Acórdão nº 50098174420208210033 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Nona Câmara Cível, 24-06-2022
Data de Julgamento | 24 Junho 2022 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Classe processual | Apelação |
Número do processo | 50098174420208210033 |
Tipo de documento | Acórdão |
Órgão | Décima Nona Câmara Cível |
PODER JUDICIÁRIO
Documento:20002256937
19ª Câmara Cível
Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906
Apelação Cível Nº 5009817-44.2020.8.21.0033/RS
TIPO DE AÇÃO: Assinatura Básica Mensal
RELATOR: Desembargador MARCO ANTONIO ANGELO
APELANTE: JUCIANE MARIZA BECKER (AUTOR)
APELADO: CLARO S.A. (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta por JUCIANE MARIZA BECKER contra a sentença proferida na ação de obrigação de fazer c/c repetição de indébito e reparação de danos morais ajuizada em face da CLARO S.A., com o seguinte dispositivo (Evento 32 do originário):
Diante do exposto, forte no art. 487, inciso I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados por JUCIANE MARIZA BECKER.
Condeno a requerente no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que vão fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, na forma do art. 85 do CPC, considerando o bom trabalho desenvolvido pelos profissionais e a exígua duração do feito. Suspensa a exigibilidade em razão da gratuidade da justiça deferida.
A parte-autora, declinando suas razões (Evento 38 do originário), requer a reforma da sentença para julgar procedente a sua pretensão de repetição de indébito e reparação de danos morais. Destacou a existência de indústria das cobranças indevidas e o astronômico lucro das empresas de telefonia, bem como a alteração unilateral e injustificada do contrato de telefonia pela falta de anuência prévia do consumidor e ausência de manifestação de vontade. Ressaltou a impossibilidade da prova negativa e a inversão do ônus da prova em favor do consumidor. Referiu a migração unilateral para o plano com aplicativos digitais e tarifas camufladas.
Foram apresentadas contrarrazões (Evento 41 do originário).
Cumprido o disposto nos artigos 931, 934 e 935 do CPC/2015.
É o relatório.
VOTO
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE TELEFONIA MÓVEL. ALEGAÇÃO DE COBRANÇA POR SERVIÇOS NÃO SOLICITADOS E DE INDEVIDA ALTERAÇÃO DO VALOR DO PLANO CONTRATADO.
Consoante o art. 22, caput, da Lei n. 8.078/90 - Código de Defesa do Consumidor – CDC – “os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos”.
Já o parágrafo único do mesmo dispositivo reza que “nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas e cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste Código”.
A ré explora serviços de telecomunicações mediante concessão da União, motivo pelo qual as normas previstas no CDC são aplicáveis aos serviços de telefonia por ela fornecidos.
Os fornecedores de produtos e serviços respondem pelos vícios que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor (arts. 18 e 20 do CDC).
A responsabilidade da companhia telefônica é objetiva quanto aos defeitos/vícios verificados na prestação de serviços.
Ademais, nota-se que entre as práticas abusivas vedadas pelo CDC, encontra-se o ato de enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço (art. 39, III, do CDC).
Nessas circunstâncias, a companhia telefônica deve ser responsabilizada pela cobrança de serviços não contratados e pela falha na prestação de serviços.
Contudo, embora tenha reconhecido ao consumidor o direito de informação sobre o negócio jurídico realizado com o fornecedor (art. 6º, III, da Lei n. 8.078/90 - Código de Defesa do Consumidor - CDC) e o direito de facilitação da sua defesa (art. 6º, VIII, do CDC), exige-se do autor a demonstração da existência dos danos e do nexo causal entre estes e a alegada falha na prestação de serviços, isto é, prova da plausibilidade das suas alegações, com indícios mínimos capazes de elucidar os fatos narrados na petição inicial, nos termos do inciso I do artigo 373 do CPC/2015.
Relativamente ao ônus probatório ensina Paulo de Tarso Vieira Sanseverino1 o seguinte:
Como, nas demandas que tenham por base o CDC, o objetivo básico é a proteção ao consumidor, procura-se facilitar a sua atuação em juízo. Apesar disso, o consumidor não fica dispensado de produzir provas em juízo. Pelo contrário, a regra continua sendo a mesma, ou seja, o consumidor, como autor da ação de indenização, deverá comprovar os fatos constitutivos do seu direito.
O fornecedor, como réu da ação de reparação de danos, deverá demonstrar os fatos impeditivos, modificativos e extintivos do direito do consumidor, bem como aqueles cujo ônus probatório lhe for atribuído pela lei ou pelo juiz.
[...]
No Brasil, o ônus probatório do consumidor não é tão extenso, inclusive com possibilidade de inversão do ônus da prova em seu favor [...] Deve ficar claro, porém, que o ônus de comprovar a ocorrência dos danos e da sua relação de causalidade com determinado produto ou serviço é do consumidor.
Para ilustrar, transcrevo jurisprudência deste Tribunal:
PELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. TELEFONIA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. COBRANÇA INDEVIDA. INOCORRÊNCIA. ÔNUS DA PROVA. ART. 373, CPC. INEXISTÊNCIA DE ATO ILÍCITO. EXISTÊNCIA DO DÉBITO: A versão apresentada pela autora não confere com a prova dos autos, porquanto se limita a aduzir os fatos sem produzir prova alguma da sua existência. Sequer convence da incidência do Código de Defesa do Consumidor, porquanto esse não exonera a parte fazer prova mínima da existência de suas alegações. O autor utilizou os serviços prestados pela empresa de telefonia mesmo após o mês de fevereiro de 2016, data em que supostamente havia solicitado o cancelamento da linha móvel, razão pela qual a prova dos autos não dá guarida a sua tese. Deste modo, é lícita a cobrança, inexistindo ato ilícito a dar ensejo à condenação por danos morais. Recurso não provido. SUCUMBÊNCIA RECURSAL: O art. 85, §11º, do CPC/15 estabelece que o Tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal. Sucumbência recursal reconhecida e honorários fixados em prol do procurador da parte demandada majorados. NEGARAM PROVIMENTO AO APELO.(Apelação Cível, Nº 70083404129, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo João Lima Costa, Julgado em: 20-02-2020)
DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER, CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. TV POR ASSINATURA. CORTE DE CANAIS. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO. A inversão do ônus da prova (art., 6º, VIII, do CDC), ainda que acolhida, não desobriga o consumidor de produzir a mínima prova acerca dos fatos alegados na petição inicial. No caso sub judice, o corte de canais pela empresa-ré não passou de mera alegação da parte-autora, já que nenhuma prova carreou para os presentes autos a esse respeito. Assim, não o fazendo, isso leva à manutenção da sentença que julgou improcedentes os pedidos. Apelação desprovida.(Apelação Cível, Nº 70083338285, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Voltaire de Lima Moraes, Julgado em: 12-12-2019)
Na hipótese dos autos, o conjunto probatório permite uma conclusão segura no sentido da inexistência de cobrança indevida pela companhia telefônica-demandada.
Em sua petição inicial (doc."INIC1" do Evento 01 do processo de origem) a parte-autora alega cobrança indevida decorrente dos serviços "COBRANÇA DE SERVIÇOS DE TERCEIROS CLARO BANCA PREMIUM, CLARO BANCA, CLARO GAMES, COMBO MÚSICA E CLARO VÍDEOS" que sustenta não contratados. Além disso, aduz indevida alteração do valor do plano contratado.
Contudo, a prova documental comprova que as rubricas alegadamente não contratadas se referem a...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO