Acórdão nº 50112441520208210021 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Vigésima Quarta Câmara Cível, 29-06-2022

Data de Julgamento29 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo50112441520208210021
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoVigésima Quarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO

Documento:20002215355
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

24ª Câmara Cível

Avenida Borges de Medeiros, 1565 - Porto Alegre/RS - CEP 90110-906

Apelação Cível Nº 5011244-15.2020.8.21.0021/RS

TIPO DE AÇÃO: Cláusulas Abusivas

RELATOR: Desembargador JORGE ALBERTO VESCIA CORSSAC

APELANTE: MARIA SALETE COITO KLAUS (AUTOR)

APELANTE: BANCO AGIBANK S.A (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de recursos de apelação interposto por MARIA SALETE COITO KLAUS e BANCO AGIBANK S.A, em face da sentença que, nos autos da ação revisional que move a primeira em desfavor da última, assim julgou o pedido (Evento 23, SENT1, Origem):

Ante o exposto, na forma do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por MARIA SALETE COITO KLAUS em desfavor de BANCO AGIBANK S.A, para:

a) revisar os juros remuneratórios da Cédula de Crédito Bancário n° 1210721011, devendo haver a limitação das taxas de juros para 47,40%a.a.;

b) condenar a parte ré à compensação/repetição do valor pago indevidamente pela parte autora, de forma simples, após a revisão dos encargos mencionados acima, recalculando-se o contrato.

Considerando a sucumbência recíproca, que reputo em maior grau ao demandado, condeno este ao pagamento de 70% da Taxa Única e despesas processuais, além de honorários advocatícios em favor do Procurador da parte autora, os quais fixo em 15% sobre o valor da condenação, observando-se os estritos vetores do art. 85, §2° do CPC, considerando a natureza da causa e trabalho desenvolvido. Ainda, condeno a parte autora ao pagamento de 30% da Taxa Única e despesas processuais, além de honorários advocatícios em favor do Procurador da parte ré, que fixo em 12% sobre o valor atualizado da causa. Suspensa a exigibilidade das custas e honorários em relação à parte autora, pois litiga sob o amparo da gratuidade judiciária, na forma do art. 98, §3° do CPC.

Em razões recursais, a instituição financeira requer a aplicação da taxa referente a empréstimo pessoal não consignado ao presente caso. Sustenta a incidência de conexão da presente ação, pois alega haver identidade de pedidos e de causa de pedir com outras sete ações revisionais igualmente ajuizadas pela autora. Alega que não há que se falar em abusividade de juros, tampouco em redução do percentual de juros remuneratórios. Pugna pelo arbitramento da verba honorária com base no valor econômico da ação. Requer o provimento do recurso.

Em razões recursais, a autora postula a repetição em dobro e indenização pelos danos morais suportados. Pugna pela majoração da verba honorária, de forma condigna ao profissional de advocacia. Requer o provimento do recurso.

Da sentença, a autora opôs embargos de declaração, os quais foram rejeitados (Evento 33, DESPADEC1, Origem).

Intimadas, as partes apeladas apresentaram contrarrazões. (Eventos 43 e 46, CONTRAZ1 E CONTRAZAP1, Origem).

Vieram-me os autos conclusos para julgamento, cumpridas as formalidades legais.

É o relatório.

VOTO

DA ADMISSIBILIDADE RECURSAL

O presente norteia-se pelas disposições processuais estabelecidas pelo Código de Processo Civil de 2015.

Com fundamento no art. 1010, §3º, in fine, presentes os pressupostos de admissibilidade intrínsecos e extrínsecos (cabimento e adequação, tempestividade, regularidade procedimental e formal, preparo do apelo do réu e ausência de preparo da autora, ante a concessão da gratuidade da justiça, ausência de fato extintivo ou modificativo do direito de recorrer, legitimidade e interesse) recebo o apelo em ambos os efeitos.

Ausentes quaisquer das hipóteses previstas no art. 933 do CPC, passo ao exame dos recursos.

DA RELAÇÃO CONTRATUAL

A presente ação tem por objeto a Cédula de Crédito Bancário nº 1210721011, firmado em 01.11.2017, no valor de R$ 1.928,54, em 12 parcelas, prevendo juros remuneratórios no percentual de 18% ao mês e 628,76 % ao ano, conforme contrato juntado no Evento 9, CONTR4, origem.

DO APELO DA PARTE RÉ

PRELIMINAR DE CONEXÃO. NÃO CARACTERIZAÇÃO.

