Acórdão nº 50107349820218210010 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeira Câmara Criminal, 10-02-2022

Data de Julgamento10 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50107349820218210010
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001373585
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

1ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Criminal Nº 5010734-98.2021.8.21.0010/RS

TIPO DE AÇÃO: Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas (Lei 11.343/06)

RELATOR: Desembargador SYLVIO BAPTISTA NETO

APELANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

APELADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

1. Ricardo de Bitencourt Pontes foi denunciado como incurso nas sanções dos artigos 33 da Lei 11.343, 244-B da Lei 8.069 e 16, §1º, da Lei 10.826, (denúncia recebida em 14 de maio de 2021) e, após o trâmite do procedimento, condenado às penas de onze anos e nove meses de reclusão, regime fechado, e seiscentos e quarenta e dois dias-multa. Descreveu a peça acusatória que, no dia 18 de abril de 2021, o denunciado, acompanhado do adolescente William, foi detido, porque tinha em depósito, para fins de tráfico, três tijolos de maconha (2,09kg). Na ocasião apreenderam-se armas de fogo e munição.

Inconformada com a decisão, a Defesa apelou. Em suas razões, o Defensor arguiu uma preliminar (violação de domicílio) e, no mérito, postulou a absolvição do apelante ou a desclassificação do delito de tráfico ou o redimensionamento da punição. Em contrarrazões, o Promotor de Justiça manifestou-se pela manutenção da sentença atacada.

Nesta instância, em parecer escrito, a Procuradora de Justiça opinou pelo parcial provimento do recurso.

(Esta Câmara adotou o procedimento informatizado, tendo sido atendido o disposto no artigo 613, I, do CPP)

VOTO

Antes de iniciar o voto, destaco que o fato de reproduzir parte da decisão com o fundamento do julgador não causa nenhuma nulidade, pois não viola a exigência constitucional da motivação.

Neste sentido é a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a Corte responsável pelo controle da constitucionalidade da lei e de atos judiciais. Exemplo:

"A jurisprudência desta Corte é no sentido de que não viola a exigência constitucional da motivação o acórdão de segunda instância que adota como razões de decidir fundamentos contidos na sentença recorrida. Precedentes." (Ag. Reg. no Recurso Extraordinário 1.099.396, Primeira Turma, Relator Roberto Barroso).

Depois, eu poderia, se quisesse, usar da mesma fundamentação da decisão judicial, mas determinando que a minha assessoria, usando os mesmos argumentos, trocassem palavras e verbos por seus sinônimos, invertessem frases ou parte delas etc., e todos diriam que a fundamentação era deste Relator.

Mas o referido acima não seria honesto. Prefiro reproduzir a sentença ou decisão como proferida. Deste modo, valorizo o trabalho do colega quem, efetivamente, teve o esforço intelectual da argumentação jurídica e fática, para mostrar, fundamentalmente, porque tomou aquela decisão.

2. A preliminar se confunde com o mérito, pois, se fosse acolhida (e não o será), implicaria na absolvição do apelante.

O apelo procede parcialmente e com relação à agravante da calamidade. A prova, conforme salientou o ilustre julgador, Dr. Samuel Borges, mostrou-se segura (e válida) a respeito da existência dos delitos de tráfico de drogas, corrupção de menores e posse de arma de fogo.

Com relação à prova condenatória – depoimentos de policiais - sempre afirmo que os depoimentos dos policiais envolvidos nas diligências devem ser analisados como os de qualquer outra pessoa. E, por uma questão lógica e racional, eles preponderam sobre a declaração de quem é acusado de um delito, pois geralmente este tenta fugir de sua responsabilidade penal. Ora, não se imagina que, sendo o policial uma pessoa séria e idônea e sem qualquer animosidade específica contra o agente, ele vá a juízo mentir, acusando um inocente.

Sua declaração, como a de todas as outras testemunhas e vítimas, deve ser examinada apenas pelos elementos que contém. Confrontar-se-á com as outras provas obtidas na instrução e até com a qualidade da pessoa que depôs. Se a prova sobrevive após esta análise, ela é forte para a condenação, não importando quem a trouxe.

E foi o que ocorreu aqui, como já referido acima.

Tendo em vista que os argumentos do recurso já foram examinados na decisão de primeiro grau, permito-me transcrevê-la. Faço-o porque com ela concordo e homenageio o trabalho do colega.

Destaco os trechos importantes da sentença:

"Inicialmente, quanto à arguição de nulidade das provas obtidas por ocasião da autuação em flagrante do réu em razão da ausência de mandado judicial ou justa causa para ingresso na residência, sem razão a Defesa, adianto.

