Acórdão nº 50107464320218210033 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 29-06-2022

Data de Julgamento29 Junho 2022
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo50107464320218210033
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002256026
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5010746-43.2021.8.21.0033/RS

TIPO DE AÇÃO: Cláusulas Abusivas

RELATOR: Desembargador FERNANDO FLORES CABRAL JUNIOR

APELANTE: BANCO BMG S.A (RÉU)

APELADO: LUIZ CARLOS DA ROSA BORBA (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por BANCO BMG S/A em face da sentença prolatada nos autos da ação de obrigação de fazer em que contende com LUIZ CARLOS DA ROSA BORBA. Constou na sentença apelada (Evento 26):

“[...] Ante o exposto, com base no art. 487, inc. I do CPC, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados por LUIZ CARLOS DA ROSA BORBA em face de BANCO BMG S.A. p a r a DECLARAR nula a cláusula contratual que autoriza a realização de descontos no benefício previdenciário da parte autora sem estabelecer prazo final e CONVERTER a contratação em empréstimo pessoal consignado para aposentados do INSS, devendo serem amortizados os valores pagos/descontados a fim de apurar eventual saldo devedor.

Nos termos da fundamentação supra, caso apurada a existência de crédito em favor da parte autora, autorizar a repetição do indébito, na forma simples, acrescido de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação e de correção monetária pelo IGP-M desde a data de cada desconto realizado. Já, no caso de haver saldo devedor, determinar o recálculo das parcelas mensais com estipulação de prazo final de pagamento, levando em consideração a taxa média de juros remuneratórios divulgada pelo Banco Central para data da contratação da espécie contratual referida (2,21% ao mês e 29,92% ao ano) e os limites legais acerca dos descontos no benefício previdenciário.

Condeno a parte demandada ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.200,00), corrigidos pelo IGP-M a contar da presente decisão, com juros moratórios de 1% ao mês, a partir da data do trânsito em julgado da sentença, forte no que dispõe o artigo 85, §8º, do CPC.

Interposto recurso de apelação, intime-se a parte contrária para o oferecimento de contrarrazões, no prazo de 15 (quinze) dias. Da mesma forma, havendo interposição de apelação adesiva, intime-se a parte contrária para apresentar suas contrarrazões, no mesmo prazo. Após, remetam-se os autos para o Tribunal de Justiça, em consonância com o que dispõe o artigo 1.010,

§3º, do CPC.

Com o trânsito em julgado e nada sendo requerido, proceda-se à baixa do presente feito.

Em suas razões recursais, a parte apelante argui, preliminarmente, a prescrição do pedido de indenização por danos materiais e morais. Assevera a decadência das pretensões autorais. Requer a extinção do processo com resolução de mérito, nos termos do art. 487, II, do CPC. Aduz ter cumprido integralmente o ônus que lhe cabia, demonstrando a legalidade da contratação. Menciona que, no documento assinado pela parte autora, constava a modalidade contratual em questão. Informa ser o termo de adesão redigido de forma simples, clara e de fácil compreensão. Assevera ter a parte autora efetuado saques, utilizando-se do cartão de crédito contratado. Esclarece o funcionamento do cartão de crédito consignado. Destaca não ter omitido informações contratuais. Afirma que apenas o valor mínimo das faturas é descontado em folha de pagamento. Sustenta que o débito deve ser adimplido mediante pagamento da fatura para que seja quitado. Colaciona jurisprudência alinhada a sua argumentação. Defende não caber repetição de valores ao caso, dada a licitude das cobranças. Informa que o cliente só terá o desconto equivalente ao valor da RMC se utilizar todo o limite do cartão. Pleiteia, caso haja condenação para restituir os valores descontados, que seja observado os descontos efetivos. Requer a manutenção do canal utilizado para os descontos dos valores, se mantida a alteração da modalidade contratual ou, alternativamente, a mudança da forma de pagamento para boleto bancário. Pede a compensação do crédito liberado em favor da parte autora. Menciona que o advogado da parte autora ajuíza diversas ações idênticas, com petições genéricas. Pleiteia a intimação pessoal da parte autora, a fim de verificar se possui conhecimento da ação proposta. Requer a condenação do advogado por litigância de má-fé e a expedição de ofícios às autoridades competentes para que apurem os indícios de infrações disciplinares e ocorrência de conduta típica. Manifesta interesse em prequestionar a matéria arguida. Postula o provimento do presente apelo. (Evento 33).

Foram apresentadas contrarrazões no Evento 36.

É o relatório.

VOTO

A presente apelação interposta no Evento 33 é tempestiva, pois o prazo para recorrer da sentença iniciou em 15/02/2022 e findou em 09/03/2022 (Evento 27), sendo que o recurso foi interposto no dia 15/02/2022 (Evento 33). Além disso, a parte apelante comprovou o recolhimento do preparo (Evento 32).

