Acórdão nº 50097877120218210001 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeira Câmara Criminal, 10-02-2022

Data de Julgamento10 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50097877120218210001
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001445222
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

1ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5009787-71.2021.8.21.0001/RS

TIPO DE AÇÃO: Decorrente de violência doméstica (art. 129, §§ 9º e 11)

RELATOR: Desembargador JAYME WEINGARTNER NETO

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

O Ministério Público ofereceu denúncia contra LUCAS NATAN SILVA GOUDINHO, dando-o como incurs o nas sanções dos artigos 129, § 9º, 147, caput (duas vezes), e 150, § 1º, combinados com o artigo 61, inciso II, alínea “a”, e na forma do artigo 69, “caput”, todos do Código Penal, pela prática dos seguintes fatos delituosos:

1º FATO: lesão corporal

No dia 26 de dezembro de 2020, no período compreendido entre as 19 horas até as 21 horas, na Rua Jaguari, nº 500, Bairro Cristal, nesta capital, o denunciado LUCAS NATAN SILVA GOUDINHO ofendeu a integridade corporal da vítima Kate Tamires Witt Nogueira, sua ex-companheira, causando-lhe as lesões corporais descritas no Laudo Pericial n.º 242613/2020: “em região do supercílio esquerdo há ferimento cortocontundente de bordos irregulares e acometendo subcutâneo, medindo vinte e cinco milímetros e apresenta crostas hemáticas aderidas”.

Na oportunidade, o denunciado, após dirigir-se até a residência da vítima, passou a discutir com ela. Ato contínuo, o acusado, de posse de uma garrafa de vidro, passou a agredir a ofendida, desferindo-lhe um golpe com o referido objeto na região da cabeça, bem como derrubando-a no chão e lhe chutando, ocasionando-lhe as lesões corporais acima descritas.

2º FATO: ameaça

Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar acima descritas, o denunciado LUCAS NATAN SILVA GOUDINHO ameaçou, mediante palavras, a vítima Kate Tamires Witt Nogueira, sua ex-companheira, de causar-lhe mal injusto e grave.

Na ocasião, após cessar as agressões, devido à intervenção do irmão da vítima, o denunciado passou a ameaçá-la, proferindo que “não iria deixá-la em paz; que iria infernizar a vida da vítima; que se ela não ficasse com ele, não ficaria com ninguém; que iria pendurar a cabeça da vítima; que iria matá-la; que iria buscar uma arma e ela iria ver; que iria colocar fogo na casa com suas filhas dentro” (sic), fato que lhe causou fundado temor.

A vítima ofereceu representação contra o denunciado, estando presente a condição de procedibilidade para a deflagração da persecução criminal.

3º FATO: violação de domicílio

No dia 27 de dezembro de 2020, aproximadamente às 13 horas, na Rua Jaguari, nº 500, Bairro Cristal, nesta capital, o denunciado LUCAS NATAN SILVA GOUDINHO entrou e permaneceu, clandestina ou astuciosamente, contra a vontade expressa ou tácita nas dependências da casa da vítima Kate Tamires Witt Nogueira, sua ex-companheira.

Na oportunidade, o denunciado, valendo-se de uma saída temporária da vítima da residência, invadiu a casa da ofendida, lá permanecendo até a sua chegada.

4º FATO: ameaça

Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar acima descritas, o denunciado LUCAS NATAN SILVA GOUDINHO ameaçou, mediante palavras, a vítima Kate Tamires Witt Nogueira, sua ex-companheira, de causar-lhe mal injusto e grave.

Na ocasião, após invadir a residência da vítima, o denunciado passou a ameaçá-la, proferindo que “iria colocar fogo na residência, matá-la e fugir com sua filha, caso não reatassem o relacionamento” (sic), fato que lhe causou fundado temor. Ato contínuo, depois de acionada, a Autoridade Policial, em diligência, prendeu o acusado nas proximidades do local, em razão dele estar na condição de foragido do sistema prisional.

A vítima ofereceu representação contra o denunciado, estando presente a condição de procedibilidade para a deflagração da persecução criminal.

Os delitos foram praticados por motivo fútil, eis que assim agiu o denunciado tão somente em razão de não aceitar o término do relacionamento que mantinha com a vítima, o que revela desproporcionalidade na conduta adotada.

O denunciado cometeu o delito prevalecendo-se das relações domésticas e familiares que possuía com a vítima, infringindo, assim, as prescrições contidas na Lei nº 11.340/06.

A denúncia foi recebida em 18 de fevereiro de 2021.

Após regular instrução, sobreveio sentença de procedência da ação penal para condenar o réu como incurso nas sanções dos artigos 129, § 9º, 147, caput (duas vezes) e 150, todos do Código Penal, à pena privativa de liberdade fixada em 08 (oito) meses e 28 (vinte e oito) dias de detenção, a ser cumprida em regime inicial semiaberto, além de R$ 3.000,00 a título de indenização. A Magistrada, em face da detração, determinou o cumprimento da pena privativa de liberdade remanescente de 06 (seis) meses e 02 (dois) dias de detenção.

