Acórdão nº 50098301620198210021 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Cível, 24-11-2022

Data de Julgamento24 Novembro 2022
ÓrgãoSexta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50098301620198210021
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002981698
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

6ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5009830-16.2019.8.21.0021/RS

TIPO DE AÇÃO: Responsabilidade civil

RELATOR: Desembargador NIWTON CAES DA SILVA

APELANTE: JONAS ANDRE DE OLIVEIRA BENITES (AUTOR)

APELADO: BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL S/A - BANRISUL (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

JONAS ANDRÉ DE OLIVEIRA BENITES ajuizou ação de indenização por danos morais em face do BANCO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL S/A - BANRISUL, alegando que, no dia 24.10.2012, foi nomeado administrador judicial nos autos da ação declaratória de nulidade de ato administrativo, processo n° 021/1.12.0016115-9, assinando termo de compromisso em 26.12.2012. Disse ter sido autorizado pelo juízo a praticar atos jurídicos na qualidade de representante do Círculo Operário Passofundense, inclusive movimentar conta bancária da agência do réu estabelecida no Fórum, sendo incumbido do dever de contas de sua gestão bancária a cada seis meses. Relatou que, em audiência realizada no 03.06.2015, ficou determinado que o autor permaneceria presidindo a instituição ré pelo período de dois anos. Narrou que, no entanto, o banco réu, injustificadamente e sem prévia notificação, bloqueou o acesso do demandante à conta bancária, impossibilitando-lhe de prestar as devidas contas ao juízo. Discorreu sobre os danos morais decorrentes do ilícito praticado pelo demandado, que lhe impossibilitou de pagar, sacar e verificar extratos. Postulou a procedência da ação, com a condenação do réu ao pagamento do valor de R$ 100.000,00 a título de danos morais.

Sobreveio sentença de improcedência da ação, com a condenação da parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios do patrono da parte ré, arbitrados em 10% sobre o valor atualizado da causa, cuja exigibilidade resta suspensa em face da gratuidade de justiça deferida na origem (evento 29, SENT1).

A parte autora apelou aduzindo que o banco réu não negou ter bloqueado seu acesso à conta, pelo contrário, confirmou o bloqueio. Asseverou que sofreu enorme turbação de ânimo quando, de inopino, teve bloqueada a senha de acesso à conta, impedindo-o de recolher todos os dados para prestação de contas. Defendeu que o caso retrata típica relação de consumo onde o apelado é quem deveria comprovar inexistência do bloqueio apontado, o que não ocorreu no decorrer da tramitação processual. Sustentou ser remansosa a jurisprudência que reconhece a existência de reflexos e desdobramentos nos direitos da personalidade quando ocorre ilícito contratual. Mencionou que ônus probatório incumbe ao demandado. Requereu, assim, o provimento do recurso (evento 29, SENT1).

A parte ré apresentou contrarrazões (evento 37, CONTRAZAP1).

Os autos vieram conclusos em 28 de setembro de 2022.

É o relatório.

VOTO

Eminentes Colegas. Trata-se, consoante sumário relatório, de ação através do qual a parte autora pretende ser indenizada pelos danos morais experimentados em decorrência do bloqueio de seu acesso à conta bancária de titularidade da Escola Círculo Operário Passofundense, a qual estava autorizado judicialmente a gerir na qualidade de administrador judicial, nomeado nos autos do processo nº 021/1.12.0016115-9, julgada improcedente na origem.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Inicialmente, impende salientar que o artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor estabelece que consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

No caso em apreço, não há qualquer relação entre o autor e o banco demandado, pois a conta bancária era de titularidade da Escola Círculo Operário Passofundense, da qual o autor era administrador nomeado judicialmente.

A meu juízo, a situação retratada nos autos deve ser analisada sob a ótica da responsabilidade civil subjetiva prevista nos artigos 186 e 927 do Código Civil, os quais estabelecem que aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito, ficando obrigado a repará-lo.

Entretanto, ainda que fosse o caso de aplicação do CDC, como bem mencionado na sentença, não está a parte autora totalmente dispensada de trazer aos autos elementos mínimos de convicção que confiram verossimilhança às alegações deduzidas na exordial, mormente no tocante à efetiva impossibilidade de acesso à conta bancária, tendo em vista que se trata de fato constitutivo do direito alegado, aplicando-se o disposto no art. 373, inciso I, do CPC.

O fato de a relação ser de consumo não inverte de forma automática o ônus da prova, tendo em vista que a hipossuficiência deve ser em relação à capacidade de produzir e não de forma impositiva em prol do consumidor, que deve instruir seu pedido com elementos mínimos que permitam a aferição dos fatos narrados.

Nesse sentido, são os seguintes precedentes jurisprudenciais, in litteris:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DO INDÉBITO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. RELAÇÃO DE CONSUMO. REGRA DE INSTRUÇÃO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
1. A inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, não é automática, dependendo da constatação, pelas instâncias ordinárias, da presença ou não da verossimilhança das alegações e da hipossuficiência do consumidor.
2. Esta Corte Superior perfilha o entendimento segundo o qual ?a inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC, é regra de instrução e não regra de julgamento, motivo pelo qual a decisão judicial que a determina deve ocorrer antes da etapa instrutória, ou quando proferida em momento posterior, garantir a parte a quem foi imposto o ônus a oportunidade de apresentar suas provas? (REsp 1.286.273/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, Quarta Turma, julgado em 8/6/2021, DJe de 22/6/2021).
3. Agravo interno desprovido.
(AgInt no AREsp n. 2.162.083/SP, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 24/10/2022, DJe de 28/10/2022.)

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO E RESTITUIÇÃO DE VALORES C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. - CDC. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA PREVISTA NO INC. VIII DO ART. 6º DO CDC NÃO OCORRE DE MODO AUTOMÁTICO, MAS OPE JUDICIS. O DISPOSITIVO AUTORIZA O JULGADOR A INVERTÊ-LO QUANDO CONVENCIDO DA VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES OU DA HIPOSSUFICIÊNCIA, OU NÃO SE TRATAR DA FATO CONSTITUTIVO DO ALEGADO DIREITO. CIRCUNSTÂNCIA DOS AUTOS EM SE IMPÕE MANTER A SENTENÇA RECORRIDA. - JULGAMENTO ANTECIPADO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. NÃO HÁ CERCEAMENTO DE DEFESA PELO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE QUANDO A MATÉRIA DE MÉRITO É UNICAMENTE DE DIREITO OU SENDO DE DIREITO E DE FATO HÁ PROVA SUFICIENTE PARA O JULGAMENTO DO PROCESSO. CIRCUNSTÂNCIA DOS AUTOS EM QUE A ARGUIÇÃO PRELIMINAR É INSUBSISTENTE. - PRESCRIÇÃO. REPARAÇÃO DE DANOS. O PRAZO PRESCRICIONAL À PRETENSÃO DE REPARAÇÃO DE DANO MATERIAL OU MORAL, É O TRIENAL PREVISTO NO § 3º DO ART. 206 DO CÓDIGO CIVIL. CIRCUNSTÂNCIA DOS AUTOS EM QUE SE IMPÕE MANTER A SENTENÇA. RECURSO DESPROVIDO.(Apelação Cível, Nº 50079827320198210027, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: João Moreno Pomar, Julgado em: 26-10-2022)

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. TELEFONIA. CONSUMIDOR. COBRANÇA INDEVIDA DE SERVIÇOS NÃO CONTRATADOS. DEVOLUÇÃO EM DOBRO. FATURAS TRAZIDAS EM FASE DE LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. INCIDÊNCIA DE PRESCRIÇÃO TRIENAL. HONORÁRIOS MAJORADOS. Código de Defesa do Consumidor. Aplica-se o CDC às relações como a dos autos. Ônus probatório. Embora aplicáveis as regras do Código de Defesa do Consumidor, dentre elas a inversão do ônus da prova, imprescindível a presença de verossimilhança nas alegações do demandante, o que, no caso dos autos, ocorreu apenas em parte, pois a mera alegação de cobrança indevida, sem qualquer substrato probatório, não tem o condão de dar ao consumidor o direito à restituição pleiteada. O fato de a relação ser de consumo não inverte de forma automática o ônus da prova, tendo em vista que a hipossuficiência deve ser em relação a capacidade de produzir a prova e não de forma impositiva em prol do consumidor, que deve instruir seu pedido com elementos mínimos que permitam a aferição dos fatos narrados. Valores a serem repetidos. Cabe a devolução em dobro dos valores cobrados indevidamente por serviços não contratados, respeitado o prazo trienal, conforme art. 206, § 3°, IV, do CC/02. As faturas, necessárias para a elaboração da memória de cálculo, devem sem juntadas aos autos pela fornecedora do serviço quando da fase de liquidação de sentença. Não há como limitar-se a devolução às faturas anexadas aos autos, pois acarretaria o locupletamento ilícito da ré. Dano moral. Para se fazer jus à reparação por dano moral não basta alegar prejuízos aleatórios ou em potencial, é necessária a comprovação do dano efetivo sofrido pela parte. Demandante não logrou provar fato constitutivo de seu direito, nos termos do art. 373, inc. I, do CPC/15, não havendo comprovação de que a situação vivenciada ultrapassou a esfera do mero dissabor diário a que todos estamos sujeitos. DOU PARCIAL PROVIMENTO AO APELO, POR DECISÃO...

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