Acórdão nº 50111056720218210073 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décima Sétima Câmara Cível, 23-01-2023

Data de Julgamento23 Janeiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50111056720218210073
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécima Sétima Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20003207270
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

17ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5011105-67.2021.8.21.0073/RS

TIPO DE AÇÃO: Retificação

RELATORA: Desembargadora ROSANA BROGLIO GARBIN

APELANTE: GUIDO PEDRO KIELING (REQUERENTE)

APELADO: OFICIAL DE REGISTROS PUBLICOS DE CIDREIRA (INTERESSADO)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de apelação interposto por GUIDO PEDRO KIELING em face da sentença em que a Magistrada a quo julgou improcedente suscitada "dúvida registral (inversa)" referente a nota de impugnação lançada pelo Oficial do Registro de Imóveis de Cidreira, e determinou o pagamento de custas pelo requerente (evento 18, SENT1).

Em suas razões (evento 24, APELAÇÃO1), contextualiza o demandante que o feito foi proposto porque "o Registro de Imóveis de Cidreira impugnou pedido de transferência de um imóvel de propriedade do recorrente (com a necessária outorga uxória de sua cônjuge), como forma de integralização de capital na sociedade “Família Gageiro Kieling Administração De Patrimônio Familiar Ltda”, da qual é sócio". Pontua que é casado pelo regime da comunhão universal de bens, mas que houve a expressa outorga uxória no respectivo instrumento contratual. Alega que não se pode exigir que a esposa do recorrente fosse sócia da empresa para fins de possibilitar a transferência do bem imóvel, diante da vedação do art. 977 do CC. Nos termos do art. 1.667 CC, conclui que, na espécie de regime de casamento eleita por ele e esposa, constitui-se um único acervo patrimonial, que pertence a ambos os cônjuges, de modo que não haveria como alegar que o bem sub judice pertence a terceiro. Assevera que a anuência do cônjuge do sócio pode ser dada no próprio ato de constituição ou alteração das sociedades comerciais e levada a registro acompanhada da certidão expedida pela Junta Comercial, nos termos dos arts. 35, VII, e 64 da Lei 8.934/94, dispensando, assim, a escritura pública específica. Esclarece que pretendendo integralizar capital à sociedade por meio de imóveis de sua propriedade ao capital social da empresa (dentre os quais um situado no Município de Cidreira), efetuou alteração do contrato social, devidamente registrado na Junta Comercial. Reitera que sua esposa lançou expressa anuência (outorga uxória) no referido instrumento contratual, o que seria suficiente para provar a sua ciência e aceitação no que tange à integralização dos bens no patrimônio da sociedade da qual o requerente é sócio, e, assim, revelando-se meio hábil para o registro e transferência da propriedade junto ao Ofício do Registro de Imóveis. Chama atenção que "nos demais cartórios imobiliários a transferência de propriedade feita pelo apelante foi levada a efeito (p. ex. Viamão, Porto Alegre, Dois Irmãos), sem qualquer impugnação no que tange à alegada insuficiência da outorga uxória". Colaciona jurisprudência. Pugna, ao final, pelo provimento da irresignação, julgando-se procedente a presente dúvida inversa, afastando-se as exigências constantes da Nota de Impugnação Cartorária e determinado-se que o suscitado proceda ao registro do contrato social apresentado.

Não foram ofertadas contrarrazões.

Aportou aos autos parecer do Procurador de Justiça que atua nesta Câmara (evento 8, PARECER1), opinando pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

Remetidos a esta Corte, vieram os autos eletrônicos conclusos para julgamento.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame do apelo.

Cuida-se o feito de suscitada "dúvida registral (inversa)" movida por GUIDO PEDRO KIELING em virtude de o Registro de Imóveis de Cidreira/RS ter impugnado pedido de registro de transferência de um imóvel de propriedade do recorrente (matrícula nº 11.565 - evento 1, MATRIMÓVEL3), como forma de integralização de capital na sociedade “Família Gageiro Kieling Administração De Patrimônio Familiar Ltda”, da qual é sócio o autor, sob o fundamento de ser indispensável a escritura pública quanto à metade do imóvel, eis que casado o postulante sob o regime da comunhão universal de bens.

Na impugnação do registrador (evento 1, OUT6 e evento 1, OUT9), consta que "uma vez que o cônjuge não integra a sociedade em cumprimento do art 977 do CCB, o título hábil a transferir a propriedade deve ser através de instrumento público, conforme exige a lei civil"; completou, outrossim, que "ainda que a certidão dos atos de constituição e de alteração fornecida pela junta comercial seja o documento hábil para o sócio que busca integrar quotas sociais, inviável neste caso pelo cônjuge não sócia" (sic).

A controvérsia instaurada, portanto, diz com a possibilidade ou não de a outorga uxória do cônjuge não sócio de sociedade empresária - quanto à integralização de capital com bens de sócio casado no regime da comunhão universal -, se dar por meio certidão dos atos de constituição e de alteração fornecida pela junta comercial em que haja alusão à anuência da esposa (evento 1, CONTRSOCIAL4), dispensando escritura pública específica.

Pois bem.

Estando segundo consta dos autos, o autor e sua esposa, GLADYS GAGEIRO KIELING, casados sob o regime de comunhão universal de bens, incidem as disposições dos seguintes dispositivos legais:

"(...)

Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta:

I - alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis;

II - pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos;

III - prestar fiança ou aval;

IV - fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação.

Parágrafo único. São válidas as doações nupciais feitas aos filhos quando casarem ou estabelecerem economia separada.

(...)

Art. 1.667. O regime de comunhão universal importa a comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges e suas dívidas passivas, com as exceções do artigo seguinte.

Art. 1.668. São excluídos da comunhão:

I - os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar;

II - os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva;

III - as dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum;

IV - as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de incomunicabilidade;

V - Os bens referidos nos incisos V a VII do art. 1.659.

(...)" (grifou-se)

A lei nº 8.934/1994, que dispõe sobre o Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins, a seu turno, preconiza o quanto segue:

"Art. 35. Não podem ser arquivados:

(...)

VII - os contratos sociais ou suas alterações em que haja incorporação de imóveis à sociedade, por instrumento particular, quando do instrumento não constar:

a) a descrição e identificação do imóvel, sua área, dados...

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