Acórdão nº 50109353820228217000 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 27-04-2022

Data de Julgamento27 Abril 2022
ÓrgãoOitava Câmara Criminal
Classe processualAgravo de Execução Penal
Número do processo50109353820228217000
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20001787397
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

8ª Câmara Criminal

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Agravo de Execução Penal Nº 5010935-38.2022.8.21.7000/RS

TIPO DE AÇÃO: Roubo (art. 157)

RELATORA: Desembargadora NAELE OCHOA PIAZZETA

AGRAVANTE: SEGREDO DE JUSTIÇA

AGRAVADO: SEGREDO DE JUSTIÇA

RELATÓRIO

Trata-se de agravo em execução interposto pela DEFENSORIA PÚBLICA em favor de DIEGO SILVA LOPES em face da decisão proferida pelo juízo da Vara de Execução Criminal Regional da Comarca de Caxias do Sul que determinou a retificação do Relatório da Situação Processual Executória do apenado, fazendo constar, como requisito objetivo ao livramento condicional, a aplicação da fração de 1/2 sobre o montante de todas as condenações em face da reincidência, mesma oportunidade em que reconheceu a prática de falta grave por novo crime no curso da execução e determinou a alteração da data-base para 13-10-2020 e a perda de 1/3 dos dias remidos, incluídos aqueles eventualmente ainda não reconhecidos judicialmente, deixando de impor a regressão a regime mais gravoso, pois já em regime fechado (SEEU, seq. 52).

Em suas razões, sustenta que a condição de reincidência atinge apenas as condenações em que reconhecida expressamente a agravante, sendo que, para as demais, devem ser aplicados os lapsos temporais previstos para os apenados primários. Igualmente menciona a necessidade de sentença condenatória transitada em julgado para eventual recognição de falta disciplinar. Postula a reforma da decisão a fim de afastar o status de reincidente da totalidade das penas, bem como para afastar o reconhecimento da falta grave, prequestionando a matéria ao final (evento 3, AGRAVO1).

Recebido o agravo em execução (evento 3, OUT - INST PROC2), apresentadas contrarrazões pelo Ministério Público (evento 3, OUT - INST PROC3) e mantida a decisão singular (evento 3, OUT - INST PROC4), os autos foram remetidos a esta Corte, manifestando-se o ilustre Procurador de Justiça, Glênio Amaro Biffignandi, pelo desprovimento da insurgência (evento 9, PARECER1).

Conclusos para julgamento.

Breve relatório.

VOTO

Conforme expediente carcerário obtido mediante acesso ao processo eletrônico de execução penal nº 8000103-78.2020.8.21.0010, DIEGO SILVA LOPES cumpre pena de 09 anos e 01 mês de reclusão, atualmente no regime fechado, em razão da prática de crimes de roubo e desobediência.

Iniciou a expiação em 06-4-2019, no mencionado regime.

Após intercorrências envolvendo seu histórico carcerário, sobreveio notícia da prática de novo crime no curso da execução em 13-10-2020, originando o expediente nº 50216867320208210010, com sentença condenatória proferida em 04-6-2021 confirmada por esta Corte em sede de recurso de apelação em 27-10-2021, havendo registro de trânsito em julgado em 09-11-2021.

Realizada audiência nos moldes do §2º do artigo 118 da LEP (SEEU, seq. 50) e colhida a manifestação das partes, o juízo da Vara de Execução Criminal Regional da Comarca de Caxias do Sul acolheu pleito ministerial e determinou a retificação do Relatório da Situação Processual Executória do apenado, fazendo constar, como requisito objetivo ao livramento condicional a aplicação da fração de 1/2 sobre o montante de todas as condenações em face da reincidência, mesma oportunidade em que reconheceu a prática de falta grave prevista no artigo 52 da LEP, determinando a alteração da data-base para 13-10-2020 e a perda de 1/3 dos dias remidos, incluídos aqueles eventualmente ainda não reconhecidos judicialmente, deixando de impor a regressão a regime mais gravoso, pois já em regime fechado (SEEU, seq. 52).

Contra tanto se insurge o agravante.

Inicio pelo enfrentamento do pleito de afastamento do status de reincidente da totalidade das penas à contagem para o benefício do livramento condicional.

Não colhe.

A reincidência é instituto destinado a diferenciar os criminosos contumazes que não compreenderam as finalidades da sanção imposta daqueles que estão iniciando o contato com o mundo do delito. Configura circunstância de natureza pessoal que, uma vez constatada, passa a reger todo o cumprimento da pena, impondo o atendimento de frações mais elevadas para o alcance de determinados benefícios.

Quando o reeducando adquire o status de reincidente, todas as condenações subsequentes que figuram em sua guia de execução passam a ter essa chancela.

Para fins de livramento condicional, em havendo várias condenações, devem as penas ser somadas, realizando-se sobre o total o cálculo para verificação do requisito temporal para a concessão do benefício, consoante artigo 84 do Código Penal1. Em se tratando de condenado reincidente em crime doloso, deverá cumprir a fração de 1/2 sobre todas as condenações, sendo infundado o argumento no sentido da necessidade de verificação individualizada em cada processo.