Inconformada, a defesa busca a reforma da decisão. Em razões, aduz insuficiência probatória a ensejar a condenação do réu, razão pela qual requer a absolvição. Subsidiariamente, postula o redimensionamento das basilares ao mínimo legal, o afastamento da agravante prevista no artigo 61, inciso II, alínea "f", do Código Penal, a alteração do regime de cumprimento da pena para o aberto e, por fim, o afastamento da condenação do pagamento de indenização ou, ainda, a redução do valor fixado.

O Ministério Público apresentou contrarrazões.

Nesta instância, a Procuradoria de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso defensivo.

É o relatório.

VOTO

A materialidade delitiva restou consubstanciada pelo auto de prisão em flagrante, boletins de ocorrência policial, auto de exame de corpo de delito, bem como pela prova oral coligida.

A autoria, da mesma forma, é incontroversa.

Colaciono, por oportuno, trecho da sentença em que resumida a prova oral:

A vítima, Kate Tamires Witt Nogueira (evento 90), relatou que no dia 26 (vinte e seis) de dezembro estava na casa de seu compadre juntamente com o acusado e seu irmão Cannon. Disse que quando iniciou o relacionamento com o acusado já estava grávida de um outro relacionamento, salientando que após Lucas deixar o presídio foi morar com a depoente, pois estava de tornozeleira eletrônica. Referiu que a partir desse momento o acusado começou a lhe incomodar para saber quem era o pai da menina, afirmando a depoente que concedeu tal informação a Lucas, que não o conhecia. Relatou que todas as noites o acusado lhe perturbava para que ela fornecesse o endereço do pai da sua filha, afirmando que iria matá-lo e declarando que “eu era uma vagabunda, que eu tinha feito uma filha com um cara que não tava comigo”(sic). Afirmou que na época dos fatos "seus dias estavam horríveis" (sic), salientando que mandava Lucas embora de sua casa, sendo que o réu ameaçava-a, colocando uma faca na cintura. Ponderou que ele não "ia com a faca para cima" (sic) dela, mas que todas as vezes que, após brigas, ela lhe mandava embora de casa, Lucas colocava a faca na cintura para lhe amedrontar. Referiu que possui quatro filhas e que a sua filha de 13 anos possui verdadeiro pânico de Lucas, já que a infante assistia tudo dentro de casa. Destacou que à época o acusado sequer permitia que a depoente tomasse banho sozinha, observando que não tinha mais sua privacidade de mulher. Narrou que certo dia o acusado foi trabalhar com o pai dele, tendo a depoente então ido tomar um banho. Destacou que quando o acusado chegou quase a agrediu por ela ter tomado banho sozinha. Informou que o acusado maltratava suas filhas e que não estava mais aguentando essa situação. Disse que "quando mandou ele embora de verdade" (sic), antes de a polícia chegar, foi para a casa de seu irmão (que fica ao lado) com suas filhas, salientando que Lucas, diante disso, começou a colocar fogo na sua casa. Disse que como a polícia não chegava sua cunhada ingressou no imóvel e apagou o fogo que Lucas estava tentando colocar, salientando que nesse momento já estavam queimando roupas que havia posto em cima de um sofá. Referiu que neste momento a polícia chegou e conduziu Lucas até o Palácio da Polícia. Informou que no dia seguinte estava retornando do hospital (onde havia levado sua filha) e se deparou com o acusado, que havia sido solto. Disse que após uma discussão ela foi para a casa de seu compadre (que se localiza ao lado de seu imóvel), tendo o acusado ido também. Narrou que no local o acusado lhe ofendeu "de várias coisas" (sic), questionando quem era o pai da sua filha e a maneira como a criança havia sido feita (se em um motel ou na casa dela). Disse que logo após declarar ao réu que "isso não lhe interessava" (sic), ato contínuo Lucas pegou um copo de cerveja que estava na mão dela e arremessou no rosto da depoente, sendo necessários cinco pontos de sutura em razão do ferimento. Contou, ainda, que o acusado também lhe agrediu fisicamente lhe derrubando no chão e chutando, afirmando que seu irmão teve que intervir, embora estivesse bastante alcoolizado. Disse que seu compadre o colocou para fora e a depoente chamou a polícia novamente. Referiu que o acusado lhe disse que ela poderia chamar a polícia porque ele a mataria de qualquer maneira, dizendo também que iria infernizar a vida dela, que ela não viveria em paz e que se ela pensasse em colocar outra pessoa para dentro de casa veria quem ele era. Contou que de lá foi ao Hospital de Pronto Socorro e após ao Palácio da Polícia, onde pegou sua Medida Protetiva e voltou para casa. Disse que foi informada pelos policiais de que não poderiam levar Lucas preso, pois dentro de casa não poderiam pegar ele. Relatou, ainda, que no outro dia pela manhã, saiu de casa para ir a padaria, deixando suas filhas em casa sozinhas, Afirmou que ao retornar Lucas estava dentro da sua casa, salientando que suas filhas estavam chorando diante da presença do acusado. Referiu que nesse momento o informou de que ele não poderia estar no local em razão da medida...

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