACHADO ITAQUY em razão do descumprimento de medidas protetivas decretadas em prol da sua ex-companheira, que o proíbem de se aproximar e de manter qualquer tipo de contato com ela. Embora devidamente intimado dessas proibições, o Representado retornou à residência, acompanhado de um "colaborador", e ameaçou-lhe de morte, recusando-se a deixar o local.

O Ministério Público opinou seja acolhida a representação. Discorreu sobre o histórico do fato e a vida pregressa do agente, destacando o descumprimento de medidas protetivas.

Relatado, passo a fundamentar.

O conjunto de garantias processuais e as naturais dificuldades investigatórias muitas vezes tornam necessária a adoção de medidas de cautela que acelerem a atuação do Estado-Juiz em alcançar aos jurisdicionados bens jurídicos urgentes, o que faz por meio de medidas de natureza acautelatória.

A prisão preventiva é medida extrema de ordem cautelar, pois não decorre de sentença criminal condenatória, tendo por essência natureza excepcional e provisória, e como objetivos assegurar a ordem pública/econômica e garantir a eficácia dos procedimentos/provimentos judiciais criminais. Em situações de violência doméstica, o leque amplia-se como medida coercitiva contra o descumprimento e de garantia de provimentos mais singelos, mantido o caráter cautelar.

No caso dos autos, os elementos ora aportados fornecem provas suficientes da existência/materialidade do fato e significativos indícios de autoria. Conforme se verifica no processo nº 503716351, em 29/12/2021 o Representado foi intimado das medidas protetivas que o proíbem de qualquer forma de contato ou aproximação da Ofendida.

Apesar disso, retornou à residência da ex-companheira acompanhado de intitulado "colaborador", ameaçou-lhe de morte e afirmou que não deixará a residência. As medidas protetivas foram decretadas em razão de anterior agressão física à mesma vítima, objeto de ação criminal em curso (5000323-08.2022.8.21.0027).

Os elementos e circunstâncias presentes no caso concreto indicam que neste momento é necessária a adoção de medidas mais incisivas de cautela, para suficiente garantia de segurança física e psíquica da vítima.

Identifica-se no agente padrão comportamental violento e voltado para atividades criminosas o que, obviamente, reflete na sua vida privada. Certidão Judicial Criminal revela tratar-se de indivíduo firmemente inserido em práticas criminosas, ostentando 15 páginas de antecedentes criminais. Possui condenação criminal por estelionato (crime pelo qual indiciado várias vezes) e disparo de arma de fogo, e responde processos por crimes graves, como Associação Criminosa, Extorsão Mediante Sequestro, Desacato e Lesão Corporal Qualificada. Nota-se constante envolvimento em crimes envolvendo armas de fogo irregulares (2 ações penais e 4 inquéritos).

Nos diversos processos criminais nos quais envolvido figuram as Comarcas de Santa Maria e Itaqui, o que revela frágil ligação com o distrito da culpa, ensejando também risco ao cumprimento da lei penal.

Destaco que não apenas a efetiva reincidência, mas também maus antecedentes, inquéritos, atos infracionais e ações penais em curso são fortes indicadores de contumácia delitiva (STJ, RHC 107.238/2019), e devem ser considerados como apontadores da perigosidade do agente e da fundada probabilidade de reiteração criminosa (STF, HC nº 150906/2018).

No plano da violência doméstica, a dinâmica familiar é conturbada. A recente separação do casal, por iniciativa da ofendida, tem enfrentado a agressiva oposição do agente. As ameaças foram praticadas mediante o uso de arma e concurso de agentes. O descumprimento violento de medidas protetivas menos rigorosas, demonstra-no incapaz de deter-se diante de cautelas mais brandas e o elevado risco que a sua liberdade representa para a segurança dela.

Sinais de comportamento perigosamente obsessivo. Incapaz de assimilar a vontade da vítima de romper o relacionamento, ameaçou-a como forma de fazer impor a sua vontade afetiva sobre a dela.

O conjunto de elementos do caso concreto vem sendo empiricamente observado como indicador de maior risco de aumento na intensidade e gravidade dos atos de violência intrafamiliar e na propensão à reincidência, e fornece dados para identificar e estimar a margem de perigosidade do agressor.

Também emprestam-nos importantes subsídios teóricos os estudos que inspiraram o Guia de Avaliação de Risco para o Sistema da Justiça (MPDFT), que identifica os apontadores de alerta máximo.

Com efeito, os dados presente no caso concreto evidenciam a urgente necessidade de se adotar medidas capazes de garantir de maneira efetiva a segurança física e psíquica da vítima, estancando-se de forma imediata os riscos de outros atos extremados e incontornáveis de violência doméstica.Vê-se, portanto, que a prisão cautelar do Representado é medida imprescindível no caso concreto para garantia da ordem pública, do cumprimento da Lei Penal e da segurança da vítima.

Isso posto, DECRETO A PRISÃO PREVENTIVA DE CLOVIS BATISTA MACHADO ITAQUY, nascido em 05/08/1967, filho de ISMAR FERNANDES ITAQUY e de HERONDINA MACHADO ITAQUY, com fundamento no art. 312 e parágrafo, e 313, inc. III do Código de Processo Penal, art. 147 do Código Penal e art. 24-A da Lei nº 11.340/06.

Expeçam-se Nota de Culpa e o correspondente Mandado de Prisão com prazo de validade de 3 (três) anos, registrando-o junto ao BNMP/CNJ e entregando-o à Autoridade Policial para cumprimento.

Recomende-se-o à Penitenciária Estadual de Santa Maria.

Comunique-se à Autoridade Policial."

Vê-se que referida decisão, de lavra da Juíza de Direito, Dra. Fernanda de Melo Abicht, encontra-se motivada, em observância ao disposto no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, não se verificando qualquer violação ao princípio da presunção de inocência, uma vez que devidamente fundamentada e legalmente amparada.

Com efeito, encontram-se presentes os requisitos do artigo 312 do CPP, para a decretação da prisão cautelar, quais sejam, o fumus comissi delicti e o periculum libertatis.

O fumus comissi delicti vem amparado nos indícios suficientes de autoria e prova da materialidade do delito, consoante registro de ocorrência policial e dos termos de declarações de testemunhas juntados aos autos, conforme elementos documentados nos autos do IP.

No caso em comento, segundo se depreende...

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