Sobre a questão, destaco julgados do Superior Tribunal de Justiça e deste Órgão Fracionário:

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS COUS. DECISÃO SINGULAR PROFERIDA POR RELATOR. NÃO CONHECIMENTO DO WRIT. OFENSA AO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. INOCORRÊNCIA. WRIT IMPETRADO EM SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO CABÍVEL. LIVRAMENTO CONDICIONAL. CÁLCULO DO TEMPO NECESSÁRIO PARA OBTENÇÃO. REINCIDÊNCIA EM CRIME DOLOSO. INCIDÊNCIA SOBRE O MONTANTE OBTIDO PELA REUNIÃO DAS EXECUÇÕES. LAPSO DE 1/2 (UM MEIO).
AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL.
DECISÃO MANTIDA PELOS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. AGRAVO DESPROVIDO. 1. O art. 34, inciso XX, do Regimento Interno desta Corte Superior de Justiça autoriza o relator a decidir o habeas corpus quando o pedido for manifestamente incabível ou improcedente, como ocorre na hipótese dos autos, não se configurando, portanto, ofensa ao princípio da colegialidade. Precedentes. 2. A via eleita revela-se inadequada para a insurgência contra o ato apontado como coator, pois o ordenamento jurídico prevê recurso específico para tal fim, circunstância que impede o seu formal conhecimento. Precedentes. 3. É assente neste Tribunal o entendimento de que, havendo várias condenações, deve se proceder à soma das penas, realizando-se o cálculo do requisito objetivo exigido ao livramento condicional sobre o montante obtido, nos termos do art. 84 do Código Penal. 4. In casu, como o paciente é reincidente em crime doloso, deve ser adotado o lapso preconizado no art. 83, inciso II, do Código Penal, impondo-se o transcurso do patamar de 1/2 (um meio) da sanção para a obtenção do livramento condicional, não havendo cogitar a aplicação concomitante do patamar de 1/3 (um terço) para a execução de pena aplicada ao tempo em que o réu ostentava a primariedade e de 1/2 (um meio) para as demais execuções. 5. Por ter sido proferida em consonância com o entendimento firmado neste Sodalício sobre o tema impugnado, a decisão agravada deve ser mantida pelos seus próprios fundamentos. 6. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no HC 494.119/MS, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 10/09/2019, DJe 19/09/2019)

AGRAVO EM EXECUÇÃO. RECURSO MINISTERIAL. LIVRAMENTO CONDICIONAL. PRESSUPOSTO OBJETIVO. APENADO REINCIDENTE. FRAÇÃO APLICÁVEL E FORMA DE CÁLCULO. PLEITO DE RETIFICAÇÃO DA GUIA DE RECOLHIMENTO. - Para fins de livramento condicional, em havendo várias condenações, devem as penas ser somadas, realizando-se sobre o total o cálculo para verificação do requisito temporal para a concessão do benefício. Art. 84, CP. E sendo o apenado reincidente em crime doloso, deve ele cumprir metade de sua pena para fruir desse benefício, conforme prevê o art. 83, inc. II, do CP. A condição de reincidência, uma vez adquirida pelo agente, estende-se sobre o total da pena em cumprimento, não se justificando a consideração isolada de cada condenação, tampouco a aplicação concomitante de percentuais diferentes para umas e outras reprimendas. Agravo em execução provido. (Agravo de Execução Penal, Nº 70083543488, Oitava Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Dálvio Leite Dias Teixeira, Julgado em: 29-01-2020)

Portanto, na medida em que o apenado cumpre pena pelas condenações referentes aos processos nº 0012987-18.2019.8.21.0010 e 5021686-73.2020.8.21.0010, correta a decisão que determinou fosse anotada sua condição de reincidente, o que atrai a necessidade do cumprimento de 1/2 da pena total para o preenchimento do requisito objetivo exigido para o livramento condicional.

Prossigo ao exame do cometimento de falta grave consistente em novo crime no curso da execução.

A Lei de Execução Penal é composta por um conjunto de normas cujo objetivo é disciplinar, organizar e harmonizar coletividade que, em ofensa às regras de convivência em sociedade, afrontou as vedações contidas no Estatuto Repressivo e na legislação penal extravagante, competindo ao preso cumprir os regramentos a ele destinados sob pena de arcar com as reprimendas previstas e adequadas à conduta transgressora.

Inadmissível, por conseguinte, que o apenado se afaste sponte propria de sua obrigação legal de cumprir a pena pelo ilícito que reconhecidamente cometeu, pratique novo crime no curso do resgate de condenatória anterior e, última análise, deixe de expiar a privativa de liberdade nos termos antevistos pelo Legislador Infraconstitucional.

Lado outro, dispensável a existência de sentença condenatória transitada em julgado à caracterização da falta grave. A norma exige expressamente a prática de fato previsto como crime doloso, orientação adotada por esta Oitava Câmara Criminal:

AGRAVO EM EXECUÇÃO. COMETIMENTO DE FATO PREVISTO COMO CRIME DOLOSO. FALTA GRAVE. CONSECTÁRIOS LEGAIS. 1. PAD. PRESCRIÇÃO. Prazo prescricional constante no art. 37 do RDP, que se direciona, unicamente, à prescrição para apuração da falta no âmbito administrativo e às consequências disciplinares daí decorrentes, a serem aplicadas pelas autoridades...

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