Acórdão nº 50105440920198210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Cível, 02-03-2023

Data de Julgamento02 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50105440920198210010
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoOitava Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003177428
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5010544-09.2019.8.21.0010/RS

TIPO DE AÇÃO: Guarda

RELATOR: Desembargador RUI PORTANOVA

RELATÓRIO

Trata-se de ação de guarda cumulada com alimentos e regulamentação de convívio ajuizada por DINARIA e os filhos comuns MIGUEL e CARLA, menores, em face de EDSON.

Na inicial, a autora DINARIA requereu a guarda unilateral dos filhos. MIGUEL e CARLA requereram a fixação de alimentos a serem suportados pelo genitor no valor de 01 salário mínimo, bem como a fixação e convívio paterno-filial.

Liminarmente, a guarda foi concedida a genitora, sendo regulamentado o convívio paterno-filial, e foram fixados alimentos em 80% do salário mínimo (Evento 6 dos autos de origem).

Devidamente intimado, o demandado deixou de oferecer contestação (Eventos 12 e 18 dos autos de origem).

O demandado manifestou-se aos autos, requerendo a guarda dos filhos comuns. Alternativamente, pede a redução da obrigação alimentar para 15% do salário mínimo (Evento 52 dos autos de origem).

Os alimentos provisórios foram reduzidos para 50% do salário mínimo (Evento 65 dos autos de origem).

Determinada a avaliação psicológica das partes, bem como o estudo social do núcleo familiar, vieram os laudos aos autos (Eventos 94, 107 e 116 dos autos de origem).

Após o acoste dos laudos, a genitora requereu a suspensão do convívio paterno-filial (Evento 119 dos autos de origem).

Novos laudos, referentes a avaliações com o genitor, foram acostados (Eventos 147 e 151 dos autos de origem).

A genitora manifestou-se pela manutenção do convívio paterno-filial como fixado - de forme assistida. Alternativamente, pediu pela suspensão do convívio até o término da apuração da denúncia de abuso sexual - supostamente praticada pelo genitor contra a filha (Evento 158 dos autos de origem).

Realizada audiência de instrução, na qual o genitor não compareceu, foi suspenso convívio paterno-filial presencial, facultado o contado por vídeo chamado (Evento 187 dos autos de origem).

O genitor requereu, em tutela de urgência, a redução da verba alimentar para 20% do salário mínimo (Evento 198 dos autos de origem).

Memoriais da parte autora ao Evento 200 dos autos de origem.

A sentença julgou parcialmente procedente os pedidos (a) concedendo a guarda dos filhos à genitora; (b) regulamentando o convívio paterno-filial em sábados alternados, das 13hs as 17hs, de forma assistida; e (c) ficando alimentos no valor de 50% do salário mínimo e, em caso de vínculo formal de emprego, 30% dos rendimentos líquidos (Evento 210 dos autos de origem).

Ambas as partes recorreram.

A genitora requereu a suspensão do convívio paterno-filial (Evento 218 dos autos de origem).

O genitor requereu a redução dos alimentos para 20% do salário mínimo (Evento 219 dos autos de origem).

Ambas as partes apresentaram contrarrazões (Eventos 223 e 224).

O Ministério Público com atuação neste grau de jurisdição opinou pelo desprovimento do recurso do genitor, e pelo parcial provimento do recurso da genitora, para manter o convívio paterno-filial mas em horário flexível (Evento 07).

É o relatório.

VOTO

As matérias devolvidos nos apelos das partes são diferentes.

A genitora recorre quanto ao convívio do genitor com os filhos comuns. E o genitor recorre quanto a verba alimentar fixada.

Vejamos.

Apelação da genitora. Convívio paterno-filial.

A sentença regulamentou o convívio paterno-filial a ser exercido em sábados alternados, das 13hs as 17hs, sendo intermediado pelo filho mais velho do casal, Maicon e pela nora Mariane, para acompanhar o convívio em sua integralidade.

Disse a sentença:

"Não há como negar a necessidade de manutenção do vínculo existente entre pai e filhos, e até mesmo destes com a família paterna após a separação do casal. Trata-se, ademais, de um direito legalmente assegurado, conforme art. 1.589 do CC.

O direito de visitas é, antes de tudo, um direito do menor e um dever dos pais, sendo dever do genitor guardião possibilitar tal convívio com o outro.

Assim, face as peculiaridades do caso concreto, no presente feito, a fim de manter fortalecidos os vínculos afetivos entre genitores e menores, tenho por adequado regulamentar que as visitas paternas ocorram em sábados alternados, das 13h às 17h, nos termos do que já vem ocorrendo, conforme laudos dos eventos 116, 147 e 151.

Nesse sentido, diante da existência de processo de medidas protetivas em desfavor do réu (autos n. 5006622-52.2022.8.21.0010), a visitação deverá continuar a ser intermediada pelo filho mais velho do casal, Maicon e a nora Mariane, que acompanharão as visitas em sua integralidade.

Outrossim, ressalto que tal direito de visitação é mínimo e pode ser ampliado ou mesmo modificado, desde que consensualmente entre as partes, independente de decisão judicial."

