Acórdão nº 50096012020198210033 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Nona Câmara Cível, 24-06-2022

Data de Julgamento24 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50096012020198210033
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Nona Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002179771
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

19ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5009601-20.2019.8.21.0033/RS

TIPO DE AÇÃO: Promessa de Compra e Venda

RELATORA: Desembargadora MYLENE MARIA MICHEL

APELANTE: MARILIN JOHANN DE MELO (AUTOR)

APELADO: PROJETO IMOBILIARIO SPE 103 LTDA. (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por MARILIN JOHANN DE MELO contra sentença de parcial procedência proferida nos autos da Ação Indenizatória que propôs em face de PROJETO IMOBILIARIO SPE 103 LTDA.

Eis o dispositivo da sentença (evento 42, SENT1, da origem):

Face ao exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação indenizatória ajuizada por MARILIN JOHANN DE MELO em face de PROJETO IMOBILIÁRIO SPE 103 LTDA, apenas para o efeito de:

a) CONDENAR a parte ré ao ressarcimento dos valores despendidos a título de aluguel pela autora, em face do atraso na entrega da obra, relativos ao período de setembro de 2015 a fevereiro de 2016, a serem corrigidos pelo IGP-M, desde a data do desembolso, bem como acrescidos de juros de mora de 1% a.m, desde a citação.

Considerando a parcial procedência da ação, condeno cada um dos litigantes ao pagamento das custas processuais e dos honorários devidos ao procurador da parte adversa, fixados em 20% sobre o valor atualizado da condenação retro, na forma pro rata, vedada a sua compensação e suspensa a exigibilidade dos encargos devidos pela autora em face do benefício da gratuidade de justiça.

Interposto recurso de apelação por quaisquer das partes, e, considerando que não há mais juízo de admissibilidade em primeiro grau, tendo em vista o disposto no art. 1.010, do CPC, intime-se a parte contrária para apresentar contrarrazões, no prazo de 15 dias. No caso de haver recurso adesivo, intime-se a parte apelada para contrarrazões no mesmo prazo. Após, subam os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça do RS.

Nas razões recursais (Evento 45 da origem) a apelante sustenta a necessidade de reforma da sentença quanto à parcial procedência do pedido de indenização por danos materiais e de improcedência dos danos morais. Quanto aos danos materiais, afirma ter postulado não só o ressarcimento dos valores despendidos a título de aluguel de imóvel diverso, mas também das despesas condominiais a ele relativas. Dessa forma, afirma que não se tratada das taxas de condomínio do imóvel objeto da promessa de compra e venda, mas do imóvel locado em razão do atraso na entrega da obra. Também defende a necessidade de reforma da sentença quanto ao pedido de indenização por danos morais, ao argumento de que a jurisprudência deste Tribunal de Justiça é uniforme no sentido de que o atraso injustificado da obra caracteriza dano in re ipsa. Menciona ter recebido o imóvel com vícios construtivos - os quais são objeto de discussão nos autos de ação de obrigação de fazer autuada sob o nº 5007522-68.2019.8.21.0033 -, de modo que tal fato não configura mero dissabor, mas danos morais indenizáveis. Requer o provimento do recurso com a majoração dos honorários advocatícios.

Intimado, o apelado apresentou contrarrazões (Evento 47 da origem) alegando que o pedido deduzido na petição inicial de ressarcimento de cotas condominiais se refere ao imóvel objeto do contrato pactuado entre as partes, e não ao imóvel alugado pelo apelante. Afirma que o pedido de ressarcimento de despesas condominiais referentes ao imóvel locado está desprovido de fundamentação e que a invocação do princípio da reparação integral constitui inovação recursal. Em relação aos danos morais, afirma que o recurso não prospera, na medida em que o atraso na entrega da obra constitui inadimplemento contratual com reflexos obrigacionais. além disso afirma não haver prova dos danos morais alegadamente suportados. Pugna pelo desprovimento do recurso.

Remetidos os autos a esta Egrégia Corte, o recurso foi regularmente distribuído.

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Conheço do recurso, porquanto presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade aplicáveis à espécie..

Cuida-se, na origem, de Ação Indenizatória proposta por MARILIN JOHANN DE MELO, ora apelante, em desfavor de PROJETO IMOBILIARIO SPE 103 LTDA., ora apelada.

Em apertada síntese, extrai-se da petição inicial que a apelante celebrou instrumento particular de compromisso de compra e venda (Evento 2, CONTR4) com a apelada tendo por objeto o apartamento 202, bloco 13 do Condomínio Viver São Leopoldo situado na Av. Tomaz Edson, quadra 725-A, São Leopoldo - RS. Referiu que o prazo para entrega do imóvel estava aprazado para março de 2015, mas que as chaves do imóvel somente foram entregues em fevereiro de 2016.

