Acórdão nº 50102113020198210019 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Cível, 07-04-2022

Data de Julgamento07 Abril 2022
ÓrgãoOitava Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50102113020198210019
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001480970
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5010211-30.2019.8.21.0019/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5010211-30.2019.8.21.0019/RS

TIPO DE AÇÃO: Guarda

RELATOR: Desembargador LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por DENISE A. W. em face da sentença que extinguiu a ação de suprimento judicial de consentimento paterno e autorização para viagem da filha menor e domicílio no exterior ajuizada contra CRISTIANO V. B., pai da infante, com fundamento no art. 485, VI, do CPC - ausência de interesse processual e perda superveniente de objeto (evento 3 - PROCJUDIC9 - fls. 28/34 e PROCJUDIC11 - fls. 36/37).

Sustenta que (1) diante da demora na apreciação do pedido liminar e ante o risco de perder a oportunidade de trabalho, decidiu se apresentar na Itália, a fim de poder dar seguimento ao projeto de morar no exterior com a filha menor; (2) caso não se deslocasse na oportunidade e efetivasse a vaga de trabalho, o presente feito perderia o objeto, pois não teria mais disponível o meio de subsistência e a infante não teria mais vaga assegurada na escola italiana; (3) mantém o interesse em obter o provimento jurisdicional, chancelando sua viagem para o exterior juntamente com a filha, de modo a demonstrar que o interesse da menor é estar ao lado da mãe; (4) a infante tem qualidade de vida superior à que vinha dispondo no Brasil e está plenamente adaptada ao cotidiano do novo país; (5) o interesse processual está centrado na necessidade e utilidade da tutela jurisdicional; (6) seu interesse permanece hígido, já que o intuito é ter a situação da filha regularizada no país estrangeiro; (7) após sua ida à Itália, requereu imediatamente ao procurador que levasse ao conhecimento do juízo tal decisão e os procedimentos adotados e os justificasse, também comunicando ao genitor da criança, ora apelado, as razões da decisão tomada, o que restou registrado nos autos; (8) o julgador deixou de apreciar e julgar o mérito da demanda, extinguindo o feito sem resolução de mérito; (9) a circulação da menor é restrita ao país da Itália, justamente porque não possui autorização paterna para emissão do passaporte italiano; (10) com a nova proposta de trabalho, tem condições de angariar mais recursos financeiros, o que, somado aos que o país oferece no âmbito da educação e saúde gratuitos, além dos fatores segurança e estabilidade, melhor atendem aos interesses da infante; (11) embora tenha sido estabelecida a guarda compartilhada, é decisão provisória proferida nos autos da ação de guarda; (12) desde o nascimento, a filha sempre esteve em seu convívio, tendo sido demonstrado, em estudo social, que sua intenção é permanecer na companhia materna, pessoa que lhe é mais próxima e sempre zelou pelo seu bem-estar de forma responsável, seja na rotina do colégio, educação, cuidados com saúde, lazer e junto ao círculo de amigos, não lhe apresentando risco ou prejuízo; (13) o suprimento de autorização de viagem com residência no exterior e emissão de passaporte italiano não comporta dilação probatória, senão a oitiva de assistente social, a fim de verificar o melhor caminho a ser adotado em prol da menor; (14) tem total interesse no prosseguimento do feito, para análise da melhor condição para a infante, de modo que fique na companhia materna em moradia no exterior, onde terá melhor qualidade de vida; (15) nunca viveu sob o mesmo teto do genitor da criança, o qual ficava com a filha em esparsas oportunidades, que se resumiam a almoço no meio da semana e finais de semana alternados, quando não eram cancelados por justificativa de compromissos com estudos; (16) o convívio da menor com o genitor deve se amoldar à nova realidade, sempre visando ao melhor interesse da infante, bastando um simples ajuste na ação própria de regulamentação de visitas; (17) seu interesse na demanda não pode ser visto como sequestro internacional de criança, como vem sendo tratada a situação, pois resta justificada sua viagem à Itália; (18) é primordial que haja decisão concedendo suprimento à autorização do genitor para a filha Lara viajar e residir no exterior, pois, do contrário, poderão ser utilizados os meios da ACAF - Autoridade Central Administrativa Federal, tumultuando a vida da infante e podendo lhe causar algum trauma; (19) merece consideração a carta redigida pela própria filha e direcionada aos avós maternos, na qual menciona sua rotina, novidades e a satisfação com a vida nova; (20) o demandado nunca assumiu a criação e a educação da filha, transferindo aos avós paternos o pagamento dos alimentos, não sendo justo, nem razoável que venha a privar a menor de ter segurança e qualidade de vida em outro país; e (21) nunca impôs empecilho ao convívio entre pai e filha, tendo, inclusive, enviado fotos da menina ao réu assim que chegou na Itália e lhe dito para ligar e conversar com a filha, mas levou algumas semanas para ele manter contato, o que revela ausência de vínculo emocional com a menor. Pede a reforma da sentença, a fim de ser reconhecida a presença do interesse processual, dando-se prosseguimento ao feito, com o julgamento de mérito ou, entendendo que o feito se encontra apto para julgamento, requer a procedência da demanda, de modo a ser concedido o suprimento judicial de autorização de viagem e residência da menor no exterior, acompanhada da mãe/guardiã, com determinação expressa de emissão de passaporte italiano (evento 3 - PROCJUDIC11 - fls. 45/50 e PROCJUDIC12 - fls. 01/15).