Agora recorre a genitora.

Requer a suspensão do convívio.

Alega que os laudos acostados aos autor relatam "maus tratos perpetrados contra o filho MIGUEL, e a lascívia com que o apelado tratava a filha CARLA". Menciona que, em uma madrugada, encontrou o apelado deitado sobre a filha menor, e que o mesmo furtava as calcinhas da menina. Relata que o filho MIGUEL não gosta de conviver com o pai, e ia nas visitas apenas para evitar que sua irmã ficasse sozinha com o genitor, pois o genitor negava comida ao filho e o tratava de maneira ríspida. Afirma que o genitor faz uso abusivo de álcool. Pontua que, em que pese a sentença tenha determinado que o convívio deve ser intermediado por Maicon e Mariane, os mesmos não desejam participar das visitas.

Pois bem.

Em que pesem as alegações e abuso praticado pelo genitor contra a filha, nenhuma prova corroborando os fatos narrados foram acostados aos autos.

A menina realizou avaliação psicológica e participou de estudo social, e em momento algum narrou a prática de atos de abuso sexual por parte do genitor.

De qualquer sorte, considerando as peculiaridades do caso que foram relatadas pelos profissionais que acompanharam o núcleo familiar, o convívio paterno-filial foi determinado de forma assistida, justamente para evitar qualquer prática abusiva do genitor para com os filhos, seja algum ato lascivo com a filha CARLA, seja prática de maus-tratos contra o filho MIGUEL.

Tal como decidiu a sentença, entendo ser caso de manter o convívio, seja porque os laudos acostados aos autos sugerem nesse sentido, seja porque os próprios filhos relatam que, muito embora discordem de algumas posturas do genitor, desejam continuar convivendo com o mesmo.

Vejamos os laudos acostados aos autos, confeccionados por profissionais que acompanharam o núcleo familiar, e que contam com relatos dos filhos.

Relatório Psicológico do Ambulatório Municipal de Atenção à Criança e ao Adolescente Vítimas de Maus Tratos (Evento 94 dos autos de origem):

Os irmão Carla e Miguel foram encaminhados ao APOIAR pelo Conselho Tutelar em janeiro de 2020 para realizar avaliação psicológica em fundação de presenciarem constantes conflitos e agressões físicas e verbais entre os genitores. (...)

Acerca da suspeita que [a genitora] tinha sobre a possibilidade de abuso sexual relacionado à filha Carla, a mãe referiu que a menina já lhe negou que algo houvesse acontecido. A mãe só considera inadequado ainda a forma como o pai quer estar sempre mantendo comunicação com Carla pelo celular, com diferença no tratamento que dispensa para Miguel. (...)

Carla negou que ele [genitor] tivesse lhe tratando mal em algum momento, assim como nega qualquer atitude na área sexual por parte do genitor. (...)

Tendo em vista os relatos acima, percebeu-se que, apesar das relações familiares conflituosas pelas quais passaram, Carla e Miguel mostraram-se bem emocionalmente neste momento, ambos sentindo-se tranquilos no convívio diário com a genitora, o companheiro dela e os irmão mais velhos. Assim por não apresentarem sintomas traumáticas atualmente, receberam alta deste Serviço." - destaques não originais.

Laudo Social, confeccionado pela Assistente Social (Evento 107 dos autos de origem):

Miguel justifica que “não o considera seu pai”, pois “nunca foi tratado como filho” por ele. Explica que somente comparece na casa paterna para as visitas, pois a irmã Carla quer continuar indo. Se sente na “obrigação” de acompanhá-la para “cuidá-la”, sendo que seu irmão mais velho e sua cunhada os acompanham. (...) Relata que durante as visitas o pai compra lanches diferentes, como xis-burguer, somente para Carla e como ela insiste, ele acaba comprando, eventualmente, também para ele. Em algumas visitas, relata que o pai não serve nenhum lanche para eles. Não concorda com outras atitudes como o fato do pai não pagar uber para o deslocamento para as visitas, conforme se comprometeu. Quem paga é Maicon. Menciona que numa determinada ocasião, o pai lhes entregou R$ 20,00 (dividido entre ele e Carla), porém ele entregou para o irmão para pagar o uber. (...) Manifesta interesse em reduzir as visitas, sugerindo que seja para sábados intercalados das “14 às 17 horas”. Embora o horário estipulado seja “das 9h às 19 horas”, relata que, atualmente, comparecem das 13 às 19h”.

Carla relata que “gosta de visitar o pai, porque é uma oportunidade de brincar com seus animais de estimação e jogar videogame”. Como residiam todos nesta casa, está acostumada naquele ambiente. Confirma que seu pai “não gosta de Miguel”, o que a incomoda, mas “não se envolve”. Afirma que “nunca fica sozinha com o pai”, e que “ele costuma lhe dar dinheiro para comprar doces e refrigerantes, mas não dá para o irmão”. Como considera injusto, pede a ele que dê ao irmão também. Diz ter presenciado várias vezes o pai sendo agressivo com a mãe, quando estavam juntos e, mesmo separados, ele “costuma falar mal dela em sua...

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