A conexão é causa de modificação da competência relativa. Caracteriza-se quando duas ou mais ações tiverem o mesmo pedido ou a causa de pedir, aplicando-se também esse conceito às execuções de título extrajudicial e à ação de conhecimento referentes ao mesmo ato jurídico, nos termos dos arts. 54 e 55, § 2º, I, do CPC:

Art. 54. A competência relativa poderá modificar-se pela conexão ou pela continência, observado o disposto nesta Seção.

Art. 55. Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir.

§ 1º Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta, salvo se um deles já houver sido sentenciado.

§ 2º Aplica-se o disposto no caput :

I - à execução de título extrajudicial e à ação de conhecimento relativa ao mesmo ato jurídico;

II - às execuções fundadas no mesmo título executivo.

§ 3º Serão reunidos para julgamento conjunto os processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre eles.

No caso em tela, a presente ação revisional tem por objeto contrato diverso àqueles mencionados pelo demandado, ou seja, são contratos distintos e autônomos.

Desse modo, ainda que idênticas as partes litigantes, tem-se que os pedidos e a causa de pedir são diversos, bem como a relação jurídica discutida em cada lide, não havendo falar em conexão.

JUROS REMUNERATÓRIOS

Com relação à revisão dos juros, embora não divirja propriamente quanto à possibilidade de alteração de dispositivos contratuais que se mostrem abusivos, vinha mantendo entendimento mais restritivo quando da identificação das hipóteses de abusividade, conforme reiteradamente sustentado em decisões anteriores, tanto em primeiro quanto em segundo grau. Não obstante isso, considerando as peculiaridades do trabalho colegiado e também com vistas a preservar a unidade do julgamento, nesse tópico passo a adotar o posicionamento dominante nesta Câmara conforme desenvolvimento que segue.

Embora a questão da incidência do Código de Defesa do Consumidor se encontre superada pela edição do verbete 297 do STJ, tal não significa que a revisão de cláusulas contratuais seja medida imperativa, senão nos casos de comprovada abusividade.

Nessa linha, persiste o princípio da liberdade na fixação dos juros remuneratórios nos contratos de mútuo e negócios bancários em geral, a exceção daqueles regidos por legislação especial.

Desarrazoada, portanto, a pretendida limitação ao percentual de 12% ao ano como requerido.

Aliás, cuida-se de matéria há muito superada no âmbito jurisprudencial, sendo pacífico o entendimento de que as instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios que foi estipulada pela Lei de Usura (Decreto nº 22.626/1933), em consonância com a Súmula nº 596/STF, sendo também inaplicável o disposto no art. 591, c/c o art. 406, do Código Civil para esse fim, salvo nas hipóteses previstas em legislação específica.)

Tal questão, aliás, encontra-se sedimentada na Corte Superior, cujo entendimento é seguido pela jurisprudência majoritária do Tribunal Gaúcho.

Confira-se a Súmula n. 382 do STJ:

“A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.”

A orientação emanada pelo Superior Tribunal de Justiça pauta-se no sentido de que, comprovada a abusividade na pactuação dos juros, aplica-se a taxa média de mercado divulgada pelo BACEN para o mês de celebração do instrumento.

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. BANCÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE NÃO CONSTATADA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. SÚMULAS N. 5 E 7 do STJ. DECISÃO MANTIDA.

1. As taxas de juros remuneratórios devem ser fixadas à taxa média de mercado quando verificada, pelo Tribunal de origem, a abusividade do percentual contratado.

2. No caso concreto, o acórdão recorrido afastou a alegada abusividade da taxa contratada. Dessa forma, não há como conhecer do recurso especial ante o óbice das Súmulas n. 5 e 7 do STJ.

3. A análise da extensão da sucumbência das partes para fins de aplicação do art. 21, parágrafo único, do CPC revela-se inviável em recurso especial, em virtude do óbice erigido pela Súmula n. 7/STJ. Precedentes.

4. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no AREsp 393782 / MS, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Quarta Turma, 16/09/2014, DJe 22/09/2014)

Nesse contexto, a redução dos juros depende de comprovação da onerosidade excessiva - capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - em cada caso concreto, tendo como parâmetro a taxa média de mercado para as operações equivalentes.

No caso concreto, o contrato foi firmado em 01.11.2017, e considerando os percentuais de juros pactuados (18% ao mês, conforme...

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