Contrarrazões no evento 3 - PROCJUDIC13 - fls. 44/50 e PROCJUDIC14.

Em petição anexada ao evento 8 desta instância, a autora/apelante juntou documentos, dando conta do indeferimento do pedido paterno de repatriação da menor pela autoridade italiana (Tribunal da Infância e da Juventude da Emília Romagna em Bolonha).

O Ministério Público opina pelo desprovimento (evento 9 nesta instância).

O presente recurso foi incluído na pauta de julgamento da sessão virtual de 03.02 passado, contudo, em virtude da juntada de documentos novos pela autora/apelante - relatório de assistente social e decisão do Tribunal da Infância e da Juventude da Emília Romagna, Itália, acerca da permanência da infante naquele país -, foi pleiteada a intimação do apelado para manifestação (eventos 8 e13), o que restou deferido, com a retirada de pauta da sessão (evento 14), sobrevindo resposta no evento 21.

É o relatório.

VOTO

Adianto que estou em prover o recurso.

É bem verdade que a presente ação foi ajuizada em 30.10.2018 e a mudança de domicílio da autora e da filha menor Lara para o exterior ocorreu em 15.05.2019, ou seja, antes mesmo da autorização judicial ora reclamada.

Também é verdade que os genitores exercem a guarda compartilhada da criança, concedida em caráter provisório nos autos da ação de guarda, visitas e oferta de alimentos ajuizada pelo pai (processo nº 019/1.17.0007644-0), ainda em tramitação.

Contudo, com a devida vênia, não vejo razão para a extinção do feito, sem julgamento de mérito, por falta de interesse processual da autora e perda superveniente de objeto, como decidiu o juízo na origem.

Pelo que se observa da prova dos autos, há uma explicação plausível para a atitude tomada pela demandante.

Começa que o pedido liminar de suprimento judicial de consentimento paterno e autorização para viagem da filha menor e domicílio no exterior nem sequer foi apreciado, e exigia urgência. O julgador optou por ouvir a parte contrária antes de deliberar sobre o pleito.

E, após apresentada a contestação, o feito acabou sendo redistribuído para a 2ª Vara de Família e Sucessões de Novo Hamburgo/RS, onde já tramitava a ação de guarda, visitas e alimentos promovida pelo genitor, em decisão datada de 03.05.2019.

Em petição protocolada em 16.05.2019, a autora veio aos autos noticiar sua ida para a Itália com a filha, em virtude da proposta de trabalho que recebera na área de sua formação acadêmica (fisioterapia), com prazo de validade de aceitação (60 dias), iniciado em fevereiro de 2019. Para tanto, necessitava validar sua qualificação profissional perante os órgãos competentes na Itália (evento 3 - PROCJUDIC8 - fls. 19/23).

Vê-se que a mudança para o exterior, sem prévia autorização judicial, não foi despropositada, tinha motivação, de modo que não se vislumbra má-fé ou mesmo irresponsabilidade na atitude da demandante, a qual pretende proporcionar à filha melhor qualidade de vida, educação e saúde.

E mesmo que as questões afetas à criança estejam sendo discutidas na ação movida pelo genitor, ora demandado (pensão, convivência e guarda), é fato que a permanência de Lara no exterior, na companhia materna, precisa ser definida/chancelada, até para não configurar eventual crime por parte da genitora. Situação fática, aliás, que perdura há mais de 2 anos.

Daí porque tenho como evidente o interesse processual da autora/recorrente em ver regularizada a situação da filha Lara, de 11 anos de idade...

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