Dessa forma, considerando que é própria e tempestiva, recebo a apelação, a qual passo a examinar.

1. PRELIMINAR RECURSAL. PRESCRIÇÃO. REPETIÇÃO DO INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.

Defende a parte ré a aplicação, no caso concreto, do prazo prescricional previsto art. 206, §3º, incisos IV e V, do Código Civil, qual seja, o trienal, quanto à pretensão de restituição dos valores descontados a título de contrato de cartão de crédito consignado, bem como de indenização por danos morais.

Razão não lhe assiste, conforme passo a expor.

Na hipótese, considerando que a parte autora alega serem indevidos os descontos realizados pelo banco réu a título de “Empréstimo sobre a RMC”, a controvérsia posta nos autos cinge-se à análise da licitude ou de eventual nulidade do contrato de cartão de crédito consignado firmado entre as partes.

Assim, revendo meu posicionamento anterior, entendo que, à luz do disposto no art. 169 do Código Civil, existente alegação de nulidade da avença celebrada entre os litigantes, não há falar na ocorrência da prescrição da pretensão de repetição do indébito, visto que “o negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo."

A respeito do tema, colaciono julgado do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CONTRATO. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL DE ASCENDENTE A DESCENDENTE POR INTEOSTA PESSOA.

SIMULAÇÃO.

REEXAME DE PROVAS. NULIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO. DECADÊNCIA.

INEXISTÊNCIA. ATO NULO INSUSCETÍVEL DE CONVALIDAÇÃO PELO DECURSO DO TEMPO. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.

1. O Tribunal de origem, com fundamento na prova documental trazida aos autos, concluiu pela existência de simulação de negócio jurídico relativo ao contrato de compra e venda de imóvel de ascendente a descendente por interposta pessoa. A modificação do entendimento lançado no v. acórdão recorrido demandaria o revolvimento de suporte fático-probatório dos autos, o que é inviável em sede de recurso especial, a teor do que dispõe a Súmula 7 deste Pretório.

2. O negócio jurídico nulo por simulação não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo e, portanto, não se submete aos prazos prescricionais, nos termos dos arts. 167 e 169 do Código Civil de 2002.

3. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt no REsp 1702805/DF, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 03/03/2020, DJe 25/03/2020) – grifei.

No mesmo sentido, cito precedentes deste Tribunal de Justiça:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. AÇÃO DECLARATÓRIA. NULIDADE. SIMULAÇÃO. PRESCRIÇÃO. O negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo (art. 169 do CC/02). No caso concreto não se trata de pretensão de restituição de valores pagos a título de comissão de corretagem a partir de abusividade da transferência da obrigação ao consumidor em contratos de promessas de compra e venda. A questão trazida diz respeito à suposta nulidade da promessa de compra e venda entabulada entre as partes litigantes sob a alegação de vício de consentimento. Assim, a devolução dos valores pagos a título de comissão de corretagem, parcela da pretensão indenizatória, apresenta-se como corolário lógico do eventual reconhecimento da nulidade do contrato. Portanto, envolvendo a ação declaração de nulidade de promessa de compra e venda com fundamento na ocorrência de simulação, não há falar em prescrição trienal da pretensão de restituição do valor pago a título de comissão de corretagem. Prescrição afastada. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 70083858092, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Antonio Angelo, Julgado em: 30-04-2020) – grifei.

APELAÇÃO CÍVEL. POSSE. BENS IMÓVEIS. AÇÃO REIVINDICATÓRIA E ANULATÓRIA DE REGISTRO PÚBLICO. PROPRIEDADE DO IMÓVEL DEVIDAMENTE COMPROVADA. POSSE INJUSTA DA RÉ. INCORREÇÃO NA CONFRONTAÇÃO DO IMÓVEL LEVADO A REGISTRO. PROVA DOS AUTOS A CONFORTAR O PEDIDO. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA INOCORRENTES. GRATUIDADE JUDICIÁRIA.. A declaração de inexistência de ato jurídico - ato nulo - não se submete aos institutos da prescrição e decadência, pois na forma do artigo 169 do CCB, “o negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo”. Logo, não há que se falar em prazo prescricional e decadencial. A ação reivindicatória é o procedimento que visa garantir posse àquele que já possui o domínio do bem, estando tal situação consubstanciada na regra trazida pelo art. 1.228, do Código Civil. Caso. A prova documental e testemunhal confirma a incorreção das confrontações do terreno pertencente aos demandados, a qual adentrou ao terreno pertencente aos autores, cabendo a regularização e a procedência da ação, nos termos da sentença. Gratuidade judiciária deferida. DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME.(Apelação...

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