Por essa razão, requereu a condenação da apelada ao pagamento de indenizações por danos materiais - consubstanciados nos valores despendidos a título de aluguel e condomínio do imóvel alugado onde residia - e por danos morais.

Conforme relatório supra, a ação foi julgada parcialmente ao escopo de condenar a apelada apenas ao ressarcimento dos valores pagos pelo apelante a título de aluguel de imóvel diverso.

Cinge-se a controvérsia em verificar: i) a possibilidade de ressarcimento dos valores pagos pelo apelante a título de condomínio do imóvel alugado onde residia; e ii) a configuração de danos morais indenizáveis.

Inicio o julgamento do recurso pela tese de inovação recursal suscitada nas contrarrazões.

1. Preliminar contrarrecursal:

A preliminar não comporta acolhimento.

Conquanto o Recurso de Apelação goze do efeito devolutivo amplo, o art. 1.013 do CPC é expresso ao consignar que podem ser objeto de análise pelo Tribunal apenas as questões propostas perante o juízo a quo, ainda que a sentença não as tenha analisado por inteiro:

"Art. 1.013. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada.

§ 1º Serão, porém, objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desde que relativas ao capítulo impugnado.

§ 2º Quando o pedido ou a defesa tiver mais de um fundamento e o juiz acolher apenas um deles, a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento dos demais."

A respeito do efeito devolutivo ínsito ao apelo, oportuna é a lição de Nelson Nery Júnior1:

"2. Devolução. O efeito devolutivo da apelação faz com que seja devolvido ao tribunal ad quem o conhecimento de toda a matéria efetivamente impugnada pelo apelante nas suas razões de recurso. Recurso ordinário por excelência, a apelação tem o maior âmbito de devolutividade dentre os recursos processuais civis. A apelação presta-se tanto à correção dos errores in iudicando quanto aos errores in procedendo, com a finalidade de reformar (função rescisória) ou anular (função rescindente) a sentença, respectivamente. O apelo pode ser utilizado tanto para a correção de injustiças como para a revisão e reexame das provas. A limitação do mérito do recurso, fixada pelo efeito devolutivo, tem como consequências: a) a limitação do conhecimento do tribunal, que fica restrito à matéria efetivamente impugnada (tantum devolutum quantum apellatum); b) proibição da reforma para pior; c) proibição de inovar em sede de apelação (proibição de modificar a causa de pedir ou pedido."

Como se observa, inviável o conhecimento de recurso que incorre em inovação recursal e altera o pedido ou a causa de pedir, sob pena de afronta aos princípios da estabilidade objetiva da demanda, da ampla defesa e do contraditório e supressão de instância jurisdicional.

Nesse sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO. CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA OU A PURGA DA MORA. INOVAÇÃO RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA NÃO SURESA. Trata-se de ação de rescisão de contrato que não contém pedido no sentido de impedir a consolidação da propriedade fiduciária ou a purga da mora. Inclusive este pedido também não foi veiculado na emenda à inicial O agravo de instrumento não merece ser conhecido por veicular matéria (consolidação da propriedade fiduciária ou a purga da mora) que não é objeto da lide, tampouco versada na decisão recorrida, o que caracteriza inovação recursal. A ausência de debate de determinada matéria não suscitada em primeiro grau impede sua apreciação pelo Tribunal, sob pena de supressão de instância. Observância da vedação à decisão surpresa (art. 10, CPC). NÃO CONHECERAM DO AGRAVO DE INSTRUMENTO.(Agravo de Instrumento, Nº 50294436620218217000, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo João Lima Costa, Julgado em: 18-06-2021)

No caso em apreço, não há falar em inovação recursal, na medida em que a apelante requereu expressamente, por intermédio do pedido de letra "b", a procedência da ação para que a requerida seja condenada "a indenizar a parte autora materialmente em valor a título de aluguel e condomínio do local onde residia, acrescido de indenização do valor do condomínio da unidade autônoma no valor de R$ 7.157,90".

Ou seja, formulou pedido expresso visando não só ao ressarcimento dos valores pagos a título de aluguel, mas também ao ressarcimento das despesas condominiais atinentes ao imóvel que alugava.

Oportuno referir que, intimado para juntar a carta de habitação do imóvel adquirido da apelada, a autora, ora apelante, inclusive opôs embargos de declaração (Evento 27, EMBDECL1) referindo que tal documento não era necessário para o deslinde da controvérsia, tendo em vista que o pedido visava ao ressarcimento dos valores despendidos com a taxa condominial do imóvel locado, e não do imóvel objeto do contrato pactuado com a ré.

De igual sorte, também não se verifica inovação recursal pelo fato de a apelante ter fundamentado a sua tese recursal no ...

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