"Pois, mostrou-se regular a atuação dos policiais militares com o ingresso no imóvel diante da suspeita de prática de ilícito no local, durante diligências para apuração de delitos de homicídio ocorridos dias antes, quando depararam-se com agente que tentou empreender fuga ao visualizar os policiais, o qual foi detido após ingressar no apartamento e, na mochila que trazia consigo, foi apreendido uma porção de maconha com peso aproximado de um quilograma; naquele imóvel onde o adolescente teria tentado se ocultar, residência do ora acusado, foram encontrados outros dois invólucros de substância entorpecente, pesando cerca de um quilograma de maconha, juntos, além de balanças de precisão, uma arma de fogo e caderno com anotações e, na ocasião, teriam declinado aos policiais que havia mais ilícitos em um outro endereço, para onde a guarnição deslocou-se e apreendeu, desta vez, outras armas de fogo, munições e carregadores.

"Ou seja, diversamente do alegado pela Defesa técnica, havia, sim, fundadas suspeitas da prática de crime.

"Ademais, tratando-se de crime de natureza permanente, o tráfico, assim como a posse de armas de fogo, nas modalidades elencadas na inicial, especialmente no tocante a guardar e ter em depósito, estava em execução, a justificar o ingresso dos policiais no imóvel diante das suspeitas evidenciadas, ainda que de modo forçado, sem autorização dos moradores. E ainda, prescinde a necessidade de flagrante da efetiva venda, manuseio, preparo ou comercialização dos entorpecentes, desde que respaldado com base em outras provas que indiquem a prática ilícita do tráfico.

"Nessa direção: "..."

"...

"Em relação ao crime de tráfico de drogas, a materialidade resta comprovada...

"...

"Com relação à autoria, também evidenciada, adianto.

"...

"Em tal contexto, em que pese a negativa do acusado, o relato uníssono dos Policiais Militares, confirmando que durante as diligencias realizadas para tentar apurar informações de crimes contra a vida receberam informações relacionadas ao endereço onde residia o ora acusado, e depararam-se com o adolescente William nas escadarias do prédio, este, ao visualizar os policiais tentou frustrar a abordagem e ingressou no imóvel do réu, sendo seguido pela guarnição; já no imóvel, os policiais realizaram a revista nos suspeitos e no apartamento, vindo a encontrar drogas tanto na mochila que William trazia consigo quanto sobre uma mesa, além de outros materiais comuns da traficância, como balança de precisão e um caderno de anotações, tudo registrado nas fotografias anexadas no relatório final, carregado no evento 50, com minúcias acerca das anotações do caderno apreendido, relacionando nomes e valores, característica também comum em apreensões relacionadas ao tráfico de drogas; além disso, ainda de acordo com a versão dos policiais e do adolescente em sede policial, William e Ricardo estavam agindo juntos, assim, certa a posse do réu sobre as substâncias entorpecentes apreendidos no fato em tela.

"E mais, reforçando a versão dos policiais, a análise do conteúdo do aparelho celular do acusado Ricardo, carregada no evento 50, do expediente vinculado, fls. 47/53, onde recuperadas fotografias na galeria de imagens do dispositivo, havendo registro de armas de fogo, munições (muito semelhantes com aquelas apreendidas), e também segurando uma porção de drogas e ostentando uma arma de fogo na cintura.

"Outrossim, a apreensão dos tóxicos na moradia do réu, em quantidade incompatível com hipótese de exclusivo consumo pessoal - cerca de dois quilogramas de substância - é contexto de prova suficiente que se mostra suficiente para amparar decreto condenatório pelo delito de tráfico de drogas, inviável a desclassificação para posse para consumo próprio.

"Registro, ainda, que o crime de tráfico de drogas é daqueles de múltipla ação, dispensando a flagrância do efetivo ato de comércio, não havendo distinção para comprovação do delito entre o ato de vender, possuir, guardar ou ter em depósito, bastando a demonstração de que os tóxicos destinavam ao consumo de terceiros, o que, reforço, é validado pelo montante apreendido; e, por tais fundamentos, inviável a desclassificação para hipótese de exclusivo consumo pessoal.

"Ademais, não há razão para que a palavra dos policiais seja recebida com ressalvas, pois, em delitos dessa natureza – tráfico de entorpecentes – é especialmente difícil a coleta de provas, diante do temor demonstrado por testemunhas que presenciam as práticas; além do que, não há nenhuma notícia de animosidade pretérita que comprometesse a validade dos depoimentos e, ausentes quaisquer elementos de convicção que demonstrem algum tipo de perseguição contra estes; mas ao contrário, merecedora de credibilidade a palavra dos agentes com munus publicum de justamente zelar pela segurança de todos.

"E sobre a relevância do relato dos policiais em detrimento à negativa do acusado, colaciono os seguintes julgados: "..."

"Tampouco merece trânsito a tese de defesa pessoal no sentido de que os tóxicos pertenciam exclusivamente ao adolescente, uma vez que de acordo com os militares, havia drogas sobre uma mesa na residência de Ricardo, localizada quando do ingresso no imóvel após a perseguição do adolescente, ou seja, a droga já se encontrava na casa do réu antes do...

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